Serra diz que JK, se vivo, seria tucano; Ciro destaca seu bom hu









Serra diz que JK, se vivo, seria tucano; Ciro destaca seu bom humor
BRASÍLIA, DIAMANTINA (MG), POUSO ALEGRE E BELO HORIZONTE. Os quatro principais candidatos à Presidência da República aproveitaram a comemoração do centenário de nascimento do presidente Juscelino Kubitschek para prometer implementar políticas semelhantes às adotadas com sucesso por JK. O tucano José Serra, em homenagem no Memorial JK, em Brasília, contou que dissera a Maristela Kubitschek, filha do ex-presidente, que se Juscelino fosse vivo seria tucano.

— Um homem reformador, ousado e bem disposto! — relatou Serra.

O tucano contou ainda que, quando conheceu JK pessoalmente, na década de 60, era presidente da União Nacional de Estudantes (UNE). Segundo o candidato, JK perguntou-lhe quem os estudantes iriam apoiar nas eleições de 1965, que acabaram não ocorrendo por causa do golpe militar. Serra contou que, para desconversar, respondeu que o movimento estudantil não se comprometeria e Juscelino então teria respondido:

— Eu sei que vocês preferem o (Miguel) Arraes. O Arraes é ótimo, mas eu sou bom, vocês deviam ficar comigo, porque o ótimo é inimigo do bom. Se vocês querem o ótimo, não vão ter o bom e vão ter o ruim”, que era o (Carlos) Lacerda. Na verdade, tivemos o péssimo, que foi a ditadura militar — disse o candidato.

“Povo recuperou a auto-estima”
Lembrando Juscelino e o plano de metas de seu governo, o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, disse que o Brasil precisa de uma política industrial e comercial mais arrojada e com planejamento para que a população possa cobrar do futuro presidente:

— A maior obra do governo JK foi recuperar a auto-estima do povo brasileiro, valorizar a possibilidade de este país se transformar num país livre, soberano e industrializado.

Em sessão solene do Congresso, o senador José Alencar (PL-MG), candidato a vice na chapa de Lula, discursou e fez coro com o petista:

— Sua grande obra não foi construir Brasília, nem as estradas e nem as grandes hidrelétricas, mas sim a recuperação da auto-estima do povo.

Garotinho: “Ele enfrentou o FMI”
O candidato do PSB, Anthony Garotinho, participou de solenidade em homenagem a JK na Câmara de Vereadores de Belo Horizonte .

— JK foi o presidente que teve a coragem de, em defesa do Brasil, enfrentar o Fundo Monetário Internacional e fazer com que o país entrasse na nova era de industrialização — disse Garotinho.

O candidato disse que Juscelino era um desenvolvimentista, e não um entreguista, e contestou a afirmação de Serra que, se fosse vivo, JK seria hoje um tucano.

No Congresso, o vice de Garotinho, deputado José Antônio Almeida (PSB-MA), também discursou e chegou a chorar ao se lembrar de um encontro com JK, em São Luís, quando ainda era estudante.

— Foi um ídolo da nação brasileira — disse.

O candidato da Frente Trabalhista, Ciro Gomes, respondeu a todas as perguntas de uma entrevista coletiva no aeroporto de Pouso Alegre (MG) com referências ao governo de JK e disse que ele representa o seu modelo de vida pública.

— JK enfrentou mil dissabores, foi caluniado, foi agredido, foi insultado, lutou contra os barões do Brasil que contra ele se levantaram, vencendo as eleições — disse Ciro.

Dizendo que tem JK como exemplo, Ciro afirmou que Juscelino nunca se deixou abater e que enfrentou com entusiasmo e sem perder o humor os que se levantaram contra ele.

— Ele nunca se deixou abater e enfrentou sem perder o humor as incompreensões, calúnias e agressões que fazem parte de um lado sujo e escuro da política brasileira — disse Ciro.

