Todos se unem contra Serra no debate









Todos se unem contra Serra no debate
Adversários trocam perguntas e aproveitam para atacar tanto o tucano quanto o governo

O governo federal e o candidato do PSDB, José Serra, foram o principal alvo dos três presidenciáveis de oposição – Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Ciro Gomes (PPS) e Anthony Garotinho (PSB) – no debate transmitido ontem à noite pela TV Record. Os adversários do tucano insistiram nos problemas de desemprego, da dengue, no destino do dinheiro das privatizações, entre outras críticas ao presidente Fernando Henrique Cardoso. Serra interrompeu o debate várias vezes para pedir direito de resposta e acusou os rivais de uma suposta “tabelinha” para atacá-lo.

O encontro de ontem – segundo do gênero entre os presidenciáveis – teve momentos de tensão, com acusações diretas entre os participantes. O adjetivo “mentiroso” foi o preferido dos presidenciáveis. No final, uma nova tendência: Lula, líder nas pesquisas, parece ter escolhido definitivamente Serra – que divide com Ciro a segunda colocação – como seu provável adversário no segundo turno. “A maior parte das conquistas do governo na área da saúde se deve à ajuda de companheiros do PT, que nessa área sempre se deram muito bem”, disse Lula.

As críticas ao governo e a Serra começaram logo no início do programa, quando o petista perguntou a Garotinho a que se devia a epidemia de dengue no Rio. Resposta, réplica e tréplica foram usadas para “bater” no governo e em Serra, ex-ministro da Saúde. Logo em seguida, o primeiro embate entre Ciro e Serra. “Você tem feito uma campanha sórdida, de agressões a mim.

O senhor tem agora, na minha presença, ocasião de fazer o ataque”, disparou Ciro ao tucano, que também foi duro. “Não estamos fazendo nenhuma campanha sórdida, estamos mostrando o que você diz; a maior parte é mentira”, respondeu Serra.

No segundo bloco, Lula e Ciro trocaram perguntas sobre as privatizações. Novamente, as falas foram ocupadas por críticas ao governo federal, inclusive com o candidato do PPS lembrando das denúncias de propina envolvendo o ex-caixa de champanha de Serra, Ricardo Sérgio de Oliveira.

“Está havendo uma tabelinha”, disse o candidato do governo, acusando os adversários de usar seus tempos apenas para atacá-lo e constrangendo o apresentador do debate, Boris Casoy, com seus seguidos pedidos de direito de resposta. “Você tem de arcar com o ônus do governo”, retrucou Lula.

Embates – A tal “tabelinha” continuou, mas dessa vez entre Ciro e Garotinho. O candidato do PPS perguntou ao rival do PSB “para onde foram os bilhões obtidos com as privatizações – essa pergunta foi feita por Ciro a Serra no debate anterior, na TV Bandeirantes. Aproveitando a bola levantada, Garotinho retomou o bombardeio. “Para os bancos, os grandes padrinhos do candidato oficial.”

O clima esquentou com Garotinho fazendo ataques diretos ao tucano, ao perguntar como criaria 8 milhões de empregos. “Seu padrinho (Fernando Henrique) é incompetente ou não colocou o emprego como prioridade”, disse o candidato do PSB. “Ainda faltam quatro meses para acabar o governo do qual o senhor faz parte: dê a fórmula para Fernando Henrique e peça para o pessoal passar lá na segunda-feira para pedir emprego”, disse Garotinho, referindo-se ao programa de empregos de Serra, chamado “Segunda-feira”.

Artistas – Garotinho ainda chamou Serra de mentiroso, por dizer que criou o seguro desemprego.

“Se aqui nesse debate, se tem um mentiroso não é um só”, referindo-se também a Ciro. O ex-governador do Rio, que insistiu na tese de que Serra é “o candidato dos banqueiros”, criticou a aparição de artistas no programa do tucano. “Quem vai governar não é a Elba Ramalho, nem o Chitãozinho e o Xororó, é ele (Serra), ele que enrola você há oito anos.”

