TCE ameaça não punir e põe Lei Fiscal em xeque



 





TCE ameaça não punir e põe Lei Fiscal em xeque
Tendência é adotar interpretação menos rígida em todo País, permitindo até que governador gaste mais no fim do mandato e deixe conta para o sucessor

RECIFE – Tribunais de Contas Estaduais (TCEs), a quem cabe fiscalizar o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, estão defendendo a flexibilização das normas destinadas a controlar a expansão de gastos em ano de eleições. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), candidato à reeleição, por exemplo, não terá suas contas rejeitadas se, nos últimos meses de seu mandato, fizer determinadas despesas e deixar a conta para ser paga no próximo exercício. A garantia é do diretor do TCE do Estado de São Paulo, Sérgio Rossi.

O artigo 42 da Lei Fiscal manda os governantes deixarem em caixa os recursos para cobrir as despesas novas assumidas nos últimos oito meses do mandato e que não puderem ser pagas até 31 de dezembro, bem como o dinheiro para quitar as parcelas futuras, caso o empreendimento seja feito em etapas. A Lei dos Crimes Fiscais prevê de dois a quatro anos de reclusão aos administradores públicos que descumprirem o artigo.

Os TCEs também não pretendem punir os governadores que iniciarem obras contando com verbas da União e não liquidarem o débito antes de encerrar o mandato porque o dinheiro não chegou a tempo, segundo declarou o presidente da Associação dos Tribunais de Contas Estaduais, Carlos Pinna. Com as restrições previstas na Lei Eleitoral para a transferência de verbas da União neste ano, os Estados estão prevendo um atraso considerável na execução dos convênios para a realização de projetos em parceria com o governo federal.

Outra tendência é os TCEs adotarem uma conduta menos rígida sobre o dispositivo voltado a estancar os tradicionais aumentos de salários ao funcionalismo público às vésperas das eleições. “Ou partimos para esta visão mais ampla da lei ou estaremos decretando a morte do mandato dos governadores aos três anos e quatro meses de gestão”, ressaltou Rossi.

Na avaliação de Pinna, os tribunais merecem a confiança da sociedade para dosar a aplicação da lei. “Com critério, vamos diferenciar gastos eleitoreiros daqueles essenciais, principalmente nas áreas sociais.”

Chafariz – O novo entendimento em torno das restrições previstas na Lei Fiscal para períodos pré-eleitorais – principalmente do artigo 42, que trata dos chamados “restos a pagar” – foi manifestado em seminário realizado no Recife (PE), na última semana, para marcar os dois anos de implantação da lei complementar 101, sancionada em 4 de maio de 2000. O evento foi promovido pelo Instituto Brasileiro Pró-Cidadania. Pela primeira vez, eleições presidenciais e estaduais serão submetidas às restrições da Lei Fiscal, criadas para reforçar a Lei Eleitoral. O primeiro teste da lei foi em 2000, nas eleições municipais.

TEXTO/TEXTOSegundo o diretor do TCE paulista, “uma coisa é o governante fazer um chafariz sem dinheiro e outra comprar remédios para combater uma epidemia”. “É preciso diferenciar farra com o dinheiro público do uso do dinheiro para atender ao interesse público.”

Ele assegura que essa mesma posição foi adotada no julgamento das contas de 2000 dos prefeitos. “Pecado mortal é governadores e prefeitos deixarem de aplicar o mínimo determinado na Constituição em educação e saúde, ficar dentro dos limites dos gastos de pessoal e do endividamento”, disse Rossi.

Para o consultor de Orçamento e Fiscalização do Congresso, Weder de Oliveira, especialista em Lei Fiscal, os TCEs não estão relaxando sua posição para “aliviar” os governadores às vésperas das eleições. “O bom senso está prevalecendo.”

O atual administrador não será responsabilizado pelos “restos a pagar” herdados de seus antecessores, basicamente débitos junto a fornecedores que não foram refinanciados pelo Tesouro Nacional. O conselheiro substituto do TCE de Pernambuco, Carlos Figueiredo, também não vê razões para rejeitar as contas do governador se o único problema for um contrato firmado entre maio e dezembro deste ano, sem cobertura financeira. “Isso, no entanto, não significará que o artigo 42 será considerado cumprido.”

