Sete horas de intenso debate para votar a CPMF



A votação da proposta de emenda à Constituição (PEC 89/2007) que prorrogava a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira ( CPMF ) só foi concluída na madrugada desta terça-feira, por volta de 1h Os encaminhamentos de votação foram iniciados às 18h com uma autocrítica e um apelo governista por parte do senador Valter Pereira (PMDB-MS). Mesmo reconhecendo que o Brasil é obrigado a suportar uma alta carga tributária, o parlamentar por Mato Grosso do Sul advertiu para o risco que correm os programas governamentais caso falte a CPMF.

Valter Pereira quis ir além dos cinco minutos regulamentares, obrigando o recém-eleito presidente, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), a consultar os líderes sobre a extensão dos encaminhamentos. Por unanimidade, foi mantido o que manda o regimento, e a defesa governista prosseguiu com o senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), que também reconheceu o excesso de impostos, mas defendeu a importância do imposto do cheque.

- Seria um ato criminoso para com o Brasil negar a CPMF ao governo Lula - apelou Inácio Arruda, com a concordância do senador Gerson Camata (PMDB-ES), que chamou a CPMF de "tributo Robin Hood", e alertou para o efeito nulo da derrota do imposto sobre a popularidade de Lula.

Outro governista, o senador João Pedro (PT-AM), fez um histórico da CPMF, partindo da emenda que em 1993 criou o Imposto sobre Movimentações Financeiras (IPMF), passando pelas emendas de prorrogação do tributo sob outra denominação em 1996, 1999, 2002 e 2003. Em seguida, citou o idealizador da CPMF, o médico e ex-ministro da Saúde Adib Jatene, ainda hoje um defensor da contribuição.

Quinto orador a usar a palavra, o senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), manteve a defesa da CPMF no ar, embora lamentando que os adversários não tenham se convencido por todo o tipo de argumentação. Valadares chegou a assumir a incerteza vivida pela bancada do governo em relação à sorte do imposto.

- Se a CPMF cair, os preços dos alimentos não vão variar para baixo, mas o dinheiro para cirurgias pelo SUS [Sistema Único de Saúde] vai diminuir. A oposição pode ganhar esta batalha, mas uma outra vitória desse tipo acabará com a oposição - advertiu.

A líder do bloco da apoio ao governo, Ideli Salvatti (PT-SC), pegou o bastão das mãos de Valadares e classificou a votação de "histórica". Como argumento favorável à CPMF citou os dados da pesquisa CNI/Ibope, divulgada na terça-feira (11), com aumento da confiança da população no governo, e números de crescimento da economia.

- A percepção do povo é a de que a situação do país está melhor. Sem a CPMF, o ritmo de crescimento e distribuição será menor. Por isso, o povo está atento a como vamos votar - argumentou Ideli, que cedeu a palavra ao senador Francisco Dornelles (PP-RJ), tendo este alertado também para o risco que a não prorrogação da DRU teria sobre os setores que não têm assegurada receitas vinculadas.

Às 19h50, subiu à tribuna o senador Tião Viana (PT-AC), que no final da manhã havia entregue a presidência ao senador Garibaldi Alves, eleito o novo presidente. Os argumentos de Tião Viana dividiram-se entre os racionais e os emocionais: de um lado muitos estados, como o Pará, recebem em razão da CPMF mais recursos do que arrecadam com o imposto

Críticas

O contra-ataque da oposição só viria depois dos argumentos do senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA), por meio do líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), que minimizou os alertas sobre crise na saúde, "num momento de bonança", ou seja, alta carga tributária e aumento crescente da arrecadação. O líder do PSDB criticou a estratégia de negociação do governo que ofereceu isenção para a faixa de renda para a CPMF que seriam tragadas pelo aumento da arrecadação e "chantageou" governadores com o corte de recursos.

- Se com o fim da CPMF vier um cenário favorável, dividirei com a minha bancada, mas e vier o caos eu assumo a inteira responsabilidade. Estou tranqüilo porque a recusa à CPMF vai obrigar o governo a descer à terra para negociar uma verdadeira reforma tributária e diminuir gastos - disse Virgílio, que afirmou não acreditar nas promessas que o governo fez para chegar a um acordo com os tucanos, como a prorrogação do governo só por mais um ano. E lembrou que na oposição o PT nunca fez concessões ao governo para proteger a população.

