STJ quer punir governante que não paga dívida
STJ quer punir governante que não paga dívida
Costa Leite levará ao Congresso proposta para tornar inelegível quem descumprir precatório
BRASÍLIA - O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Paulo Costa Leite, vai apresentar ao Congresso até o fim do mês um projeto para tornar inelegíveis os administradores que descumprirem sentença judicial para o pagamento de precatórios. São Paulo, por exemplo, tem uma dívida atualizada de R$ 6 bilhões em precatórios. Goiás reiniciou o processo de negociação, mas o último pagamento efetuado pelo governo estadual foi em 1981. No Distrito Federal, o último credor conseguiu receber em 1994.
Para Costa Leite, é preciso mudar os mecanismos atuais de cobrança das dívidas judiciais. "A medida fará com que as pessoas não percam a crença na Justiça e não se sintam impotentes perante o Estado", completou o ministro.
Ele sugere que os governantes que ignoram o precatório sejam enquadrados no crime de lesa-corte e processados por improbidade administrativa.
A legislação atual prevê que a União pode decretar a intervenção federal no Estado que descumprir uma decisão judicial. "Só que essa medida pune o Estado, não o governante que desrespeitou uma sentença da Justiça", comenta o presidente do STJ, ao justificar sua proposta.
Enquanto amadurece a proposta da inelegibilidade dos devedores, Costa Leite já começa a articular, nesta semana, mudanças na legislação. Na terça-feira, ele discutirá com o presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Bernardo Cabral (PFL-AM), a transformação do precatório em um título negociável pelo credor, que poderá vendê-lo ou aplicar e, dessa forma, reaver seus prejuízos.
Críticas - Mesmo antes de formalmente apresentado, o projeto de Costa Leite para punir os governantes já começa a causar polêmica. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, afirma que os precatórios são uma "herança maldita" recebida pelos atuais administradores e, portanto, não seria justo puni-los. Ele ressalta que, em alguns casos, há tentativas de renegociar esses esqueletos.
Para aqueles que não fazem nem isso, o presidente do Supremo sugere outra pena - o seqüestro do numerário da pessoa jurídica para cobrir essa dívida com o cidadão. Marco Aurélio afirma que os administradores precisam entender que sentenças transitadas em julgado "não são atos líricos, são reais".
Relator da CPI dos Precatórios, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) amplia as críticas à proposta. Para ele, é preciso punir, também, os juízes que se tornam coniventes com a "indústria dos precatórios". "Eu mesmo, quando era governador do Paraná, tive uma sentença irrecorrível, de um precatório de R$ 200 milhões, que era completamente frio", comentou.
Requião acha correto que o ex-prefeito Paulo Maluf (PPB) seja punido no episódio dos precatórios na Prefeitura de São Paulo, mas questiona por que os bancos, envolvidos no escândalo da CPI de 1996, jamais tenham sido citados. "A corrupção é igual, tanto no Executivo quanto no Judiciário. Não é justo que os magistrados só vejam o problema por um lado."
Alckmin mantém orçamento enxuto, apesar das críticas
Assembléia decidirá sobre corte de verbas do Ministério Público, que pode recorrer à Justiça
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), afirmou ontem que a decisão sobre o valor do orçamento do Ministério Público Estadual para 2002 será da Assembléia Legislativa - polêmica que pode acabar na Justiça.
"A palavra final é da Assembléia, que é um poder independente e dá o parecer final à peça orcamentária", explicou. "Mas, sempre que se aumenta em algum lugar, tem de se tirar de outro. O cobertor é sempre curto."
Apesar disso, Alckmin avisou que não cederá às reclamações dos promotores de Justiça contra o corte de 23% no projeto de orçamento da instituição. A proposta original previa R$ 692,71, mas foi reduzida a R$ 524,83 milhões.
Para os promotores, o valor que o Palácio dos Bandeirantes se dispõe a repassar é insuficiente e não deverá cobrir a folha de pagamentos, que consome 92% dos cofres do Ministério Público.
"As verbas de que o Ministério Público disporá são maiores que as deste ano", contesta Alckmin.
Representantes do Ministério Público protestaram contra a redução de valores no orçamento e, se não conseguirem demover os deputados a favor de sua causa, ameaçam recorrer à Justiça, por meio de mandato de segurança, para obter os 2% da receita corrente do Estado. A polêmica deve se acirrar nas próximas semanas, pois a Assembléia precisa aprovar o orçamento do Estado até o fim do ano legislativo, em dezembro.
Segundo Alckmin, as propostas ao Orçamento "são sempre maiores" que o valor possível de ser disponibilizado. "Tudo foi baseado num quadro de crescimento econômico de 2,5% e inflação baixa", afirmou. Para o governador, o Ministério Público já está abaixo do 2% do Orçamento - montante previsto para a instituição pela Lei de Responsabilidade Fiscal. "O Executivo tem 49%, o Judiciário 6%, a Assembléia 3% e o Ministério Público 2%. Assim chegamos aos 60% permitidos", calculou.