Segundo Figueiredo, neste caso, caberá ao TCE analisar o fato e ao Ministério Público, decidir pela abertura de processo penal. A Lei dos Crimes Fiscais prevê de dois a quatro anos de reclusão para essa infração.

TEXTO/TEXTOPelo entendimento do TCE paulista, se houver aumento das receitas para cobrir a ampliação da folha de salários, os reajustes também serão tolerados em final de mandato. “De novo, a lei quer permitir apenas ampliação das despesas que podem ser arcadas nesta e na próxima gestão”, ressaltou Rossi.

Recentemente, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu que a Lei Eleitoral também não veda reajustes salariais até três meses antes das eleições, desde que os benefícios não sejam lineares para todo o funcionalismo. Essa posição permitiu reajuste para mais de 13 carreiras de servidores federais.

Bom senso – O secretário da Fazenda de São Paulo, Fernando Dall’Acqua, considera que o TCE paulista “tem interpretado a Lei Fiscal com bom senso”. Ele ressalta que desde 2001 o Estado mantém um saldo de caixa superior ao valor dos restos a pagar (despesas faturadas e não pagas), o que o mantém dentro dos limites da lei.

Dall’Acqua destaca que grandes convênios com financiamento externo ou da União não devem ser restringidos pela lei, pois as datas de suas assinaturas não dependem do Estado.

Se fossem, seria impossível, por exemplo, assinar contratos de novas linhas do Metrô.


Jarbas 'divide' responsabilidade com assessores
RECIFE - O governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos (PMDB), não quer correr o risco de sofrer as penalidades previstas na Lei dos Crimes Fiscais para o descumprimento do artigo 42, que limita os gastos em final de mandato. A pena é de dois a quatro anos de reclusão, uma das mais severas da nova legislação.

Em decreto editado recentemente, Jarbas divide com seus auxiliares a responsabilidade pela observação das normas que, pela primeira vez, são aplicadas nos governos estaduais e federal - as prefeituras passaram pelo teste em 2000. Neste caso, a Lei Fiscal pune apenas o governador e o secretário de Fazenda pelas infrações.

De acordo com a diretora do Tesouro de Pernambuco, Maria José Briano, o decreto do governador atribui diretamente aos secretários e diretores de órgãos a decisão de assumir despesas que não estejam programadas no Orçamento e dentro dos tetos fixados para este ano.

"Se, por ventura, o artigo 42 for desrespeitado, teremos um instrumento para provar que o governador e o secretário de Fazenda tomaram as medidas preventivas", explicou a diretora.

Seca - Maria José acrescentou que, no início do ano, foi adotada a primeira providência visando a cumprir o dispositivo. O governo cortou várias despesas aprovadas no Orçamento estadual e um novo contingenciamento das verbas não está descartado.

"Será difícil justificar à população a razão de suspendermos a distribuição de água na região da seca por causa do artigo 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal, mas não podemos fugir desta realidade", argumentou Maria José.

A diretora do Tesouro Estadual se queixou do excesso de vinculações existentes hoje nas despesas públicas.

Dos R$ 200 milhões arrecadados mensalmente pelo Estado com o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), 64% estão comprometidos pela legislação - 25% para os municípios, 25% para educação, 10% para saúde, 14% para o pagamento de dívidas, entre outros compromissos. (L.L.)


Após 2 anos, regras ainda são motivo de críticas
Apesar das finanças de Estados e municípios melhorarem, nenhuma multa foi aplicada

RECIFE - Os resultados obtidos nos dois primeiros anos da Lei de Responsabilidade Fiscal ainda são motivo divergências. Os favoráveis à legislação, sancionada em 4 de maio de 2000, exibem números para sustentar a tese de que as finanças dos Estados e dos municípios de todo País melhoraram depois dos limites com gastos de pessoal e endividamento, sanções pelo descumprimento das normas e transparência na prestação de contas.

