Senadores defendem reforma política, mas divergem quanto à mudança do sistema de governo
A reforma política passou a ser uma das maiores bandeiras dos senadores nesta legislatura e sua discussão suscita, novamente, a polêmica acerca do sistema de governo a ser adotado no país: a manutenção do presidencialismo ou a adoção do parlamentarismo.
O tema demarca, basicamente, três posições entre os senadores: os que defendem a adoção do sistema parlamentarista já, no contexto de uma ampla reforma política; os que preferem a adoção do parlamentarismo somente após uma reforma política efetiva que fortaleça os partidos políticos; e os que são claramente contra o parlamentarismo e preferem o aperfeiçoamento do presidencialismo.
Seja como for, o parlamentarismo no Brasil só pode ser decidido por meio de uma consulta ao povo por plebiscito, antes de uma lei sobre o assunto ser constituída. Isso porque, na Constituição de 1988, foi aprovado o artigo 2º das Disposições Transitórias estabelecendo que o eleitorado deve decidir, por meio de plebiscito, a forma (república ou monarquia constitucional) e o sistema de governo (parlamentarismo ou presidencialismo) que deve vigorar no país.
O plebiscito realizado no dia 21 de abril de 1993 teve resultado amplamente favorável ao sistema presidencialista, com 55% dos votos, contra 24% em favor do parlamentarismo. Os demais índices foram: 66% a favor da república, contra 10,2% de votos a favor da monarquia. Houve um índice alto de abstenções: 25%.
- Se houver outro plebiscito hoje sobre o assunto, acredito que vence novamente o presidencialismo, a não ser que o presidente Lula faça uma declaração a favor do parlamentarismo, mas ele é contra - disse o senador Pedro Simon (PMDB-RS), defensor do parlamentarismo.
Para Simon, os grandes nomes da política brasileira que têm voto popular sempre defenderam o presidencialismo. Ele lembrou de Ulysses Guimarães e Leonel Brizola, e citou, no Congresso, políticos de peso como os senadores Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), e Marco Maciel (PFL-PE).
- Fernando Collor agora passou a defender o parlamentarismo, mas era a favor do presidencialismo. E o povo é contra o parlamentarismo, pois quer alguém que decida, que mande. É uma imagem que venderam ao povo, infelizmente! - disse Simon.
O senador pelo Rio Grande do Sul é um dos que defende a adoção do parlamentarismo já, dentro de uma ampla reforma política. Para Simon, esse sistema de governo é a melhor saída para o Brasil. Ele argumenta que ainda há "uma profunda incompreensão" sobre o parlamentarismo devido às sucessivas crises que o sistema viveu, principalmente na Itália.
Mas, atualmente, o parlamentarismo funciona muito bem em países como França, Espanha, Inglaterra e na própria Itália, observou o senador.
- Somente nos Estados Unidos, para lembrar dos países mais desenvolvidos, é que vigora o sistema presidencialista. Hoje existe o que chamamos de parlamentarismo construtivo. Há o voto de confiança para o parlamento, de forma que, no momento de crise, o governo só cai quando houver um outro governo para substituí-lo. Não há mais aquela instabilidade que havia na Itália - explicou.
Mesmo dizendo saber de fortes pressões no Senado em favor do presidencialismo, Simon disse que vai apresentar proposta de emenda à Constituição (PEC) em favor do parlamentarismo, requerendo, para isso, a realização de plebiscito para que a população novamente decida qual a forma de governo que prefere para o país.
Reforma Política
Outro que anunciou uma PEC e projetos de lei propondo uma ampla reforma política - "a mãe de todas as reformas", segundo definiu -, incluindo a adoção do parlamentarismo, foi o senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL).
O pacote de medidas, segundo ele, deverá ser apresentado à Mesa do Senado em março ou até a primeira quinzena de abril. Collor disse que vai propor a realização de plebiscito com a defesa do parlamentarismo, financiamento público de campanha, fidelidade partidária, adoção do voto distrital misto e não obrigatoriedade do voto, além da exigência, por parte dos partidos políticos, de cursos de formação para seus quadros.
- O presidencialismo é a carroça do sistema político brasileiro. É anacrônico, ultrapassado e ineficiente, porque concentra nas mãos de seu titular os mais diversos poderes, confundindo as atribuições de chefe de estado e de governo - afirmou.
Collor citou um exemplo de quando era presidente da República e despachava com o então embaixador Jório Dauster, com quem tratava da renegociação do pagamento dos juros da dívida externa. Naquele mesmo momento, contou, conversava com um ministro a respeito da greve dos eletricitários e com um deputado sobre uma pessoa indicada para um cargo no estado de origem do parlamentar.
- Isso é uma salada diária para o presidente. E é preciso separar uma fruta da outra - comentou Collor.
Para o senador, o rendimento de um governo perde muito de sua eficiência num sistema presidencialista, que, além de tudo, é mais vulnerável às crises políticas. Já o parlamentarismo, segundo Collor, "é moderno, atual, contemporâneo, mais ágil e infenso a crises de governabilidade".