Ciro defende a Embraer
Mais cedo, em São José dos Campos (SP), Ciro criticou a forma como o governo está fazendo a licitação para a compra de caças supersônicos para a Força Aérea Brasileira (FAB) e disse que uma concorrência pública deste porte deveria favorecer as empresas nacionais, numa referência à Embraer. Ciro visitou a empresa acompanhado da mulher, Patrícia Pillar, e da mãe, Maria José Gomes. A licitação, de US$ 700 milhões, prevê a aquisição de 12 a 24 jatos pela FAB. A Embraer disputa a concorrência pública num consórcio com a francesa Dassault. Os outros quatro consórcios são de fabricantes internacionais.


Lula e Serra brigam por números de emprego
DIAMANTINA (MG), BRASÍLIA e SÃO PAULO. Um dia depois de afirmar que não pode garantir que criará dez milhões de empregos caso seja eleito, o candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, pela primeira vez deu uma resposta mais incisiva às críticas do tucano José Serra. Lula enfatizou que não se trata de uma meta, mas do número de vagas de que o Brasil precisaria. Em discurso no Largo Dom João, no Centro de Diamantina, para militantes petistas, afirmou:

— Entre perder a eleição e contar uma mentira, prefiro perder. Um homem nunca pode perder o direito de andar de cabeça erguida. E se mentir, vou perder esse direito.

Lula: “Número depende da volta do desenvolvimento”
Antes, em entrevista à imprensa — que chamou de quarto poder — disse que a estratégia do PT está dando certo e que não vai criticar adversários:

— Ele (Serra) deveria olhar para o que eles fizeram em oito anos. Só isso! Vou tentar recuperar em quatro anos os postos de trabalho que eles fecharam em oito anos. Não sei se isso é possível, porque no nosso plano de empregos não prometemos gerar dez milhões de empregos. Dizemos e afirmamos que o Brasil precisa gerar dez milhões de empregos. Se vamos gerar um pouco menos ou um pouco mais, vai depender da retomada do desenvolvimento.

Lula disse que não mudou uma vírgula do que tem dito, pois sempre deixou claro que a geração de empregos será obsessão num governo do PT:

— Acho que quando um candidato começa a ler o programa do outro para fazer crítica é porque não tem programa. Faço questão que ele leia meu programa. Não só esse do emprego. Que leia o da habitação, da segurança, da energia, da saúde, da educação... Quem sabe eles vêem o que deixaram de fazer em oito anos de mandato?

No comício, Lula criticou a política econômica e disse que nenhum país vai para a frente pedindo dinheiro emprestado ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

Comparando a eleição a um campeonato, Lula disse que o eleitor se entusiasma mais na reta final, quando escolhe o candidato com o qual tem mais afinidade. Ele argumentou que o segundo lugar ainda não está decidido e afirmou que o problema é que há três candidatos de oposição e um do governo que “às vezes finge que é de oposição”.

Serra, em Brasília, disse que sua meta de geração de oito milhões de empregos é mais realista:

— Mais útil do que renunciar à paternidade da idéia é debater como eles pretendem criar dez milhões de empregos. No debate, perguntei a ele sobre esse número e ele não me contestou. Lula poderá debater comigo o que tem de errado na minha proposta e tentarei mostrar o que tem de errado na dele. Faz parte do confronto democrático, sem elemento de natureza pessoal.

O presidente do PSDB, deputado José Aníbal (SP), também partiu para o ataque:

— Lula viu que sua meta era inconsistente. Serra já vinha denunciando que era demagogia e mostrando que criar oito milhões de empregos era viável. Estamos mostrando como fazer e Lula viu que foi onde não podia ir.

O líder do PSDB na Câmara, Jutahy Júnior (BA), afirmou que Lula desconhece seu próprio programa e que o episódio é mais uma demonstração da falta de sintonia entre o que ele fala e o que o PT escreve.

— O grande problema de Lula é esse, não conhece o que está escrito no programa de governo dele. Ele está falando o que os outro s dizem e, assim, muitas vezes ele não sabe o que diz — afirmou.

