Ministérios gastarão R$ 1,5 bilhão a mais








Ministérios gastarão R$ 1,5 bilhão a mais
Arrecadação além do esperado permite ao governo ampliar gastos a três semanas das eleições. Decisão não comprometerá acordo com o FMI

O governo brasileiro arrecadará R$ 5,5 bilhões a mais do que esperava neste segundo semestre. O ganho líquido, descontadas as transferências constitucionais para estados e municípios, será de R$ 4,1 bilhões. Segundo o secretário-executivo do ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Simão Cirineu, citado pela Folha Online, a arrecadação extraordinária vem, principalmente, do pagamento de impostos atrasados pelas empresas e do provável recebimento de R$ 1,7 bilhão, referente a dívidas da Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco de Brasil) com o Fisco.

Essa verba extra permitirá que a União economize dinheiro e libere, conforme anunciado ontem, R$ 1,535 bilhão (US$ 490 milhões) para os ministérios a três semanas das eleições. O ministro do Planejamento, Guilherme Dias, disse no Rio que não há qualquer ligação eleitoral.

Do total, R$ 420 milhões serão destinados a programas e ações estratégicas do governo, que incluem desde a manutenção de estradas até obras de saneamento básico. A maioria desses programas tiveram suas verbas reduzidas devido aos ajustes no orçamento para cumprir a meta de superávit.

O ministério da Defesa receberá R$ 310 milhões. Esse ministério foi outro dos grandes sacrificados pelo corte no orçamento: recentemente, pela primeira vez na história, 44 mil soldados voltaram para casa após terem cumprido apenas metade do serviço militar obrigatório, por falta de dinheiro. Cerca de R$ 199 milhões foram destinados ao ministério da Fazenda e outros R$ 106 milhões ao do Planejamento.

Esses gastos não impedirão que o Ministério da Fazenda realize um aumento de R$ 1,6 bilhão na meta de superávit primário (arrecadação superior à despesa, exceto a conta de juros) deste ano, conforme anunciou há poucos dias. A nova meta de superávit, 3,88% do Produto Interno Bruto (PIB), não será comprometida segundo o governo federal. Esse objetivo faz parte de um acordo, pelo qual o país receberá US$ 30 bilhões do Fundo Monetário Internacional (FMI) até o final de 2003. Desse empréstimo, o governo brasileiro já sacou os US$ 3 bilhões.

O dinheiro entrou ontem nas reservas internacionais do país, que subiram de US$ 37 bilhões para US$ 40 bilhões. Outros US$ 3 bilhões poderão ser sacados em dezembro deste ano, depois da primeira revisão do acordo. Os US$ 24 bilhões restantes sairão no próximo ano. O acordo com o FMI deu ao Banco Central US$ 13 bilhões mais para enfrentar a especulação contra o real este ano. Além dos US$ 3 bilhões iniciais, o BC pode usar US$ 10 bilhões das reservas graças ao rebaixamento do seu piso de US$ 15 bilhões para US$ 5 bilhões.

A arrecadação de tributos federais teve crescimento de 18,9% nos oito primeiros meses deste ano em relação ao mesmo período de 2001. Em agosto, porém, a arrecadação registrou queda de 12,06% em relação a julho. Os números divulgados ontem pela Receita Federal mostram que foram arrecadados R$ 152,7 bilhões de janeiro a agosto deste ano, R$ 24,3 bilhões a mais do que no mesmo período de 2001. Boa parte desse aumento decorreu de receitas extraordinárias que não vão se repetir nos próximos anos.

A principal é relativa à decisão judicial favorável à União que levou os fundos de pensão a pagar R$ 7,4 bilhões de Imposto de Renda (IR) atrasado. Esse valor pode crescer caso a Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, pague R$ 1,7 bilhão de IR atrasado nas próximas semanas. Além de acertarem o pagamento, os fundos passaram a fazer o recolhimento mensal, o que gerou mais R$ 270 milhões. Outra receita extra refere-se à desistência de ações judiciais em troca do pagamento de R$ 1,9 bilhão em débitos parcelados em atraso.