Tribunal sugere mais fiscalização do Judiciário
Conselho proposto pelo STJ coibiria casos de agressão física, entre outras atribuições
BRASÍLIA - O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Paulo Costa Leite, vai propor nesta semana ao Congresso que aprove a criação de um órgão para fiscalizar o Judiciário. Uma das funções do Conselho Nacional de Administração da Justiça seria tentar coibir e punir as freqüentes agressões entre os profissionais do direito ocorridas nos tribunais e fora deles. Costa Leite está preocupado com as recentes notícias de agressões físicas entre promotores, advogados, juízes e delegados.
"Antes, episódios desse tipo não eram comum na família forense", observou o ministro, que deverá entregar a sugestão ao senador Bernardo Cabral (PFL-AM), que é o relator da reforma do Judiciário no Senado. O presidente do STJ atribui a mudança no comportamento, principalmente, ao excesso de trabalho na Justiça.
Se o Congresso aprovasse a criação do conselho, que seria formado por sete magistrados, Costa Leite acredita que seria possível fiscalizar de forma mais efetiva incidentes como o ocorrido recentemente na Bahia envolvendo uma juíza e um promotor.
A história movimentou a cidade de Juazeiro, localizada a 566 quilômetros de Salvador. Duas das principais autoridades do município, a juíza Olga Regina Guimarães, e o promotor Luciano Assis, envolveram-se na briga. Após desentendimento sobre o trabalho, o marido de Olga, identificado como Balduíno, teria chicoteado o promotor. Em seguida, um grupo de cerca de 50 policiais teria invadido a casa da magistrada e disparado tiros para o alto, segundo o advogado da juíza, Arx Tourinho.
Outro caso que chamou a atenção de Costa Leite ocorreu em Fortaleza, no Ceará. O promotor Teodoro dos Santos e o advogado J. Monteiro se socaram após uma audiência com dois suspeitos do assassinato de um grupo de portugueses, realizada no Fórum Clóvis Bevilaqua. J. Monteiro deixou o local numa cadeira de rodas.
Ensino - O presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Rubens Approbato Machado, acredita que a baixa qualidade do ensino jurídico no País contribui para o despreparo dos operadores do direito. Para demonstrar isso, ele disse que as reprovações nos exames da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) atingem 70%.
Approbato contou que também há casos de desentendimentos entre advogados e delegados. Um desses episódios ocorreu recentemente em São Paulo e envolveu o experiente advogado crimin alista José Roberto Leal de Carvalho, que ficou conhecido após atuar no caso do jornalista Wladimir Herzog, morto em 1975 nas dependências do Exército.
Segundo a OAB, na madrugada de 22 de julho, a delegada Henriqueta Caruso, do 4.º Distrito Policial, manteve Carvalho algemado por quatro horas. De acordo com a entidade, o advogado foi ao distrito policial acompanhar uma ocorrência envolvendo seu genro, que é dono de um bar cujo barulho estaria incomodando a vizinhança.
A recusa de Carvalho em apresentar sua carteira da OAB teria provocado a reação da delegada, segundo a OAB. A Ordem encaminhou uma representação ao Ministério Público e à Polícia Civil por crime de abuso de autoridade.
Presidente da última banca examinadora do concurso de juízes de São Paulo, o desembargador aposentado Djalma Lofrano lembrou que no Brasil existem centenas de faculdades de direito que, todos os anos, lançam no mercado um contingente enorme de jovens profissionais.
Ele contou que no último concurso realizado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, dos 4.434 candidatos apenas 70 foram aprovados. "De 50% a 60% eram absolutamente incapazes", observou o juiz aposentado, de 70 anos de idade.
"Alguns alunos vão levando o curso e colam grau com absoluto despreparo", comentou. Para ele, a solução seria instituir um rigor maior na concessão de licença para a instalação de faculdades de direito no País.
Corrida presidencial deve ficar isolada em 2002
Desta vez, palanques regionais podem não ter grande influência na campanha pelo Planalto
BRASÍLIA - A composição dos palanques regionais para eleição de governadores, deputados e senadores não deve, desta vez, condicionar as campanhas presidenciais. Esta é uma das interpretações produzidas pelo final do prazo de filiação partidária, na semana passada, para quem disputará as eleições de 2002. Se essa hipótese se materializar, a corrida presidencial tenderá a se tornar mais parecida com uma campanha isolada, apesar do caráter geral das eleições, cujo resultado dependerá fundamentalmente do desempenho individual dos candidatos e bem menos das máquinas partidárias e administrativas, como reza a tradição.
Com a convicção de que as coisas podem se passar desse modo, os políticos sumiram de Brasília nos últimos dias e mergulharam nos acertos para formação das chapas majoritárias e das listagens de candidatos a deputado. Ela orientou também movimentos regionais, como o do ex-líder do PPS, Paulo Hartung (ES), que se filiou ao PSB para montar uma aliança com oito partidos visando o governo do Espírito Santo. Ele diz que seu palanque será aberto para as campanhas de Ciro Gomes, do PPS, Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, e Anthony Garotinho, do PSB. Esta tem sido também a lógica do discurso do pré-candidto do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, que diz preferir subir num palanque com 45% de apoio popular que num palanque purista do PT com um candidato de 6%.