Para um dos criadores da Lei de Responsabilidade Fiscal, o superintendente da Área Fiscal e Emprego do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), José Roberto Affonso, o fato de nenhum prefeito ter sido preso até agora por ter infringido as regras significa que o objetivo de prevenir o mau uso dos recursos público foi atingido. Já o presidente da Associação dos Tribunais de Contas Estaduais (TCE), Carlos Pinna, defende uma reforma na legislação para tornar mais eficiente a cobrança das sanções administrativas, ou multas, aplicadas até agora.

"Até agora, nenhum tostão foi cobrado porque, pelas regras atuais, a tarefa de cobrar as multas cabe aos procuradores das fazendas dos próprios Estados e municípios penalizados", enfatizou.

Ele admitiu, no entanto, que o problema se estende a todas as multas aplicadas pelos Tribunais de Contas.

Apesar de reconhecerem alguns pontos positivos, os críticos da lei acham que o foco está concentrado nos governos estaduais e municipais, aliviando a União de vários controles, especialmente do endividamento. Recentemente, o Senado votou duas resoluções fixando os tetos para o montante das dívidas dos Estados e municípios, excluindo o governo federal.

"O Banco Central (BC) deu parecer contrário sobre a medida, por achar que isso pode interferir no manejo das políticas monetária e cambial", disse o deputado Sérgio Miranda (PC do B-MG), um dos debatedores do seminário.

O secretário-geral da Transparência Brasil, Cláudio Weber Abramo, acha que a Lei Fiscal ajuda pouco no combate à corrupção. As contas de um político podem estar enquadradas nos requisitos do que é considerado bom para as finanças públicas, mas isso não quer dizer lisura com o uso do dinheiro da população. "A corrupção se dá na execução orçamentária, mesmo que a contabilidade esteja correta", afirmou Abramo.

Resultados - Segundo Affonso, a lei já produziu vários resultados positivos. No fim de 2001, só em três Estados o Executivo gastava mais do que os 49% da receita corrente líquida permitidos na Lei Fiscal - Rio Grande do Sul, Alagoas e Minas. Até o fim deste ano, esses Estados devem zerar o excesso. Do contrário, a União poderá reter verbas das transferências voluntárias.

Os dados também são animadores sobre o endividamento, ressaltou o chefe da assessoria econômica do Ministério do Planejamento, Joaquim Levy, ao abrir o seminário Gestão Pública, Responsabilidade Fiscal e Controle Social, realizado no Recife (PE) pelo Instituto Pró-Cidadania para marcar o segundo aniversário da Lei Fiscal.

Em dezembro de 2000, primeiro ano de vigor da nova legislação - últimos dados disponíveis -, apenas seis Estados estavam acima do limite fixado pelo Senado no ano passado.

O estoque da dívida não poderá ultrapassar em duas vezes a receita líquida dos Estados. Os que estão muito endividados - como Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Goiás e Alagoas - terão 15 anos para se ajustar ao limite. (L.L.)


Serra nega acusação, mas não acalma aliados
Ele rebate denúncia de que, em 1994, teria recebido e não declarado doação de R$ 2 milhões

BRASÍLIA – O candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, reagiu com indignação à reportagem da revista Veja que acusa o economista Ricardo Sérgio de Oliveira, arrecadador de recursos para sua campanha ao Senado, de pedir propina no processo de privatização da Vale do Rio Doce – e ainda menciona uma contribuição de R$ 2 milhões do empresário Carlos Jereissati não declarada à Justiça Eleitoral. “Estou estarrecido com o tamanho da mentira e da leviandade publicadas nesta matéria, manipulando seus leitores”, disse o tucano, ao desmentir a suposta doação de Jereissati em 1994.

Preocupado com os efeitos da reportagem sobre a campanha à Presidência da República, Serra insistiu ontem que “essa história toda é uma maluquice completa, uma plantação eleitoral muito grande”. Mas, apesar do desmentido e de toda a indignação demonstrada, o candidato não conseguiu tranqüilizar seus aliados nem calar os adversários. Enquanto o comando nacional do PFL recomenda o silêncio diante “da gravidade das denúncias” e ri discretamente dos apuros dos tucanos, o PMDB debocha nos bastidores do candidato que exigia um vice inatacável, que não tivesse de dar explicações. Ao mesmo tempo, o PT aproveita para cobrar esclarecimentos.

