Noticiário intenso é desafio para horário eleitoral
Noticiário intenso é desafio para horário eleitoral
Candidatos chegam a essa fase da campanha mais conhecidos e programas de TV precisam ser mais criativos, ágeis e informativos para não ficarem obsoletos
A um mês do seu início, marcado para 20 de agosto, o horário eleitoral gratuito continua sendo a principal aposta dos candidatos à Presidência, mas já não marca o início da campanha nem é seu único fator decisivo. A antecipação do debate eleitoral, o grau de conhecimento do público em relação aos candidatos e, principalmente, a exposição inédita dos presidenciáveis na mídia transformou o trunfo do horário eleitoral num grande desafio: produzir programas de qualidade, mas ágeis e informativos o suficiente para não ficarem obsoletos até o próximo telejornal.
Ao contrário das outras eleições, a deste ano já faz parte do cotidiano do telespectador. Boa parte dos 140 milhões de brasileiros que assistem à TV viu alguma das entrevistas dos presidenciáveis, exibidas há duas semanas, de forma inédita, dentro do Jornal Nacional. E isso foi só o começo. Outra rodada está prevista no telejornal de maior audiência do País para setembro.
Todos os dias o JN reserva pelo menos dois minutos para o noticiário sobre a sucessão presidencial.
Na TV Record, além desse espaço e de um debate em setembro, o apresentador Boris Casoy quer abrir 5 minutos diários para pronunciamento dos candidatos.
Na Bandeirantes, o diretor-geral de Jornalismo, Fernando Mitre, anuncia um debate para dia 4 e outro, dos candidatos a vice-presidente, para dia 18, dois dias antes do horário eleitoral. Ainda em agosto (de 5 a 8), haverá uma rodada de entrevistas no Jornal da Globo e no Bom Dia Brasil (entre 26 e 29). Entre noticiários, talk shows e programas especiais dass emissoras, calcula-se que os candidatos terão mais tempo do que as 16 horas dos programas oficiais previstos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Nada disso significa que o horário eleitoral será menos importante, mas desta vez vai encontrar um telespectador mais informado e atento. "A TV será a grande praça pública desta eleição e sua maior cobertura dará uma visão mais crítica dos candidatos", avalia Mitre. "Teremos um eleitor menos emocional e, portanto, mais exigente."
Para Fátima Pacheco Jordão, especialista em pesquisas eleitorais, o horário gratuito vai começar com uma temperatura mais alta. "Como a campanha já começou, os candidatos terão um desafio mais complexo, explicando desde logo os assuntos que estão em pauta no noticiário", prevê. Para ela, os telespectadores estão cada vez mais treinados com a TV e já não se iludem facilmente. "Eles conhecem os truques dos vídeos e percebem a manipulação", adverte. Apesar disso, pondera, não se pode desprezar o horário eleitoral.
"O telespectador sabe que este é o único momento em que o candidato fala só para ele."
Com a mesma opinião, o cientista político Afonso de Albuquerque, professor da Universidade Federal Fluminense, acha que o horário gratuito fornece algo impossível para qualquer noticiário. "Só esses programas oferecem a interpretação dos partidos sobre os problemas do País e suas possíveis soluções", analisa Albuquerque. "Tal diversidade interpretativa é algo que nem o jornalista mais conseqüente e responsável poderia oferecer."
Agressivos - Por isso, a professora Vera Chaia, do Departamento de Política da Pontifícia Universidade Católica (PUC) e coordenadora do Núcleo de Estudos em Arte, Mídia e Política, diz aguardar com curiosidade o início do horário eleitoral. "Esse é o espaço que os candidatos têm para responder, criticar e levantar dossiês", diz ela. "Com a exposição exacerbada na mídia, esse processo já está acelerado, o que deve tornar os programas mais agressivos."
Do mesmo modo, a professora Maria Thereza Fraga Rocco, da Faculdade de Educação da USP e especializada em linguagem da mídia, ressalta a importância dos programas oficiais.
"O noticiário pode dar a temperatura real da coisa, que os programas não conseguem, mas o eleitor jamais vai abrir mão do horário gratuito", anota ela. "A questão é o que as pessoas vão reter na memória do noticiário e dos programas eleitorais para fazer comparações."
Assim como Fátima, a professora da USP alerta que os riscos são mais dos candidatos do que dos telespectadores, mesmo na população de classe baixa.
"Eles já nascem vendo TV, sabem reconhecer uma novela de qualidade, dão risada com os excessos e percebem quando alguém tenta enganá-los", observa.
"O candidato que exagerar não vai convencer." Nesse aspecto, Thereza cita os clichês de Lula (PT), o economês exagerado de Ciro Gomes (PPS), o aspecto "morno" de José Serra (PSDB) e a fanfarronice de Anthony Garotinho (PSB).
Tudo isso pode ficar mais visível com a maior exposição dos candidatos no noticiário. É o que acha a jornalista Luciana Fernandes Veiga, doutora em Ciências Políticas, coordenadora de pesquisas qualitativas e autora da tese "Em Busca de Razões para o Voto: o uso que o eleitor faz do horário eleitoral". Após esse trabalho, aliás, ela se convenceu de que o horário gratuito influencia na decisão do voto. "Esses programas dão ao eleitor argumentos positivos e negativos dos candidatos e apresentam justificativas para a decisão do voto", explica.
Influência - Para a pesquisadora, a propaganda política tem como função facilitar a decisão do eleitor. "Ela busca aumentar a percepção do eleitor sobre futuros ganhos políticos, com informações mais fáceis de serem entendidas e assimiladas." Nem por isso Luciana despreza o efeito da maior cobertura da TV. "É um estímulo para a comparação e a tendência é de que o noticiário acabe pautando o horário gratuito."
