Tucanos conseguem fechar apoio a Serra







Tucanos conseguem fechar apoio a Serra
Lançamento oficial da candidatura do ministro será feito na próxima semana

BRASÍLIA - Agora só falta Tasso Jereissati. À exceção do governador do Ceará, o ministro da Saúde, José Serra, fechou ontem o apoio de todas as alas do PSDB em torno de sua candidatura à Presidência. Até mesmo o ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga, "tassista" renitente, participou do almoço para tratar da agenda do pré-candidato Serra. O lançamento oficial será na semana que vem, possivelmente na quarta-feira.

Os serristas comemoraram os últimos acontecimentos, que trouxeram para a linha de frente da campanha o presidente do partido, deputado José Aníbal (SP), o secretário-geral da Presidência, Arthur Virgílio Netto, e o governador de Mato Grosso, Dante de Oliveira. O governador comunicou ontem a Serra a desistência de sua pré-candidatura, prometendo arregaçar as mangas e trabalhar pelo ministro. Também aderiram os senadores Teotônio Vilela Filho (AL) e Geraldo Melo (RN), líder tucano no Senado, além do governador do Pará, Almir Gabriel - todos tassistas.

Nessa virada, tanto o presidente Fernando Henrique Cardoso quanto ex-adversários de Serra deram ao ministro o mesmo conselho: articular e conversar mais. A sugestão inclui uma conversa "urgente" com Tasso. "O Serra é que tem de se mexer, porque é uma tarefa intransferível", disse Fernando Henrique, a um dirigente do partido.

Serra não perdeu tempo e iniciou imediatamente as articulações. O acerto com Pimenta foi feito pessoalmente, na noite de terça-feira, quando eles tiveram um encontro. Com Dante, a conversa foi por telefone.

"Preciso de você", disse Serra. Na outra ponta da linha, o governador respondeu que é homem de partido. "Já me decidi e estou pronto a trabalhar por você." Dante ainda reforçou o conselho de Fernando Henrique: "Em política, você tem de fazer carinho em homem, porque é assim que funciona."

Ato simples - A contabilidade do apoio a Serra foi feita durante almoço, ontem, no apartamento do secretário-geral do PSDB, deputado Márcio Fortes (RJ). "Estamos todos com Serra", disse Aníbal. "De A a Z, do Acre ao Rio Grande do Sul, estamos todos fechados com a candidatura de Serra."

Os "serristas" queriam definir ontem mesmo a data e o formato do anúncio do lançamento da candidatura. Mas, para prestigiar e envolver na campanha o recém-convertido Aníbal, que tinha simpatia pela candidatura de Tasso, preferiram delegar ao presidente do partido a tarefa de acertar tudo pessoalmente com o candidato. Definiram, apenas, que será um ato simples, durante reunião da executiva nacional. A festa fica adiada para a pré-convenção de 24 de fevereiro, que poderá ocorrer em Fortaleza.

"Existia um movimento anti-Serra muito forte dentro e fora do partido", avaliou o prefeito de Vitória, Luiz Paulo Vellozo Lucas, cotado para coordenar a campanha. "Fora do PSDB, esse movimento produziu a candidatura de Roseana Sarney (PFL), mas dentro do partido ele está sendo desmontado."

Foi quando o deputado Alberto Goldman (SP), vice-presidente da legenda, perguntou ao ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, como havia sido o atrito com Tasso, às véspera do Natal, no Palácio da Alvorada. "Foi apenas a demonstração de que existem mágoas e de que, de vez por outra, Tasso escolhe um alvo. Dessa vez fui eu", respondeu o ministro.

Serra se queixou, no almoço, de que os meios de comunicação "estão dando repercussão exagerada" aos desentendimentos com Tasso. A conclusão geral dos nove participantes do almoço foi de que a melhor estratégia é não valorizar a briga - que, acreditam, não passa de uma dissidência superável.

