Serra monta comitê de campanha







Serra monta comitê de campanha
Eventual candidato do PSDB começa a convidar tucanos de alta plumagem para integrar comando do escritório político

BRASÍLIA - Antes mesmo de formalizar a candidatura à Presidência da República, o ministro José Serra cuida da montagem do comitê de campanha. A coordenação, apostam dirigentes do PSDB, ficará por conta de um colegiado de tucanos aliados do ministro e outros nem tão próximos assim. Com a receita, Serra pretende consolidar a paz no partido - incluído aí o grupo do governador cearense Tasso Jereissati. A pedido de Serra, o PSDB deve adiar para quinta-feira a solenidade de lançamento da candidatura, no Espaço Cultural da Câmara dos Deputados.

O ex-senador José Richa (PR), um dos fundadores do partido e remanescente do núcleo do falecido governador Mário Covas, foi convidado a integrar a coordenação. Não aceitou, nem recusou. O ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga, que até pouco tempo trabalhava pelo nome de Tasso, também foi sondado. Diz que aceita, se o convite se concretizar, embora planeje disputar ou o governo de Minas Gerais ou uma vaga no Congresso. ''A candidatura não me impediria de trabalhar na campanha do Serra'', garante Pimenta.

Programa - O ministro da Educação e ex-presidenciável, Paulo Renato Souza, será convidado a colaborar no programa de governo. Em 1994, Paulo Renato cumpriu idêntica missão para FH. O presidente de Itaipu e ex-coordenador político da campanha de Fernando Henrique à reeleição, Euclides Scalco, está entre os cotados para o colegiado.
A coordenação compartilhada, observam colaboradores do eventual candidato, objetiva acabar com o clima de desconfiança de lado a lado no partido. Não são poucos os que temem a exclusão do processo eleitoral.
É justamente para não alimentar tal clima que Serra analisa convidar um tucano apartidário para a coordenação-geral. O perfil de Richa se encaixa perfeitamente no papel até porque não planeja concorrer e terá tempo para se dedicar exclusivamente à tarefa.

O núcleo mais próximo do ex-ministro não será esquecido - o líder do PSDB na Câmara, Jutahy Júnior (BA), o presidente da Câmara, Aécio Neves (MG), o secretário-geral do PSDB, deputado Márcio Fortes, o deputado Alberto Goldman (SP), o senador Artur da Távola e o prefeito de Vitória, Luiz Paulo Velloso Lucas. Velloso Lucas e Fortes devem integrar o comitê.

Lançamento - Os tucanos tentam cercar de mistério a solenidade de formalização da candidatura. Serra pediu o adiamento por um dia para preparar o discurso. Há uma semana, o PSDB reservou o Espaço Cultural da Câmara, com capacidade para 108 pessoas. Ontem, apenas a movimentação de funcionários da empresa de publicidade DM9 indicava alguma organização.
A agência, que um dia pertenceu a Nizan Guanaes (o publicitário da eventual candidata do PFL, Roseana Sarney) e hoje tem a conta do Ministério da Saúde, nega estar cuidando do marketing e da organização da festa de lançamento. Mas os funcionários foram flagrados pelo Jornal do Brasil montando a infra-estrutura do evento.


Brasil e Rússia firmam aliança
Países vão atuar conjuntamento da ONU e na Organização Mundial do Comércio

MOSCOU - Brasil e Rússia selaram uma parceria estratégica para atuar na Organização das Nações Unidas (ONU) e na Organização Mundial do Comércio (OMC), entidades onde predomina o poderio norte-americano. O presidente Fernando Henrique Cardoso pregou reformas no Conselho de Segurança da ONU e pediu a ampliação do colegiado, com maior participação do chamado Grupo dos Vinte, integrado por países desenvolvidos e emergentes. Hoje, apenas Estados Unidos, França, Inglaterra, Rússia e China têm assento permanente, o que lhes confere poder de veto às resoluções do organismo.
A pretensão brasileira de somar-se ao seleto clube recebeu o aval russo, formalizado em documento assinado pelo presidente Vladimir Putin. ''Os rumos da globalização não podem ficar à mercê de instâncias restritas como o Grupo dos Sete ou o Grupo dos Oito'', disse Fernando Henrique em discurso na Universidade de Moscou, onde recebeu o título de doutor honoris causa.