Benedita evita o pior e ajuda PT
Com o fim da rebelião em Bangu 1, sem a invasão da polícia, a governadora consegue evitar o uso eleitoral do motim por adversários do partido no Rio e na campanha presidencial

O maior motim da história da penitenciária que abriga os principais traficantes do país durou 23 horas e terminou com dois vencedores: a governadora Benedita da Silva, do Partido dos Trabalhadores, e o traficante Fernandinho Beira-Mar, do partido do crime, o Comando Vermelho, líder do levante. Os derrotados são os de sempre, a população, e em especial, os moradores das 600 favelas do Rio, escravizados pelo narcotráfico e que agora sofrerão com novas disputas de território entre os gerentes da droga.

Benedita ganhou porque conseguiu evitar derramamento de sangue inocente, o que minimizou as chances de uso político da rebelião nas campanhas eleitorais. José Serra (PSDB) e Ciro Gomes (PPS) não se meteram para valer no assunto. Pelo menos por enquanto. Anthony Garotinho (PSB) se limitou a uma alfinetada recheada de adjetivos contra a política de segurança pública do PT.
Luiz Inácio Lula da Silva fez o previsível. Elogiou a performance de sua companheira de partido.

A governadora anunciou uma nova era em Bangu 1. Demitiu o diretor, afastou carcereiros suspeitos de facilitar a balbúrdia, reduziu as visitas e os banhos de sol dos presos. Por fim, definiu que a partir de agora, a carceragem ficará por conta das polícias, Civil e Militar.

Durante as negociações, a governadora e o secretário de Segurança Pública, Roberto Aguiar, oscilaram entre duas estratégias. No final da tarde, mandaram as tropas invadirem a cadeia. Optaram pelo risco de matar presos e reféns. Recuaram no começo da noite, quando agentes penitenciários engatilharam as armas e prometeram atirar contra policiais sob o argumento de que havia carcereiros entre os reféns e que morreriam durante a invasão (leia depoimento ao lado). As autoridades cederam.

Dois delegados entraram desarmados no presídio e passaram a negociar com um debochado Beira-Mar, que tinha cinco pistolas e duas escopetas. Se rendeu de madrugada. Até a noite de ontem, as autoridades não divulgaram o destino do traficante. Querem despachá-lo do Rio, mas ainda não sabem para onde.

Luiz Fernando da Costa, o Beira-Mar, é outro vitorioso do episódio que mereceu uma página do jornal americano New York Times na edição especial de aniversário dos atentados de 11 de setembro. Beira-Mar venceu porque sobreviveu ao levante, matou quatro rivais e deu um grande passo para o plano que traçou em janeiro deste ano. Quer virar o grande capo (chefão) da bandidagem nacional. Planeja monopolizar o crime, unificá-lo num único comando e aumentar os lucros de sua ‘‘firma’’, cuja contabilidade inclui contrabando de armas e fornecimento de drogas.

Para aumentar a rentabilidade dos negócios, Beira-Mar precisa eliminar inimigos. ‘‘Ele está agindo como se fosse um reizinho, um Luiz XIV que quer mandar no Rio’’, resumiu o Roberto Aguiar.

Desde que chegou a Bangu 1, Beira-Mar já ordenou pelo telefone celular cinco mortes. Ontem, queimou o corpo de seu principal concorrente, Ernaldo Pinto Medeiros, o Uê, homem que controlava a venda de drogas em 15 morros cariocas e chefiava o Terceiro Comando, quadrilha que disputa com o Comando Vermelho, as mortes, as drogas, as armas que aterrorizam os cariocas.

Na semana passada, Beira-Mar soube que Uê planejava assassiná-lo na cadeia. Estavam separados por oito portas de ferros e agentes dispostos a corrupção. Beira-Mar se antecipou. Liderou o motim com as chaves das celas nos bolsos.