O economista José Roberto Afonso, da equipe de programa de governo de Serra, afirmou que a geração de oito milhões de empregos é um compromisso. Ele explicou que a proposta não apresenta um cálculo sobre as necessidades do país, mas sim o que um governo Serra pretende fazer.

A página da campanha de Serra na internet está desde a noite de quarta-feira criticando as declarações de Lula numa entrevista a uma emissora de televisão da Alemanha. “Lula agora diz que não sabe quantos empregos vai criar”, diz uma das notas. Uma faixa na página reproduz, sem precisar a data, uma declaração de Lula: “Reafirmo o que tenho dito desde o início da campanha: vamos criar dez milhões de empregos, o que o Brasil necessita para incluir no mercado de trabalho uma legião de desempregados, milhares de jovens que procuram seu primeiro emprego”.

Tucanos usam dados do site da campanha petista
Os tucanos recorreram ao site da campanha petista. Nele, uma nota veiculada às 15h de 23 de julho diz que “Programa indica como gerar dez milhões de empregos”. O texto acrescenta: “O documento ‘Mais e Melhores Empregos 2002’, parte do programa de governo, indica como é possível fazer com que o país gere dez milhões de postos de trabalho até 2006”.

O presidente do PT, deputado José Dirceu (SP), rebateu as críticas.

— Não preciso fazer propaganda porque todos sabem que o PT é emprego. Ao contrário de outros candidatos, que precisam ficar provando isso para todo mundo. Ele (Serra) é um dos principais responsáveis pelo desemprego que está aí.


Só posso dizer que criei 9 milhões de empregos’
BRASÍLIA E POUSO ALEGRE (MG). O presidente Fernando Henrique Cardoso aproveitou ontem a divulgação dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), feita em 2001, para rebater as críticas dos candidatos da oposição à Presidência, que acusam o governo de ter aumentado o desemprego nos oito anos de sua gestão. Ele evitou se envolver na guerra entre o petista Luiz Inácio Lula da Silva e o tucano José Serra sobre geração de empregos. Perguntado se seria possível criar oito milhões de empregos como Serra promete, disse:

— Só posso dizer que criamos nove milhões de empregos.

Fernando Henrique acusou os candidatos de usarem dados de forma abusiva e distorcida. O presidente garantiu que criou nove milhões de empregos, mas admitiu que o Plano Real não conseguiu resolver o problema do desemprego.

— No período do Plano Real, efetivamente houve um aumento de desempregados. Não de dez ou 12 milhões, mas de 3,4 milhões. Por quê? Porque já havia, em 1993, 4,3 milhões. O Real não resolveu o desemprego, é verdade, mas não diminuiu o número de empregos — disse.

O presidente admitiu que os novos postos de trabalho foram insuficientes para acomodar a população economicamente ativa, que cresceu mais rapidamente. Ele disse que, desde a implantação do Real, foram criados no Brasil 8,9 milhões de empregos. Mas, no mesmo período, 3,4 milhões ficaram desempregados. O número de desempregados, segundo o presidente, passou de 4,3 milhões em 1993 para 7,7 milhões em 2001.

Números do Censo 2000 do IBGE mostram que no país há 11,4 milhões de pessoas sem trabalho.

— Não se pode dizer que tenha havido essa massa de desempregados que, muitas vezes, por dados não criteriosos, dá a sensação de que há dez milhões de desempregados. Os números são sete milhões — afirmou.

Ciro diz que há desgoverno
O candidato tucano José Serra destacou que seu possível governo enfrentará o emprego informal, que, segundo a pesquisa do PNAD, aumentou no governo Fernando Henrique. Segundo a pesquisa, em 1999 existiam 20,1 milhões de postos de trabalho sem carteira assinada. Em 2001 o número cresceu para 22,2 milhões.

— Essa questão deve ser enfrentada — disse Serra.