Para o cientista político da PUC-RS Flávio Eduardo Silveira, outro especialista em pesquisas, o noticiário mais amplo vai ajudar também os candidatos. "Aqueles menos conhecidos podem estabelecer contato com o eleitor, que dificilmente buscaria informações sobre ele." Assim, avalia, noticiário e programas eleitorais não são coisas excludentes. "São duas informações diferenciadas, que aumentam a importância da mídia no processo e fortalecem a relação entre candidato e eleitor."
Novo formato - Foi com esse objetivo, afirma o diretor da Central Globo de Comunicação, Luís Erlanger, que o JN abriu espaço para os candidatos. Segundo ele, durante as quatro entrevistas a audiência se manteve constante, em torno de 40 pontos. Isso significa que 50% dos aparelhos ligados estavam sintonizados na Globo. "A gente mudou o formato para não ficar em cima de ofensas e passar à discussão de idéias", conta ele. "Os candidatos aceitaram e a repercussão foi muito boa."
Para ele, uma das maiores vantagens do noticiário é que não se trata de uma imposição.
"Qualquer coisa obrigatória representa um prejuízo para os telespectadores e as emissoras", acha Erlanger. "Os candidatos dizem que vão usar o espaço para defender idéias, mas só se auto-elogiam ou jogam farpas no adversário." Outro crítico do horário eleitoral é o diretor José Bonifácio de Oliviera, o Boninho. "Sendo obrigatório, acho esses programas um lixo, porque são criados por marqueteiros sem nenhum fundamento maior em entretenimento."
Vantagens - Já o diretor de Jornalismo da Globo, Ali Kamel, prefere destacar as vantagens que a continuidade do processo democrático trouxe à televisão. Um exemplo, na sua opinião, é a obrigatoriedade de os candidatos nanicos terem sempre o mesmo espaço em qualquer programa de TV. Desta vez, porém, a Justiça indeferiu os pedidos de José Maria de Almeida (PSTU) e Rui Pimenta (PCO) para serem entrevistados no JN. Como compensação, o telejornal fez uma reportagem com os dois candidatos. "Dep ois de algumas eleições, os juízes ficam mais seguros da interpretação da lei. E isso facilita uma cobertura mais ampla da TV."
Tudo isso é verdade, concorda Boris Casoy, mas seria ainda melhor se a TV tivesse maior liberdade para também oferecer opiniões, em vez de se resumir ao noticiário. "O grande diferencial da TV em relação ao horário eleitoral seria o de oferecer uma postura mais crítica dos candidatos", diz Boris. "O problema é que ainda sofremos censura prévia, porque estamos proibidos de dar qualquer opinião", lamenta. (Colaborou Luciana Nunes Leal)
Especialistas ainda acham propaganda decisiva
Professor da Iuperj diz que programas definem escolha de indecisos e isso pode mudar quadro
RIO - A propaganda gratuita eleitoral vai tirar o eleitor da categoria dos indecisos e fazê-lo optar por um dos concorrentes, segundo especialistas ouvidos pelo Estado. "Os programas e os comerciais eleitorais podem mudar drasticamente o quadro, dada a quantidade de indecisos do eleitorado", avalia o professor Marcus Figueiredo, do Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (Iuperj). O último levantamento do Ibope revela, na pergunta espontânea, que 46% dos eleitores não sabem em quem votar para presidente. Outros 6% pretendem votar nulo ou em branco.
Figueiredo lembra que não há comício ou corpo-a-corpo que atinja o público de um programa na televisão. "Na democracia de massa, o contato direto do candidato a presidente com o eleitor é muito limitado, no espaço físico e no tempo. A propaganda massiva via televisão e rádio tem um alcance infinitamente maior do que os tradicionais comícios e viagens."
Pesquisas coordenadas pelo professor em eleições anteriores indicam que a média da audiência dos programas eleitorais gratuitos fica um pouco abaixo da média da programação normal, cerca de 10% a menos. "Trata-se de 10% do eleitorado que não quer saber de política. O resto está ligado na campanha.
Se não viu, algum parente ou amigo viu e vai comentar. A eleição passa a fazer parte de sua prioridade nas conversas do dia-a-dia."
Rídiculo - Para ele, o eleitor tem interesse, sim, no horário gratuito. "Os eleitores que reclamam são poucos." Os estudos indicam ainda que, entre os que assistem ao horário gratuito, 90% vêem pelo menos um programa por semana.
"O eleitor pode não gostar, às vezes acha ridículo, mas é no programa que ele reúne argumentos para votar ou não no candidato", afirma a cientista política Alessandra Aldé, que é pesquisadora do Laboratório de Pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública Doxa, do Iuperj.
Produção vira guerra paralela de marqueteiros
Por trás da telas, publicitários lutam para valorizar mais seus candidatos e até brigam
Por trás das telas, os maiores marqueteiros do País vão travar uma batalha tão ou mais acirrada do que a disputa presidencial. Talento, criatividade e a capacidade de transmitir com sucesso mensagens a eleitores com origens e interesses diferentes são armas estratégicas, pagas a preço de ouro por todos os partidos.
O poder de convencimento dos publicitários é comparável ao tamanho de seus egos. Especialmente no caso dos responsáveis pelas candidaturas de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e José Serra (PSDB): os baianos Duda Mendonça e Nizan Guanaes. Einhart Jacome da Paz e Carlos Rayel, das campanhas de Ciro Gomes (PPS) e Anthony Garotinho (PSB), têm perfil mais discreto. Einhart é velho conhecido de Ciro e seu cunhado. Rayel convive com Garotinho há apenas um mês.