Ficamos mais pobres
Pesquisa do IBGE aponta queda de 10,3% no rendimento médio do trabalhador brasileiro nos últimos cinco anos. O levantamento também traz dados positivos, como a diminuição do analfabetismo e a tendência de crescim ento na escolaridade

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou ontem que o brasileiro ficou mais pobre nos últimos anos. A via crucis registrada pelo IBGE ano a ano começou em 1996. De lá para cá, houve perda de 10,3% da renda média da população do país. ‘‘Os rendimentos mantiveram a tendência de queda, passando de R$ 663 em média, em 1996, para R$ 595 em 2001’’, afirma a pesquisadora do IBGE, Vandeli Guerra. Os números são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) de 2001. Feita todos os anos, ela mostra também que a concentração de renda no país não mudou durante o governo Fernando Henrique.

‘‘O rendimento piorou principalmente por causa de crises internas e externas que aconteceram nos últimos anos. Todas tiraram um pouco do dinheiro do trabalhador’’, explica o chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas, Marcelo Neri. Para o especialista, os resultados da Pnad — divulgados a menos de um mês do primeiro turno das eleições — servirão de munição para os candidatos na corrida pela Presidência. ‘‘O que tiver de ruim será usado contra o candidato do governo. E os números bons podem virar propaganda positiva’’, afirma.

Foi o que fez ontem mesmo o presidente Fernando Henrique Cardoso. Ele aproveitou dados da Pnad para rebater críticas ao governo na campanha eleitoral. ‘‘Não convém dar ao país uma impressão equivocada de que está tudo piorando’’, disse o presidente em pronunciamento na sala de cinema do Palácio da Alvorada.

Longe da política eleitoral, mas perto da realidade do baixo poder aquisitivo, está o camelô Valfredo Carlos Silva, 50 anos. Morador de Ceilândia há 12 anos, ele criou cinco filhos vendendo relógios. Mantinha as contas domésticas em dia. Neste ano, um mês paga a água, no outro a luz. ‘‘Há seis anos, comprei uma casa. Agora, o dinheiro mal dá pra comer’’, reclama.

Água e esgoto
O salário encolheu, mas o IBGE constatou melhora nas condições de vida do brasileiro. No saneamento básico, por exemplo, o país avançou. Mesmo que a passos de tartaruga. O número de domicílios atendidos pela rede de abastecimento de água aumentou em média de 77,7% para 81,1%, de 1996 para 2001. Os dados mostram ainda um incremento no número de domicílios com esgoto sanitário adequado. Hoje, 66,8% das casas têm esgoto tratado. O número é 3,1% maior do que há cinco anos.

A pequena melhora beneficiou a dona-de-casa Francinete Soares da Silva, 28. Há dois anos, Moradora do Areal, no Distrito Federa, a piauiense tinha de andar com um balde de água na cabeça por quilômetros. A água encanada demorou dois anos para chegar à invasão onde ela montou barraco no DF. A pesquisa do IBGE mostra também que aumentou o número de crianças na escola (leia quadro ao lado com dados da pesquisa). Na Pnad 2001, foram pesquisadas 378.837 pessoas e 126.858 domicílios em 851 municípios de todos os estados.


Brasilienses de sorte
Quatro colegas de trabalho de uma empresa da construção civil dividiram o prêmio de R$ 1, 8 milhão da Mega-Sena sorteado quarta-feira. No mesmo dia, um apostador do Distrito Federal ganhou a Lotomania

O Distrito Federal é pé-quente. Pelo menos para cinco brasilienses. Ontem, eles acordaram ricos. Quatro trabalham juntos. Fizeram um bolão de R$ 40 e ganharam o prêmio máximo da Mega-Sena, de R$ 1.843.709,96. O dinheiro já está na conta deles — exatos R$ 460.927,49 para cada. O quinto sortudo acertou sozinho os 20 números da Lotomania. Ganhou R$ 1.793.405,21. Até o início da noite, não havia buscado a bolada. A Caixa Econômica Federal não informou em que lotérica ele apostou, nem onde mora.

Os quatro colegas souberam que haviam acertado os seis números do concurso 395 da Mega-Sena logo cedo. Estavam no trabalho — uma empresa da construção civil, no Setor de Indústria e Abastecimento (SIA) — quando um deles resolveu conferir no jornal o resultado do sorteio realizado na noite de quarta-feira, em Feira de Santana (BA).

