Quieto, FHC corteja PFL para evitar CPI e desgaste de Serra









Quieto, FHC corteja PFL para evitar CPI e desgaste de Serra
Planalto articula reação à suspeita de propina no caso Vale

Juridicamente, não há prova de que teria ocorrido um crime. Politicamente, a prioridade é cortejar o PFL para impedir uma CPI, além de sondar personagens envolvidos para evitar surpresas e saber o que falar publicamente. Eleitoralmente, o PSDB sai ferido, mas não a ponto de ter de substituir o pré-candidato tucano ao Planalto, José Serra.

Essas são as primeiras avaliações e recomendações do presidente Fernando Henrique Cardoso a dirigentes tucanos e auxiliares em razão da reportagem da revista "Veja" que diz que Ricardo Sérgio de Oliveira, ex-diretor do Banco do Brasil, pediu propina de R$ 15 milhões para ajudar o empresário Benjamin Steinbruch a formar o consórcio que comprou a Companhia Vale do Rio Doce, privatizada em 1997.

Ainda esperando o que chama de "decantação do caso" e aguardando o comportamento de seus personagens, emissários do presidente entraram em contato com Steinbruch (amigo de familiares de FHC) e com Carlos Jereissati, empresário que disse ter contribuído financeiramente, via Ricardo Sérgio, para a eleição de Serra ao Senado na campanha de 1994. À primeira vista, os dois não colocarão lenha na fogueira, dando eventuais provas, como gravação.

O ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros é visto como um problema, pela mágoa por ter saído do governo após a divulgação, em 1998, do grampo do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) sobre a privatização.

Se Mendonção resolver atirar em Ricardo Sérgio ou em Steinbruch, o que deve ocorrer (leia texto na pág. A6), pode causar problemas. Daí a cautela de FHC para se manifestar, a fim de evitar dar uma versão que caia no vazio no dia seguinte. Até o final da noite de ontem, o Palácio do Planalto não fez comentário sobre o caso.

O ministro Paulo Renato Souza (Educação), que confirmou o suposto pedido de propina, sofreu críticas duras dentro do PSDB. FHC avalia que ele já fez um estrago e que deveria demitir-se.

Apesar das declarações de que Ricardo Sérgio não fala em nome de tucanos e de que não existe mais relação entre ele e Serra, há contato entre membros do partido e o ex-arrecadador de recursos das campanhas de FHC (1994 e 1998) e Serra (1990 e 1994). Ricardo Sérgio não pretende atirar no governo ou no PSDB.

Congresso
Em conversas reservadas, o presidente diz que, se não surgirem fatos novos, o estrago maior é político, mas, na sua avaliação, contornável. Ele crê que o cacife do PFL cresceu, pois o partido será fundamental para que não prospere uma CPI em ano eleitoral.

A orientação é tratar bem os 97 deputados e 16 senadores do partido. Para que saia logo uma CPI, é preciso que ela seja mista e tenha um terço das assinaturas na Câmara (171) e no Senado (27). Na Câmara, a oposição tem entre 120 e 140 deputados, a depender do tema. No Senado, esse grupo é de 19 membros e também não vota unido sempre. Ou seja, uma CPI não vinga sem apoio do PFL.

Serra e PMDB
Em relação a Serra, a recomendação de FHC é indicar nesta semana o vice peemedebista para a sua chapa, a fim de sair da defensiva e não dar combustível à movimentação de setores do PFL e do PSDB pela troca de candidato. FHC acha que Serra passa por um mau momento, que maio será um mês de turbulência para ele e que é preciso minimizar os atritos.

Estava prevista uma reunião ontem em São Paulo entre o PSDB e o PMDB para confirmar o deputado federal Henrique Alves (RN) como vice. O encontro, porém, podia ser adiado.


Candidato tem de declarar doações para campanha
Especialistas em legislação eleitoral ouvidos pela Folha afirmaram que as regras eleitorais em vigor no pleito de 1994 determinavam que o aluguel de avião para candidatos, mesmo quando pago por terceiros, deveria constar na prestação de contas à Justiça Eleitoral.