"Nós consideramos muito importante a participação de Tasso, mas a campanha não depende dele", disse o líder do PSDB na Câmara, Jutahy Júnior (BA), um dos principais articuladores da candidatura Serra. Tanto o ministro quanto seu staff concluíram que não dá mais para arrastar a indefinição. Ao primeiro ato público que o ministro comparecer, terá de fazê-lo como candidato. "Na sexta-feira, o ministro vai ao Rio e sua passagem por lá certamente será um inferno, porque ninguém quer saber de saúde, só de candidatura", disse Fortes. "Se fosse eu, anunciava a candidatura hoje mesmo."


Propaganda do PSDB não poderá ser antecipada
BRASÍLIA - Na corrida para divulgar o nome do ministro da Saúde, José Serra, como pré-candidato à Presidência, o PSDB tentou, mas não conseguiu, a autorização do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para antecipar a veiculação dos anúncios do partido no rádio e na TV.
A propaganda, com inserções de duração máxima de um minuto, ocorrerá, então, nos dias 2, 4, 14, 21, 28 e 30 de maio e nos dias 1.º e 4 de junho. Pela vontade do PSDB, as inserções seriam veiculadas em março. A relatora do caso, Ellen Gracie, rejeitou o pedido em 13 de dezembro, alegando que as datas requisitadas tinham sido concedidas a outros partidos. O TSE negou, em 19 de dezembro, o pedido de reconsideração.

O programa do PSDB, com duração de 20 minutos, será veiculado em 6 de março, em cadeia nacional. A lei estabelece 1.º de dezembro do ano anterior como a data-limite para ajustar o calendário dos programas partidários. A pré-candidata do PFL, a governadora do Maranhão, Roseana Sarney, vai aparecer em cadeia nacional, por 20 minutos no dia 31 de janeiro. Uma bateria de anúncios da pefelista será exibida nos dias 15, 17, 19 e 22.


'Jungmann não é nossa Roseana', afirma Geddel
Líder reage com irritação ao lançamento de pré-candidatura do ministro peemedebista

BRASÍLIA - O líder do PMDB, Geddel Vieira Lima (BA), reagiu com ironia e irritação ao lançamento da candidatura do ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann, à Presidência. "Processo malconduzido, extemporâneo, amador, malpreparado, sem consistência...", classificou Geddel, que ontem ligou para o presidente Fernando Henrique Cardoso para falar sobre o assunto. "É muita pretensão de alguém que se filiou ao PMDB há menos de quatro meses lançar-se dessa maneira, como se o partido não existisse", considerou o líder.

Num telefonema, às 23h30 de segunda-feira, quando Jungmann comunicou a Geddel suas intenções, o líder teria alertado: "Isso não é uma aventura." Na mesma noite, o ministro falou sobre o assunto com o presidente da legenda, deputado Michel Temer.
A direção do PMDB avalia que as chances do ministro na convenção nacional do partido, em 17 de março, são remotíssimas. "Ele entrou de forma atabalhoada na disputa; é inábil", critica Geddel. "Jungmann é imaturo, não pode ser candidato a nada. Ele não é a nossa Roseana", conclui.

E o que poderia estar por trás da atitude de Jungmann? "Não acredito que seja Fernando Henrique Cardoso, como estão dizendo. Acho que o ministro está pavimentando o caminho para disputar uma cadeira na Câmara", arrisca o líder.
Ontem, Jungmann distribuiu à imprensa um recorte de jornal, de alguns meses atrás, onde Geddel declara que o ministro poderia ser candidato a qualquer coisa, até à Presidência. "Se eu disse isso um dia, mudei de idéia", rebate o líder.

Geddel ficou especialmente irritado com o discurso do "debate ideológico" utilizado por Jungmann para justificar o lançamento de sua candidatura. "Outro negócio malfeito, não é assim que se faz."

Quimeras - No PMDB, considera-se quase impossível sustentar candidatura própria em 2002. Candidato do PMDB é quimera, costumam dizer os caciques do partido. "Nós não conseguimos viabilizar nossa Roseana", admite Geddel. Até março, o PMDB terá de escolher um caminho: Roseana Sarney, do PFL, que tem a vantagem de estar em segundo lugar nas pesquisas, ou o ministro José Serra, do PSDB, que deu início ontem a sua campanha.
"Serra traz menos problemas do que Roseana", avalia um importante peemedebista. Com Serra, as questões regionais são menores e quase todas contornáveis. Com Roseana, há obstáculos intransponíveis, como Antonio Carlos Magalhães, na Bahia, arquinimigo de Geddel, por exemplo.