“Tapetão” – “Serra precisa parar de pregar investigação quando a denúncia é contra os outros e dizer que é tudo maluquice e bobagem quando a acusação é contra o governo ou o PSDB”, protestou o presidente nacional do PT, José Dirceu, que quer ouvir as explicações do candidato tucano no Congresso. Não que o PT esteja prejulgando ou acusando o adversário de Luiz Inácio Lula da Silva, diz Dirceu. “Queremos derrotar o Serra nas urnas, e não no tapetão”, resumiu o deputado Walter Pinheiro (PT-BA).

Mas que fique claro que a oposição não tem a menor intenção de dar sossego ao governo, ao PSDB e ao candidato tucano. E o Palácio do Planalto sabe disso. Tanto que um importante colaborador do presidente Fernando Henrique Cardoso reconhece que a reportagem coloca governo, partido e candidato sob suspeição e prevê turbulências no Congresso e na campanha presidencial.

As previsões gerais são de tempos difíceis, sobretudo porque o mesmo PFL que se recusa a fazer o papel de incendiário avisa logo que não criará dificuldades à investigação. Os próprios pefelistas já falam em convocar o ministro da Educação, Paulo Renato Souza, a explicar detalhes de como ficou sabendo que Ricardo Sérgio teria tentado conseguir R$ 15 milhões do empresário Benjamin Steinbruch, que liderou o grupo de empresas e fundos de pensão vencedor do leilão da maior mineradora do País.

A reportagem da revista abriu ainda uma crise interna no PSDB. O presidente do partido, José Aníbal, criticou o ministro. “Paulo Renato foi leviano por ter deixado todos os tucanos em situação de constrangimento.” O ministro reagiu no mesmo tom: “Eu não fiz nada de errado. Escutei uma história e confirmei que escutei. Queriam que eu mentisse? Não reconheço autoridade no José Aníbal para fazer comentários a meu respeito.”

“Boataria” – O líder do governo na Câmara, Arnaldo Madeira (PSDB-SP), apressou-se em afirmar que estamos todos diante de um “fato que não houve”, já que o próprio empresário diz na reportagem que não pagou a propina. “Nunca um governo investigou tanto e combateu tanto a corrupção, mas neste caso o presidente Fernando Henrique não podia agir em cima de rumores, de boataria”, defendeu também Aníbal, ao destacar que Serra tem a vida “marcada pela honestidade”.

O PMDB concorda com Aníbal e solidariza-se com Serra, mas defende a apuração das denúncias e nem por isto descarta os prejuízos eleitorais. Ao contrário, o deputado Wagner Rossi (PMDB-SP) diz que seu partido está preocupado com as denúncias porque elas “dificultam a consolidação” da candidatura de Serra: “Não é uma candidatura leve. Ele tem densidade, um grande preparo que também se manifesta como peso.”

Rossi salienta que a candidatura tucana ainda não deslanchou e as denúncias su rgem justamente na fase em que três candidatos disputam uma vaga no segundo turno. Apesar das dificuldades, ele aposta que Serra saberá se defender: “Ele é um homem sério e nunca se levantou suspeita em contrário.” Já o líder do PDT na Câmara, Miro Teixeira (RJ), estranha que sejam os próprios tucanos a confirmar a denúncia: “É fogo amigo contra Serra.”


Dividida, oposição quer CPI sobre venda da Vale
Adversários não sabem se investigação deve se restringir só a Ricardo Sérgio ou ir além

BRASÍLIA - Os líderes dos partidos de oposição chegam esta semana ao Congresso dispostos a cobrar uma investigação parlamentar sobre a suposta tentativa de cobrança de propina no processo de privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Eles querem instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), mas ainda divergem sobre o alvo das investigações.

Enquanto dirigentes do PT querem focar o trabalho na ação do ex-diretor do Banco do Brasil Ricardo Sérgio de Oliveira e dos fundos de pensão estatais, o líder do PDT na Câmara, Miro Teixeira (RJ), avalia que as denúncias são mais amplas e atingem o PSDB, partido do presidente Fernando Henrique Cardoso. Ele quer que o presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), convoque o Colégio de Líderes para avaliar qual o melhor instrumento de investigação e espera que o líder do PSDB na Câmara, Jutahy Junior (BA), encabece a lista de assinaturas de um pedido de CPI.