Essa é a norma atual. Ela também era aplicada na legislação eleitoral vigente na época, de acordo com advogados ouvidos pela Folha. Segundo Admar Gonzaga, advogado do PFL, qualquer despesa em dinheiro é considerada doação.

"Na época, o controle era feito por meio de bônus eleitorais. O partido deveria incluir o uso do bem como gasto de campanha para a devida emissão do bônus pela Casa da Moeda."

A interpretação do advogado do PPB, Valmor Giavarina, é a mesma. Segundo ele, o candidato precisaria ter estimado quanto custaria o aluguel do avião e declarado a despesa.

Para o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Marco Aurélio de Mello, na época ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o pagamento do aluguel de um meio de transporte por uma pessoa física é uma doação de utilidade.

"Não me lembro de todos os detalhes da lei de 1994, mas é uma questão de transparência", disse. Segundo ele, se o candidato não fosse obrigado a declarar esse tipo de doação, poderia driblar a prestação de contas. Na opinião de Aristides Junqueira, ex-procurador geral da República e procurador eleitoral em 1994, não declarar despesas é crime de falsidade ideológica previsto no Código Penal e na Lei Eleitoral.

Os especialistas afirmaram, porém, que, ainda que comprovado, o crime já estaria prescrito.


Tucano não confirma valor da doação
O pré-candidato do PSDB à Presidência da República, senador José Serra, disse ontem que o empresário Carlos Jereissati, dono do grupo La Fonte e irmão do ex-governador cearense Tasso Jereissati, de fato contribui para sua campanha ao Senado de 1994, inclusive emprestando um avião modelo King Air pequeno. Mas garantiu que as doações foram todas legais e registradas na Justiça eleitoral.

Serra estranhou apenas os valores mencionados pelo empresário em entrevista à Folha: cerca de R$ 700 mil, sendo que R$ 600 mil na forma de aluguel de um avião. O tucano calcula que, para ter gastado essa quantia, nos cinco meses de campanha, teria de ter passado cinco horas por dia no ar, o que seria um despropósito. "Eu não faria campanha. Ficaria voando", disse o senador tucano.

Sem uma cópia da prestação de contas registrada no TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de São Paulo, Serra recorreu a um livro empoeirado, guardado em casa, com anotações gerais sobre sua campanha ao Senado em 1994, inclusive dados sobre contabilidade básica. Por isso, preferiu não falar por enquanto em números precisos ou citar especificamente a fonte das doações, o que diz que pretende fazer depois de recuperar a declaração que está no TRE.

Folha - A revista "Veja" publicou que o empresário Carlos Jereissati disse ter doado R$ 2 milhões para sua campanha ao Senado em 94, por meio do ex-diretor do Banco do Brasil Ricardo Sérgio de Oliveira, mas que só R$ 95 mil foram registrados no TRE. Agora, à Folha, o empresário fala que doou R$ 700 mil à campanha ao Senado. Afinal, qual é o número certo?
José Serra - Está muito claro, é muito importante ressaltar, que não houve a tal doação de R$ 2 milhões por meio do Ricardo Sérgio. É uma mentira que me deixou estarrecido, mesmo levando em conta as baixarias previsíveis de uma campanha eleitoral.

Folha - O empresário contribuiu para sua campanha?
Serra - É fim de semana, o tribunal está fechado. Não tenho aqui comigo a prestação de contas da campanha de oito anos atrás.
Mas lembro-me perfeitamente que as empresas do Carlos Jereissati contribuíram para a campanha e que isso foi devidamente registrado no TRE.

Folha - E o avião?
Serra - Lembro-me também que o Carlos Jereissati emprestou um avião King Air para a campanha. Sei, além disso, que houve registro de doação para a campanha na forma de horas de vôo.

Folha - Por R$ 600 mil?
Serra - Não sei quanto. Vamos ver isso em detalhes. Mas posso adiantar que R$ 600 mil, a preços da época [1994], me parece excessivo, desproporcional.