Desânimo - Ontem, em Belo Horizonte, o governador Itamar Franco deixou evidente seu desânimo em relação ao processo de escolha candidato peemedebista à Presidência. O anunciou que desistiu de viajar pelo País, para fazer campanha da própria pré-candidatura. Estavam programadas viagens para o Paraná, Piauí e Goiás, entre outros Estados. "Não vou mais correr o Brasil porque tenho outras coisas a fazer."

Itamar foi questionado se estaria otimista sobre as prévias do PMDB. Respondeu com uma pergunta, em tom irônico:partido: "Otimismo com as prévias?" Mesmo assim, garantiu que irá concorrer.


Suplicy já tem até slogan para disputar prévias
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) já está com a campanha para vencer as prévias de seu partido nas ruas. "E tem melhor?" será seu slogan para a disputa, no dia 3 de março, com o presidente de honra da legenda, Luiz Inácio Lula da Silva, pela candidatura à Presidência. Já em 31 de dezembro, durante a corrida de São Silvestre, simpatizantes usaram camisetas com o nome e a foto do senador, além do slogan e cinco estrelas desenhadas, indicando que ele é "candidato cinco- estrelas".

Também estão sendo confeccionados adesivos e buttons. De acordo com uma assessora, que trabalha na criação da campanha, a frase obriga a pessoa a pensar e escolher o melhor candidato. Apesar da distribuição de material próprio, Suplicy diz que confia na executiva nacional do PT para fazer a divulgação das prévias.

"Membros da executiva têm me dito que vão tomar as providências necessárias", garante Suplicy. Uma possibilidade seria fazer um jornal sobre as prévias e as duas candidaturas.
O senador revelou que terá uma reunião na segunda-feira com o presidente do partido, deputado José Dirceu (SP), para dialogar sobre as normas da disputa, que serão definidas na reunião da executiva em 21 ou 29 de janeiro. "Tenho confiança de que o presidente procederá com toda a correção e isenção", afirmou.

Suplicy acredita também que Lula irá respeitar a decisão do PT em realizar debates, caso isso seja decidido, embora o presidente de honra já tenha dito que não quer participar. "Creio que se a executiva definir a realização de debates o Lula vai respeitar."


'Candidatura é para valer', diz ministro
Jungmann garante que seu nome não servirá para acordos: “Sou péssimo vice”

BRASÍLIA – O ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann (PMDB), disse estar disposto a batalhar pela sua candidatura à Presidência. “É para valer”, garantiu, após reunião no Palácio do Planalto. No encontro, ouviu elogios do presidente Fernando Henrique Cardoso. “O presidente acha que minha decisão é legítima.” Ele aproveitou para criticar os líderes partidários que vêem na sua decisão uma jogada do Palácio do Planalto e marcou a saída do cargo para 17 de fevereiro.

Estado – O prefeito de Vitória, Luiz Paulo Vellozo Lucas, cotado para coordenar a campanha tucana avalia que o senhor pode ser um ótimo vice.
Raul Jungmann – Eu sou um péssimo candidato a vice-presidente e não aceito ser vice. Não sirvo para essa função. Minha pré-candidatura à Presidência é para valer.

Estado – Alguns líderes consideraram que a forma pela qual o senhor lançou a sua pré-candidatura foi atabalhoada. O que aconteceu?
Jungmann – Foi, realmente. Mas tive de lançar meu nome, porque a notícia vazou. O lançamento gerou um profundo mal-estar no PMDB. Foi um atropelo. Hoje estou quebrado como arroz de terceira. Conversei com o senador Pedro Simon (RS): ele acha que a decisão não passa de armação. Mas não é armação, não é uma aventura pessoal nem algo maquiavélico.