Serra retrucou com ironia, dizendo que o adversário não precisa de artistas. “Ele (Garotinho) já é um artista”. E deu detalhes de seu papel no surgimento daqueles dois projetos: “Eu não inventei.

Eu fiz acontecer.” O ex-governador do Rio respondeu: “Desafio publicamente o Serra a provar que não gastamos o dinheiro federal no combate à dengue. Ele está confundindo com o dinheiro da vacinação. Isso que dá escolher quem não entende do assunto para a Saúde.”

Evolução – Num outro embate, desta vez entre Lula e Serra, o tucano criticou o candidato petista por defender hoje medidas contra as quais seu partido voltou contra no Congresso Nacional, como as privatizações e a criação do Fundef. “Se o PT votou contra, é porque naquele momento achou que deveria votar: é a evolução de uma espécie chamada parlamentar”, respondeu o petista.

O candidato tucano ainda reclamou com o adversário petista, por causa da pergunta feita no primeiro bloco a Garotinho, sobre a dengue. “Tem havido uma certa tabelinha, aquela pergunta da dengue deveria ter sido feita para mim, não para o Garotinho, porque da forma como foi, eu fico sem comentar”, afirmou o governista.


Ao pé do ouvido, Lula e Garotinho riam dos rivais
Os candidatos Anthony Garotinho (PSB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) divertiram-se no primeiro bloco do debate entre os presidenciáveis ao ver o embate travado entre os adversários José Serra (PSDB) e Ciro Gomes (PPS). Enquanto Ciro e Serra discutiam, Garotinho puxava conversa com Lula e fazia comentários, ao pé do ouvido, em que os dois riam.

Após responder a uma pergunta formulada por Lula, Serra pedia ao mediador Bóris Casoy direito de resposta, alegando que havia sido citado na resposta de Garotinho. O candidato do PSB, por sua vez, ria com o petista. Garotinho chegou a avisar Lula que na seqüência do debate perguntaria ao petista, deixando clara, assim, sua intenção de provocar a polarização entre Serra e Ciro.

No intervalo, tanto Lula quanto Garotinho permaneceram muito calmos, ambos tomando café e rodeados de seus assessores. Já Ciro e Serra pareciam mais tensos.

O candidato da Frente Trabalhista foi assessorado por sua mulher, a atriz Patrícia Pillar, que gesticulava bastante diante dos olhos atentos do candidato. Ao lado de Ciro permanecia seu coordenador, Einhart Jacome da Paz, que falava ao telefone celular e repetia orientações para o candidato.

Com base no debate anterior, promovido pela Rede Bandeirantes, no dia 4 de agosto, é fácil supor que Einhart repetiu o procedimento de ouvir os resultados das pesquisas qualitativas, que foram feitas durante o debate, indicando a reação dos eleitores/telespectadores, para orientar as manifestações de Ciro. Serra, por outro lado, demonstrava serenidade enquanto falava com seu marqueteiro Nelson Biondi.


Direito de resposta cria impasse para mediador
Boris chegou a pedir que Ciro e Serra não mais se agredissem para programa prosseguir

Na luta para conquistar os eleitores, os presidenciáveis Ciro Gomes (PPS) e José Serra (PSDB) disputaram até mesmo os direitos de resposta. A troca de acusações entre os dois candidatos monopolizou parte do terceiro bloco do programa, provocou a reação dos demais candidatos e levou o jornalista Boris Casoy a um impasse. O mediador do debate chegou a pedir que Serra e Ciro não mais se agredissem para não ter de conceder direito de resposta e, indiretamente, prejudicar Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Anthony Garotinho (PSB).

O embate mais tenso ocorreu quando Ciro perguntou a Serra como espera que a população acredite na sua promessa de criar 8 milhões de empregos, se o governo do qual participou “acabou com mais de 11 milhões de postos de trabalho”. O candidato tucano explicou que os eleitores acreditarão porque não está fazendo uma promessa, mas mostrando como fará.