O gesto de Putin terá como contrapartida o apoio do Brasil às intenções da Rússia de fazer parte da OMC. O Brasil é o primeiro parceiro dos russos na América Latina, com negócios que somaram US$ 1,5 bilhão no ano passado. Durante solenidade de assinatura de programas de intercâmbio nas áreas de educação, esporte e cultura, os dois presidentes salientaram o objetivo de aprofundar as relações entre a Rússia e o Mercosul. Em declaração conjunta, citaram interesse nas áreas de alta tecnologia, como a indústria aeronáutica, espacial e nas telecomunicações.

Tropical - Fernando Henrique destacou a proximidade entre as duas nações e chegou a chamar o país de uma Rússia tropical. O objetivo maior da aliança firmada em Moscou, contudo, é enfrentar a força dos Estados Unidos em organismos como a ONU e a OMC. Na pauta, estão por exemplo a defesa de um tribunal penal internacional, e do Tratado de Mísseis Balísticos, que freia a proliferação de armas de destruição em massa, como o Escudo Antimísseis arquitetado pelo governo George Bush. Para Fernando Henrique, esse seria um dos ''pilares do sistema jurídico'' nessa área.

Como tem feito em outras viagens ao exterior, Fernando Henrique voltou a defender a quebra de patentes dos medicamentos destinados aos portadores de Aids.''Entre a sacralização do instituto de patentes e o socorro às vítimas da Aids, o Brasil não hesita: defende a opção humanitária.''
A crítica ao sistema financeiro internacional, outra tônica da fala presidencial em solo estrangeiro, também tomou parte dos discursos em Moscou. Segundo Fernando Henrique, os acordos de Bretton Woods - que traçaram a arquitetura da economia depois da Segunda Guerra Mundial - estão obsoletos. O presidente lembrou que Brasil e Rússia foram vítimas da volatilidade do capital financeiro e voltou a propor mecanismos de controle internacionais.


Seqüestros preocupam o governo
Ministério da Justiça elabora plano para diminuir número de casos e estuda condicionar verbas a ações dos Estados

BRASÍLIA - O Ministério da Justiça estuda com os Estados um plano para diminuir seqüestros no País. As conversas estão sendo conduzidas pela Secretaria Nacional de Segurança Pública. O conjunto de ações deve estar definido até o fim do mês. Nos últimos dias, o governo manteve contatos com as secretarias de segurança pública do Rio, São Paulo e de vários outros estados. Apesar de não ser atribuição do governo federal combater diretamente os seqüestros, o ministro Aloysio Nunes Ferreira, nas conversas com auxiliares, tem manifestado preocupação com este tipo de crime.

São Paulo é um dos Estados prioritários para o Ministério da Justiça. Registra aumento nas estatísticas deste tipo de crime. Entre as autoridades do governo federal, a ocorrência que mais chama a atenção no momento é a do publicitário Washington Olivetto, que continua desaparecido mais de um mês depois de ter sido levado por um grupo que simulou uma blitz em São Paulo, em 11 de dezembro.
O financiamento de iniciativas e projetos para reduzir seqüestros poderá ser feito com recursos do Plano Nacional de Segurança Pública. No ano passado, a União enviou aos Estados R$ 413 milhões para compra de equipamentos e treinamento de policiais nos Estados.

Para este ano, a expectativa do governo é repassar aos Estados R$ 500 milhões. Uma das armas que o governo federal poderá usar para forçar uma ação mais efetiva dos Estados, para reduzir seqüestros, é condicionar o envio dos recursos a um conjunto de ações das polícias civis e militares. A técnica de impor condições para liberar v erbas já é utilizada na construção de presídios. A União, que este ano repassará R$ 300 milhões aos Estados para obras, condiciona a transferência do dinheiro à construção de penitenciárias de pequeno porte.