Duda e Nizan já deram mostra da guerra paralela que vão travar. Durante um seminário sobre marketing político em São Paulo, em abril, Nizan ainda não havia sido incorporado à campanha tucana, mas defendeu sua proposta com tanta paixão - só comparável à de Duda - que os dois brigaram feio. Bateram boca, acusaram-se de incoerentes e tiveram de ser apartados pela mediadora.
A relação de Duda e Nizan é uma mistura de amor e respeito marcada pela necessidade de o aprendiz superar o mestre e este, por sua vez, manter sua superioridade. Nizan começou na publicidade como estagiário da DM9 de Duda, chegou a sócio do ex-patrão e depois assumiu o comando da agência.
No prefácio que fez para o livro autobiográfico do colega, Duda Mendonça, Casos & Coisas, Nizan cita Duda como pai e encerra o texto dizendo que "o fato de amar Duda e celebrar seu talento não significa dar-lhe um cheque em branco. Pais e filhos se amam, mas resguardam seus estilos, suas convicções e até mesmo versões diferentes de um mesmo fato".
Duda também se refere de forma carinhosa a Nizan no livro: "(..) chegou à minha agência, num belo dia, um garoto gordinho, moreno, de nome esquisito.
Nervoso, falador, cheio de idéias, dono de um excelente texto. Não era do tipo que passava despercebido. Logo, logo estava do meu lado, como meu braço direito."
Rayel, ex-colaborador de Orestes Quércia (PMDB), e Einhart, que já trabalhou com Nizan na campanha de Fernando Henrique Cardoso em 1994, evitam comentários sobre seus maiores adversários. "Eles têm equipes grandes, problemas deles. Não vou arrumar uma briga com o Nizan e o Duda. Eles fazem o que fazem e são pagos para isso", esquiva-se Einhart.
Engana-se quem imagina que marqueteiros e políticos vivem de mãos dadas o tempo todo.
Nizan e Serra, por exemplo, têm a relação mais conturbada do grupo. Os dois trabalharam juntos a contragosto na corrida pela Prefeitura paulistana em 1996 e Nizan deixa claro que, se pudesse, escolheria como candidato à Presidência Tasso Jereissati. A primeira escolha de Serra para esta campanha foi um amigo e ex-parceiro de Duda, Nelson Biondi. Nizan entrou a pedido de Fernando Henrique.
Comunicativo - Carlos Rayel e Garotinho se conheceram em São Paulo, há um ano, e encontraram-se algumas vezes. Em junho, Garotinho convidou Rayel a se transferir para o Rio. Passaram a conviver já na correria da campanha. A experiência de radialista faz diferença com Garotinho. "Ele tem idéia para comerciais, liga no meio das viagens para falar de uma sugestão que ouviu e gostou. Está o tempo inteiro atento. E, como é comunicador, tem grande facilidade para falar com o público", diz Rayel, que está em sua 26.ª campanha eleitoral.
Einhart Jacome da Paz admite que suas relações familiares com Ciro podem atrapalhar. Ele é casado com Lia Ferreira Gomes, irmã do candidato. "Sou muito amigo da família de minha mulher", explica. "É um problema como profissional, mas também um bônus, o de poder conversar com ele a hora que quero." Os dois conversam por telefone diariamente, até três vezes por dia.
Acertam detalhes, discutem o andamento da campanha. O marqueteiro analisa a imagem do candidato na mídia. Ele dá orientações, embora nem sempre sejam seguidas.
Lula e Duda vivem um caso de amor à parte. Embora possam discordar, tornaram-se amigos. "Gosto muito do Duda. Ele descobriu o Lula como o Lula é", resume o petista sobre seu marqueteiro. Os dois se conheceram em 1992, apresentados pelo jornalista Ricardo Kotscho, e Duda só não trabalhou antes por resistência do PT, já que havia cuidado de campanhas malufistas vitoriosas. Por respeito ao cliente e carinho com o amigo, Duda até trocou a máquina de café de sua agência por uma de café expresso, que Lula adora.
CIRO - Namorada vira estrela da campanha
Participação da atriz Patrícia Pillar era solução de emergência, mas saiu melhor que o esperado
À primeira vista, a ascensão do presidenciável Ciro Gomes (PPS) parece ter sido esquadrinhada nas pranchetas de geniais estrategistas políticos. Pelas pesquisas, começou com 11% em abril, caiu para 9% em junho e não só reverteu a queda, como chegou ao segundo lugar isolado. Livre dos ataques, o candidato foi o último a aparecer nos programas elei torais de TV.
Proibido de participar nos horários dos partidos coligados ao dele, a solução foi levar ao ar a namorada, a atriz Patrícia Pillar. Deu certo.
Muito melhor do que previam ou podiam sonhar políticos e assessores ligados à campanha.
Se o PSDB não tivesse entrado com recurso para proibir a aparição de Ciro nos programas do PDT e do PTB, Patrícia apareceria de forma mais burocrática no ar. Assumiria, talvez, o papel de "mulher" do candidato. Mas, com o aval dos partidos da Frente Trabalhista, o marqueteiro Einhart Jacome da Paz decidiu criar um fato político. "A gente tinha algo forte e crível para dizer que estavam tentando censurar o Ciro. Foi na hora certa", reconhece.