A defesa da CPMF feita pelo governador de Minas Gerais, Aécio Neves, do partido de Virgílio, foi utilizada minutos depois pelo senador Paulo Paim (PT-RS) como argumento a favor da manutenção do imposto. Ele criticou a oposição por manter-ser irredutível a despeito de todos os pontos em que o governo aceitou ceder.

- Eu não entendo esta Casa - lamentou poucos minutos depois o senador Wellington Salgado (PMDB-MG) diante da posição dos que são contra a CPMF. Ele disse que não se poderia questionar um presidente com índices de popularidade tão grande.

"Lorota"

O senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) rechaçou os ataques aos adversários do imposto e tachou de "lorota" a afirmação do governo de que CPMF ajuda a combater a sonegação. Repetindo o que dissera Virgílio, o parlamentar pernambucano citou estudo da Universidade de São Paulo (USP) que demonstraria ser a CPMF um tributo que pesa mais no bolso dos pobres do que no dos de maior renda, pelo efeito da transferência do imposto para os produtos.

O senador Sibá Machado (PT-AC) justificou a mudança da posição do PT contra a CPMF, no governo Fernando Henrique, pela mudança na aplicação que teria sido feita no governo Luiz Inácio Lula da Silva, destinando recursos da CPMF para o pagamento do Bolsa-Família e da aposentadoria dos trabalhadores rurais.

- Vim aqui falar da emoção do povo - disse Sibá.

O líder do DEM centrou sua argumentação na eficiência econômica, defendendo o ponto de vista de que o aumento da carga tributária nos coloca em desvantagem perante os concorrentes do Brasil como Rússia e a Índia.

- Se o governo quer ajudar os pobres, deve deixar de usar o aumento da arrecadação para contratar 26 mil petistas em cargos comissionados e criar 38 ministérios - disse Agripino, que citou dados da execução do Orçamento para dizer que os investimentos públicos em saúde não passam de 4% do total de investimentos do governo.

- Chega de egoísmo. Vamos buscar a solidariedade e da fraternidade - respondeu a senadora Serys Slhessarenko (PT-MT).

- Não estamos sendo egoístas. Egoísta é o governo que arrecada R$ 60 bilhões em outros impostos e ainda quer ficar com R$ 40 bilhões dos trabalhadores - replicou a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), relatora das PECs na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).

Membro de um partido que fechou questão a favor da CPMF, o senador Osmar Dias (PDT-PR) disse que recebeu documento assinado pelo líder do governo, senador Romero Jucá (PMDB-RR), e pelo ministro das Relações Institucionais, José Múcio, com vários compromissos do governo: redução 0,02% na alíquota da CPMF, para passar dos atuais 0,38% a 0,30% em 2011; redução da incidência da DRU nas verbas para educação, de forma que a partir de 2011 não haveria mais o corte de 20% dos recursos, o equivalente a R$ 5 bilhões a mais; contenção dos gastos correntes (mensagem 154/2000 na pauta da Comissão de Assuntos Econômicos - CAE); restrição dos limites globais para o montante da dívida consolidada da União; limite de crescimento dos gastos com pessoal igual à inflação mais 2,5% ao ano (matéria na CAE); estabelecimento de limites mais específicos para limite despesas correntes na LDO de 2008; verbas para a recuperação do Hospital das Clínicas de Curitiba.

- Além disso, a promessa do governo de v ir a utilizar toda arrecadação da CPMF com a saúde condiz com os interesses da população - disse Osmar Dias.

- Não há momento mais oportuno do que este para acabar com a CPMF, quando há um excesso de arrecadação - argumentou dois discursos depois o irmão de Osmar Dias, senador Alvaro Dias (PSDB-PR). Para ele, rejeitar a CPMF será um sinal de independência do Legislativo em relação às imposições do Palácio do Planalto.