Em seguida, criticou a atua ção de Ciro no Ministério da Fazenda por ter mantido uma das mais altas taxas de juros e por ter feito acusações sem prová-las. “Você, Ciro, é o único dos quatro candidatos que já foi condenado pela Justiça por fazer acusações e não provar”, afirmou Serra, referindo-se ao fato de o candidato do PPS ter acusado o ex-ministro Henrique Santillo de não apurar denúncia sobre suposto desvio de verba pública ocorrida na prefeitura de Sobral, no Ceará.

Ciro explicou que criticou Santillo por ele ter se reunido com o ex-prefeito de Sobral, que fora cassado, e questionou a ligação de Serra com o ex-diretor do Banco do Brasil Ricardo Sérgio de Oliveira, que foi acusado de participar de supostas irregularidades no processo de privatização do governo federal. O candidato do PSDB pediu direito de resposta, disse que não tinha nada a ver com a atuação de Ricardo Sérgio e questionou o seu adversário sobre a ligação de um ex-coordenador da sua campanha com Paulo César Farias, o PC – empresário que arrecadou recursos para a campanha do ex-presidente Fernando Collor.

Serra referiu-se ao empréstimo que o deputado José Carlos Martinez (PTB-PR), que coordenou a campanha de Ciro, teria feito com PC Farias. Ciro também quis responder à acusação e então ocorreram os protestos.

Respeito – “Boris, precisa convocar o Ciro e o Serra para um debate”, reagiu Lula. Ele argumentou que, como os candidatos do PPS e do PSDB ficaram brigando e conseguindo direitos de resposta, os demais candidatos estavam sendo prejudicados.

“Estou em primeiro lugar nas pesquisas e não me neguei a ir a nenhum debate, ao contrário do que os primeiros colocados costumam fazer e quero respeito”, argumentou Lula. O mediador do programa reconheceu, pediu para não fazerem mais ofensas pois não não mais concederia direito de resposta.

Ciro explicou que José Carlos Martinez pertenceu à base aliada nas duas gestões do presidente Fernando Henrique Cardoso e nunca houve denúncia alguma. E, em seguida, acusou Serra de oferecer um Ministério para que Martinez evitasse que o PTB apoiasse a sua candidatura.


Nos bastidores, Pimenta pedia cobranças a Lula
INTERTITULO/INTERTITULOAntes do debate, em que o candidato do PSDB, José Serra, foi o principal alvo dos ataques, o coordenador da campanha tucana, Pimenta da Veiga, dizia que o presidenciável do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, deveria ser “chamado ao debate”. Segundo ele, o petista vinha sendo “poupado”.

Para o coordenador tucano, Lula acabou beneficiado pela polarização entre Serra e Ciro Gomes (PPS). “Nós ganhamos com isso, mas Lula também, só que isso vai até certo ponto.”

Apesar do bom resultado nas pesquisas, Pimenta preferiu ser cauteloso ao falar sobre apoios num eventual segundo turno. “Primeiro precisamos chegar no segundo turno, depois ver como chegamos lá, e aí ver quem vamos poder contar.”

Pimenta disse não não temer uma eventual vitória de Lula no primeiro turno. “As indicações que temos não são essas.”

Estrela – O presidente do PT, deputado José Dirceu (SP), afirmou que Lula não responderia a agressões contra ele durante a campanha. “O PT não tem uma estrela só, tem uma constelação. O Lula não vai abrir a boca, se for necessário, os dirigentes do PT respondem.” Para ele, “Lula tem de debater com o eleitor e não com o PSDB.”

Ao cruzar com Herrmann num corredor a caminho de estúdio, o candidato do PT ao governo do Estado, José Genoíno, pediu votos: “Você vai votar em mim, que história é esta de votar no (Antonio) Cabrera?” Herrmann respondeu: “Rasgo meu RG se o partido apoiar o Geraldo Alckmin no segundo turno.”