Estado – Líderes reunidos hoje (ontem) avaliaram que a decisão não passa de uma jogada do Planalto...
Jungmann – Aqueles que criticaram estão confundindo minha lealdade ao presidente com meu projeto político. Garanto que vou pleitear a vaga de candidato do PMDB.

Estado – Mas o que levou o senhor a essa decisão?
Jungmann – Estávamos caminhando para discussão em torno de índices de popularidade. O importante é definir um rumo político em torno de uma chapa de centro-esquerda.

Estado – Essa é uma referência à candidatura da governadora Roseana Sarney...
Jungmann – É. Não é preconceito, mas não dá para mudar de perfil e assumirmos uma chapa comandada por uma candidatura liberal. Não podemos aceitar. Isso provocaria fraturas no PSDB e no PMDB. Além disso, poderia ser um risco à governabilidade. O PFL foi essencial ao governo, mas temos de rejeitar uma inversão no comando da chapa.

Estado – O presidente participou dessa articulação?
Jungmann – Não. Conversei com o governador do meu Estado, Jarbas Vasconcelos (PMDB), e depois comuniquei minha decisão ao presidente.

Estado – Há interesse em atrapalhar os planos do governador Itamar Franco (MG)?
Jungmann – Não. Faço um apelo para que Itamar e Simon participem das prévias. Eles darão credibilidade ao processo.


Alckmin inicia personalização de seu governo
Troca na Segurança indica novo perfil na equipe herdada de Covas; Lembo é cotado para Justiça

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), começou ontem a imprimir marca própria em sua administração com a escolha do atual presidente da Febem, Saulo de Castro Abreu Filho, para a Secretaria da Segurança Pública. Saulo comandará a área mais crítica do governo e substituirá o procurador Marco Vinício Petrelluzzi, que ficou quase três anos no cargo. Provável candidato à reeleição, Alckmin também quer ampliar sua base de apoio, levando o PFL para a equipe. O nome considerado “ideal” pelos tucanos é o do presidente do PFL paulista, Cláudio Lembo, cotado para assumir a Secretaria da Justiça no lugar de Édson Vismona.

Com as mudanças no secretariado, Alckmin inaugura outra etapa de seu governo desde a morte de Mário Covas, em março do ano passado. Motivo: os sete titulares que deixarão o cargo no próximo dia 22 para concorrer às eleições e os dois que alegaram razões pessoais foram nomeados por Covas. Petrelluzzi, por exemplo, é antigo amigo da família.

Não é a primeira troca que Alckmin faz na equipe desde que assumiu o Palácio dos Bandeirantes. Mas, certamente é a de maior peso. Na terça-feira, o secretário de Governo, Antônio Angarita, foi substituído pelo adjunto, Dalmo Nogueira. Angarita foi uma exceção porque, mesmo não sendo candidato, pediu para sair.

Palanque – O PFL deve garantir palanque em São Paulo para a tentativa de reeleição do governador, embora o casamento nacional com os tucanos esteja beirando o divórcio. Ao que tudo indica, PFL e PSDB não vão reeditar a aliança que elegeu por duas vezes o presidente Fernando Henrique Cardoso. Na disputa pelo Palácio do Planalto, o racha parece evidente: de um lado deve estar a governadora do Maranhão, Roseana Sarney, e, de outro, o ministro da Saúde, José Serra.

“São coisas distintas: a executiva nacional não interfere no projeto estadual”, afirmou o deputado Gilberto Kassab (SP), vice-presidente do PFL paulista. As negociações dos pefelistas com Alckmin, bem adiantadas, incluem o lançamento de Romeu Tuma (PFL-SP) à reeleição para o Senado.

“Além da competência técnica, o critério para a escolha dos novos secretários é o da afinidade política. Não no sentido partidário, mas, sim, no de seguir os princípios do governo, que são de austeridade e transparência”, disse Alckmin. Ele não negou nem confirmou o convite a Lembo, que fo i secretário municipal de Negócios Jurídicos nas gestões de Olavo Setúbal (1975-1979) e Jânio Quadros (1986-1989), além de ter ocupado a cadeira de Planejamento na administração de Paulo Maluf (1993-1996), hoje candidato ao governo pelo PPB.