Miro disse ontem que o episódio lembra a briga familiar que resultou no impeachment do ex-presidente Fernando Collor. "A denúncia confirma a máxima segundo a qual dois tucanos não se bicam", disse o líder do PDT, observando que tucanos ilustres - o ministro da Educação, Paulo Renato, e o ex-ministro das Comunicações Luiz Carlos Mendonça de Barros - confirmaram ter ouvido do empresário Benjamin Steinbruch que Ricardo Sérgio pedia propina para ajudar a formação do consórcio que comprou a Vale.

O líder do PT na Câmara, João Paulo Cunha (SP), disse que só pretende propor a CPI se houver receptividade nos outros partidos, inclusive no PFL. "Só vou apresentar requerimento de CPI se sentir que há vontade de apurar", afirmou João Paulo, frisando que uma eventual investigação deveria se restringir à ação do ex-diretor do BB e dos fundos de pensão.

Maioria - O líder do PT considera que a CPI seria importante para esclarecer as denúncias, mas não acredita que ela prospere, porque o governo continua tendo maioria parlamentar. O presidente do PT, deputado José Dirceu (SP), acha que essa avaliação não deve inibir a oposição de cobrar uma CPI: "As denúncias são gravíssimas e o Congresso que assuma a sua responsabilidade de investigá-las."

Os deputados petistas avaliam que uma CPI poderá facilitar o trabalho de investigação que vem sendo realizado pelo Ministério Público. O procurador Luiz Francisco de Souza disse que a denúncia ajudará a obter mais informações sobre o crescimento do patrimônio de Ricardo Sérgio.

"O que se verifica é uma explosão gigantesca de patrimônio e isso não tem explicação", afirmou o procurador, que já investiga o ex-diretor do BB.


Senado começa a discutir prorrogação da CPMF
BRASÍLIA - O Senado começa a analisar nesta semana a proposta de emenda constitucional que prorroga até o fim de 2004 a vigência da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), senador Bernardo Cabral (PFL-AM), vai conversar amanhã com dirigentes de seu partido para escolher o relator da emenda - que poderá ser ele próprio ou o senador Romeu Tuma (PFL-SP).

No plenário do Senado, deverá ocorrer, na quarta-feira, o primeiro turno de votação da emenda que permite a participação do capital estrangeiro nas empresas de comunicação. A expectativa é de que a proposta seja aprovada.

Na Câmara, a prioridade será a votação da medida provisória que trata da renegociação das dívidas dos pequenos produtores rurais. Amanhã, representantes dos partidos de oposição, dos pequenos produtores e dos assentados vão se reunir com o ministro-chefe da Casa Civil, Pedro Parente, para discutir as alterações feitas na MP durante a votação do Senado. "Vamos ver até onde conseguimos avançar", disse ontem o deputado Walter Pinheiro (PT-BA).


Artigos

Lula e o Imposto de Renda
Alcides Amaral

Restam poucas dúvidas de que no próximo governo, seja ele qual for, o binômio "desenvolvimento" e "inclusão" fará parte das discussões e ações governamentais. Todos concordam que o Brasil precisa crescer e que o combate à pobreza e uma melhor distribuição de renda deverão caminhar para um país mais justo. A maneira de fazê-lo é que diferenciará o comportamento de cada um dos candidatos, após eleito. Quando o presidenciável Lula - aquele hoje com melhores perspectivas de assumir o poder - declara que sua reforma tributária passará pela revisão da Tabela do Imposto de Renda, pois "não é justo um trabalhador que ganha em torno de R$ 3 mil pagar a mesma alíquota (27,5%) que alguém que receba bem mais", começamos a ficar preocupados. É igualmente mencionada, como exemplo, uma nova escala de descontos, que deve variar de 5% a 50%, este para os salários mais altos, passando por alíquotas de 10%, 20%, 30% e 40%, diante da lógica de que a atual Tabela de Imposto de Renda provoca uma grande injustiça social.

Essa percepção errônea - que, aliás, é a de muitos brasileiros - não sobrevive a alguns pequenos cálculos, utilizando-se como base a atual e "injusta" tabela progressiva do Imposto de Renda.