Folha - Por quê?
Serra - De 80% a 90% dos vôos que fiz como candidato foram com Mário Covas [candidato ao governo", em aviões da campanha dele, não da minha. Na época, pagar R$ 600 mil por um pacote de cinco meses de um King Air pequeno permitiria voar cerca de 300 mil quilômetros, ou 2.000 quilômetros por dia. Ou seja, à velocidade do King Air, isso totaliza cinco horas por dia no ar. Sem contar os vôos com o Covas, deslocamentos terrestres, etc., eu não faria campanha, ficaria voando.


Ex-ministro diz que foi ameaçado por Steinbruch
O ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros deve centrar fogo sobre o empresário Benjamin Steinbruch, ex-sócio da Vale, em entrevista a ser publicada amanhã no site Primeira Leitura
(www.primeiraleitura.com.br).

O site, de propriedade de Mendonça de Barros, também anuncia que irá revelar "a real atuação" de Ricardo Sérgio, ex-diretor do Banco do Brasil, nas privatizações da Vale e da Telebrás, e ainda a maneira como Steinbruch "ameaçou" o governo federal com a suposta propina de R$ 15 milhões para "manter o controle da Vale".

Segundo o site, Ricardo Sérgio "extrapolou de suas funções institucionais" e Steinbruch "tentou criar, sem êxito, um monopólio do aço com recursos públicos".


FHC espera que Paulo Renato peça demissão
O presidente Fernando Henrique Cardoso não deverá tomar a iniciativa de demitir o ministro da Educação, Paulo Renato Souza, mas gostaria que ele pedisse para sair do governo.

Um auxiliar de FHC diz que, em condições normais, Paulo Renato seria demitido ou fritado mais explicitamente. Como é ano eleitoral e ele confirmou uma denúncia, pegaria mal bombardeá-lo diretamente. O desejo do presidente e da cúpula tucana é que ele peça demissão.

Se Paulo Renato quiser continuar, ficará desprestigiado. FHC acredita que ele, ao confirmar que teria havido o suposto pedido de propina na privatização da Vale do Rio Doce, deu um tiro no governo e no pré-candidato do PSDB à Presidência, o senador paulista José Serra.

O ministro da Educação tentou ser candidato a presidente, mas perdeu a indicação para Serra. Depois, como compensação, buscou uma candidatura ao Senado por São Paulo, mas não teve respaldo do PSDB. Desde então, tem demonstrado mágoa em relação a Serrar e aos tucanos em conversas reservadas.

Anteontem, o presidente do PSDB, José Aníbal, disse que o ministro da Educação fora leviano porque não perguntou em nome de quais tucanos Ricardo Sérgio teria pedido propina a Benjamin Steinbruch para ajudá-lo a formar o consórcio que comprou a Vale, privatizada em 1997. "Se não perguntou, perdeu uma boa oportunidade para não ficar calado", declarou Aníbal.

Ontem, Paulo Renato reagiu ao ataque de Aníbal (SP). Ao site da Globonews, o ministro declarou que não reconhece autoridade em Aníbal para criticá-lo ou fazer comentários a seu respeito. "Eu não fiz nada de errado. Escutei uma história e confirmei que escutei. Queriam que eu mentisse?", disse Paulo Renato.


Jereissati diz que doou R$ 700 mil a Serra
Tucano só declarou R$ 95 mil ao TRE-SP; restante do dinheiro teria sido para aluguel de avião

O empresário Carlos Jereissati, 55, presidente da La Fonte Participações, disse ontem à Folha que sua contribuição para a campanha ao Senado de José Serra, em 94, foi de "cerca de R$ 700 mil". Desse total, R$ 95 mil foram doados, por intermédio do economista Ricardo Sérgio de Oliveira, em dinheiro e estão declarados à Justiça Eleitoral.

Outros cerca de R$ 600 mil foram pagos diretamente pelo empresário pelo aluguel de um avião King Air, usado por Serra em sua campanha.