Reforma – Alckmin planeja ainda fundir a Secretaria de Recursos Hídricos com a de Energia. No comando da “superpasta” deve ficar o atual titular de Energia, Mauro Arce. No ano passado, o governador seguiu o mesmo modelo, extinguindo Esportes e Turismo e repassando suas atribuições para outras secretarias.

O deputado Antônio Kandir (PSDB-SP) é o preferido para a Secretaria do Planejamento, mas está difícil convencê-lo: ele quer voltar para a iniciativa privada. Na bolsa de apostas circulavam ontem os nomes do economista Roberto Macedo para Emprego e Relações do Trabalho e o da empresária Milu Villela para Cultura. “Não vivemos um momento de fim de governo, mas de novo governo”, resumiu o deputado Édson Aparecido, presidente do PSDB paulista.


Itamar estuda seguir Rio e processar União
BELO HORIZONTE - Para o governador de Minas, Itamar Franco (PMDB), a decisão do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, de conceder liminar ao governo do Rio, reconhecendo perdas de arrecadação durante o racionamento de energia, favorece seu Estado. Ele confirmou que a Procuradoria do Estado estuda entrar com ação semelhante, mas mantém-se cauteloso. "Há diferenças fundamentais e condicionamentos que estamos examinando para ver a conveniência (de uma ação)", disse.


Brizola discute com Simon idéia de aliança
PORTO ALEGRE - O líder nacional do PDT, Leonel Brizola, e o senador Pedro Simon (PMDB-RS), admitiram ontem que podem se aproximar nas próximas eleições. Uma aliança entre os partidos, que tentam atrair o PTB, seria uma alternativa para enfrentar a bipolarização entre o PT e o grupo do ex-governador Antônio Britto na disputa estadual. O provável candidato seria o vereador José Fortunati, ex-petista recentemente filiado ao PDT. O acordo reforçaria as pretensões de Simon na corrida presidencial.


Entediado das férias, Lula retoma rotina
RIO - O pré-candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, deve interromper as férias em Búzios e voltar hoje para São Paulo. Lula pretendia ficar no balneário até o dia 15. O petista teria se cansado da tranqüilidade. Ele ficou hospedado na mansão do empresário Mauro Dutra.
Antes de deixar a cidade, no entanto, ele deu uma palestra para cerca de 50 pessoas, entre elas o prefeito da cidade, vereadores e comerciantes, na qual expôs sua intenção de, eleito presidente, investir em turismo.


Artigos

A lição da Argentina
ROBERTO MACEDO

A situação desastrosa da economia argentina tem levado à busca de culpados. Entre os acusados estão o neoliberalismo e o ultraliberalismo, o FMI, o sistema financeiro do país, os políticos, o ex-ministro Domingo Cavallo, os ex-presidentes Menem e De la Rúa, e outros.
Que não se culpe, entretanto, a economia como ciência. Nem é necessário recorrer às suas análises mais sofisticadas. Em essência, ela diz que recursos são escassos e que é preciso escolher judiciosamente entre usos alternativos. Antigos princípios de boa gestão das finanças publicas, já ensinados pela experiência bem antes de livros-textos sobre o assunto, sempre insistiram que os déficits governamentais precisam ser bem controlados, e o termômetro é o crescimento da dívida. Também é sabido que, para bem funcionar, o câmbio fixo exige flexibilidade de preços e de rendimentos (lucros, salários, aluguéis e outros), em particular para baixo, como alternativa às desvalorizações.

Assim, em lugar de desvalorizar o peso atrelado ao dólar, teria sido necessário, por exemplo, reduzir fortemente as diárias em pesos dos hotéis de Buenos Aires, para que o turismo local voltasse a atrair brasileiros, ao mesmo tempo em que os argentinos não se sentissem tão estimulados a veranear em Santa Catarina. Reduzir diárias, contudo, significaria diminuir nominalmente lucros dos proprietários, aluguéis pagos pelos edifícios, salários dos funcionários, preços cobrados pelos fornecedores, e por aí afora. Como fazer isso num regime democrático, e no tempo necessário para produzir os efeitos desejados?