O candidato da Frente Trabalhista, Ciro Gomes, disse ontem que o resultado da pesquisa do IBGE que aponta a queda do rendimento médio mensal do trabalhador é mais uma prova do “desgoverno que continua aí”. Ele desqualificou, mais uma vez, a proposta de Serra de geração de oito milhões de empregos.

— Já achava esse número exorbitante. Hoje, temos quase 12 milhões de desempregados. E o candidato do governo insulta a dignidade das pessoas mentindo despudoradamente que vai criar oito milhões de empregos.

A massa salarial tem encolhido nos últimos anos. Tudo isso é conseqüência do desgoverno que continua aí — disse.


Serra tenta atrair setores militares e faz promessa
BRASÍLIA. Para neutralizar resistências nas Forças Armadas por causa da drástica redução de investimentos no setor, o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, reuniu-se ontem com o ministro da Defesa, Geraldo Quintão. No encontro, o candidato recebeu reivindicações e informações sobre a situação das Forças Armadas. Na saída, Serra anunciou que, se eleito, trabalhará para aumentar a produção de equipamentos militares e armas para exportação.

Ele disse que Quintão fez um relato sobre as prioridades para modernização do Exército, da Marinha e da Aeronáutica e sobre a importância de ter uma ocupação maior de toda a fronteira oeste e norte do Brasil.

Segundo Serra, o ministro comentou o aperto orçamentário e a expectativa de que verbas sejam liberadas até o fim do ano. O candidato acredita que as Forças Armadas têm uma contribuição a dar em relação à segurança das fronteiras, mas não acha que devem substituir as polícias. Terça-feira, ele tem encontro com militares da reserva no Rio para apresentar suas propostas.

Hoje, o adversário do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, terá no Rio duas reuniões com militares. Uma delas no Clube da Aeronáutica e outra com integrantes de uma fundação ligada à Escola Superior de Guerra (ESG).


Ciro e Serra abrem mão dos minutos que um tirou do outro no TSE
BRASÍLIA. Enquanto os candidatos à Presidência Ciro Gomes (PPS) e José Serra (PSDB) trocam críticas e insultos no horário gratuito, seus advogados celebram acordos em clima de cordialidade. Depois de várias representações com pedidos de direito de respostas, os advogados decidiram abrir mão, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), do tempo conquistado no horário do outro, zerando o placar.

Serra renunciou ao tempo que ocuparia no programa de Ciro que, num pronunciamento, acusara o tucano de “subtrair clandestinamente” fitas para atacá-lo. Já Ciro abriu mão da resposta que veicularia no programa do adversário em razão das comparações feitas entre ele e Fernando Collor.

Mas isso não significa trégua. Ontem, Serra pediu mais um minuto de resposta no programa de Ciro por causa das cenas sobre a dengue.

Serra acusa Ciro de responsabilizá-lo por mortes
Para Serra, o programa acabou por responsabilizá-lo por suicídios, abortos e mortes que teriam ocorrido em conseqüência da demissão dos mata-mosquitos. O caso será examinado pelo ministro José Gerardo Grossi, que ontem negou outro pedido de direito de resposta de Ciro por causa da comparação com Collor. Ciro sofreu outra derrota. O ministro Peçanha Martins negou a resposta solicitada por causa das inserções da campanha de Serra com a frase “Ciro: mudança ou problema”. Para Peçanha, o que a inserção faz é uma crítica e não ofensa.

O TSE negou direito de resposta pedido pela União no programa eleitoral de Ciro Gomes. No dia 31 de agosto, Ciro afirmou que no Brasil há 11,7 milhões de desempregados, número contestado pelo Ministério do Trabalho. O TSE entendeu que a divergência de números não constitui elementos suficientes para este direito.

O candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, fez uma reclamação contra a TV Globo no TSE, por cau sa da interrupção por um minuto da transmissão do programa vespertino do dia 10, que “impossibilitou a exata compreensão por parte dos eleitores da mensagem”. O programa apresentava propostas para a segurança pública. O problema afetou a TV Globo e suas afiliadas. Lula pede a retransmissão integral do programa.