Embora Jereissati diga não ter cometido ele próprio uma ilegalidade, Serra deveria ter necessariamente declarado a doação recebida na forma do aluguel do avião -segundo especialistas ouvidos pela Folha.
Jereissati diz não saber se tem os recibos que comprovam o pagamento do serviço. "Dificilmente terei documentos tão antigos, de 94. Mas não acho que seja necessário. Era uma despesa pessoal minha", declarou.
Trata-se de um detalhe importante: só os R$ 95 mil declarados à Justiça teriam saído do cofre do grupo La Fonte e passado pela mão de Ricardo Sérgio. Os outros cerca de R$ 600 mil teriam sido doados pelo empresário como pessoa física.

Ao dizer que não entregou a Ricardo Sérgio dinheiro em espécie, Jereissati protege o economista que foi caixa de campanha de Serra. Mas esse tipo de proteção não se estende ao tucano.

Carlos Jereissati é irmão do ex-governador do Ceará Tasso Jereissati (PSDB), adversário de Serra dentro do tucanato.

O grupo La Fonte é dono de vários shoppings centers (entre eles o shopping Iguatemi, de São Paulo) e de 11,25% na Telemar (empresa que explora a telefonia fixa em 16 Estados).

A revista "Veja" do fim de semana publicou que Jereissati teria doado o equivalente a R$ 2 milhões a Serra em 94. "Foram quatro ou cinco prestações, não me lembro exatamente", declarou o empresário. Seria a confissão de que houve caixa dois na campanha do tucano, hoje candidato oficial do Palácio do Planalto à Presidência da República.

À Folha, Jereissati não negou a informação dada à "Veja", mas disse ter havido um "mal-entendido". O valor doado teria sido de "cerca de R$ 700 mil". Como um real valia aproximadamente um dólar em 94, "a revista pode ter feito uma atualização aproximada do que foi doado".

Ao TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de São Paulo, Serra informou gasto total de R$ 1,894 milhão na campanha. Registrados em nome de empresas do grupo La Fonte haviam três doações: R$ 15 mil (11/ 07/94), R$ 30 mil (9/8/ 94) e R$ 50 mil (27/9/94). Não há registro de doações em nome de Carlos Jereissati.
Entre os gastos informados e que poderiam conter os realizados com aluguel de avião estão despesas de viagem (R$ 138 mil), locação de bens móveis (R$ 23 mil) e despesas com veículos (R$ 17 mil). Somados, esses valores ficam abaixo dos R$ 600 mil informados por Jereissati.

Ele respondeu ao pedido da Folha por uma entrevista ontem de manhã. Telefonou para o celular do repórter. Como o empresário inicialmente queria falar apenas de forma reservada (em "off", como se diz no jargão jornalístico), pois temia ser mal interpretado, a Folha fez uma proposta: transcreveria apenas as frases referentes ao episódio da campanha de 94 e leria as declarações para ele. Um novo telefonema foi então realizado na parte da tarde, e ele aprovou o teor de suas declarações, publicadas abaixo:

Folha - O sr. deu R$ 2 milhões para a campanha de José Serra a senador em 1994?
Carlos Jereissati - Não. Houve um mal-entendido a respeito da minha declaração à "Veja". Eu posso ter dito que doei US$ 700 mil porque, à época, um dólar valia um real. Mas o valor correto são cerca de R$ 700 mil. A revista pode ter feito uma atualização aproximada do que foi doado, o que não está errado, mas fica um pouco impreciso. No fundo, houve apenas, realmente, um mal entendido.

Folha - Ainda assim, mesmo que tenham sido apenas R$ 700 mil, o valor declarado pelo candidato José Serra em 94 foi de apenas R$ 95 mil no que se refere a doações do grupo La Fonte. Há uma discrepância. Como o sr. explica isso?
Jereissati - De novo, um mal entendido. De fato nós doamos pelo grupo La Fonte um valor de aproximadamente R$ 100 mil, em dinheiro, para a campanha de José Serra. Essa doação foi tratada com Ricardo Sérgio.
Essa parte é que foi dada em umas quatro ou cinco prestações, como afirmei à "Veja". O restante, cerca de R$ 600 mil, foi na forma de pagamento de um serviço. No caso, aluguei um avião que foi usado por Serra na campanha, durante uns cinco meses, em algumas ocasiões.