Ligada ao câmbio irrealista e à fragilidade da moeda, também é trivial a proposição de que a acumulação de déficits externos acaba gerando problemas de financiamento. E mais: a regra de que só se emitiriam pesos como contrapartida do ingresso de uma quantidade idêntica de dólares nas reservas do sistema bancário não prescinde da confiança na moeda, que se deteriora quando a dívida pública e a externa se agravam. A razão é que o sistema bancário, a partir de sucessivos depósitos e empréstimos, cria um outro tipo de moeda, escritural, na forma de depósitos à vista, de valor bem superior às reservas que mantém e do papel moeda emitido. Tomando, por exemplo, os últimos dados disponíveis para o Brasil, relativos a novembro do ano passado, constata-se a existência R$ 30 bilhões em papel-moeda emitido, R$ 16 bilhões em reservas bancárias e R$ 43 bilhões em depósitos à vista.

Assim, quando houve, na Argentina, a perda de confiança na moeda e a população passou a sacar depósitos, não havia reservas suficientes para honrá-los. E quem tinha dólares não se interessava pela troca por pesos, à taxa anterior à crise. Sucessivos feriados bancários e limites de saques não resolvem esse tipo de problema. Contribuem até mesmo para agravá-lo quando os bancos são reabertos sem que se atue na correção dos problemas fundamentais. Enquanto isso se resolvia, os feriados bancários e cambiais foram sucessivamente prolongados na Argentina. Seria uma maravilha se feriados resolvessem problemas econômicos.

Ainda recentemente, o Brasil tropeçou em alguns problemas dessa natureza, como o do real artificialmente valorizado e fixo, que quase nos levou pelos caminhos argentinos. E até hoje a dívida pública e o desequilíbrio externo, agravados pela aventura cambial, são pontos vulneráveis da economia brasileira. Assim, nos encontros entre economistas argentinos e brasileiros, estes usualmente manifestavam sua incredulidade, alimentada tanto pela ciência como pela experiência, quanto à lógica do que lá se passava, ao lado de vaticínios quanto ao brejo para o qual os argentinos levariam suas vacas.

Não é fácil explicar tamanhas irracionalidades econômicas, e aí os economistas não têm muito a oferecer. Conforta-me, entretanto, saber que a que cultivo é próxima da apontada pelo escritor Mario Vargas Llosa, neste jornal, no último domingo. Ele toma o irrealismo típico da obra do argentino Jorge Luís Borges como reflexo da alma do país, e associa esse estado de espírito ao que se tentava na área econômica. No meio de um mar de causas, vejo como fundamental a evidente dificuldade de os argentinos, que já foram ricos nas primeiras décadas do século passado, admitirem que empobreceram, o que também seria uma manifestação do irrealismo borgiano. O apego à paridade com o dólar veio na mesma linha, e o comportamento dos políticos acompanhou o que demandava a nostalgia econômica de seus eleitores.

Vindo a desvalorização por falta de alternativas, o empobrecimento do país vai ficar explícito na queda do seu produto interno bruto (PIB) em dólares.
Aliás, este deve aproximar-se novamente do PIB do Estado de São Paulo. No caminho das correções, adotou-se ainda um desvio pelo câmbio duplo, de uma taxa oficial e outra livre, o qual igualmente seguirá para o brejo. Já passamos por esse sistema e sabemos que gera distorções, falcatruas e corrupção, com a taxa oficial levando a importações superfaturadas e a exportações subfaturadas, e a diferenças acertadas por fora e fora do país, no qual ingressarão para venda no mercado livre.

Nós, brasileiros, temos aprendido com os nossos próprios e sérios erros. Se os ainda mais sérios dos argentinos nos trazem alguma lição, a principal delas, para os que ainda teimam em não aceitá-la, é a de que problemas como os que afetam a moeda, o câmbio, e as dívidas interna e externa não se resolvem com o voluntarismo dos políticos, nem a passes de mágica como a da paridade, e que as boas práticas econômico-financeiras não podem ser sacrificadas nos altares em que atuam falsos milagreiros. Em particular, os que prometem "soluções" políticas mal justificadas por seus aspectos sociais, sem levar em conta as limitações inexoravelmente ditadas pelo lado econômico.