Governo pressiona postos
BRASÍLIA - Para tentar assegurar uma redução de 17% a 20% no preço da gasolina para o consumidor, o governo está pressionando donos de postos e distribuidoras com os instrumentos disponíveis para tornar o mercado mais competitivo. Ameaça investigar cartéis de revendas, aumentar o número de postos em cidades onde não há competição e até permitir que distribuidoras possam ser donas de postos, o que hoje é proibido.
Esse foi o quadro apresentado ontem, aos empresários, numa reunião conduzida pelo ministro de Minas e Energia, José Jorge, e pontuada por debates intensos. Os técnicos do governo apresentaram indícios de formação de preços em diversas cidades como prova de que o mercado não é competitivo o suficiente.

Pressão - O presidente da Federação Nacional do Comércio Varejista de Combustíveis (Fecombustíveis), Gil Siuffo, disse que os descontos da gasolina dependem da redução da base de cálculo do ICMS. Sentindo-se pressionados, os donos de postos vão, a partir de hoje, fixar cartazes informando o público sobre quanto pagam de imposto por litro de gasolina. ''Não se pode discutir margem de lucro porque estamos num mercado livre'', afirmou Siuffo. ''Cartel se chama Confaz, entidade que é presidida pelo Ministério da Fazenda'', alfinetou o empresário.

Após a conversa, o presidente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes (Sindicom), João Pedro Gouveia Vieira Filho, saiu sem divulgar a posição do sindicato sobre o assunto. ''A reunião serviu para o governo reiterar que espera competição'', resumiu o vice-presidente em exercício do Sindicom, Alísio Vaz.

ICMS menor - O governo federal também pretende, pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), convencer os Estados, que já fizeram acordo para rever a base de cálculo do ICMS, a adotar uma redução de pelo menos 25% no preço do litro da gasolina de referência já no próximo mês.
A pesquisa diária da Agência Nacional do Petróleo (ANP), feita em mais de 800 postos em oito capitais desde o dia 7, revela que, na última sexta-feira, os preços do litro da gasolina comum caíram, no máximo, 10%. O percentual médio foi de 9%.

O Rio agora só perde para Brasília no desconto médio oferecido: 10,22% contra 10,84%. A gasolina comum está saindo na bomba a R$ 1,559, em média. De impostos, o consumidor do Rio paga R$ 0,8765 por litro, o que equivale a mais da metade (55,5%) do preço médio de bomba, segundo o Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis do Rio de Janeiro.
Os donos de postos alegam que o governo estadual leva R$ 0,486 por litro (30,8% do preço médio de bomba) por conta do ICMS cuja alíquota (30%) supera a de outros Estados (25%). Outro fator que pode contribuir para a queda de preços é a importação de combustíveis. A ANP avalia quatro pedidos de empresas privadas até o momento.


O Brasil no meio de duas crises
Maiores fornecedores de petróleo do país na América do Sul, Argentina e Venezuela tentam evitar colapso institucional

O Brasil, outra vez está no meio de uma grande confusão, com os seus maiores fornecedores de petróleo na América do Sul, a Argentina e a Venezuela, mergulhados em graves crises.
Das reservas de petróleo dessas duas nações vizinhas sai um em cada quatro barris que o Brasil importa diariamente. Na Argentina, o país compra 17% do óleo que necessita. Na Venezuela adquire 6%. O consumo brasileiro é de 1,9 milhão de barris por dia. A produção nacional atingiu o recorde de 1,5 milhão de barris por dia, em dezembro. O país compra no exterior, diariamente, outros 400 mil barris. Por decisão do governo, concentrou quase um quarto das importações na Argentina e na Venezuela.