Folha - Quem alugou o avião? O sr. ou o grupo La Fonte?
Jereissati - Eu próprio, com recursos pessoais.

Folha - O sr. se recorda de como foi feito o aluguel?
Jereissati - Claro. Foi por intermédio do Rolim Amaro", da TAM, que me indicou um avião e um piloto que poderiam fazer o serviço. O serviço não foi pago à TAM, mas foi o Rolim quem me indicou o avião. Recordo-me que foi um King Air.

Folha - O sr. tem como provar, por meio de recibos de pagamento, que foi realmente feito esse aluguel?
Jereissati - Dificilmente terei documentos tão antigos, de 94. Mas não acho que seja necessário. Era uma despesa pessoal minha.

Folha - O sr. se lembra do nome da empresa dona do avião ou do piloto contratado?
Jereissati - Não.

Folha - Quem intermediou o negócio do aluguel do avião foi Ricardo Sérgio?
Jereissati - Não. Ele apenas tratou da doação em dinheiro, que foi declarada pela campanha.

Folha - Ocorre que foi cometida aí uma irregularidade. Ao que se sabe, José Serra não declarou à Justiça Eleitoral que esse avião havia sido pago com o dinheiro de Carlos Jereissati...
Jereissati - Quanto ao candidato, eu não sei. Eu não tenho de declarar os meus gastos. Aluguei um avião e paguei. Nos últimos dez anos, tem sido muito comum as ajudas financeiras a campanhas políticas serem na forma de pagamento de serviços. Quase ninguém dá dinheiro em espécie. Além disso, não me consta existir na legislação eleitoral anterior a 96 alguma norma restritiva ao uso de recursos de terceiros no pagamento de serviços de uma campanha -tendo em vista o lastro legal na renda da pessoa física que fez o pagamento.

Folha - Sim, mas há controvérsia a respeito. Há quem entenda que o candidato devesse ter declarado. Nesse caso o sr. pode ter participado, ainda que indiretamente, de uma operação irregular...
Jereissati - Eu não fiz nada de ilegal. Apenas aluguei um avião para uma pessoa usar. Se essa pessoa precisava declarar -o que eu não sei, acho que não precisava-, é um assunto sobre o qual não tenho influência.

Folha - O sr. contribuiu em 94 para a campanha ao Senado de José Serra. Dois anos depois, em 96, ele se candidatou à Prefeitura de São Paulo. O sr. também contribuiu na campanha de 96?
Jereissati - Prefiro não falar sobre esse assunto.


Artigos

Serra na barca do inferno
Vinicius Torres Freire

SÃO PAULO - Anda ruim a coisa para os lados de José Serra. Não bastasse a campanha da direita do governismo para derrubá-lo, a folha corrida do governo e do tucanato (escândalos e incompetências) ressurge e ameaça estropiar a sua candidatura.

A ironia é que a semana passada foi inteira de picuinhas especulativas e de burrices sórdidas dirigidas contra Lula da Silva. Mas, após quatro campanhas eleitorais, a vida do petista é um livro aberto, para usar uma frase original. A do tucanato é um livro de ocorrências.

Primeiro, há a denúncia de caixa dois em campanha eleitoral de Serra. Segundo, há a curiosa biografia financeira do executivo Ricardo Sérgio de Oliveira, coletor de dinheiro para as eleições do tucanato. Curiosa também é a reação dos tucanos, para quem há um complô contra Serra. A mesma reação dos botocudos do PFL no escândalo de Roseana Sarney, quando os tucanos posavam de limpinhos indignados.

De resto, a economia estropiada vai crescer uma ninharia, de novo. Não vai crescer também por incompetências do governo. Ruim para Serra.