A partir de agora, a realidade é outra. A estratégia não é mostrar "quem" é Ciro, mas o que ele quer e como vai fazer, explica o marqueteiro. Paulistano de 48 anos e cunhado de Ciro, Einhart (pronuncia-se Einar) prefere amenizar sua participação. Diz que não acredita na "criação de um personagem", mas se preocupa em analisar as pesquisas para decidir que rumo dar à imagem do candidato. "Desta vez, os eleitores estão mais maduros e interessados em conhecer propostas."
Cerca de 15 pessoas da agência New Trade vão coordenar a área de marketing de Ciro.
Uma produtora, a Teddy Bear, com outras 30 pessoas, se encarregará dos programas eleitorais. Uma equipe com um cameraman, um assistente de câmera, um jornalista e um fotógrafo vão acompanhar a maioria das viagens do candidato. Só que eles viajam em vôos regulares, enquanto Ciro vai de jatinho. "Não gosto de esquemas grandes, não funciona, é conflitante", afirma o marqueteiro.
Um dia por semana, pelo menos, Ciro ficará gravando inserções para a propaganda eleitoral. Ele deverá contar com 8 minutos e 33 segundos, às terças, quintas e sábados, mais 4 minutos divididos em oito comerciais de 30 segundos cada. Einhart aposta que, para seu candidato, o melhor é que ele apareça da forma mais discreta possível nesse tempo.
Neste ano, os marqueteiros estarão preocupados com as aparições nos programas jornalísticos. Como o noticiário político vai ser maior, é importante que o candidato produza "imagens" diárias. "O eleitor acha que o político em campanha que não vai para as ruas é preguiçoso. Ele não quer saber para ir atrás, mas para ver na TV que seu candidato está trabalhando", interpreta Einhart.
"O maior espaço dos noticiários não assusta ninguém da campanha do Ciro", acrescenta o jornalista e editor Luiz Fernando Emediato, assessor de comunicação da campanha. Emediato é o responsável por atender aos pedidos de entrevista em programas de rádio e TV, e a orientação é "aceitar todos os convites na medida do possível". Como os adversários, o comitê financeiro não divulga quanto dos R$ 25 milhões previstos para a campanha serão gastos com mídia eletrônica.
Ciro comemora, agora, o bom desempenho após a série de entrevistas da Rede Globo com os presidenciáveis. Pesquisas indicaram que ele, assim como Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tiveram o melhor desempenho na tela.
União - O 'casamento' de Ciro e Einhart começou em 1988, quando ele foi convidado pelo ex-governador do Ceará Tasso Jereissati para fazer a campanha à prefeitura pelo PSDB.Foi nessa época que ele começou a namorar Lia Ferreira Gomes, irmã do candidato. Em 1990, o publicitário fez a campanha para governador de Ciro, e no ano seguinte, casou-se com Lia.
Em 1994, Einhart foi um dos marqueteiros da campanha "Mãos à obra, Brasil", que elegeu o presidente Fernando Henrique Cardoso. No ano passado, coordenou as campanhas políticas do atual primeiro-ministro de Portugal, Manuel Durão Barroso, e de Pedro Santana Lopes, presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
LULA - Na quarta tentativa, o maior orçamento
Estratégia é traduzir o economês para o eleitor, que agora conhecerá a "galega" Marisa
Quando começar o horário eleitoral gratuito de rádio e televisão, no dia 20 de agosto, o PT jogará sua grande cartada para tentar, pela quarta vez, eleger Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência. Sob a batuta do publicitário Duda Mendonça, cerca de 100 pessoas trabalham na produção de imagens, com equipes de TV acompanhando o petista dia e noite.
A tática de Lula, nesta etapa da campanha, é dar prioridade às atividades de rua e traduzir para o eleitor de que maneira o "economês" do mercado interfere no seu dia-a-dia. Um exemplo foi dado na noite de quinta-feira, em Aracaju (SE). Animado, Lula perguntava aos militantes quem tinha dólar ou ações nas bolsas de valores. Resposta em coro: ninguém.
"Mas eles dizem que, se eu ganhar o dólar vai subir e a Bolsa, cair", afirmava. "Então, quero falar para esse mercado que o mais importante não é a numerologia, mas é fazer o Brasil voltar a produzir e a ter empregos."
Sempre que pode, Lula dá estocadas lights em Ciro Gomes (PPS), o segundo colocado nas pesquisas, e em Serra. Mas as críticas raramente são diretas.
"Para bom entendedor, meia palavra basta", diz Sílvio Pereira, secretário de Organização do PT.
Com Marisa - Duda orienta Lula a não partir para o confronto explícito. "O povo não quer saber de ataque nem de briga: quer saber de proposta", argumenta o publicitário. Seguindo seus conselhos, o petista também tem aparecido com a mulher, Marisa, a tiracolo.
Pesquisas indicam que seu ponto franco é o eleitorado feminino. Além disso, Ciro e Serra exibem mulheres na campanha.
"Os eleitores precisam conhecer a família do futuro presidente da República", observa Duda. Agora, em todo comício, Lula apresenta Marisa.
"Essa galega aqui é a minha cara-metade", diz ele, de mãos dadas com a loira, com quem tem três filhos. As imagens da família serão usadas nos programas eleitorais.
Delúbio Soares, tesoureiro petista, diz que o orçamento para a propaganda deste ano será muito maior do que nas eleições anteriores. O custo total da campanha foi estimado em R$ 36 milhões, mas Delúbio não revela quanto será destinado às produções de rádio e TV.
Apesar do mistério, o PT não deve economizar. Somente em 2001, a despesa com as propagandas do partido foram de R$ 596 mil. No início deste ano, Duda gastou mais R$ 320 mil em produções de TV, elevando para R$ 915 mil a conta da entressafra pré-eleitoral.