É crescente a tensão nas principais cidades argentinas com o temor de maior desvalorização do peso (leia ao lado) e aumento da da escassez de alimentos e remédios. Sob pressão, o presidente Eduardo Duhalde procura um acordo rápido com o Fundo Monetário Internacional (FMI), para conseguir novos empréstimos e suspender a moratória da dívida externa.

Na Venezuela, à crise política agora soma-se uma crítica situação econômica (leia ao lado). Hoje o presidente Hugo Chavez deve anunciar a criação de um imposto extra sobre operações financeiras - similar à CPFM brasileira. O objetivo é tentar conter a especulação contra a moeda local, o bolívar, alvo de ataques especulativos nas últimas duas semanas. Estima-se que a cotação do bolívar esteja pelo menos 30% acima do valor real da moeda em relação ao dólar. As reservas cambiais venezuelanas somavam US$ 11,8 bilhões na semana passada. Entre quinta e sexta-feira últimas, o país perdeu US$ 99 milhões. O confronto entre Chavez e o Congresso, Igreja Católica e sindicatos ganhou nova amplitude, ontem, com um manifesto de militares da ativa contra o governo e a divulgação no jornal El Nacional de um susposto plano para um ''golpe constitucional'' ainda este ano.


Artigos

Exceção cultural
Nelson Hoineff

Demorou algumas semanas para repercutir no Brasil a virada de mesa de Jean-Marie Messier, o magnata francês que comprou a Universal e se tornou um dos mais importantes empresários do mundo na área do entretenimento. No final de dezembro, ao incorporar a rede USA Networks (que até 1999 era a de maior penetração nos Estados Unidos), Messier fez severas críticas à política de protecionismo ao cinema francês existente em seu país. O novo dono da Universal, que há algum tempo mora em Nova York, afirmou que o princípio de ''exceção cultural'' está morto.

Não poderia ter tocado mais fundo em muitas feridas. Tal princípio, que elevou substancialmente a penetração do cinema francês em seu mercado interno, é tido como um modelo a ser seguido por vários países, entre eles o Brasil. Seria certamente um dos temas a ser debatidos no Fórum Mundial do Audiovisual, que se realiza dentro de duas semanas em Porto Alegre, como parte do Fórum Social Mundial 2002, para discutir os efeitos da globalização sobre a produção cinematográfica no mundo inteiro. Esse fórum vai contar com nomes bem expressivos da cinematografia internacional, como Gillo Pontecorvo, Mario Monicelli e Ettore Scola, que vão estar reunidos no Sul do Brasil para discutir prioritariamente as ''alternativas à hegemonia de Hollywood''.

O princípio de exceção cultural, agora atacado por Messier, estabelece simplesmente que indústrias culturais (como a do cinema e do audiovisual) não podem ficar sujeitas às mesmas regras comerciais que abrangem os demais produtos industrializados, porque agregam valores que não podem ser mensurados simplesmente através dos preços de compra e venda dos produtos.
É claro que essa não é a opinião da indústria audiovisual hegemônica, mas a maior contribuição desse princípio à resolução do problema não está na instalação do confronto - que a rigor existe há quase 100 anos -, mas no estabelecimento de normas que possam conduzi-lo com civilidade. Se há uma exceção cultural a ser respeitada, ela parte do reconhecimento do fato de que o cinema é uma indústria cultural - o que, é claro, não se aplica apenas a um cinema, mas a todos os cinemas do mundo. O embate comercial, que tradicionalmente se dá apenas em nome do domínio de fatias do mercado, é atenuado com o entendimento de que o denominador comum é o respeito à liberdade de circulação da cultura.