Quando viu os números, não acreditou. Conferiu uma, duas, três vezes. Chamou um dos colegas apostadores, que conferiu outras vezes. Incrédulos, acessaram a página da CEF na Internet. Viram os mesmos números lá novamente e, ainda, que o ganhador era do Distrito Federal.

Os quatro trabalham na seção de recursos humanos da empresa. Ao saber da notícia, um deles passou mal e foi se recuperar da emoção na casa dos pais, no Cruzeiro. ‘‘Ele andava preocupado. Tinha feito um empréstimo de R$ 1 mil no banco para quitar a casa, em Valparaíso (GO)’’, contou um amigo de trabalho, que não quis se identificar.

Os ganhadores não querem ter nomes e fotos publicados em jornais. Mas um deles, que chefia o setor de recursos humanos, conversou com o Correio pelo telefone. ‘‘Todos precisavam do dinheiro. Uns mais, claro. Mas ninguém fala em abandonar o emprego. Não ganhamos uma fortuna. Mas vamos comemorar muito com os parentes e amigos’’, disse ele, que mora na Asa Sul.

A quantia que cada um ganhou pode não deixar ninguém milionário. Mas é o suficiente para comprar três apartamentos de três quartos no Plano Piloto ou uma casa de dois andares no chique Lago Sul, com um belo jardim e piscina.

Por acaso
Os quatro ganhadores só apostavam quando o prêmio acumulava. Nem pensavam em jogar dessa vez. Mas, durante o almoço, quarta-feira, resolveram fazer uma fezinha. Foram juntos à lotérica de sempre, a LC Loterias, que funciona dentro da loja de materiais de construção Tend Tudo, no Trecho 2 do SIA.

Cada um deu R$ 10. Fizeram 40 apostas simples, de R$ 1 cada. Nem se deram ao trabalho de marcar os cartões. A máquina registradora fez isso por eles, aleatoriamente, pelo sistema Surpresinha.

O dono da LC Loterias, Luiz Carlos Barros, 36 anos, tratou de encomendar uma faixa para exibir na fachada da loja logo que foi informado pela Caixa que o bilhete premiado havia saído de uma das suas três máquinas. ‘‘A loteca é pequena. Registramos apenas 770 apostas ontem (quarta-feira). Mas mostramos que somos pé-quente’’, gabou-se.


O dossiê Passos
O empresário Márcio Passos revela ter em seu poder fitas de vídeo nas quais integrantes do primeiro escalão do governo confessam ter recebido propina para aprovar condomínios. Ele e o irmão Pedro são procurados pela polícia

Há uma semana, a existência de um dossiê composto por mais de cem fitas de vídeo, gravações e documentos desnorteia integrantes do primeiro escalão do Governo do Distrito Federal e aliados do governador Joaquim Roriz. O material foi reunido pelo empresário Márcio Passos, foragido da Justiça desde a noite de quarta-feira.

Segundo ele, as gravações envolvem autoridades do governo em corrupção. ‘‘Em uma delas, o Odilon diz que o Gim recebeu 300 lotes para regularizar o condomínio Alto da Boa Vista. Disse ainda que não recebe mais propina em cheque, só em dinheiro’’, explicou Márcio, ao Correio, dias antes de ter a prisão decretada pelo juiz da 1ª Vara Criminal de Brasília.

Odilon Aires (PMDB) é deputado distrital. Gim Argello (PMDB), presidente da Câmara Legislativa. Até o início da campanha eleitoral, eles e a família Passos estavam do mesmo lado. Mas assim que Pedro, irmão de Márcio, foi lançado candidato a distrital (PSD), pelas mãos de Roriz, a situação mudou. O caçula dos Passos começou a disputar eleitores em áreas da cidade antes ocupadas por parlamentares do PMDB e passou a ser atacado pelos antigos amigos.