A mesma convicção deve ter orientado o único movimento de impacto nacional feito no dia 5, o do governador de Minas Gerais, Itamar Franco, que o promoveu sem sair de onde estava: no PMDB. O governador demonstra crer que se mantiver os índices acima dos 10% que alcança nas pesquisas sobre intenção de voto terá meios de vencer as eleições prévias do partido, em janeiro, e de se sair bem na corrida ao Planalto, mesmo que o PMDB se divida em relação a ele. É o mesmo argumento do senador Pedro Simon (RS), que pede ao PMDB que lhe dê somente os oito minutos que o partido terá no rádio e na TV na campanha. "Me dêem essa chance e ganho a eleição", afirma.
Os presidenciáveis terão de procurar nos Estados, por conseguinte, não um, mas o máximo de palanques em que possam subir. Se esse quadro de disputa se confirmar, as máquinas cotarem menos do que, por exemplo, na campanha da reeleição de 1998, os presidenciáveis não serão os puxadores de voto para os governadores e nem estes jogarão suas fichas num só nome.
Pulverização - Numa campanha assim pulverizada, sem um favoritíssimo, a tendência é o aumento no número de candidatos competitivos com chance de chegar ao segundo turno e ao Planalto. E o resultado estará diretamente associado à capacidade do ator-candidato na persuasão do público.
Não é esta, contudo, a suposição dos estrategistas da campanha do PSDB, que associam o êxito futuro às alianças nacionais que o partido for capaz de fazer. O que se imagina entre eles é que, escolhida a chapa governista, com apoio de dois ou mais partidos, e tendo ela as bênçãos de Fernando Henrique, seja quem for o candidato, ele terá garantidos no 20% dos votos no primeiro turno.
A opção de Lula por palanques múltiplos - suposição contrária à dos tucanos - não é, porém, um ponto pacífico no PT, embora a tendência seja levá-la adiante. Em primeiro lugar porque a direção de fato da campanha dele deverá ser do Instituto Cidadania, controlado pelas tendências que apóiam Lula e o presidente do PT, José Dirceu (SP). Essa estratégia contraria as correntes mais radicais, que controlam mais de 40% das instâncias decisórias do partido.
A opção múltipla deve prevalecer, porém, em segundo lugar, porque ela é o centro da estratégia que apresenta Lula como um líder de todos os brasileiros e não, como nas três eleições anteriores, na condição de militante de um partido conflagrado por disputas internas. Essas lutas continuarão a existir, e emergirão caso ele vença, mas aí será outra história.
Candidato comum une Roseana, Tasso e Jarbas
Governadores articulam movimento por nome de consenso na disputa pela sucessão de FHC
BRASÍLIA - Os governadores de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos (PMDB), do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), e do Ceará, Tasso Jereissati (PSDB), estão articulando um movimento em favor de uma candidatura única da base aliada na corrida presidencial do ano que vem. É este o principal objetivo do encontro que os três programam para terça ou quarta-feira.
"Temos trocado telefonemas e feito teleconferências sobre este assunto, porque estamos juntos na tese de ter um caminho comum em 2002, se possível com a participação do PPB e do PTB", revela Roseana.
Convidado a disputar as prévias eleitorais do PMDB com o governador de Minas Gerais, Itamar Franco, Jarbas recusa o lançamento de seu nome na corrida sucessória e faz uma proposta alternativa: abrir as prévias peemedebistas de 20 de janeiro ao PFL de Roseana e ao PSDB de Tasso. Os três querem aproveitar o encontro para criar um fato político que sensibilize as direções de seus partidos a trabalhar pela preservação da parceria na sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso.
"Eu não posso me colocar nas prévias do PMDB agora porque sempre disse que qualquer candidato que sair das forças governistas não terá nenhuma chance na disputa presidencial se não tiver o apoio dos outros partidos da aliança", explica Jarbas.
Mais do que aproximar aliados, a idéia das prévias interpartidárias é a saída que setores do governo e do PMDB vêem para se livrar da candidatura de Itamar. Interlocutores de Fernando Henrique estão convencidos de que dirigentes do PMDB foram lenientes no que se refere à permanência do governador de Minas no partido. "Fizeram vista grossa com o Itamar, ele pagou prá ver e agora é um risco que tem de ser enfrentado", diz o interlocutor presidencial, referindo-se ao "risco real" de o mineiro vencer as prévias do PMDB. Na avaliação deste político, a única saída para escantear o governador de Minas é ampliar as prévias para os demais partidos da base, como sugere Jarbas.
Democracia - "As prévias são um instrumento democrático difícil de recusar", concorda Jarbas. Mas o assunto provoca arrepios no grupo de tucanos que defendem a candidatura presidencial do ministro da Saúde, José Serra (PSDB), e não admitem apoiar um candidato fora do PSDB.
Apesar das resistências, até os chamados serristas, entre os quais o presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), trabalham hoje em favor de promover consultas regionais, envolvendo dirigentes e líderes locais do partido.