Embora não queiramos cansar o leitor com a matemática, é imperativo que efetuemos alguns cálculos para mostrar a falácia segundo a qual a classe média e os ricos pagam os mesmos 27,5% de Imposto de Renda.

De início, é bom que se diga que todo trabalhador que recebe até cinco salários mínimos mensais - e aí está a grande massa da nossa população - está isento de Imposto de Renda. A alíquota, pois, para quem recebe até exatos R$ 1.058,00 por mês é zero.

Para um cidadão da classe média que recebe R$ 3 mil por mês, o imposto a pagar é de R$ 401,92, aplicando-se os 27,5% da tabela e deduzindo-se a importância de R$ 423,08 aplicável a essa alíquota. Como podemos verificar, o valor efetivamente pago representa 13,4% do salário recebido, e não 27,5%, como muitos acreditam ser. O fato é que a parcela fixa dedutível pesa favoravelmente muito mais para quem menos recebe.

Da mesma forma, um privilegiado que recebe R$ 60 mil por mês paga R$ 16.076,92 de imposto, após efetuados os mesmos cálculos. Isto é, 26,8% do salário recebido. Portanto, o rico, segundo o presidenciável Lula, que possui renda mensal 20 vezes maior do que o cidadão da classe média tem uma alíquota efetiva duas vezes maior (e não os mesmos 27,5%) e desembolsa de imposto, mensalmente, 40 vezes mais em moeda corrente do País.

Como fica claro, a atual Tabela do Imposto de Renda contempla efetivamente as diferenças salariais, pagando mais, muito mais, quem mais recebe. Agora, se o objetivo for taxar mais aqueles que recebem mensalmente algumas dezenas de milhares de reais, o aumento mencionado de alíquota até, digamos, 50% teria efeito prático muito pequeno. Pois os realmente ricos, aqueles que possuem grandes fortunas, têm sua renda originada principalmente do capital, e não do trabalho remunerado. E aí temos uma outra realidade, com taxação totalmente distinta, que não tem nada que ver com a Tabela do Imposto de Renda. Entretanto, caso o governo do PT queira taxar mais esses milionários e pretenda dar continuidade ao governo Fernando Henrique Cardoso no que diz respeito ao aumento da carga tributária deste país, o caminho mais rápido seria a aprovação do imposto sobre for tunas, com todos os inconvenientes que esse novo tributo pode trazer. Pois patrimônio - terras, prédios, ações das suas companhias, etc. - não significa necessariamente dinheiro em caixa para pagar impostos adicionais. Não podemos ainda esquecer que o cidadão brasileiro não paga apenas Imposto de Renda, e sim mais um elenco criativo de impostos, tais como CPMF, IOF, IPVA, IPTU, além de mais algumas dezenas de outros impostos e contribuições que são pagos pelas empresas e repassados ao consumidor via preço dos produtos e serviços adquiridos. Não é por outra razão que temos carga tributária de Primeiro Mundo - cerca de 35% do PIB -, enquanto os serviços recebidos em troca estão em níveis de país subdesenvolvido.

É, portanto, confortante quando o deputado federal Aloízio Mercadante - figura de proa do PT e, certamente, de um governo Lula - afirma que "temos de mexer nas Tabelas do Imposto de Renda para que haja mais justiça social.

Mas não dá para chegar a um número agora, sem discussão com o Congresso Nacional e sem um estudo da Receita Federal a respeito". Pois um diagnóstico errado pode levar a remédio errado, que, ao invés de curar, mata o doente.

Que algo tem de e precisa ser feito para melhorar a distribuição de renda no Brasil é inequívoco.

Somos um país injusto, onde poucos têm muito e muitos têm pouco. A reforma tributária, que deverá sair do papel no próximo governo, é passo na direção correta, mas não é com a mexida na Tabela do Imposto de Renda que resolveremos o problema. E não é, igualmente, com mais impostos que melhoraremos a vida do trabalhador brasileiro. Pois, conforme Abraham Lincoln já dizia, "não ajudarás o assalariado se arruinares aquele que lhe paga".