Na noite de quarta-feira, a Justiça decretou a prisão de Pedro e Márcio, a pedido do Ministério Público (leia matéria ao lado). Os dois e o topógrafo Vinício Jadiscke Tasso — também foragido — são acusados de tentar implantar o condomínio Mansões do Lago, atrás da QI 27 do Lago Sul. O condomínio tinha sido benef iciado por uma lei distrital sobre a qual pesa a suspeita de ter sido fraudada.

Uma semana antes da decretação da prisão preventiva, Márcio resolveu partir para o contra-ataque e reagiu com artilharia pesada. Revelou ao Correio que, nos últimos cinco anos, gravou conversas de figurões da capital. Além de fitas de vídeo, o acervo contém documentos e fitas K-7. Os diálogos, garante Márcio, estão recheados de confissões de corrupção, de achaques, de tráfico de influência.

Questionado se gravou conversas do governador Joaquim Roriz, Márcio respondeu: ‘‘Gravei todo mundo que está ou passou pelo governo’’.

As cenas destacadas nesta página, por exemplo, são de um video
gravado e editado por Márcio. O empresário garante que a gravação mostra o ex-secretário de Assuntos Fundiários, Odilon Aires, afirmando que recebeu pagamento em lotes para facilitar a regularização do condomínio Alto da Boa Vista (veja acima). ‘‘Se você visse tudo o que eu tenho do Odilon, ficaria com pena dele’’, disse o empresário.

As gravações foram feitas no escritório dos Passos, localizado no bloco E da SCLN 311. A fita registra apenas trechos da conversa que Odilon manteve, ainda quando secretário, com Pedro. Trata-se de uma versão editada, onde parte dos diálogos foi suprimida. Cada trecho tem um título, como ‘‘Propina, de agora em diante, só em dinheiro’’ ou ‘‘Esquema de recebimento de lotes para regularização de condomínios’’.

Perícia
O Correio teve acesso ao material e submeteu-o à perícia técnica do professor Ricardo Molina, no Laboratório de Fonética Forense e Processamento de Imagens, em São Paulo. Molina, perito reconhecido nacionalmente, concluiu que, apesar de a fita ter sido editada, os trechos em destaque são íntegros. No laudo, ele atestou que não há indícios de alteração de áudio nessas passagens. Nos trechos, Odilon afirma que, na Secretaria de Assuntos Fundiários (SEAF), ‘‘só tem rolo’’ e que, na Câmara Legislativa, ‘‘só tem ladrão’’.

Pedro Passos, que aparece conversando com Odilon, negou ter feito a gravação. ‘‘Eu não tinha conhecimento de que o Márcio estava copiando essas fitas. Meu irmão está doido’’, disse Pedro, no início da semana.

Ele confirmou que costumava receber Odilon no escritório. ‘‘Somos amigos. Ele foi lá inúmeras vezes. Porém, não me recordo desse assunto específico’’, disse. Na gravação, Odilon reclama que estava levando apenas 50 lotes, enquanto outros recebem 100 a 300. Em seguida, Pedro dá uma gargalhada e diz: ‘‘Ainda tem um desprestígio desse’’. Esse trecho não foi adulterado, segundo Molina.

Odilon Aires foi procurado insistentemente pelo Correio, desde a semana passada, e não retornou nenhuma ligação. O presidente da Câmara Legislativa, Gim Argello, reagiu com irritação à afirmativa de que teria recebido lotes. ‘‘Não é verdade. Isso é um absurdo, estou com a consciência tranqüila e não tenho o que comentar sobre isso,’’ rebateu Gim.

Em uma explicação por escrito, o presidente da Câmara foi além. ‘‘Disse-me-disse, fofocas, espionagens, futricas e intrigas irresponsáveis pré-eleitorais não me atingem. Minha prática política não é essa. Fazem isso porque eu sou o primeiro colocado para deputado distrital em todas as pesquisas. Qualquer acusação irresponsável contra a minha pessoa será levada à Justiça’’, disse.