A estratégia neste caso é usar as consultas para tentar preservar o espaço do PSDB na mídia e na sociedade. A cúpula do PSDB não esconde a preocupação com o crescimento da candidatura de Roseana, que ameaça consolidar seu nome no cenário político nacional antes mesmo de um tucano decolar na corrida presidencial.
O presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), aposta que a candidatura Roseana ganhou um embalo irreversível, em um fenômeno eleitoral semelhante ao que ocorreu com Fernando Collor em 1989. "Ela é uma opção em ascensão porque representa o novo na política", diz Bornhausen. Mesmo diante do otimismo da cúpula pefelista, Roseana mantém a defesa da aliança, convencida de que seu adversário não é nenhum deles, mas o PT. Ela avalia que só com o apoio dos partidos aliados será possível chegar ao segundo turno e vencer o petista Luiz Inácio Lula da Silva.
PMDB ignora protesto tucano e aposta na indicação de Suassuna
Legenda dá como certa vitória na briga pelo Ministério da Integração Nacional
BRASÍLIA - O PMDB aposta que começará a semana derrotando o PSDB na briga em torno da indicação do senador Ney Suassuna (PMDB-PB) para assumir o Ministério da Integração Nacional. "O presidente (Fernando Henrique Cardoso) já avisou ao Ney que quer vê-lo nesta segunda-feira", conta um dirigente nacional do partido, certo de que o convite oficial será formalizado hoje.
Mas os tucanos ainda mantém a esperança de evitar a nomeação porque o horário da audiência não foi marcado.
O sinal de que a cúpula peemedebista fincaria pé na indicação do senador paraibano foi dado na conversa de líderes do partido com o presidente na semana passada. Para driblar as resistências do PSDB, que não se conforma de ver Suassuna fortalecido na disputa pelo governo da Paraíba contra o prefeito tucano de Campina Grande, Cássio Cunha Lima (PMDB), o presidente chegou a oferecer o cargo de ministro ao líder do partido no Senado, Renan Calheiros (AL). Este, porém, recusou.
"A indicação da bancada é o Suassuna e não tem outro nome porque nenhum outro senador quer assumir o ministério neste momento", argumenta o dirigente nacional do PMDB que acompanha atento as negociações com o Palácio do Planalto. Ele também aposta que a escolha recairá mesmo sobre Suassuna porque, segundo atesta, o presidente assumiu o compromisso com Renan de que o substituto do novo presidente do Senado, Ramez Tebet (MS), no ministério seria um senador.
Alianças - Nas conversas com Fernando Henrique, a cúpula do PMDB também têm lembrado que Cunha Lima é um ex-peemedebista que compôs sua chapa com o PT na eleição para a prefeitura de Campina Grande.
Argumentam que os aliados dele no Estado fazem oposição ao governo federal e ponderam: "Se o governo não se aliar conosco na Paraíba, ficará sozinho lá porque só tem a nós."
Os dirigentes tucanos insistem na idéia de que o Planalto não pode entrar na disputa eleitoral para prejudicar o PSDB que filiou o prefeito paraibano há menos de 15 dias. Mas os peemedebistas contra-atacam, defendendo a tese de que premiar dissidentes que trocam de legenda, como o fez o prefeito Cássio e seu pai, o senador Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB), estimularia a traição.
"Esta não é a ética praticada pelo presidente", insiste o cardeal do PMDB
Suíça rastreia documentos bancários de Maluf
Ofício do Cantão de Genebra a procuradores confirma ordem para apreender papéis no país
Papéis bancários relativos ao ex-prefeito Paulo Maluf (PPB) foram retidos por autoridades da Suíça. A informação consta de ofício enviado em 21 de setembro pelo procurador-geral do Cantão de Genebra, Jean-Louis Crochet, ao Ministério Público Federal em São Paulo. "Nossa autoridade, sobre a base de certas informações, decidiu proceder uma investigação preliminar e ordenou a apreensão conservatória de diversos documentos bancários", informa um trecho da carta de 26 linhas, redigida em papel timbrado da procuradoria-geral.
Trata-se do primeiro comunicado oficial da Suíça às autoridades brasileiras sobre a retenção de documentos que podem apontar movimentações financeiras do pepebista. Crochet é o mesmo procurador que investigou e decretou o bloqueio de valores do juiz Nicolau dos Santos Neto em Genebra. Para os procuradores da República que investigam a existência de ativos em nome de Maluf e de familiares dele no exterior, a carta de Crochet confirma que o ex-prefeito manteve depósitos na Suíça.
Crochet recomenda aos procuradores brasileiros que providenciem o envio "às autoridades de Genebra de uma carta rogatória internacional a fim de recolher a documentação bancária relativa às relações bancárias entretidas por Paulo Maluf e os membros de sua família, em seu nome, sobre designação numérica ou convencional, ou por meio de sociedades das quais eles seriam os detentores dos direitos econômicos".