Se isso vale para todas as cinematografias nacionais, tem um valor especial, é claro, para as cinematografias locais. O cinema brasileiro paga até hoje um alto preço por ter visto dur ante muito tempo todos os setores que não os da produção local como seus inimigos: exibidores, distribuidores, produtores estrangeiros, emissoras de televisão. Levou tempo para que se percebesse que tanto a produção não vive sem a participação de todos estes setores como eles são em conjunto seus grandes aliados - porque necessariamente impulsionadores de toda a indústria do entretenimento.
Coincidentemente, este início de ano foi marcado pela revelação de que o recolhimento do Condecine - a taxação sobre a distribuição e exibição do cinema e do audiovisual estrangeiros - terá de esperar até março, em alguns casos, e até maio, em outros, para entrar em vigor. Isto significa que a nova Agência Nacional de Cinema (Ancine) terá de esperar mais um pouco para começar a distribuir de fato os recursos do Prodecine, que advêm dessa receita. Até lá ela vai ter de enfrentar, entre outros problemas, a forte oposição de entidades como a Associação Brasileira de Programadores de TV por Assinatura, que estimam que as novas regras elevarão em cerca de 40% os custos dos canais, e das operadoras, que avaliam um repasse de quase 20% para os assinantes - o que na prática não pode acontecer, porque implicaria num índice tão grande de cancelamentos que inviabilizaria a atividade.

Os bons resultados do princípio francês de exceção cultural e as ambigüidades afloradas justamente pela absorção, pelo empresário francês, de alguns dos maiores gigantes do cinema e da televisão americanos, geram um ensinamento que não pode ser esquecido na elaboração de políticas culturais: os valores culturais hegemônicos e os valores próprios às cinematografias nacionais não se confundem - e serão sempre conflitantes. Mas eles são também complementares, na medida em que são as cinematografias hegemônicas que criam a infra-estrutura e o mercado necessários para o desenvolvimento das demais. A própria televisão francesa, por exemplo, é hoje a maior produtora de cinema da França - e ganha dinheiro com isso. A produção francesa ocupa hoje 41% do mercado local, contra menos de 5% do cinema brasileiro no Brasil. São os bons efeitos de uma política eficiente, que parte do princípio da colaboração e não do confronto.

A realização do encontro em Porto Alegre, nos dias 3 e 4, à luz da parábola de Messier e dos conflitos em torno da Ancine, deve estimular a reflexão sobre a necessidade de se pensar o desenvolvimento da indústria brasileira do audiovisual de maneira a agregar, e não confrontar, os outros setores da mesma indústria. O próprio Condecine traz embutida essa aparente contradição: do fortalecimento de todo o mercado de cinema depende a existência de recursos para aplicação na produção audiovisual brasileira.
No fundo, essa não é uma contradição, e sim uma regra numa indústria onde, afinal de contas, existe o princípio da exceção cultural. Ou seja, onde tudo o que é feito em qualquer lugar é do interesse coletivo - e portanto deve ser estimulado coletivamente a existir e se fortalecer.


Colunistas

COISAS DA POLÍTICA

O xerife do quarteirão

Ao utilizar a expressão ''não sou o xerife da esquina'', o presidente da República naturalmente quis reafirmar uma obviedade - a de que não depende única a exclusivamente dele a questão da candidatura governista ao Planalto -, mas acabou cometendo uma inverdade ao dizer que longe dele interferir na sucessão.
Também pode ser que tenha desistido, embora nada indique isso, de cumprir o que anunciou no dia 12 de julho durante o discurso de comemoração dos sete anos do Plano Real, quando deixou claro que pretendia não apenas interferir como comandar o processo sucessório. ''Já cansei de ganhar de gente que estava na minha frente e vou ganhar de novo'', avisou, à moda do xerife, não apenas da esquina, mas do quarteirão todo.

É evidente que em nosso sistema, cheio de nuances, de pontos e contrapontos entre as forças políticas, não cabe a uma figura só a decisão sobre os destinos da eleição. Quem gosta de dizer que ''fez'' de FH candidato é Itamar Franco, deixando de lado o fato de que em 1994 quem articulou mais fortemente a candidatura foi o PFL. Se dependesse da vontade de Itamar, o candidato seria Antônio Brito.
Mas, daí a Fernando Henrique tentar dizer que não interfere nos preparativos da batalha governista equivale quase a repetir aquele ''não sou gerente de crises'' que lançou no ar na virada do primeiro para o segundo mandato, pouco antes de gerenciar uma série de crises, entre elas a do câmbio, a da briga entre Antonio Carlos Magalhães e Jader Barbalho e, mais recentemente, a da energia.