Colunistas

RACHEL DE QUEIROZ

A fábula do homem e o seu garrafão
Pelo interior do Brasil é comum a presença de um cara que é chamado de "propagandista". Aqui pelo Estado do Rio, antes da camelotagem desenfreada ele era chamado também de "camelô".
Usava roupa vistosa, por exemplo: paletó xadrez vermelho e verde -, calças bois de rose, gravata azul-bebê. Em geral fazia propaganda de remédios que curam tudo, todos os males do mundo, e até maus pensamentos.

Ouvi que vendia xarope contra sífilis e, referindo-se às doenças "sexualmente transmissíveis", falava poeticamente em "mal de amores".
E foi a propósito de propagandistas que recordávamos ontem, minha irmã e eu, um caso que nosso pai nos contava garantindo que era verdadeiro.
Sucedeu numa cidade cujo nome ele não dava, para "evitar constrangimentos". O sujeito já desceu do trem vestido a caráter: terno de listras coloridas, sapato pampa, camisa roxo-batata, gravata amarela.

Na pensão registrou-se, levou a mala à sua vaga no quarto, e portando um grande rolo de papel debaixo do braço, pediu permissão à dona da casa para expor à sua porta um cartaz, que dizia o seguinte: "HOJE ÀS 16 HORAS, VENHAM VER O HOMEM QUE ENTRA NO GARRAFÃO!"
Dali foi à igreja à procura do vigário, solicitando à Sua Reverência licença para dar uma demonstração estupefaciente, tendo como palco a escadaria da Matriz. O padre ficou meio espantado quando leu o cartaz, mas acedeu.Também queria ver aquilo. Os outros cartazes foram espalhados pelas ruas, saturando todo o lugarejo.

Claro que a curiosidade foi enorme. Fizeram-se apostas, teve gente que rasgava nota de cem em duas, que é a maneira mais popular de registrar apostas sem papel escrito. Quem ganhar vai receber do outro a sua metade da nota.
Logo depois do almoço o nosso homem foi à farmácia, onde negociou o aluguel de um garrafão, de vidro, desses que transportam água destilada. Da pensão, conseguiu ainda uma mesinha, e assim, pontualmente, às 4 da tarde, lá estava ele com seus trajos multicores e os seus apetrechos, pronto para a "demonstração".

A praça pululava de gente. Faziam-se as mais ousadas conjecturas: "O garrafão é de borracha transparente. No que o homem for entrando ele estica, até caber." Outros acreditavam em hipnotismo. "Ele hipnotiza todo mundo, e aí a gente acredita que ele entrou em qualquer coisa." Outros achavam que era só um truque - "Não sei como é, mas tem de ser um truque."
E, assim, ele começou a falar sob aplausos e assobios. Delicadamente pediu silêncio à multidão: ia começar o espetáculo.
Tirou o casaco, tirou a gravata, pôs no chão o chapéu de palhinha, mostrou as mãos vazias. Então, lentamente, lentamente, tentou enfiar a mão direita pelo gargalo do garrafão. Não cabia, claro. Estirou o polegar, introduziu o dedo no gargalo - entrou! Mas parou na junta. Ele suspirava, mas, com a mão esquerda, tentou de novo: não entrou. Descalçou os sapatos, experimentou o pé - quá! Não entrou mesmo - era ainda maior que a mão. Tentou o nariz, até que ralou e minou sangue. Não entrou também.

E diante do silêncio atônito da multidão, o homem abriu os braços de pura impotência e constatou desolado:
- Realmente, foi impossível. Mas vocês bem que viram: EU TENTEI!