O ministro Grossi pediu a Globo que apresentasse sua defesa. A Globo explicou que a falha decorreu de problemas técnicos na Embratel. Grossi decidirá se concede novo tempo a Lula.


Artigos

O grande público eleitor
Rosiska Darcy de Oliveira

Permeiam as discussões sobre as eleições alguns lugares-comuns. Afirma-se que a televisão perverte a democracia e degrada o debate ideológico, transformando as idéias em show e simplificando argumentos em slogans. Que políticos desmoralizados despolitizam a política e, na tela da democracia-espetáculo, reduzem os eleitores a telespectadores distraídos e passivos, incapazes de apreender problemas de fundo, mesmerizados por dois ou três truques publicitários.

É bem verdade que a onipresença da televisão transforma em vedete a personalidade dos candidatos, na medida que os eleitores “convivem” com eles, diretamente, ou com suas imagens fabricadas em empresas de marketing.

Há cinqüenta anos, os partidos políticos mantinham sua própria imprensa, colorida com as cores da sua ideologia, alimentavam e reforçavam pontos de vista de classe, que se transmitiam de geração em geração, com pouca exposição aos argumentos contrários. Quem lia a “Tribuna da Imprensa” acreditava firmemente que o Palácio do Catete escondia um “mar de lama”. Quem lia a “Última Hora” denunciava as calúnias do “Corvo do Lavradio”.

Na sociedade de massas, as informações chegam a todos, o que, paradoxalmente, torna os indivíduos mais autônomos em relação aos partidos políticos, mais capazes de formar julgamentos, independentemente dos discursos ideológicos. Para o bem ou para o mal, não se é tanto membro de um partido, mas membro do grande público. Há uma opinião pública no país.

Indivíduos eleitores constroem suas preferências à la carte, segundo suas afinidades com as imagens e mensagens veiculadas. O que força os candidatos a malabarismos mais difíceis do que aqueles com que autores de novelas adaptam seus personagens à opinião pública, para que não haja perda de audiência ou para que, no caso, não caiam nas pesquisas.

Já não é uma parte da população que se enquadra disciplinadamente, como diz o nome, em um partido, mas uma opinião pública ampla e contraditória que dita o discurso, as gravatas, os gestos, os sorrisos e as lágrimas dos candidatos.

Se isso pode ser lido como fragilidade da cidadania, pode também ser entendido como uma maior autonomia dos eleitores, a liberdade de aderir a algumas idéias e discordar de outras. O que torna as escolhas mais instáveis, impede o confinamento ideológico e social e facilita a dinâmica individual de cidadãos que não seguem palavras de ordem e são mais livres ou indisciplinados.

Contrariamente ao que se poderia imaginar, a mídia talvez não esteja conformando o espírito dos eleitores, mas fornecendo matéria para o discernimento individual. O fato de todos verem as mesmas imagens faz também com que todos debatam essas mesmas imagens. A título de exemplo, durante meses a poderosíssima máquina mediática americana expôs as estripulias eróticas do presidente Clinton, o que não bastou para convencer a população — que não falava de outro assunto — da necessidade de afastá-lo do poder. A máquina mediática tem um poder colossal, mas não é onipotente. Seu poder é também o de ser um instrumento da vida democrática numa sociedade de massas.

Outro lugar-comum é a crise de valores, o descrédito da classe política, como indícios de um retrocesso democrático. Uma outra leitura traduziria o mal-estar dos eleitores não como regressão do ideal democrático, mas como uma progressão da exigência democrática, inconformada em face de instituições políticas que não respondem às exigências de uma sociedade que espera mais do que lhe é oferecido. O desejo democrático parece largamente disseminado e se manifesta pelo vigor do debate público, pluralidade que estimula o atrito de pontos de vista e interpretações morais divergentes.