"A televisão, desta vez, é muito importante para nós", justifica o tesoureiro.
Lula vê um novo motivo para que a campanha deste ano tenha mais palanque eletrônico.
"O fato de o governo ter um candidato fraco faz com que tentem realizar o máximo de debates para dar um empurrão nele", ironiza, numa referência a José Serra (PSDB), em terceiro lugar nas pesquisas.
Três pilotos de programas feitos por Duda já foram aprovados. O secretário de Comunicação do partido, Ozéas Duarte, diz que os quase seis minutos do PT no horário gratuito, por bloco, serão usados para o debate de idéias. Apesar da independência conferida a Duda, o partido mantém na produtora o assessor Luiz Favre, namorado da prefeita de São Paulo, Marta Suplicy (PT).
SERRA - Armadilha de ter o maior tempo na TV
Arma para chegar ao 2.º turno pode também levar à superexposição, como ocorreu com Ulysses
BRASÍLIA - A persistir o quadro atual da disputa presidencial, com Ciro Gomes (PPS) em segundo lugar, os programas que a aliança PSDB-PMDB levará ao ar na propaganda eleitoral gratuita serão na linha do confronto direto com o candidato da Frente Trabalhista (PPS-PTB-PDT). A idéia é exibir diariamente no rádio e na TV "contradições", "mentiras", "os companheiros" e "a falta de consistência" de Ciro.
No restante do programa do candidato José Serra - 20 minutos - será mostrado ao eleitor o "político honesto e coerente", "o ministro competente" e o "homem que quer presidir o Brasil com responsabilidade". Para essa função, simpatia é o que menos conta, será a mensagem subliminar.
"Serra não é candidato a marido, não precisa ser simpático, mas competente", é o que costuma dizer o publicitário e marqueiteiro da campanha do PSDB, Nizan Guanaes.
Nos programas da TV, que virão com a marca da criatividade e ousadia de Nizan, Serra só aparecerá falando de assuntos de interesse da população, em linguagem simples. O que é apontado hoje por dez entre dez políticos como a maior deficiência de Serra - a falta de simpatia e carisma-, não constitui problema, insistem os marqueteiros e assessores da campanha. O tema poderá até ser utilizado como forma de cutucar o adversário Ciro Gomes, que tem andado pelo País com sua mulher, a atriz Patrícia Pillar: "Não é com simpatia e beleza que se fará um País melhor", é uma das mensagens prováveis.
É aí que entram, também, as participações do presidente Fernando Henrique Cardoso. Não é uma estrela de televisão, mas já comprovou que simpatia e carisma tem de sobra. Já na próxima semana, quando voltar de viagem ao Equador, o presidente gravará alguns pilotos para o programa eleitoral de Serra.
"Quem tem 20 minutos diários para programa de televisão, adversários fracos e um eleitor dessa magnitude (Fernando Henrique) tem todas as condições de nadar de braçada", é o que tem dito Nizan aos que manifestam preocupação com a presença de Serra no vídeo. "Temos uma grande vantagem, o maior tempo de TV. São 60 minutos por semana e uma proposta consistente", completa o deputado mineiro Pimenta da Veiga. Nessa vantagem, porém, reside uma armadilha. Com maior tempo na televisão, os programas tendem a oferecer uma superexposição do candidato, como ocorreu nas eleições de 1989, quando o então candidato do PMDB Ulysses Guimarães tinha o maior tempo e Collor, com um dos menores tempos na TV, se elegeu.
Produção - Os programas de TV da aliança PSDB-PMDB estão sendo pensados e organizados pelos marqueteiros Nizan e Nelson Biondi, que estarão em Brasília nesta semana detalhando suas idéias numa reunião da coordenação política da campanha. Nizan está desde o início da semana passada enfurnado em Campos de Jordão (SP) com uma pequena equipe e "idéias borbulhando", como ele próprio disse a amigos.
O grande trunfo do candidato tucano para o horário eleitoral gratuito é mesmo o tempo que terá - dois programas de rádio e dois de televisão por dia, com 10 minutos cada, três vezes por semana. Enquanto isso, seu principal adversário hoje, Ciro, não contará nem com 5 minutos. E o petista Luiz Inácio Lula da Silva terá pouco mais de 7 minutos de propaganda.
GAROTINHO - Na 'lanterna' e com menor tempo na TV
Idéia é tentar compensar dificuldade usando espaço de candidatos a governador
RIO - Se o ministro da Fazenda, Pedro Malan, encontrar uma imagem sua no programa eleitoral do PSB não será engano algum. Um dos estrategistas da campanha à Presidência de Anthony Garotinho conta que está guardada a fita em que o ministro comenta a renegociação da dívida do Estado do Rio, feita pelo ex-governador.
A idéia é mostrar a fala do ministro Malan e acrescentar: "Garotinho fez pelo Rio, também fará pelo Brasil." Nesta mesma linha, o programa do PSB pretende mostrar várias outras
ações de Anthony Garotinho no governo, como os restaurantes populares com refeição a R$ 1, o cheque-cidadão de R$ 100 mensais para compra de alimentos e outras iniciativas, sempre dizendo que, se eleito, o candidato estenderá para o País o que fez no Estado.
Com a apresentação de propostas concretas, o PSB pretende alavancar a candidatura de Garotinho com a propaganda gratuita. Com apenas 2 minutos e 13 segundos em cada programa do horário eleitoral gratuito para presidente, Garotinho tentará compensar a dificuldade usando o espaço dos candidatos a governador pelo partido em pelo menos 15 Estados.