Colunistas

RACHEL DE QUEIROZ

As várias faces da violência
Diz todo mundo, mostra-se na TV, que São Paulo, Rio - e todas as grandes cidades brasileiras atravessam uma fase de incrível violência. As pessoas se matam nas ruas, nas favelas e nas avenidas, como o cinema conta que se matava em Chicago de Al Capone.

É verdade. Mas o pior é que não é só aqui. Não é um fenômeno particular. A violência ataca o mundo inteiro. Agora mesmo, a Alemanha, ainda está em estado de choque com a chacina no colégio Gutenberg, em Erfurt: um ex-aluno, revoltado porque fora expulso pela falsificação de um atestado médico, em apenas l5 minutos disparou 40 tiros na escola, matando 16 pessoas, entre alunos, professores e funcionários do colégio, suicidando-se depois.

Alguns dos 12 professores foram mortos como numa execução: o garoto assassino exigiu que eles ficassem de joelhos antes de matá-los com um tiro na cabeça.

Depois dessa tragédia, que abalou toda a Alemanha, retorno às aulas, agora, é sob o domínio da tensão e do medo: de repente, os professores começaram a levar a sério ameaças de alunos descontentes com notas baixas. Num ginásio de Varel, perto de Bremen, a prova de conclusão do curso foi realizada sob forte proteção policial: o diretor do ginásio recebeu uma carta em que um aluno ameaçava suicidar-se e levar com ele o maior número possível de alunos e professores. A carta revela que o autor é um fanático religioso. Ele disse que faria tudo por ordem de Deus.

No Oriente Médio - Europa, França e Bahia - só se briga, só se mata - é só tocar com o dedo um ponto do mapa-múndi, e se vai encontrar sempre sangue correndo, fogo queimando.

E daí? Mas será que não foi sempre assim? As guerras foram sempre o tema dominante na História. A verdade é que desde que o mundo é mundo, vivemos sob a marca da violência. Todo bicho maior usa o direito de matar o bicho menor, e os do mesmo tamanho batalham mortalmente entre si. Até no lar, doce lar. Mamãe castiga o bebê. Como? Com uma palmada. Ele não sabe falar, mas sabe que dói: violência educativa. Aliás, tudo não começou no Gênesis, quando o primeiro filho do primeiro casal humano matou o irmão? Eram só eles dois, mas eram dois machos, Caim sentiu que devia acabar com Abel para ficar o senhor da futura tribo.

Sim, hoje a violência é demais, e isso é terrível. A gente tem medo de mandar as crianças para a escola, de deixar os filhos adolescentes saírem para o futebol, morre-se de medo quando os jovens se juntam num bar, à noite, para um chopinho. Quem tem família tem medo de tudo! E com razão, o medo é justificado. Grande parte dos pais já teve a prova amarga na própria carne.

E volto à minha velha tese: esse agravamento da violência no mundo inteiro é porque tem gente demais neste dito mundo. Até as florestas da Amazônia, da África, da Austrália fervilham de índios, de negros, de "aborígines", como diziam os ingleses colonizadores. Os quinhões de terra e comida para cada um vão ficando cada vez menores, mais magros, e então se briga.

E isso sem falar na situação dramática dos espaços urbanos. E fora a violência pelo espaço e pelo pão, ainda existe a violência pela pura diversão, como espetáculo. Haverá nada mais brutal do que uma tourada? E o boxe? Milhares de pessoas enlouquecidas ante dois brutamontes seminus, se matando aos socos?

Nas batalhas modernas acabaram-se os combates a espada e lança, depois que se inventou a pólvora. E depois se inventou a dinamite, ainda mais mortífera. E logo se chegou à bomba atômica: uma só mata milhões. E se ainda se mantém uma paz relativa, em muitas partes da Terra, é porque uns têm medo dos arsenais dos outros. Já pensou na quantidade imensa de explosivos que existe armazenada nesses arsenais espalhados por todo o mundo? Daria, talvez, para liquidar não só com o nosso planeta, mas com todo o sistema solar!

Nos hinos e nos discursos, nas pregações religiosas clamamos que "somos todos irmãos". Verdade. Somos irmãos, desde Caim e Abel.