Os Passos (os irmãos Alaor, Eustachio, Márcio e Pedro) já foram condenados pela Justiça por parcelamento ilegal do solo. Eles são considerados ainda beneficiários de um acordo de divisão amigável de terras que deu um prejuízo de 72 alqueires à Terracap, em 1994. O governador Roriz responde a um processo por improbidade administrativa, na Justiça Federal, por causa do acordo.

A guerra entre os aliados de Roriz começou há cerca de um mês, quando o presidente da Terracap, Eri Varela, afirmou ter sido ameaçado de morte por Márcio Passos. Segundo Varela, as ameaças surgiram quando a Terracap passou a coibir uma tentativa de grilagem atrás da QI 27 do Lago Sul — justamente a área que, segundo o Ministério Público, está sendo loteada pelos Passos.


Artigos

O inquietante novo rosto dos Estados Unidos
Tragicamente, nosso governo está abandonando qualquer apoio a negociações importantes entre palestinos e israelenses

Jimmy Carter

Mudanças fundamentais estão ocorrendo na trajetória política dos Estados Unidos no que se refere aos direitos humanos, ao papel na comunidade das nações e no processo de paz no Oriente Médio, na maioria das vezes sem a realização de debates conclusivos, exceto alguns realizados em âmbito governamental.

Algumas novas propostas evoluíram amplamente a partir de rápidas e prudentes reações do presidente George W. Bush após a tragédia de 11 de setembro, entretanto, outras parecem vir do núcleo conservador que, sob a capa da proclamada guerra contra o terrorismo, tenta atingir objetivos há muito ambicionados.

Até o momento admirado quase universalmente como principal defensor dos direitos humanos, nosso país converteu-se no principal centro de respeitadas organizações internacionais preocupadas com os princípios básicos da vida democrática.

Ignoramos ou perdoamos abusos das nações que apóiam nossa campanha contra o terrorismo, enquanto cidadãos norte-americanos são detidos como ‘‘combatentes inimigos’’, presos de forma secreta e indefinidamente sem acusação de crime algum e sem o direito a uma assessoria jurídica. Essa política foi condenada pelos tribunais federais, mas o Departamento de Justiça parece inflexível e a questão continua duvidosa.

Centenas de soldados talibãs capturados permanecem encarcerados na baía de Guantânamo nas mesmas circunstâncias, enquanto o secretário de Defesa declara que não serão liberados, ainda que sejam julgados e declarados inocentes. Essas ações são similares às de regimes abusivos que historicamente foram condenados pelos presidentes norte-americanos.

Apesar de o presidente Bush não ter manifestado sua opinião, somos inundados pelas declarações do vice-presidente e de altos funcionários do Estado, que afirmam que as armas de destruição em massa do Iraque representam ameaça devastadora e prometem derrubar o poder de Saddam Hussein, com ou sem o apoio dos aliados.

Como enfatizaram aliados estrangeiros, líderes responsáveis pelas administrações anteriores e funcionários da atual administração, Bagdá não representa atualmente nenhum perigo para os Estados Unidos. Afrontado por um intenso controle e a esmagadora superioridade militar dos Estados Unidos, qualquer ação beligerante por parte de Saddam Hussein contra um vizinho, assim como a menor prova nuclear (necessária para a fabricação de armas), ameaça tangível de utilização de arma de destruição em massa ou de compartilhamento dessa tecnologia com organizações terroristas, seria suicídio. Entretanto, é bem possível que se utilizem essas armas contra Israel ou contra as forças norte-americanas em resposta a um ataque dos Estados Unidos.

Não podemos ignorar o desenvolvimento de armas químicas, biológicas ou nucleares, mas uma guerra unilateral contra o Iraque não é a resposta. É imperiosamente necessária a ação das Nações Unidas para impor inspeções irrestritas ao Iraque.

Provocamos o restante do mundo de maneira contraproducente ao renegar compromissos norte-americanos de acordos internacionais laboriosamente negociados. Recusas categóricas aos acordos sobre armas nucleares, a convenção de armas biológicas, a proteção ambiental, as propostas contra tortura e punição dos criminosos de guerra foram, às vezes, combinados com ameaças econômicas contra os que não concordaram conosco. Esses atos e afirmações unilaterais isolam cada vez mais os Estados Unidos das mesmas nações que ele necessita na luta contra o terrorismo.