A rogatória foi despachada há uma semana pelo Itamaraty, com pedido de formal cooperação judicial para fins de bloqueio de bens e quebra do sigilo de Maluf e de seus familiares. O pedido é assinado pelo juiz federal de São Paulo Fernando Moreira Gonçalves, que decretou devassa bancária de Maluf em todo o território nacional. O desbloqueio de dados atinge, também, a mulher, quatro filhos e uma nora do pepebista.
O ofício produzido por Crochet revela o número do procedimento referente ao ex-prefeito na Suíça: P 110877/01. O procurador suíço faz uma solicitação:
"Antes de decidir se é o caso de confiar esse procedimento a um juiz de instrução, nós vos pedimos que nos transmitam as informações essenciais referentes aos procedimentos conduzidos no Brasil contra Paulo Maluf."
Infrações - Crochet quer ter acesso a dados correspondentes às "infrações que podem ser imputadas contra aquele senhor (Maluf), o período penal cobrindo esses procedimentos, os fatos que pesam contra ele (processos em andamento) e a identidade das outras pessoas ou sociedade que seriam igualmente denunciadas". Os procuradores brasileiros já encaminharam à autoridade suíça relato sobre ações penais e civis abertas contra o ex-prefeito, acusado judicialmente de falsidade ideológica, crime de responsabilidade, enriquecimento ilícito e improbidade administrativa.
Segundo Crochet, "baseado nessas informações será determinada a necessidade ou a oportunidade de requerer uma instrução", procedimento similar a um inquérito. A carta do procurador suíço foi preparada em resposta a um fax enviado no dia 3 de setembro pelos procuradores da República, que suspeitam do envolvimento de Maluf em operações de evasão de divisas e lavagem de dinheiro desviado de transações com títulos públicos para pagamento de precatórios.
A suspeita ganhou força a partir de relatório encaminhado em agosto pelo Bundesamt Für Polizeiwsen - polícia financeira suíça - ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão ligado ao Ministério da Fazenda.
Segundo o relatório, Maluf abriu conta no Citibank de Genebra em julho de 1985 - em nome da empresa Blue Diamond Limited, mais tarde renomeada para Red Ruby. Doze anos depois, em janeiro de 1997, Maluf fechou "todas as contas" na Suíça e transferiu os ativos para o Citibank da Ilha de Jersey - paraíso fiscal no Canal da Mancha, no Reino Unido -, segundo as autoridades de Genebra.
Depoimentos - O ex-prefeito afirma não possuir ativos no exterior. Ele diz que nunca teve depósitos em Jersey "ou em qualquer outro paraíso fiscal do planeta". Os advogado s de Maluf sustentam que não há "um único documento" que comprove a existência de fundos financeiros em nome do pepebista no exterior. Para a defesa, a carta de Chochet ao Ministério Público Federal "não pode servir de prova de nada". Os advogados argumentam que o ofício do procurador-geral de Genebra não contém referências a movimentações financeiras ou número de contas.
Hoje, dois filhos (Otávio e Lina) e a nora de Maluf, Jacquelline, deverão prestar depoimento no inquérito civil do Ministério Público de São Paulo que investiga suposta conexão entre desvio de recursos de obras públicas e remessas de valores para a Suíça e Jersey.
Senado deve sabatinar Matarazzo até quarta-feira
BRASÍLIA - Indicado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso para assumir a embaixada brasileira na Itália, o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação, Andrea Matarazzo, deve ser sabatinado pelo Senado amanhã ou quarta-feira. Pronto para ser ouvido na semana passada, ele foi surpreendido com um pedido de vistas à mensagem presidencial que propôs seu nome, apresentado pelo senador Bernardo Cabral (PFL-AM). O presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), adverte, porém, que as razões de Cabral foram jurídicas, para verificar uma questão de dupla cidadania, e não políticas ou administrativas. "Acho que sua aprovação será tranqüila", prevê.
Artigos
A crise em corpo inteiro
MÁRIO CÉSAR FLORES
Tal como muitas outras crises da nossa turbulenta vida socioeconômica e política, que nascem, crescem, entram em ebulição sensacionalizada pela mídia e fenecem por saturação, também a da energia, com suas manifestações corretas ou viciadas pela paixão político-ideológica, por interesses corporativos e econômicos e pela ignorância, entrou em relativo recesso - na mídia, pois ela continua viva, só que deixou de interessar como espetáculo.
É chegada a hora de revê-la.
Cabe ao governo (atual e anteriores) parte ponderável da culpa estrutural; para a conjuntural concorreu a falta de chuva. E lhe cabe não em razão da política de desestatização, e sim da falta de orientação e estímulo para o investimento privado, uma e outro prejudicados pela força residual da cultura intervencionista, freqüentemente manifestada nas odisséias judiciais dos processos de desestatização, que freia os processos e inibe o investimento sem que o Estado possa investir o necessário, a menos que se retraia em áreas em que ele é essencial.
Nesse cenário confuso, o governo é acusado pelos adeptos do estatismo porque não investiu, meia-verdade distorcida que ignora a viabilidade fiscal; e pelos desestatizantes porque tem cedido às restrições ao investimento privado. Critica-se a opção pelas grandes usinas, omitindo-se que as pequenas eram rejeitadas porque o custo do seu kWh é maior e porque interessavam menos às grandes empreiteiras... As térmicas são louvadas agora, mas eram execradas por causa do preço do combustível e por razões ambientais.
