Papel da Anatel em análise de questões de concorrência é contestado em debate
A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) deve perder o poder de instruir processos relacionados a questões de concorrência, que se concretiza na condução de análises sobre fusões e aquisições de empresas em sua área de regulação. O ponto de vista foi defendido pelo consultor legislativo Marcelo Calliari, em debate na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), nesta terça-feira (26). Ele argumentou que, além de a Anatel ser a única agência reguladora com essa prerrogativa, essa função vem sendo desempenhada de forma totalmente insatisfatória.
- O papel da Anatel é um desastre. A agência não segue princípios de transparência e nem tem 'expertise' para isso [instrução dos processos].
No debate, destinado a instruir a votação do projeto (PLC 6/09) da nova lei de defesa da concorrência, Calliari revelou que a Anatel está no "foco" das críticas que surgem nas pesquisas feitas por grupo de trabalho montado na Câmara dos Deputados, para acompanhar a atuação das agências reguladoras. Ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade), o consultor, que também integra o fórum na Câmara, propõe que as agências cuidem apenas de questões regulatórias, e que os temas relacionados à proteção da concorrência fiquem submetidos às autoridades dessa área.
Presente ao debate, a titular da Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça, Mariana Tavares de Araújo, observou que o novo modelo de defesa da concorrência funde três órgãos que, até então, precisam emitir parecer sobre os chamados atos de concentração - caso das fusões que promovam excessivo domínio de mercado em favor de determinada empresa. Os processos são examinados pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEA), do Ministério da Fazenda, vão para a SDE, onde recebem outro parecer, para então chegar ao Cade, onde ocorre novo exame antes da decisão final dos conselheiros, em Plenário.
- A eliminação dos três guichês, uma redundância do sistema atual, tem por objetivo tornar a análise mais ágil, em ritmo que respeita o momento econômico do negócio - destacou.
Modelo complementar
Pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), falou o superintendente de Serviços, Juliano Alcântara - ele substituiu a diretora Solange Paiva Vieira, cuja ausência foi criticada pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ). Para Alcântara, o projeto de lei que cria o novo sistema não gera conflitos de competência entre o Cade e as agências reguladoras - posição manifestada por Ronaldo Sardenberg, presidente da Anatel, no primeiro debate realizado pela CAE para discutir o projeto.
- Ao contrário, o novo modelo é complementar e vai reforçar em muitos pontos o papel das agências, sendo fundamental para um sistema forte e unificado - opinou.
Na avaliação do representante da Anac, o papel das agências deve ser mesmo o de assessoramento, apenas contribuindo nas análises dos atos de concentração. Segundo ele, o único ponto do projeto capaz de criar "algum desconforto" para as autarquias reguladoras é um dispositivo que autoriza a requisição de servidores para atuar nos órgãos de defesa da concorrência. Nos termos do artigo, ele afirmou, as requisições são "irrecusáveis e devem ser prontamente atendidas", um problema para as agências que ainda se esforçam para organizar seus quadros.
Estrutura do Cade
Com respeito ao novo Cade, órgão central do sistema, o consultor Marcelo Calliari destacou como um dos pontos positivos o projeto trazer previsão de que a autarquia será contemplada com estrutura e quadro de servidores à altura de suas funções. No entanto, ele observou que, quando da criação do Cade, em 1994, ficou definido que seria encaminhado ao Congresso, em 60 dias desde a aprovação da lei, um projeto para a criação do quadro permanente desse órgão. Porém, isso nunca teria acontecido, o que, para ele, gera o temor de que o mesmo aconteça em relação a esse aspecto do projeto do novo órgão.
Mesmo reconhecendo que o projeto representa um avanço, ele criticou alguns pontos, como a autorização para nomeação de servidor do Cade, sem aprovação do Senado, para o período de vacância dos cargos de conselheiro e superintendente-geral, ainda que por uma única vez, em situações excepcionais. Ele endossou, ainda, crítica ao fato de o projeto conceder poderes muito amplos ao superintendente-geral do órgão, como a permissão para autorizar sozinho alguns tipos de negócios, ainda que o ato possa ser objeto de recurso ao Plenário.
Depois da CAE, o projeto será votado nas comissões de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), e de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA) e, então, em Plenário. Se alterada, a proposta voltará à Câmara. Mesmo com esse percurso e possível retorno à Câmara, Calliari acredita ser possível aprovar a matéria ainda esse ano.
Gorette Brandão / Agência Senado
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26/05/2009
Agência Senado
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