Editorial

Gol com a mão

O líder do PT na Câmara, deputado Walter Pinheiro, foi injusto com o secretário da Receita Federal, ao afirmar, referindo-se à medida provisória que corrigiu a Tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física e, em compensação, aumentou a carga tributária das empresas prestadoras de serviços, que "Everardo Maciel fez um gol com a mão no último minuto do segundo tempo". No episódio da correção da Tabela do Imposto de Renda, o governo fez jogo faltoso e desleal desde o primeiro minuto do primeiro tempo. Durante seis anos, a tabela não foi corrigida, embora no período houvesse inflação e reajustes de salários. Com esse simples truque inicial, o governo aumentou a arrecadação à custa de milhares de trabalhadores que, por conta dos dissídios anuais, atingiram o piso de incidência do imposto, então de R$ 900. O mesmo artifício jogou mais alguns milhares de contribuintes da alíquota de 15% para a de 27,5%, para alegria do Fisco.

Quando o Congresso se dispôs a corrigir essa aberração - o projeto original de correção da tabela é do senador Paulo Hartung -, o governo se mobilizou para obstruir a iniciativa. As autoridades da área econômica tentaram dissuadir os parlamentares, usando o argumento alarmista de que a renúncia fiscal decorrente da correção da tabela - proposta, num primeiro momento, em 35,29% - provocaria uma perda de arrecadação tal que comprometeria o ajuste fiscal feito nos últimos anos.

Como os parlamentares não se intimidaram com esse tipo de argumento, o governo passou a apresentar uma série de propostas alternativas para a correção da tabela, todas elas inaceitáveis, porque retiravam com uma mão o que davam com a outra. No curso dessas negociações, os líderes partidários chegaram a um acordo para reduzir a correção para os 17,5%. O governo, que simplesmente não queria nenhuma mudança na forma de cálculo do Imposto de Renda, mas estava convencido de que a derrota no Congresso seria inevitável, até porque a opinião pública estava maciçamente a favor da correção da tabela, deixou que o Congresso arrematasse a solução do caso.

A omissão do governo significou que o Congresso não teve à sua disposição os melhores técnicos para elaborar o projeto de lei que foi aprovado na virada do ano. O resultado foi um texto reconhecidamente imperfeito, que daria margem a uma enxurrada de ações judiciais. A solução encontrada pelo governo foi o veto ao projeto aprovado pelo Congresso e a edição de medida provisória, mantendo a correção de 17,5% da Tabela do Imposto de Renda e corrigindo as imperfeições do texto original.

Foi aí que o governo fez o gol com a mão, no último minuto da partida. Na medida provisória entrou de contrabando, fora do que estava combinado com os líderes partidários, um aumento de 1,08% para 2,88% da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das empresas prestadoras de serviços que declaram Imposto de Renda pelo lucro presumido. Segundo o ministro Pedro Malan e o secretário Everardo Maciel, o governo estava obrigado pela Lei de Responsabilidade Fiscal a aumentar impostos para cobrir a perda de receita.

De fato, a Lei de Responsabilidade Fiscal manda que qualquer renúncia fiscal - e a correção da tabela constitui renúncia, tecnicamente - tem de ser compensada. Mas pode ser compensada por corte de despesa, e não necessariamente pelo aumento de impostos - e, de fato, o governo está cortando R$ 1,67 bilhão para cobrir a diferença. Restaram R$ 188 milhões que o governo, na sua infinita esperteza fiscal, resolveu cobrir com o aumento da carga tributária, triplicando a alíquota de uma contribuição para que o Fisco arrecade, este ano, R$ 308 milhões adicionais - quase o dobro dos R$ 188 milhões que faltavam para f echar o orçamento equilibrado.

Resumo da partida: em termos fiscais, a correção da Tabela do Imposto de Renda não apenas deixará o governo nas mesmas condições em que iniciou o jogo, como também lhe garantirá um aumento de arrecadação - isso, se o gol com a mão não for anulado no tapetão da Justiça, pois existem claros sinais de inconstitucionalidade na medida provisória. O público pagante - que já contribui com mais de 35% do que ganha para o governo - será um pouco mais escorchado e com o pior tipo de tributo: aquele que incide perversamente sobre as pequenas e médias empresas, justamente as que mais empregam no País.


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01/10/2002


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