Vale perguntar aos que reagem à desestatização por ideologia, ou por interesse corporativo, ou político-eleitoral: para investir em energia o governo corta onde, já que a aritmética fiscal não admite mágica, é imune aos devaneios da ideologia e do interesse e não tem como resolver o problema do "muito Estado" sem a tributação correspondente? Na educação (nas universidades), saúde (hospitais públicos, SUS), segurança, reforma agrária, nos programas assistenciais, nos salários públicos (haja greve...), na previdência pública? O "politicamente correto" sugerirá cortar nos encargos da dívida (que contribuiu ponderavelmente para a disponibilidade de energia hoje existente), mas essa hipótese, sem a concordância negociada com os credores, produzirá um "apagão econômico" abrangente - além da reação justamente indignada dos próprios brasileiros que têm economias aplicadas nos fundos credores.
Uma observação sobre o festival de manifestações sempre espetaculizadas: se entrevistas patéticas, se inquéritos do Ministério Público, se sentenças judiciais e se concepções ideais do direito (é o caso da irrealista proteção do consumo à revelia da oferta) gerassem energia, não haveria crise.
Bastaria formular o direito ao consumo (já idilicamente formulado no Código de Defesa do Consumidor), instaurar inquéritos, impetrar ações, deferir liminares e televisar rompantes de indignação, comumente "envenenadas" pela paixão político-ideológica ou por interesse, que os kWh apareceriam abundantes, sem inflação e sem chuva. Evidentemente, nada disso resolve, mas acua o governo - o que convém a quem vê a crise como instrumento político.
A crise da energia é parte das dificuldades da interação de uma verdade resistida por ideologia ou por interesse político ou corporativo, com uma dúvida que permeia a vida nacional. A verdade: não é mais possível manter em evidência o velho Estado intervencionista-empresário, atropelado por demandas de toda ordem, agravadas pela ambigüidade, pela utopia e pela permissividade da Constituição na economia, na seguridade e no tocante ao corporativismo público, que faz do povo refém de suas pretensões sob suposto amparo constitucional. A dúvida conexa: o quanto é razoável o Estado investir na economia e na infra-estrutura em detrimento de seus encargos sociais; o quanto ambas merecem precedência por serem pré-requisito do social; o quanto é razoável o Estado (o povo pagante) sustentar, por exemplo, a insana estrutura da previdência pública ou a universidade gratuita para quem pode pagá-la?
A compatibilização entre a verdade e a dúvida, com seriedade e sem a demagogia fácil dos que aventam soluções ideais, mas irrealistas porque não lhes cabe a responsabilidade por implantá-las, é o desafio do poder político (Executivo e Congresso) que será eleito em 2002: onde e como o Estado deve aplicar recursos públicos e induzir a aplicação do capital privado?
Luzes e sombras
CARLOS ALBERTO DI FRANCO
Jovens de classe média e média alta têm freqüentado o noticiário policial. Crimes, vandalismo, consumo e tráfico de drogas deixaram de ser uma marca registrada das favelas e da periferia das grandes cidades. O novo rosto da delinqüência, perverso e surpreendente, transita nos bares badalados, estuda nos colégios da moda e vive em elegantes condomínios fechados.
O comportamento das gangues bem-nascidas, flagrado em inúmeras matérias, angustia o presente e ensombrece o futuro. O fenômeno, aparentemente incompreensível, é o reflexo lógico de uma montanha de equívocos. O novo mapa do crime não é fruto do acaso. É o resultado acabado da crise da família, da educação permissiva e do bombardeio de certa mídia que se empenha em apagar qualquer vestígio de valores objetivos.
Os pais da geração transgressora têm grande parcela de culpa. Choram os delitos que prosperaram no terreno fertilizado pelo egoísmo e pela omissão.
Compensam a ausência com valores materiais. O delito não é apenas reflexo da falência da autoridade familiar. É, freqüentemente, um grito de carência. Os adolescentes, disse alguém, necessitam de pais morais, e não de pais materiais.
Algumas teorias no campo da educação (ou da deseducação), cultivadas em escolas que renunciaram à missão de educar, estão apresentando sua fatura.
Uma multidão de desajustados, crescida à sombra do dogma da educação não-traumatizante, está mostrando o seu rosto anti-social. A despersonalização da culpa e o anonimato da responsabilidade, características da psicologia acovardada, estão gerando delinqüentes de luxo.
Ao dissecar alguns tumores que agridem a sociedade norte-americana, o sociólogo Christopher Lasch sublinha as dramáticas conseqüências que estão ocultas sob a aparênci a da tolerância: "Gastamos a maior parte da nossa energia no combate à vergonha e à culpa, pretendendo que as pessoas se sentissem bem consigo mesmas." O saldo, no entanto, é uma geração desnorteada, desfibrada, incapacitada para assumir seu papel na comunidade.