Orçamento pode sofrer novo corte de R$ 1,5 bi
Manobra ajudaria governo a cumprir aumento da meta de superávit primário

BRASÍLIA - O governo está pronto para, se necessário, promover mais um corte de gastos, da ordem de R$ 1,5 bilhão, no Orçamento deste ano. O decreto de programação financeira e orçamentária editado em 22 de julho, prevê que as despesas somariam R$ 144,9 bilhões em 2002.

Mas as tabelas comparativas que foram entregues com a proposta orçamentária enviada ao Congresso na semana passada prevê que os gastos serão de R$ 143,4 bilhões.

O corte pode ajudar o governo a cumprir a nova meta de superávit primário do setor público, que subiu de 3,75% para cerca de 4% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2002, conforme o que foi acertado com o Fundo Monetário Internacional (FMI) sem que seja necessário aumentar a receita.

Ainda que este aumento da receita bruta (incluindo transferências constitucionais) tenha uma perspectiva de aumento de R$ 239,2 bilhões para R$ 240 bilhões.

Com as medidas o governo pode ter um aumento no saldo do Orçamento dos cerca de R$ 1,7 bilhão necessários para cumprir o novo superávit. A indicação do aumento do superávit não tem respaldo na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) aprovada este ano pelo Congresso, e só será confirmada na votação do projeto de Orçamento para 2003, após as eleições.

O governo ainda não confirmou oficialmente a decisão nem o secretário da Receita, Everardo Maciel, quis apontar na sexta-feira passada qual será o ganho embutido nas novas medidas incluídas na Medida Provisória 66, mas algumas receitas devem colaborar para o superávit. É o caso da reabertura do prazo para a renegociação da dívida do maior fundo de pensão do País, a Previ, pertencente aos funcionários do Banco do Brasil.

O prazo inicial da Medida Provisória 38, que o Congresso ainda não votou, estabelecia o prazo até o junho. A MP 66 restabelece um novo prazo até 31 de setembro. A Previ tem cerca de R$ 1,7 bilhão em dívidas com o fisco e perdeu a primeira chance de renegociação estabelecida pela MP 2.222, editada no ano passado. Além dessa receita, o governo pode arrecadar algo em torno de R$ 1,5 bilhão com a renegociação pelos estados das suas dívidas com o Pasep - outra medida incluída na MP 66.

O corte na despesa e o aumento das receitas, ainda que não sejam exatamente os previstos ou calculados, podem assegurar com alguma folga ao cumprimento do novo superávit, que significará um aumento da economia a ser feita de R$ 49 bilhões para R$ 51 bilhões este pelos três níveis da administração e as estatais.


Apoios na TV
A equipe de marketing e comunicação do PSDB vai colocar no horário eleitoral gratuito mais dois importantes apoios ao candidato José Serra. Além de uma entrevista concedida pelo empresário Antonio Ermírio de Moraes, do grupo Votorantim, os tucanos devem exibir o depoimento de apoio do ex-governador do Paraná e candidato ao Senado pelo PFL do Paraná, Jaime Lerner. Ermírio gravou na semana passada.


Artigos

A meninice mental na política
Luiz Carlos Lisboa

O presidente da República, que agora está chegando ao termo do seu segundo mandato neste imenso país, que, por bem ou por mal, é o nosso, como todo o resto do gênero humano, é sujeito a enganos e passível de ilusões.

Mas ele também parece, por sorte dos seus concidadãos, o homem público mais maduro emocionalmente que chegou ao elevado cargo que ocupa, numa nação longamente assediada pela imaturidade, pelo modismo e pelo culto da esperteza. Não há orgulho nacionalista, surto de patriotismo ou tendência a nivelar tudo por baixo que nos cegue a ponto de negar isso.

Quando o presidente nos diz estar decepcionado com o mercado, é uma emoção juvenil que dirige seu discurso. Nisso lembra alguns candidatos à Presidência que disputam a eleição como quem
concorre a uma votação de diretório estudantil em entidade metropolitana. Sob uma mirada adulta, o mercado é aquilo que os investidores fazem dele. Se estes são em sua maioria crianças grandes, ele será um jogo perigoso, como a famosa loteria da Babilônia de Borges. Se o mercado é orientado por impressionistas distantes, bem pagos para balançar a cabeça e dar palpites, torna-se uma roleta irresponsável que pode aniquilar um país e milhões de economias. Nenhuma roleta é um mal em si.