Os juros estão muito altos não só por conservadorismo excessivo do Banco Central. Mas porque o sistema de metas de inflação é rígido demais para uma economia tão volátil como a nossa. Porque o desastre do apagão ainda repercute, devido aos aumentos ainda maiores da energia. Por deixar um monopólio como a Petrobras aumentar preço como quiser. Por causa da dívida pública demencial do governo FHC.

Analistas financeiros ficarão ouriçados com o destino de Serra, que viaja na barca furada da economia, na companhia dos escândalos mortos-vivos do tucanato. Vários desses analistas são ignorantes e picaretas (uns sofrem processo por enganar clientes com dicas furadas nos EUA). Mas haverá torpedos da banca global contra Lula. Normal -até Roosevelt e Kennedy, quando candidatos, foram motivo para ataques especulativos. Mas a eleição definitivamente entrou em ritmo de aventura.


Colunistas

PAINEL

Tempo ao tempo
Paulo Renato (Educação) embarca hoje para Nova York. Quando voltar, dentro de uma semana, pedirá demissão se a crise desencadeada por suas declarações sobre Ricardo Sérgio não tiver sido estancada.

Bilhete azul
No fim de semana, após a publicação das denúncias de suposta extorsão praticada por Ricardo Sérgio, FHC conversou por telefone com Paulo Renato. Deixou claro que não irá recusar um pedido de demissão do ministro da Educação.

Bronca do chefe
Paulo Renato contou a FHC na terça-feira passada que havia dado a entrevista à revista "Veja" sobre Ricardo Sérgio. O presidente repreendeu o ministro.

Longe do ninho
O caso Ricardo Sérgio dificulta a tentativa de FHC e de Nizan Guanaes de aproximar do governo a campanha de José Serra. O presidenciável prefere afastar-se cada vez mais das acusações que envolvem o governo federal e que podem desgastá-lo.

Ganhar por pontos
O PT não insistirá em uma CPI sobre Ricardo Sérgio. A estratégia é desgastar José Serra, mas não a ponto de inviabilizar sua candidatura, pois, para os petistas, um candidato novo, que unisse PMDB, PSDB e PFL, daria mais trabalho a Lula.

Interesse próprio
Eduardo Suplicy (PT-SP) e Heloísa Helena (PT-AL) vão pedir que a Comissão de Fiscalização e Controle do Congresso ouça Serra (PSDB) sobre as denúncias de "Veja". Mas acham que ele deveria tomar a iniciativa de ir logo à tribuna do Senado.

Pressão partidária
O PFL espalha que só não assinará uma CPI se houver possibilidade de Serra ser trocado por outro candidato que agrade ao partido, como Tasso Jereissati ou Aécio Neves. Tucanos acham que não passa de encenação.

Inimigos íntimos
O Planalto avalia que terá mais trabalho para abafar as investigações contra Ricardo Sérgio do que teve nos casos das teles e da compra de votos para a reeleição, quando PSDB, PMDB e PFL estavam unidos. Hoje, muitos aliados jogam lenha na fogueira para desestabilizar Serra.

Desafio na base
Lula vai intensificar a campanha em São Paulo no mês de maio. Pretende visitar cerca de 70 cidades do Estado. SP, na avaliação da cúpula do PT, tem sido o grande responsável pelas derrotas do presidenciável.

Cor-de-rosa
O eleitorado feminino também é uma preocupação do PT. No cenário mais provável pesquisado pelo Datafolha, Lula tem 39% entre os homens e 25% entre as mulheres. Cresce a possibilidade de o vice do presidenciável petista ser uma mulher.

Mais do mesmo
Paulo Maluf (PPB) já tem slogan para a campanha ao governo de São Paulo, sob responsabilidade do marqueteiro José Maria Braga: "Maluf resolve".

Almas gêmeas
João Henrique (Transportes) é chamado na Esplanada de clone de Marco Maciel (PFL). Assim como o vice-presidente, o ministro é magro, alto, meio careca e trabalha até a madrugada.