O senador por Alagoas frisou que a reforma política que pretende apresentar, incluído aí o sistema parlamentarista, não interfere no governo do presidente Lula. Sua proposta é que as medidas passem a vigorar no próximo governo, em 2010.
Contraposto
Antigo defensor do presidencialismo, o senador Marco Maciel argumenta que é necessário aperfeiçoar esse sistema na reforma política. E uma das maneiras de melhorar o presidencialismo, completa, é instituir novas normas sobre a elaboração e a tramitação das medidas provisórias (MPs), pois estas, editadas em excesso pelo Executivo, produzem crises e conflitos com o Legislativo.
- O país ainda precisa caminhar muito. Não vejo clima para se adotar o parlamentarismo. Mas se isso acontecesse agora, seria um projeto que, em vez de resolver a governabilidade, iria agravá-la. Haveria permanente instabilidade institucional. Um parlamentarismo instaurado dessa forma, sem uma reforma política, viveria em crise - afirmou Maciel.
O parlamentarismo, argumentou, pressupõe partidos fortes, com estruturas, programas claros e consistentes.
- Os parlamentaristas que defendem a mudança do sistema de governo têm que colaborar com a reforma política, porque, sem ela, não será possível pensar num parlamentarismo verdadeiro - disse.
Também antigo defensor da reforma política, Maciel apresentou uma PEC (02/07), já tramitando na CCJ, que trata da cláusula de desempenho - chamada também de cláusula de barreira -, destinada a autorizar distinções entre partidos políticos para fins de funcionamento parlamentar com base no seu desempenho eleitoral.
A PEC propõe que a lei poderá estabelecer disti nções entre os partidos que obtenham um mínimo de 5% de todos os votos válidos nas eleições para a Câmara dos Deputados, distribuídos em, pelo menos, um terço dos estados, com um mínimo de 2% dos votos válidos de cada um desses estados na mesma eleição e os partidos que não atinjam esse patamar.
A proposta já ganhou diferentes adesões. O senador Aloizio Mercadante (PT-SP) disse que a discussão sobre essa matéria é inevitável e será retomada, pois o Congresso já aprovou medida que trata da cláusula de barreira. O líder do PFL, senador José Agripino (RN) disse que essa medida, bem como a fidelidade partidária, são indispensáveis para o fortalecimento dos partidos políticos. Os senadores Alvaro Dias (PSDB-PR) e Lúcia Vânia (PSDB-GO) também são a favor da proposta.
Agripino comunga com a opinião de Maciel: é favorável ao presidencialismo com fortalecimento dos partidos políticos.
- Você já pensou em implantar o parlamentarismo com partidos políticos como estão hoje? Seria o caos - disse Agripino, para quem a discussão sobre sistema de governo só deve ser feita após a reforma política.
Mercadante também acha que não há espaço, no momento, para a discussão do parlamentarismo, pois o país já passou por dois plebiscitos que definiram posição favorável ao presidencialismo. Embora se diga parlamentarista, Mercadante defende o aprimoramento do presidencialismo, destacando como prioridade a questão das MPs, que trancam a pauta do Congresso.
Alvaro Dias admite que, embora o PSDB seja o único partido que traga no programa a defesa do parlamentarismo, não há como adotar esse sistema de governo antes de uma ampla reforma política.
- Seria uma temeridade fazer isso. A reforma política é prioritária. Estamos devendo essa reforma para o país - afirmou.
O senador diz ser a favor do parlamentarismo, mas ressalva que esse regime é ideal somente após essas reformas, com o fortalecimento e a organização dos partidos políticos. Lúcia Vânia diz que a reforma política deve ser feita o mais rápido possível, pois não dá mais para o país conviver com legendas de aluguel e sem fidelidade partidária.
Para a senadora, o parlamentarismo é um sistema que favorece os partidos e valoriza o parlamento mas, ao mesmo tempo, demanda o fortalecimento das agremiações.
- Não é assunto para agora, mas para outra ocasião. A pauta agora é a reforma política - observou Lúcia Vânia.
O senador José Sarney (PMDB-AP) também se une ao clamor pela reforma política urgente, mas defende que esta examine a questão da forma de governo para que seja implantado, progressivamente, o parlamentarismo no país.
Sarney tem a mesma reclamação a respeito do excesso de MPs, observando que o país caiu "numa cilada de difícil solução".
- Com as MPs, é impossível aprofundar a democracia e dar regularidade ao processo legislativo; sem elas, para atender os problemas urgentes e relevantes no dia-a-dia da administração financeira, é impossível governar - afirmou.
A saída para os impasses de governabilidade do país, conclui Simon, é a adoção do parlamentarismo. O senador comentou que o PSDB só defende o parlamentarismo em seu programa, "mas não executa", e se mostrou pessimista quanto à discussão desse tema no conjunto da reforma política a ser decidida no Congresso.
- Temo que isso não vá acontecer - disse.
09/02/2007
Agência Senado
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