Este presidente pode ser acusado de inativo, corrupto, complacente com a corrupção? Em sã consciência, não pode. Inimigos raivosos ou adversários gulosos podem dizer o contrário, mas não acreditam no que dizem. Em tempo de eleições, é verdade, nem sempre se diz o que se pensa e nem se pensa o que se diz. Santo certamente ele não é, mas atire a primeira pedra aquele que entre nós o é. Não nos outros, naturalmente, que isso é fácil. Demais, a santidade não é requisito para aspirar à Presidência.

Já os candidatos que ora disputam o que os contemporâneos de Rui Barbosa chamavam de "a mais alta curul da Pátria" sofrem do mal sombrio que se esconde, às vezes, sob o riso fácil; outras vezes, sob a arrogância; e, mais raramente, sob a casmurrice - a imaturidade emocional. Lula e Serra são menos flagelados pela peste da meninice mental a que estamos todos sujeitos de vez em quando, mas os outros dois postulantes parecem casos mais graves, necessitados de apoio psicoterapêutico ou de sessões compassivas de meditação transcendental. É claro que o exercício da política - aqui e no resto do mundo, diga-se -- tem afinidades imensas com as habilidades circenses, mas de modo algum ela é apenas isso. A teatralidade dos candidatos que a cada quatro anos testemunhamos nos debates e entrevistas mostrados nas grandes telas nítidas da moderna televisão reduz a pó as crenças de largas multidões nas virtudes da democracia. O que é perigoso e absurdamente injusto, como toda generalização.

O escorregão do presidente na teoria conspiratória do mercado demonizado pode ter sido somente uma homenagem ao seu passado de homem de esquerda, mas as fantasias diárias de alguns candidatos à Presidência sobre, por exemplo, uma guerra que os banqueiros movem contra a humanidade, ou a respeito da vesânia internacional em relação à Amazônia, são, sem dúvida, menos que patologias, mas resultam do cultivo do pensamento mágico, daquilo que os ingleses chamam wishfull thinking, da crença provinciana de que em política vale tudo, e, finalmente, da convicção reparadora segundo a qual "amanhã serei completamente honesto".

Os candidatos procuram compensar suas carências exibindo exatamente o que não têm, ou não são. Na verdade, eles pretendem mostrar o que lhes falta, e isso transforma seu empenho em farsa teatral de má qualidade. É fascinante a incapacidade do imaturo de notar a própria imaturidade, mesmo quando se compreende que ele é como o cego que ignora o efeito de suas feições e de sua postura, porque nunca se viu num espelho. O homem comum não amadurecido tropeça com freqüência ao longo da vida, mas não inflige muito sofrimento em redor. O homem público imaturo desgraça seu meio ambiente, e o poder petrifica sua ignorância a respeito das próprias limitações.

Meninice mental e poder é combinação fatal, para o próprio e para o alheio.

Na nossa política o mal é epidêmico e, agora mais do que nunca no passado, ameaça a "mais alta curul da Pátria", ameaça o futuro e a sobrevivência. O perigo consiste nisso: o imaturo não identifica o imaturo. Diferente do HIV, mas como a peste negra medieval, que chegava aos lares através dos pequenos animais domésticos e atingia, primeiro, os muito jovens e, em seguida, os muito velhos. Que hoje, mutatis mutandis, votam levados pelo entusiasmo ou tangidos pela indiferença.


Editorial

O 'FATOR PESSOAL' NA SUCESSÃO

Duas semanas de propaganda na mídia eletrônica confirmaram as previsões de que só a partir de seu início a grande maioria do eleitorado iria tomar conhecimento de uma campanha que há quase um ano ocupava na imprensa espaço inversamente proporcional ao interesse do público. Agora, sim, a sucessão entrou no radar de muitos milhões de brasileiros. Prova de que despertaram para o assunto e estão atentos para o que lhes é dado ver e ouvir foram a grande audiência dos primeiros programas; as mudanças nos índices de rejeição dos candidatos, à medida que estes começaram a ser conhecidos; e, sobretudo, a reviravolta nas pesquisas, deitando por terra os prognósticos de que Ciro Gomes seria o adversário certo de Lula no segundo turno.