Passou o tempo em que a regularidade de eleições e representantes eleitos pelo sufrágio universal bastavam para caracterizar a democracia. Ela hoje interroga as grandes questões sociais e culturais. Por mais dura que seja a disputa eleitoral, há um denominador comum de valores que ninguém ousa desafiar: o respeito às regras do jogo, a legitimidade das instituições, o repúdio à violência como instrumento político. Parece pouco, mas ainda recentemente contra-argumentos sobre essas questões circulavam, impunes, na vida política brasileira.

A democracia, hoje, reafirma um núcleo estável de valores e coloca suas exigências. A corrupção, claramente descrita na mídia em seus processos perversos, desperta uma indignação que levaria a crer que ela é recente, o que não é verdade. A violência, talvez a maior ameaça à democracia, desespera a população, que contra ela se une e se manifesta.

A força da democracia se revela pelo avesso, pela frustração coletiva diante dos ultrajes do nosso cotidiano. No lamento pela vida com que sonhamos, como gostaríamos que fosse e que não é.


Colunistas

PANORAMA POLÍTICO – Tereza Cruvinel

Aceno do PT a Ciro
Desde terça-feira, quando se apresentou no ciclo de entrevistas “Os candidatos no GLOBO”, Ciro Gomes vem deixando correr sua mágoa com Lula e com o PT, que teriam ficado inertes e até aplaudido os ataques do candidato governista José Serra. O PT fez-lhe um primeiro aceno ontem, em entrevista de seu presidente, José Dirceu, e deve fazer agora um gesto mais concreto.

Primeiro ponto esclarecido por Dirceu, o de que o PT não alimenta boatos, não torce nem trabalha pela renúncia de Ciro Gomes. Sua candidatura, ressaltou Dirceu, é legítima e reconhecida pelo PT como de oposição. Tem ele, portanto, todo o direito de prosseguir candidato, não havendo, da parte do PT, qualquer plano em curso para tentar obter a renúncia dele ou de Garotinho em nome de uma vitória de Lula no primeiro turno. “Vamos trabalhar até o dia 6 como se estivéssemos perdendo a eleição”, diz ainda o presidente do PT, exorcizando o já-ganhou.

Não é o suficiente, talvez, para quem disse, como Ciro, que teve agora sua “decepção final com o PT”. O fato de que Ciro jamais apoiará José Serra se este for classificado para o segundo turno não o faz aliado automático do PT. No segundo turno de 1989, o PSDB, que perdeu com Covas no primeiro, deu apoio formal a Lula contra Collor. Mas apoio passivo, um tanto constrangido. E Lula até hoje se arrepende de não ter corrido atrás do apoio de Ulysses Guimarães, que ficou no limbo.

O melhor interlocutor de Ciro no PT sempre foi Aloizio Mercadante e é possível que ele seja escalado para tentar restaurar a antiga relação entre viajantes da oposição. Nega o PT que tenha aplaudido os ataques de Serra a Ciro ou gostado deles, mas recorda que eles tiveram como temas traços e atos pessoais do candidato.

Uma injusta acusação de corrupção, por exemplo, exigiria uma resposta do PT, mas não críticas ao estilo de Ciro ou contestações a afirmações feitas por ele, como aquela relacionada com os anos de escola pública.

Antes ainda de os ataques começarem, Lula já vinha adotando o estilo que acabou batizando de “Lulinha paz e amor”. Já vinha dizendo, em todos os auditórios, que não falaria mal de ninguém, dedicando-se a falar de suas propostas de governo, do PT e dos partidos que o apóiam. O mote “paz e amor”, lembram dirigentes petistas, não foi construído à custa do embate Ciro-Serra. Mas ganhou mais visibilidade quando os outros dois foram à guerra.