Tragicamente, nosso governo está abandonando o apoio a negociações importantes entre palestinos e israelenses. Parece que nossa política consiste em apoiar sistematicamente qualquer ação israelense nos territórios ocupados e condenar e isolar os palestinos como alvos preferenciais de nossa guerra contra o terrorismo, enquanto os assentamentos israelenses crescem e as áreas palestinas diminuem.

Parece existir ainda uma luta dentro da administração no que se refere à definição de uma política abrangente no Oriente Médio. Os claros compromissos do presidente de cumprir as resoluções-chave da ONU e apoiar a criação de um Estado Palestino foram essencialmente transmitidas por declarações do secretário de Defesa de que em seus anos de vida ‘‘haverá a criação de alguma espécie de entidade’’ e sua interferência ocasionará a denominada ‘‘ocupação’’.

Isso indica um distanciamento radical das políticas de todas as administrações norte-americanas desde 1967, sempre com base na retirada de Israel dos territórios ocupados e na paz autêntica entre israelenses e os vizinhos.

Vozes beligerantes e que criam divisões parecem dominar Washington, mas não refletem as decisões finais do presidente, do Congresso ou de tribunais. É crucial que os compromissos históricos bem fundados dos Estados Unidos com a paz, os direitos humanos, o meio ambiente e a cooperação internacional prevaleçam.


Editorial

AS PORTAS DO INFERNO

George W. Bush se apresentou ontem à Assembléia Geral da ONU para exigir que as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas sejam cumpridas pelo governo iraquiano. Na tribuna, Bush exibiu arsenal de imprecações com que tenta demonizar o ditador iraquiano.

Acusou Saddam de crimes cometidos desde a guerra com o Irã, passando pela Guerra do Golfo até chegar aos nossos dias. Acusou-o, também, de não observar compromissos assumidos em decorrência da derrota do Iraque em 1991 frente à coalizão de nações que respondeu pelas armas à invasão do Kuweit. Acusou-o, ainda, de não cumprir as resoluções da ONU, que o proibiram de produzir e estocar armas de destruição em massa.

George W. Bush não pôde brindar os presentes com nenhuma prova concreta de suas alegações. Não obstante, deixou a certeza de que, se não obtiver apoio da comunidade internacional, Washington agirá. Não ficará de braços cruzados esperando um ataque devastador de Bagdá.

O secretário geral da ONU, Kofi Annan, que precedeu Bush na abertura da assembléia, frisou que a carta das Nações Unidas não aprova guerra preventiva contra quem quer que seja. No caso do Iraque, sublinhou ele, é indispensável que Saddam permita a imediata inspeção do país por técnicos das Nações Unidas.

Os ‘‘cinco grandes’’ com direito a veto no Conselho de Segurança mantêm sua posição na mesma linha das exigências do secretário geral. O Brasil, pela palavra do chanceler Celso Lafer, não destoou da necessidade de inspeção. Só com a vistoria minuciosa feita por uma equipe multinacional com autorização para esquadrinhar o território iraquiano se poderiam obter provas concretas contra o governo de Saddam Hussein.

Ao que parece, o presidente Bush não se convenceu da posição consensual de que não poderá agir contra o Iraque sem prévio consentimento da ONU. Ao mundo, que teme as conseqüências do conflito, resta dizer não — com a firmeza que só pode ser expressa numa ampla mobilização dos povos contra o conflito. É de se presumir que uma campanha mundial pela paz atraia o apoio de parcela ponderável dos norte-americanos, temerosos, como todos, dos resultados de um embate de conseqüências imprevisíveis.

Os cinco continentes têm de se mobilizar pela paz. Tenha ou não razão ao acusar o Iraque de agressor potencial, o presidente George W. Bush não pode jogar o mundo numa aventura irresponsável. A guerra, como disse o secretário-geral da Liga Árabe, seria a abertura das portas do inferno do Oriente Médio.


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09/13/2002


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