Esses efeitos confirmam também uma tendência verificada em muitos outros países em relação aos fatores que mais contam nas escolhas eleitorais. Em regra, o definhamento dos grandes embates ideológicos, o poder da TV na formação das opiniões e o uso imitigado, pelos partidos, das técnicas de persuasão da publicidade comercial e dos padrões de entretenimento da programação popular das emissoras produziram um inequívoco resultado: a personalidade dos candidatos ou prepondera sobre as suas promessas, ou estas são filtradas pelo modo como o eleitor avalia os proponentes, no plano pessoal. E, quanto maior a convergência de propostas e prioridades, tanto maior a importância dada ao caráter e ao temperamento dos candidatos.

O que eles parecem ser torna-se assim uma espécie de prova dos nove de seus projetos e posições, a pedra de toque de sua credibilidade. É consenso que Ciro caiu entre 5 e 7 pontos, e Serra subiu 6, nas primeiras pesquisas depois do início da propaganda não por causa das respectivas idéias, mas porque o primeiro foi mostrado dizendo inverdades e chamando um eleitor de "burro", enquanto o segundo se mostrou mais próximo dos brasileiros comuns do que se dizia que fosse capaz.

Não fosse tão influente o "fator pessoal" dos candidatos, o grande desafeto de Serra nesta fase da campanha talvez não se visse compelido a recorrer à própria mulher, a atriz Patrícia Pilar, para que - valendo-se da empatia que a sua imagem provoca, ainda mais por ela não ter ocultado a sua doença - avalizasse "o verdadeiro" Ciro Gomes: "Honesto, amigo, competente e solidário", que não tem "pavio curto" e diz coisas que não devem ser levadas ao pé da letra porque seriam "força de expressão". Haja força de expressão:
numa entrevista, logo no dia seguinte à entrada em cena de Patrícia, Ciro deu uma resposta chocante a uma pergunta sobre qual seria o papel dela ao seu lado. Ao perceber o constrangimento dos presentes, Patrícia incluída, apressou-se a dizer que estava "brincando".

Mas não há nada de força de expressão nas suas reiteradas referências à "oligarquia dos barões paulistas" concentradores de poder e apoiadores da candidatura Serra. A acusação tem dois aspectos no mínimo irônicos. O primeiro é o uso do termo "oligarquia". Ciro descende de uma família que influi na política, em Sobral, no Ceará, desde a Colônia. O atual prefeito da cidade é seu irmão. No final dos anos 70, era o seu pai. Já o pai de Serra (cujo sobrenome inteiro é José Serra Chirico) era um imigrante italiano que vendia frutas no mercado. A segunda ironia é que São Paulo é o Estado brasileiro por excelência onde a avassaladora mobilidade social - de que a trajetória de Serra é um entre incontáveis exemplos - há muito tempo pulverizou o poder dos "barões" locais.

Tentando justificar-se, Ciro disse que é "justo e humano" ele ficar revoltado com os ataques recebidos, argumentando que até Jesus poderia ter sido chamado de "destemperado e pavio curto", quando expulsou os vendilhões do Templo de Jerusalém. Pelo visto, ele se nega a admitir que é o único responsável pelos ataques de que se queixa e pelos prejuízos eleitorais daí decorrentes. A sua responsabilidade é intransferível. Primeiro, porque ninguém lhe atribuiu palavras que não tivesse pronunciado - em público.

Segundo, porque, numa campanha, tudo que os candidatos dizem pode ser usado contra eles. As diferenças individ uais, em suma, formam a arena onde os candidatos competem por esse passaporte para o voto que se chama credibilidade.


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09/03/2002


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