Seja como for, o PT tem razões para se preocupar com Ciro. No segundo turno, ainda que o PFL se reagrupe em torno do candidato tucano, será importante para Lula ter em seu palanque todas as forças de oposição que se dividiram no primeiro turno. Embora conte com o apoio do PSB de Miguel Arraes nesse caso, Lula quer também o apoio e a presença física de Garotinho, e, para tal, o PT do Rio chega a morder a língua para não bater muito em Rosinha na disputa estadual. O mesmo vale para Ciro e para as forças de esquerda que o acompanham, tais como o PPS de Roberto Freire e o PDT de Leonel Brizola. Lula precisa ampliar muito seu arco de apoios no segundo turno para enfrentar Serra, se este for seu adversário, e, principalmente, para governar, se ganhar. Mas a mágoa de Ciro é grande, talvez um aceno verbal não baste.O PT faz hoje a campanha “pinte o 13”. Número do partido e da sorte de Lula, que diz ter saído do Nordeste nesse dia, numa viagem de pau-de-arara que durou 13 dias.A parada de Serra

O candidato tucano José Serra conquistou o segundo lugar graças aos pontos que cresceu e mais ainda graças aos pontos que Ciro Gomes perdeu. Parou de crescer, segundo a pesquisa Vox Populi divulgada ontem pelo jornal “Correio Braziliense”. Em relação à pesquisa dos dias 1 e 2 de setembro, Lula, do PT, cresceu de 36% para 39% e Serra ficou com os mesmos 19% que tinha conquistado. Ciro caiu de 20% para 17% e Garotinho subiu de 9% para 12%. Quem está crescendo neste momento, outras pesquisas já mostraram, é Lula e Garotinho.

Não se impressionam, os tucanos. Sete de setembro era um horizonte para o candidato movimentar-se, sair do empate técnico com Garotinho e mostrar suas possibilidades de vitória. Isso foi feito.

Agora, dizem os estrategistas, Serra tem 25 dias para crescer. E o fará com suas propostas, confrontando-se com Lula quanto à capacidade e ao preparo para executar um plano de governo centrado na retomada do crescimento e do desenvolvimento. Pois, quanto a isso, os dois programas são muito parecidos.PERGUNTAS sobre o segundo turno: num confronto entre Serra e Lula, Itamar Franco e Aécio Neves vão cada um para seu lado? E Tasso Jereissati, vai de Serra ou vai de Lula, se Ciro foi excluído?. E ACM, que já jurou não apoiar Serra? Os petistas fazem acenos também a Tasso. E, ainda que não corram atrás de ACM, não recusariam seu apoio, naturalmente.


Editorial

TESTE NECESSÁRIO

A experimentação com a genética de plantas e animais não é novidade. Sob a forma do cruzamento seletivo, é uma prática de séculos, que apresenta resultados como vacas que são formidáveis produtoras de leite, frutas doces e grandes, cavalos que trabalham incansavelmente e assim por diante. Mas também há inesperados tiros pela culatra, como abelhas assassinas, pittbuls e flores que perderam o perfume. Aqui se acredita estar a diferença em relação aos produtos geneticamente modificados, ou transgênicos — porque, neste caso, age-se apenas sobre a característica que se pretende alterar. Em tese, não deve haver surpresas.

No entanto, a ciência tem um longo histórico de surpresas que se imaginavam impossíveis, porque a teoria era incorreta ou incompleta. Antes de se considerar seguros os transgênicos, devem-se tomar todas as precauções e realizar todos os testes, porque não se sabe quais são os riscos. É o que torna valiosa a decisão da Embrapa de testar cinco alimentos transgênicos (mamão, feijão, batata, soja e milho), quanto a seus efeitos nocivos à saúde de seres humanos e os danos que podem causar à ecologia.

Este último aspecto, principalmente, merece especial preocupação. Porque, como concluiu recentemente a Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos, é baixa a probabilidade de que os transgênicos, como alimentos, apresentem risco sério; mas se escaparem para o meio ambiente, podem competir destrutivamente com as espécies naturais. Aferir hoje esse risco e montar desde já uma política preventiva evitará que mais adiante precisemos enfrentar fatos consumados.


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09/13/2002


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