Na opinião do senador Aloizio Mercadante (PT-SP), o argumento do excesso de arrecadação não é válido, uma vez que esse excedente decorre de uma circunstância internacional favorável, sobre a qual não há garantia de continuidade. Ele lembrou que a dívida pública ainda está em R$ 1,3 trilhão, e que esse valor só cairá se os investidores perceberem a possibilidade de solvência do Estado.

- Tirem os ternos e vistam os jalecos. Por que não construir um entendimento? O tempo de uma cirurgia e de um parto é o tempo da vida - pressionou o senador petista.

Afirmando participar de cerimônias de entrega de cartões do Bolsa-Família, a senadora Fátima Cleide (PT-RO), disse que os brasileiros pobres não estão preocupados com números da macroeconomia, mas com os recursos sem os quais não poderiam se alimentar ou freqüentar escolas e faculdades.

Colega de partido de Fátima Cleide, o senador Eduardo Suplicy (SP) abriu alguns dados bancários para mostrar que desconta R$ 160 reais de CPMF em um salário de R$ 16 mil.

- Isso é perfeitamente razoável. É a nossa contribuição para a maior equidade social - disse.

Às 21h50, quando a oposição já dava como certa a rejeição da PEC, o debate foi agitado pelo boato de que uma carta assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a promessa de utilização total da CPMF com a saúde estava circulando entre os senadores.

Carta de Lula

Às 22h30, Romero Jucá pediu a palavra antecipadamente. Rememorou as negociações no Senado e anunciou que trazia duas cartas endereçadas ao presidente do Senado, uma assinada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e pelo ministro das Relações Institucionais, José Múcio, e outra assinada pelo próprio presidente Lula, encaminhando a primeira.

A carta dos ministros (um comunicado conjunto em termos genéricos) foi usada para embasar dois caminhos de negociação apresentados por Jucá: um deles seria o aumento dos gastos com a saúde em R$ 29 bilhões, e não mais R$ 24 bilhões, conforme sugestão do Conselho Nacional de Secretários de Saúde. A CPMF seria prorrogada por um ano apenas, enquanto se discutisse uma proposta de reforma tributária.

O outro caminho seria o aumento gradual da parcela da CPMF com a saúde até atingir, em quatro anos, o total da arrecadação, calculado em R$ 36 bilhões. Nessa hipótese, a CPMF seria prorrogada por quatro anos.

A idéia de Jucá era interromper os encaminhamentos para a retomada das negociações nesta quinta-feira (13). O DEM e o PSDB, entretanto, recusaram esse entendimento, mantendo posição favorável à votação ainda na noite de quarta.

- Esse é um fato novo. Poderemos perder, mas está aqui e a decisão é do Senado - disse Jucá.

- Esta é uma proposta intempestiva, de última hora. Não merece consideração neste momento - disse José Agripino

- Não sei por que essa proposta não veio antes. Recebo com respeito e simpatia a carta dos ministros. Mas só depois dessa votação, abriremos negociações. E estaremos prontos a negociar tão logo, votemos a CPMF - reforçou Arthur Virgílio.

Apelo de Simon

O debate prosseguiu até que às 0h05 desta quinta-feira (13) o senador Pedro Simon (PMDB-RS), voto declarado a favor da CPMF, pediu que a votação fosse adiada para que "todos pudessem refletir" sobre a matéria, evitando uma vitória ilusória para qualquer um dos lados. A iniciativa foi duramente criticada por Virgílio. Os dois trocaram reprimendas, mas uma hora depois um abraço caloroso pôs fim ao conflito.

Às 0h55, Garibaldi colocou a matéria em votação. Agripino propôs que se votasse em separado a Desvinculação de Receitas de União ( DRU ), mecanismo que permite a manipulação de recursos da ordem de R$ 40 bilhões. Com exceção do líder do PSOL, senador José Nery (PA), houve concordância com a proposta de Agripino.



13/12/2007

Agência Senado


Artigos Relacionados


Projeto dos depósitos judiciais aprovado após sete horas de debate

Depoimento de Diógenes já dura sete horas

Debate intenso na apreciação dos vetos

Após sete horas de discussão, Senado aprova o PLV 1/08

GERALDO CÂNDIDO QUER JORNADA DE SETE HORAS

Depois de sete horas de votação, avança pauta prioritária do Senado