Os dirigentes do PSB escolheram candidatos sem chances de vitória com o único objetivo de abrir espaço para Garotinho. Em outros dez Estados, as candidaturas do partido são competitivas e o tempo será usado para a disputa estadual.
Economia - Na próxima semana, Garotinho começará a gravar, com os respectivos candidatos a governador, vários discursos diferentes, cada um destinado a um Estado.
Apesar de não gostar do termo "laranja" usado para os candidatos sem chance de vitória, Garotinho conta com eles em alguns dos maiores colégios eleitorais do País, como Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul.
O tesoureiro da campanha, deputado Alexandre Cardoso (RJ), tem enfrentado grandes dificuldades para encontrar doadores. Ele diz que, em princípio, deverá gastar R$ 3 milhões com a propaganda do horário eleitoral gratuito.
Se a arrecadação melhorar, os programas poderão ganhar sofisticação, com gravações externas e outros recursos. Por enquanto, a palavra de ordem é economia.
O PSB não contratou estrelas do marketing político e vai apostar na exposição do próprio candidato, que foi radialista e tem dado sugestões em todos os detalhes da publicidade de sua candidatura. Atualmente, 20 pessoas estão envolvidas na criação das peças publicitárias do horário gratuito.
Garotinho fará muitas gravações em estúdio e raramente levará equipes de televisão em suas viagens pelo País. A venda de bônus eleitorais de R$ 1 é a aposta da cúpula da campanha para levantar recursos, embora muitos reconheçam que as doações dependerão do desempenho do candidato nas pesquisas eleitorais. Por enquanto, Garotinho está em quarto lugar nas pesquisas eleitorais, com intenções de voto em torno dos 11%.
Coordenador de comunicação da campanha do PSB, responsável inclusive pelos programas de televisão, o paulista Carlos Rayel transferiu-se para o Rio, onde fica também a produtora responsável pelos programas, a Blue Light. "O tempo podia ser um pouco maior, mas dá para fazer alguma coisa."
"Legitimidade" - A equipe, que conta com a supervisão do publicitário Elísio Pires, começou na semana passada a trabalhar nos primeiros roteiros. "Vamos fazer um programa propositivo, mostrar as propostas do candidato para governar, porque ele é o que tem maior legitimidade para assumir compromissos, tem um governo para mostrar", diz Rayel.
Apesar de toda a exposição dos candidatos em programas no rádio e na televisão, será inevitável apresentar Anthony Garotinho ao eleitorado, diz o coordenador de comunicação.
"Pode ser uma coisa muito rápida. Tem de mostrar quem ele é, a família. Tudo é importante para compor a imagem", conta. Na opinião de Carlos Rayel, "não adianta pirotecnia".
Artigos
O continente desorientado
Carlos Alberto Montaner
Seria falso afirmar que as nações desenvolvidas do mundo vêem com preocupação o que está acontecendo na Bolívia. A atitude é outra. O que prevalece é a consternada resignação que se adota diante de problemas sem remédio. Por quê? Porque à distância parece inconcebível que uma sociedade madura e com um mínimo de informação vacile entre as expressões do terceiro-mundismo mais tresloucado e empobrecedor, como as que representam o sr. Evo Morales - o líder dos cocaleros, que proclama a ditadura de Fidel Castro como um modelo político a ser imitado - e um estadista moderno e notavelmente bem formado como o sr. Gonzalo Sánchez de Lozada, que já passou com sucesso e responsabilidade pelo palácio do governo.
Em Londres, Paris, Madri ou Washington, o que se escuta em surdina é muito triste: "A América Latina não entende nem aprende as lições da História."
Logo vem a lista de horrores: uma Argentina que despencou desnecessariamente, como quem marcha, cantando e alegre, para um precipício, porque a classe dirigente, com o apoio insensato de boa parte da sociedade, armada com um aparelho de arrecadação fiscal deficiente, se empenhou em manter níveis de gasto público impossíveis de sustentar com os baixos índices de produção e de produtividade do país, o que acabou destruindo os fundamentos econômicos do sistema. Em seguida, vêm a possibilidade bastante próxima de ascensão ao poder no Brasil do sindicalista radical Lula da Silva; a permanência no Palácio de Miraflores do coronel Hugo Chávez, prior da Ordem da Charlatanice Populista Planetária; a ressurreição da tradição estatista no Peru, que a cada dia se torna mais ingovernável para Alejandro Toledo; um Equador que descamba de novo para o caos político, apesar da calma econômica trazida pela dolarização; e, naturalmente, o terrível caso da Colômbia, onde Álvaro Uribe herda um país destroçado pela ação da violência, que é preciso resgatar dos escombros a poder de balas.
O século 20 foi uma época de lições sangrentas para toda pessoa capaz de aprender com a experiência. A democracia retomou seu debilitado prestígio.
Tornou-se óbvio que não há substitutos para a liberdade política e econômica. Perdeu-se a confiança nos governos grandes e dirigistas, geralmente corruptos e esbanjadores, arbitrariamente dedicados a construir para nós uma vida feliz que nunca chegava. Ficaram demonstradas as virtudes da moderação na pressão fiscal e nos gastos públicos e caiu por terra a nefasta Teoria da Dependência: os casos do Japão, da Coréia do Sul, de Cingapura, de Taiwan, da Espanha ou de Hong Kong provaram que nenhuma potência se empenhava em impedir o desenvolvimento ou a prosperidade dos mais pobres. Em suma, a sociedade civil recuperou a preponderância ante o Estado e se inverteram as relações de poder. No final do século, o México, o Canadá e os Estados Unidos criaram uma zona de livre comércio que em menos de uma década multiplicou por seis as exportações mexicanas, trazendo mais vantagens ao país latino-americano que aos sócios anglo-saxões, embora as três nações tenham auferido grandes benefícios desse pacto econômico.