A forja do caráter, compatível com um clima de autêntica liberdade, começa a ganhar contornos de solução válida. É a sístole e a diástole da História. A pena é que tenhamos de pagar um preço tão alto para reencontrar o óbvio.
Alguns setores da mídia estão na outra ponta do problema. O culto à violência e a apresentação de aberrações num clima de normalidade são um convite à transgressão. Algumas páginas de comportamento, carregadas de frivolidade, transmitem uma falsa visão da felicidade. Os conceitos de fidelidade, sacrifício e trabalho, pré-requisitos de uma vida digna, foram sendo substituídos pelos eufemismos do egoísmo: independência, realização, sucesso a qualquer preço. O inchaço do ego e o emagrecimento da solidariedade estão na raiz de inúmeras patologias comportamentais.
O fecho destas considerações não é pessimista. Os problemas existem, mas não esgotam toda a realidade. Na verdade, outra juventude emerge dos escombros.
Toda uma geração, perfilada em dados de várias pesquisas, está percorrendo um itinerário promissor. Notável é o entusiasmo dos adolescentes com inúmeras iniciativas no campo do voluntariado. O engajamento dos jovens na batalha da qualificação profissional é indiscutível. Há, de fato, um Brasil real que está muito distante da imagem apregoada pelos negativistas de sempre. Precisamos, não obstante a gravidade dos problemas, recuperar a auto-estima. A imprensa que denuncia cumpre um papel ético. Mas, ao mesmo tempo, não deve confundir independência com incapacidade de dar boas notícias. Nossa função não é antinada, mas a favor da informação verdadeira.
Por isso, o texto que denuncia a cruel desenvoltura do banditismo bem-nascido é o mesmo que registra o outro lado: o da esperança iluminada.
Colunistas
RACHEL DE QUEIROZ
As vozes do calabouço
Não o digo por pabulagem, mas modéstia à parte, o Ceará está sempre na frente, quando se trata de direitos e liberdades do cidadão.
E isso vem de longe. Quando, por exemplo, em 1824, o imperador resolveu arbitrariamente dissolver a Assembléia Nacional Constituinte, a Câmara da Vila de Campo Maior de Quixeramobim (situada a 200 quilômetros de Fortaleza) resolveu pronunciar-se: "Considerando a horrorosa perfídia de Pedro I, resolve declarar excluído do trono o Imperador e decaída a dinastia bragantina..."
Assinou a ata Antonio Francisco Barreira de Queiroz (meu antepassado, aliás). Durante a campanha de abolição da escravatura, foi o Ceará o primeiro a declarar extinto o cativeiro dos negros. A Vila do Acarape mudou de nome e passou a se chamar "Redenção"; o movimento expandiu-se até as praias de Fortaleza: é que, de lá, os senhores de negros, temerosos de os perder, pretendiam embarcá-los, para os vender em Pernambuco.
E o chefe dos catraieiros cearenses (por nome Nascimento, que mais tarde passou a ser chamado "Dragão do Mar") decretou a proibição do embarque dos negros, com a seguinte frase, que ficou famosa: "Nesta terra não se embarca mais escravo!"
Nos levantes nordestinos de 1817 a 1824, já entre "correios" e participantes que faziam a ligação entre os "alevantados" do Recife e os do Crato, estava então o seminarista José Martiniano de Alencar, pai do romancista.
No Ceará, o movimento teve o seu trágico desfecho no combate de Santa Rosa:
os imperiais, vencedores, fuzilaram o presidente revolucionário da Província, Tristão Gonçalves de Alencar Araripe: o cadáver foi insepulto e, mais tarde, encontrado de pé, encostado a uma árvore, mumificado pelo sol.
Relembro estas coisas todas porque poucos dias atrás tive ocasião de ver o calabouço onde esteve presa a heroína dona Bárbara de Alencar, mãe de Tristão Gonçalves (dos quais tenho a honra de ser descendente).
O local é uma relíquia histórica muito bem conservada, onde se evocam principalmente as figuras de dona Bárbara e Tristão.
Fica a prisão dos heróis dentro da própria fortaleza - Fortaleza Nossa Senhora da Assunção -, que deu o nome à capital do Ceará. O calabouço é sinistro como um instrumento de tortura -, o qual, aliás, era mesmo. Em certos trechos é tão baixo que só se pode andar ajoelhado. E dá na gente uma revolta retrospectiva ao pensar naquela heróica antepassada (uma frágil mulher, aliás) ser obrigada a atravessar, posta a ferros, de joelhos o buraco sinistro que lhe servia de prisão.
Tive a honra de lá ser recebida pelo comando e toda a corporação da fortaleza que proporcionou à descendente da mártir gloriosa uma espécie de homenagem póstuma de reparação à memória da heroína. As gotas do sangue heróico que ainda me correm nas veias como que reconheceram a memória de dona Bárbara e parecíamos ouvir na masmorra sufocante os seus ais abafados, pelo orgulho de revolucionária e pelo amor à Pátria esmagada pelos coloniais.