O último presidente que tentou posar de magistrado numa eleição foi José Sarney, que se absteve de comandar o processo e permitiu que a dispersão da Aliança Democrática - cujos personagens são os mesmos de hoje - resultasse no fracasso das candidaturas do PFL, PMDB, PSDB, entre outras, deixando ao establishment a opção, hoje, de triste memória.
Se, quando diz que o governo não terá participação ativa na campanha eleitoral, o presidente quer se precaver de acusações de uso da máquina e outros desconfortos, estes de natureza política, com os partidos dos quais pretende apoio para seu candidato, José Serra, isso é uma coisa. Não obstante, esteja, com isso, tendo um papel ativo.

Outra coisa é inventar uma expressão de impacto que sabe vai ocupar as manchetes, para disfarçar o indisfarçável. Por exemplo, a insistência na afirmação de que a candidatura do ministro Raul Jungmann às prévias do PMDB é fruto de geração espontânea. Tal como deve ter sido a prestação de contas da Reforma Agrária feita por Jungmann, durante quatro minutos, em rede nacional de televisão, horas depois do voluntarioso e nada estratégico anúncio da disposição de concorrer com Itamar e Pedro Simon.
Da mesma forma como Jungmann segura a cadeira no PMDB, Pratini de Moraes, ministro da Agricultura, mantém garantido o espaço no PPB, estimulado pelo chefe que, na versão oficial, nada fez, nada viu, nada sabe. Que o presidente da República queira contar a história como esta lhe parece plausível, tudo certo, desde que nos permita pelo menos não acreditar de todo nela.

Cobras criadas
Fernando Henrique visitou José Sarney, no sábado, para desfiar fidalguias à candidatura de Roseana Sarney. A melhor delas reza, na versão de FH, que o lançamento da governadora do Maranhão foi importantíssimo para acabar com a idéia de que Luiz Inácio Lula da Silva seria invencível.
Sarney, evidentemente, fez-se de muito satisfeito, mas seus anos de vida pública - e algum conhecimento que tem sobre a personalidade do presidente - certamente não lhe permitiriam a credibilidade pretendida. Entre outros motivos porque, sobre o suposto mito da invencibilidade de Lula, a história recente traz registros suficientes para que não estabeleçamos correspondência entre o desempenho do PT em campanhas presidenciais e a performance de Roseana, nesta agora.

Para quem não pretende nem de longe interferir na sucessão, até que o presidente se expôs ao sair do Palácio da Alvorada e abalar-se até a casa de Sarney para lhe dizer que a candidatura da filha está firme como uma rocha e trata-se de fato irreversível.
De novo a versão do PFL foi a de que Sarney ficou orgulhoso e satisfeitíssimo. Provavelmente deve ter se manifestado assim frente a FH, embora sem que lhe tenha fugido da memória o carimbo de símbolo do retrocesso que tucanos importantes buscaram imprimir à candidatura de Roseana.

Candidatura esta que, se Fernando Henrique considerasse tão irreversível assim, não iria render todas as homenagens que vem rendendo ao PFL, justamente porque considera - como de resto todos os tucanos - que ela não prospera e, por isso, não podem ser queimadas as caravelas que levem os pefelistas de volta ao antigo porto.
Uma conve rsa, essa entre Fernando Henrique e José Sarney, deveras interessante, pelo que encerra de exercício recíproco de dizer apenas o que convém aquilo que ao outro interessa ouvir.