Diante desse exemplo, ou diante de outra meia dúzia de casos similares - Espanha e União Européia é um deles -, somente os seres patologicamente obstinados e intelectualmente mais deficientes poderiam insistir nas "vantagens" do isolacionismo e do nacionalismo econômico.
Mas todas essas notícias chegaram em surdina à América Latina. Por quê?
Provavelmente, porque em nenhum rincão do Ocidente a tradição contrária à liberdade econômica e a suspeita em relação às liberdades políticas tenham sido mais fortes e diversas, à direita e à esquerda do espectro político, do que nesta nada aprazível região do mundo. Além disso, na América Latina, juntamente com a corrente progressista, que reconhece suas raízes e ramificações na cultura ocidental e busca sua integração dentro desta família, persiste uma tendência rancorosa e excêntrica, sempre em busca de pretextos para justificar o estabelecimento de barreiras ou para cavar trincheiras destinadas a preservar a suposta especificidade latino-americana em face das influências "imperialistas" das velhas metrópoles.
Felizmente, nem todos os sinais emitidos pela América Latina são tão negativos como os acima citados. O Chile é a prova de que os latino-americanos são capazes de aprender. Contra ventos e marés, seus governantes mantiveram o rumo pró-ocidental, de abertura e pró-mercado, mesmo quando a União Européia e os Estados Unidos, submetidos à pressão acicatada de alguns sindicatos e de mesquinhos cartéis de produtores industriais e agrícolas, não foram suficientemente generosos para acolher mais resolutamente esse país nos circuitos da colaboração internacional.
Gravíssimo erro, não só pela injustiça que se comete contra os chilenos, a quem se prega o evangelho da liberdade econômica e em seguida, parcialmente, se exclui da grande festa comercial, mas porque a América Latina precisa desesperadamente da consolidação de um paradigma regional que sirva de modelo e referência. O Chile pode desempenhar esse papel. E isso contribuiria para o resgate deste continente tão desditosamente desorientado.
Colunistas
RACHEL DE QUEIROZ
Amor, eterno amor
Outro dia liguei a TV e vi que faziam um concurso entre os telespectadores procurando uma definição para o amor. As respostas eram muito ruins, até dava para se pensar que nem apresentadores nem telespectadores entendiam nada de amor realmente; o lugar-comum é mesmo o refúgio universal, que livra de pensar e dá a quem o usa a impressão de que mergulha a colher na gamela da sabedoria coletiva e comunga das verdades eternas. O que, aliás, pode ser verdade.
Mas a idéia da definição me ficou na cabeça e resolvi perguntar por minha conta. Tive muitas respostas. A impressão geral que me ficou do inquérito é que de amor entendem mais os mais velhos do que os moços, ao contrário do que seria de imaginar. E menos os profissionais que os amadores - digo os amadores da arte de viver, propriamente, e os profissionais do ensino da vida.
Vamos ver:
Dona Alda, que já fez bodas de ouro diz que o amor é principalmente paciência. Indaguei: e tolerância? Ela disse que tolerância é apenas paciência com um pouco de antipatia. E diz que amor é também companhia e amizade. E saudade? Não, saudade não: saudade se tem das pessoas, das alegrias de coisas da mocidade, da infância dos filhos. Mas do amor? Não. Afinal, o amor não vai embora. Apenas envelhece, como a gente.
A jovem recém-casada me diz que amor é principalmente materialismo. Todos os sonhos das meninas estão errados. Aquelas coisas que se lêem nos livros da Coleção das Moças, aqueles devaneios e idealismos e renúncias e purezas, está tudo errado. Quando a gente casa é que vê que o amor não passa de materialismo.
Terezinha de Jesus, às vésperas de botar no mundo o seu filho de mãe solteira, responde: Amor é iludimento. No começo é dançar, tomar Coca-Cola com pinga, ganhar radinho de pilha e vidro de loção. Depois é a barriga e todo mundo apontando e o camarada sumido. Semana que vem vai para a maternidade. Quem quiser lhe falar de amor, venha, que ela tem uma resposta. Mas impublicável.
Um senhor quarentão, bem-casado, pai de filhos: amor, como se entende em geral, é coisa da juventude. Depois de certa idade, amor é mais costume. É verdade que tem a paixão com os seus perigos. Mas você falou em amor e não em paixão, não foi?
E de paixão, que me diz? - Aí ele se fecha em copas. Deixo isso para os jovens. Velhote apaixonado é fogo. E eu não passo de um pai de família.
A mãe da família desse senhor: Amor? Bem, tem amor de noiva, que é quase só castelos e tolices.
Tem o de jovem casada, que é também muita tolice -, mas sem castelos. Complicado com ciúme, etc., mas já inclui algum sentimento mais sério. E tem o amor do casamento, que é a realidade da vida puxada a dois. Agora, o amor de mãe... Você perguntou também o amor de mãe?
Respondi energicamente que não; amor de mãe, não. Quero saber só de amor de homem com mulher, ou... vocês me entendem, mas amor propriamente dito.
Diz o solteiro, quase solteirão que se imagina irresistível e incansável: amor é perigo. Só é bom com mulher sem compromissos. Com moça donzela dá em noivado, com mulher casada dá em tragédia. O melhor é amor forte e curto, que embriaga enquanto dura e não tem tempo para se complicar. Aquela história de marinheiro com um amor em cada porto, tem o O pastor protestante diz que o amor é sublimar a atração entre os dois seres, é atingir a mais alta e pura das emoções.