Balão reforçado
As próximas pesquisas do GPP e do Sensus incluirão Silvio Santos (SBT). Os institutos são controlados pelos pefelistas Cesar Maia (RJ) e Clésio Andrade (MG), respectivamente.

Outra pedra
A direção nacional do PPS tenta convencer Rubens Bueno, pré-candidato ao governo, a compor com o rival Álvaro Dias (PDT) para evitar mais uma crise na aliança trabalhista. Mas o deputado continua irredutível.

TIROTEIO

Do presidenciável Anthony Garotinho (PSB-RJ), sobre o governo federal não ter agido ap ós Luiz Carlos Mendonça de Barros e Paulo Renato terem ouvido denúncia de cobrança de propina no leilão da Vale:
- O que me espanta no episódio é que nada foi feito após dois ministros de Estado terem tomado conhecimento de uma denúncia desse tamanho.

CONTRAPONTO

Conselho de amigo
O pré-candidato do PSDB à Presidência, José Serra, foi convidado a depor na CPI dos Medicamentos em dezembro de 99, quando era ministro da Saúde.
Na véspera do depoimento, Serra ligou para o deputado Jutahy Júnior (BA), então vice-líder do PSDB na Câmara, e pediu que ele fosse acompanhar o depoimento e que levasse junto alguns deputados.
No dia da audiência, Jutahy chegou às 9h30, meia hora antes do depoimento, e ficou esperando Serra. O ministro chegou meia hora atrasado, prestou seu depoimento e foi embora sem nem cumprimentar Jutahy.
À noite, o deputado telefonou para Serra e reclamou da falta de atenção do tucano.
- Mas você ficou bravo, Jutahy? -perguntou o ministro.
- Eu não, mas só porque sou seu amigo. Se fosse um eleitor comum, pode ter certeza que você teria perdido um voto.


Editorial

A ALCA IMPÕE CONSENSO

O prazo que acaba de ser definido para que os países americanos apresentem suas primeiras propostas de liberalização comercial no âmbito da Área de Livre Comércio das Américas impõe enorme esforço de coordenação entre o governo brasileiro e as demais forças políticas.

A imposição decorre da coincidência entre o calendário da Alca e o cronograma político-eleitoral. No dia 1º de janeiro próximo, toma posse o novo presidente da República. Apenas 15 dias depois, o seu governo está obrigado a apresentar sua oferta aos demais 33 países que comporão a Alca nas áreas de bens industriais, agricultura, serviços, compras governamentais (concorrências públicas) e investimentos.

Na prática, quase todo o universo do que se produz e se comercializa em um país estará coberto pela oferta, que significará necessariamente uma redução no protecionismo hoje oferecido aos produtores locais. Afinal, se se pretende chegar a uma área americana de livre comércio, como o próprio nome o diz, é inescapável reduzir, paulatinamente, as barreiras em todas as áreas.

Posto de outra forma: em apenas 15 dias, o novo presidente se verá forçado a definir um elenco de medidas que interferem decisivamente no conjunto da política econômica. É um prazo exíguo demais.

Por isso mesmo, é um imperativo do bom senso que o governo Fernando Henrique Cardoso, ao qual legitimamente compete conduzir a negociação até o seu último dia de mandato, convoque as demais forças políticas para oferecer-lhes todas as informações necessárias sobre o andamento das negociações e recolha opiniões sobre até onde pode ou não avançar, já que a decisão final pertencerá ao futuro governo.

Será um exercício inédito, mas indispensável. Optar entre participar ou não da Alca -e, se escolhida a primeira hipótese, definir como participar- não pode nem deve ser uma decisão do governo FHC, mas tão consensual quanto possível.


Topo da página



05/06/2002


Artigos Relacionados


Olívio Dutra tenta evitar desgaste para o PT

Antonio Carlos quer votar MPs para evitar desgaste do Congresso

Educação: Escola de Rio Grande da Serra estimula uso do grafite para evitar nova pichação

FH corteja PTB e pede união da base

Mozarildo quer evitar retirada de não-índios da reserva Raposa Serra do Sol

Olívio faz maratona para reverter desgaste