Contudo, a visita não nos deixa uma impressão de tristeza. A oficialidade que cuida da velha fortaleza prima em manter o local tal como deveria ser antes, duro e sóbrio. É chocante o contraste entre as masmorras lúgubres do interior da prisão e a bela edificação da fortaleza, banhada de luz, dando para o verde mar que quase lhe lambe os alicerces, oceano aberto, cuja visão parece levar ao infinito.
A oficialidade da fortaleza talvez nem soubesse direito a importância que tinha para esta velha senhora, que eles recebiam com tanto carinho, o momento de emoção e orgulho suscitados pela evocação dessa saga de sofrimento e heroísmo.
Editorial
O Cade e o setor financeiro
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) está prestes a decidir se é ou não de sua competência julgar casos de concentração, como fusões e aquisições, que envolvam instituições financeiras. A questão surgiu durante o julgamento da aquisição de 26% do capital social da Brasmetal Industrial S.A., empresa holding do Grupo Finasa, pela Zurich Brasil Seguros S.A. e depois que o presidente Fernando Henrique Cardoso aprovou parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), estabelecendo que cabe apenas ao Banco Central apreciar os atos de concentração no setor financeiro. Os pareceres da AGU, aprovados pelo presidente da República, obrigam, por lei, a todos os órgãos da administração federal. Assim, um ato de concentração que, em circunstâncias normais, seria aprovado sem maiores alardes, se transformou numa acirrada disputa envolvendo a competência do Cade para apreciar as fusões e incorporações de instituições financeiras.
Três dos conselheiros do Cade votaram, contrariando o parecer da relatora, conselheira Hebe Romano, e afirmando a autonomia da autarquia diante da AGU, além de reconhecer a própria competência para julgar atos de concentração no setor financeiro. O julgamento será retomado esta semana e basta um único voto para que prevaleça a tese.
Os diretores do Banco Central e de instituições financeiras públicas e privadas estão naturalmente preocupados com o desfecho do caso. O Cade não dispõe de quadros técnicos para decidir, com rapidez, se fusões e incorporações de bancos prejudicam ou não a concorrência. A aquisição de parte do capital social da Brasmetal pela Zurich, por exemplo, está sob exame desde o ano passado. Trata-se de uma transação pequena, que praticamente não produzirá impacto no mercado financeiro. Mas há operações, envolvendo grandes conglomerados, que exigem resposta imediata das autoridades para sua realização, sob pena de se estabelecer o descrédito das instituições financei ras.
Pelo sistema atual, dois bancos interessados em fundir-se só avançam as negociações depois de obter o placet do Banco Central, que examina a operação do ponto de vista prudencial, da proteção da poupança popular, do aumento da eficiência do setor e dos riscos sistêmicos. Isso significa, na verdade, que o Banco Central, além de atuar e de ser o órgão regulador do sistema financeiro, avalia os efeitos da operação sobre o ambiente concorrencial - função que o Cade reivindica, sob o argumento de que a lei assegura que nenhum setor de atividade foge à sua alçada - e, finalmente, exerce fiscalização, impondo penalidades quando constata irregularidades ou abuso do poder econômico.
Quando consultado sobre incorporações e fusões, o Banco Central age rapidamente, atendendo às peculiaridades do setor financeiro. O Cade, no entanto, tem seu próprio tempo, é mais lento, demorando-se na avaliação das conseqüências, para o mercado, dos atos de concentração. Além disso, o Cade pode, por lei, determinar que operações já concluídas sejam desfeitas, no todo ou em parte. No caso de empresas industriais ou comerciais, uma decisão desse tipo não afeta necessariamente a saúde financeira das empresas atingidas. No setor financeiro, porém, a demora da decisão ou a anulação da operação poderia equivaler a um golpe mortal no maior capital de qualquer instituição financeira: seu crédito, a confiança a elas dada pelos correntistas. Como observam as autoridades monetárias, o simples boato de que o Cade não aprovaria a fusão de bancos poderia provocar uma corrida dos correntistas, a falência das instituições diretamente envolvidas e o abalo de todo o sistema financeiro. Esse é o tão temido risco sistêmico.
Por todas essas razões, alguns países com sistemas financeiros altamente desenvolvidos retiram as fusões e incorporações do setor financeiro da competência dos órgãos de defesa da concorrência. Nos Estados Unidos, por exemplo, a Federal Trade Comission não examina os atos de concentração do setor bancário. E, lá, os riscos sistêmicos são infinitamente menores que os do Brasil, como comprovam as falências de bancos locais e regionais, sem que o Fed tenha de intervir.
Nos últimos cinco anos, o sistema financeiro brasileiro se transformou radicalmente, tornando-se mais forte e sólido com uma série de fusões de bancos e sem que se registrassem danos à concorrência - ao contrário, com a abertura aos bancos estrangeiros, a disputa tornou-se mais acirrada, em benefício dos poupadores. Seria simplesmente desastroso para o País que, como resultado de uma disputa de poder entre o Cade e a AGU, tais operações - assim como as que vierem a ocorrer - precisem passar pelo crivo do órgão de defesa da concorrência, que tem o poder legal de desfazer qualquer ato de concentração que julgue prejudicial ao mercado.
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10/15/2001
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