Não confundir amor com sexo! E perguntado - sendo assim, por que casam os pastores? Ele responde citando São Paulo: "Porque é melhor casar do que arder. "
Já o padre católico não elimina o sexo do amor. Explica que, pelo contrário, o sexo, no amor, é tão importante como os seus demais componentes - o altruísmo, a fidelidade, a capacidade de sacrifício, a ausência do egoísmo. E é tão importante, que, para santificar o amor sexual - o amor conjugal - a Igreja o põe sob a guarda de um sacramento, o santo matrimônio. E ante a pergunta: se tudo é assim tão santo, por que os padres não casam? O padre velho não se importa com a impertinência, sorri: "Nós nos demos a um amor mais alto. Casamento, para nós, seria pior que bigamia..."
E por último tem a matrona sossegada que explica: Amor? Amor é uma coisa que dói dentro do peito. Dói devagarinho, quentinho, confortável. É a mão que vem da cama vizinha, de noite, e segura na sua, adormecida. E você prefere ficar com o braço gelado e dormente a puxar a sua mão e cortar aquele contato, tão precioso ele é. Amor é ter medo - medo de quase tudo - da morte, da doença, de desencontro, da fadiga, do costume, das novidades. Amor pode ser uma rosa e pode ser um bife, um beijo, uma colher de xarope.
Mas o que o amor é, principalmente, são duas pessoas neste mundo.
Editorial
UMA GREVE CUSTOSA PARA O PAÍS
A economia brasileira continua a sofrer os prejuízos causados pela paralisação dos auditores fiscais da Receita Federal. Em julho, a interrupção do trabalho tem ocorrido somente nas quintas-feiras. A greve geral e por tempo indeterminado poderá recomeçar no dia 19 de agosto, segundo boletim divulgado pelo Unafisco, o sindicato nacional da categoria.
Uma assembléia está marcada para a próxima quinta-feira, para decisão sobre o rumo do movimento. No setor de bens de capital foram estimadas perdas de US$ 120 milhões, por atrasos de exportações e de importações, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). Esse cálculo não inclui, disse o presidente da associação, Luiz Carlos Delben Leite, o aumento dos gastos com armazéns, nem os custos de capital de giro causados pela interrupção de negócios.
Outros setores de atividade também têm sido prejudicados. Indústrias que usam componentes importados têm paralisado a produção. "Conheço casos em que o equipamento está 95% montado, mas continua parado na linha porque não há componentes", disse ao Estado o presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Carlos Paiva Lopes.
Muitas perdas dificilmente serão atenuadas, mesmo com a normalização do abastecimento. A conquista de clientes no exterior não se realiza sem muito esforço e sem muita negociação. Uma entrega atrasada, ou que nem se realiza, pode representar um prejuízo muito maior que a receita não recebida pelo exportador. Confiabilidade é um fator de enorme importância no comércio internacional. É fácil perdê-la, quando se deixa de cumprir prazos de entrega, uma condição cada vez mais importante em mercados sujeitos a intensa competição. Já é muito ruim que a impontualidade afete a imagem de uma empresa séria e empenhada em batalhar no mercado internacional. Mas a imagem do País também é facilmente afetada, quando os clientes ficam insatisfeitos.
Os auditores da Receita Federal, que iniciaram a greve em abril, adotaram as paralisações semanais em julho e poderão voltar à greve geral em agosto, têm procurado facilitar a liberação de certos produtos perecíveis, radioativos, explosivos, medicamentos e animais vivos. É justo reconhecer esse cuidado.
Mas isso não impede que ocasionem prejuízos graves à economia brasileira, pondo em xeque o funcionamento de muitas atividades produtivas e comprometendo o esforço exportador. É quase impossível estimar todas as perdas, que incluem danos à imagem comercial do País e o desperdício de oportunidades.
Auditores fiscais da Receita Federal, assim como empregados portuários, de empresas de eletricidade e de telecomunicações, têm uma capacidade especial de prejudicar o País, de forma indiferenciada, quando paralisam seu trabalho. Essa condição cria um problema também especial na esfera dos direitos. Não se pode negar aos trabalhadores de setores como esses o direito de lutar por seus interesses e de recorrer, em certas circunstâncias, também à paralisação do trabalho. Mas também não se pode aceitar que o País seja posto em xeque porque uma categoria detém um poder excepcional de causar danos. Prejuízos impostos por essas categorias, quando paralisam atividades, não atingem só empresas individuais, setores produtivos ou áreas limitadas do setor público. Esse problema ainda não foi discutido com a clareza, a objetividade e a coragem necessárias, porque mesmo as normas relativas a greves em setores essenciais são pouco eficazes.
Os auditores fiscais estão lutando contra dispositivos da Medida Provisória n.º 46/2002, editada no momento em que seria votado o projeto de lei de conversão da MP 2.175, que foi então revogada.
Os auditores defendem a paridade entre ativos e aposentados, para efeito de salários e de gratificações, a reposição do salário inicial de ingresso no cargo e outros benefícios de carreira, além de um reajuste emergencial de 28,86%. Com o fim do recesso parlamentar, a MP 46 poderá ser votada e, por isso, a categoria poderá retomar a greve parcialmente interrompida em julho. Os custos para o País poderão crescer enormemente. Permanece o desafio para que o poder público, sem violar direitos básicos, encontre meios mais efetivos para cuidar do problema.
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07/21/2002
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