Editorial

SUMIU O ESPÍRITO DE DOHA

Há apenas seis meses o mundo parecia pronto para avançar, finalmente, na busca de um comércio mais justo e mais equilibrado. Essa disposição foi em pouco tempo substituída pela desconfiança e por um ambiente de conflito.

O fracasso da reunião de cúpula entre Estados Unidos e União Européia, na quinta-feira, foi mais uma prova dessa mudança. Encerrado o encontro do presidente americano com líderes europeus, os dois principais negociadores comerciais das duas potências, o americano Robert Zoellick e o francês Pascal Lamy, esticaram suas conversações, na tentativa de atenuar as disputas sobre aço, incentivos fiscais e ameaças européias de retaliação. Em todas as frentes de negociação os progressos têm sido lentos e modestos. As incertezas da economia mundial e a persistência de crises regionais dificultam as decisões. Na rodada global da Organização Mundial do Comércio (OMC), na Alca e nas discussões entre União Européia e Mercosul há poucos sinais animadores.

O momento de maior otimismo foi logo depois da Conferência Ministerial de Doha, em novembro.

Na capital do Catar, ministros de 144 países lançaram a nova rodada global de negociações comerciais, depois de dois anos de impasses. Na mesma ocasião, as duas Chinas oficializaram seu ingresso na OMC. Até 2005, ninguém se iludia, haveria discussões muito difíceis, mas a maior parte dos envolvidos parecia seriamente disposta a negociar. Os ataques terroristas de 11 de setembro haviam estimulado, entre as principais potências, uma rara disposição para cooperar.

O encanto se rompeu quando o governo dos Estados Unidos, atendendo a pressões de indústrias e sindicatos, adotou salvaguardas contra a importação de aço. Interesses de parceiros comerciais de todos os quadrantes foram atingidos de uma só vez. Alguns dos prejudicados logo recorreram à OMC contra a decisão americana. Ao mesmo tempo, a União Européia adotou medidas de salvaguarda, para evitar, segu ndo se alegou, que grandes volumes de aço fossem desviados para seu mercado. Os europeus já haviam conquistado, em processo recente, o direito de retaliação contra os Estados Unidos, por causa de incentivos considerados irregulares. Essa retaliação pode chegar a US$ 4 bilhões. Antes de sua aplicação, os dois lados tentam entender-se.

No dia em que o presidente George W. Bush se encontrou com os presidentes da União Européia e da Comissão Européia, José Maria Aznar e Romano Prodi, os deputados americanos aprovaram a lei que poderá elevar os subsídios à agricultura dos Estados Unidos nos próximos dez anos.

Esse projeto será ainda votado pelos senadores, mas não havia, até o fim de semana, dúvida quanto à sua aprovação. O próprio presidente Bush, na quinta-feira, manifestou a disposição de sancioná-la. Além de não resolver as pendências com os europeus, o governo americano cria mais um grave motivo de conflito com a Europa e com dezenas de nações exportadoras de produtos agrícolas.

É difícil imaginar como as negociações multilaterais de comércio poderão progredir, nesse ambiente. Até a solidariedade ocasionada pelos atentados de 11 de setembro se evaporou, substituída por novas divergências entre europeus e americanos a respeito do Oriente Médio e de questões de segurança.

Também não há otimismo em relação a outras negociações. A crise argentina, que afeta o Mercosul, dificulta as negociações do bloco sul-americano com a União Européia. Não se esperam grandes novidades, portanto, na reunião de cúpula marcada para os dias 17 e 18 em Madri. Nem mesmo o objetivo de um acordo de livre comércio entre os dois blocos é hoje considerado seriamente pelos europeus, que passaram a falar num projeto mais modesto.

A negociação da Alca também derrapa. Ainda se espera lançar dia 15 de maio as discussões sobre acesso a mercados, mas, para isso, será preciso completar, nos dias 12 e 13, as discussões que ficaram incompletas na recente reunião na Ilha Margarida, na Venezuela. O espírito de Doha pode haver pairado sobre o mundo por alguns meses, mas já não há sinal de sua influência benéfica. Tudo isso é uma coleção de sinais muito maus, especialmente para as economias em desenvolvimento.


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05/06/2002


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