Editorial

Ação Política

A troca de ultimatos entre o presidente Andrés Pastrana e a guerrilha das FARC, que controla 40% do território colombiano, chegou ao ponto de não retorno. Três anos de negociações resultaram em nada. A quatro meses da eleição presidencial, Pastrana, que vem alimentando a tentativa de diálogo com paciência budista, resolveu endurecer sua posição, baseada aliás sobre aspiração nacional expressa em várias pesquisas.
A Colômbia está literalmente com um pé na guerra civil. O governo exige que os guerrilheiros abandonem a zona desmilitarizada de 42 mil quilômetros (área maior do que a Suíça), onde se realizou o diálogo de paz que a nada conduziu. Há algum tempo a Colômbia se mantém dividida em duas partes quase nítidas, uma oficial, com capital em Bogotá, e outra oficiosa, sob domínio das Farc, com capital em San Vicente, hoje financiada pelo narcotráfico, pelos seqüestros e pelo imposto revolucionário.

Praticamente falharam as atividades do grupo de contato (Cuba, Venezuela e México, pela América Latina; e Espanha, França, Suécia e Noruega, pela Europa), com apoio da ONU, entre outras razões porque agiu tarde demais. Agora que a paciência de Pastrana se esgotou, desde que decretou o fim da zona desmilitarizada, a guerra praticamente inevitável terá conseqüências incalculáveis para todos os países que fazem fronteira com a Colômbia, em especial o Brasil. A guerra significa a expansão da violência, que custa ao país vizinho 3,5 mil vidas todos os anos.

O Brasil já teve atrito sério com a Colômbia quando o governo de Bogotá pediu permissão para um de seus aviões pousar, por motivos humanitários, numa cidade brasileira, mas que na realidade estava perseguindo narcotraficantes. Obviamente a repressão ao tráfico na Colômbia provoca êxodo de traficantes e plantadores para os países vizinhos. O Plano Colômbia, elaborado e desencadeado ainda no final do governo Clinton, mudou os dados do problema.
Pelo Plano, assessores (militares e civis) americanos se envolveram no combate aos traficantes. A presença de assessores americanos em território colombiano ajudou a melhorar a qualidade das forças militares locais. É isto que poderia desequilibrar o empate técnico entre governo e guerrilha.

O envolvimento diplomático do Brasil neste conflito será inevitável. Os colombianos, em sua luta agora aberta contra a guerrilha, vão solicitar uso do espaço aéreo, direito de pouso e outras situações delicadíssimas na extensa fronteira amazônica. Chegou, portanto, a hora de uma tomada de posição clara das autoridades brasileiras, do ministro da Defesa, Geraldo Quintão, ao chanceler Celso Láfer, passando pelo presidente Fernando Henrique que, com sua Ação Global, sempre dirigiu pessoalmente a diplomacia nacional. De certa forma, a diplomacia brasileira está sendo testada como nunca agora que a situação explosiva da fronteira com a Colômbia se tornou ameaça real.

Em Bogotá, Pastrana, que só tem mais seis meses de governo, está sob pressão política. A opinião pública perdeu a fé no diálogo e exige ação. As Farc dizem que os culpados pelo rompimento do diálogo são os guerreristas, num lance com vistas à sucessão presidencial, mas a verdade é que 15 mil soldados estão mobilizados até os limites da zona desmilitarizada. Nos últimos decênios, a guerra não declarada entre Exército, guerrilheiros e paramilitares provocou mais de 35 mil mortos.

Em setembro de 2000 o Itamarati manifestou reservas, igualmente feitas por outros países, ao Plano Colômbia. Naquela ocasião, o Brasil não parecia disposto a aceitar solicitações para cooperar nessa ofensiva e se manifestou contrário à idéia de introduzir um fungo geneticamente modificado para prejudicar o desenvolvimento das plantas de coca (idéia de alguns conselheiros americanos). O eco-sistema brasileiro é frágil; intervenções anteriores demonstraram que é difícil controlar os efeitos sobre o meio ambiente.
Politicamente e militarmente Pastrana não pode voltar atrás na investida contra a guerrilha. Por este motivo a viagem do secretário-geral do Itamarati, Omar Chohfi, à Colômbia, no fim de semana, reveste-se da maior importância. Com toda a urgência o Brasil tem de se posicionar sobre a situação no país fronteiriço.
A sorte está lançada.


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01/15/2002


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