Uma coligação de dúvidas
Uma coligação de dúvidas
Aconfusão é grande no Congresso, mas nem mesmo os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) conseguiram chegar a um consenso sobre todos as conseqüências da decisão, tomada na última terça-feira, de uniformizar as coligações. Como a resposta à consulta feita pelo PDT em agosto passado se refere apenas a partidos que fizerem coligações para disputar a Presidência da República, os ministros divergem sobre o que será exigido da legenda que não tiver candidato próprio às eleições presidenciais ou não fizer parte de qualquer coligação nacional.
O ministro do TSE Sepúlveda Pertence, que votou na terça-feira contra a verticalização das alianças, entende que os candidatos de um partido que não formalizar aliança nacional também não poderia fazer coligação nos estados. Para ele, se o PMDB, por exemplo, não fizer aliança nacional, só poderá disputar os governos estaduais sozinho.
— Se o partido não se coligar nas eleições para presidente, vai ter que disputar sozinho nos estados — disse Sepúlveda.
Já o ministro Fernando Neves, favorável à uniformização das alianças, tem uma opinião diferente. Ele diz que a decisão do TSE daria ao PMDB, nessa hipótese, a liberdade de coligar-se a quaisquer partidos nos estados. E até mesmo fazer alianças diferentes em cada estado.
Dúvidas devem ser esclarecidas terça
A decisão do tribunal fará parte da resolução 55 do TSE, que vai tratar das regras para registro de candidaturas. A norma será publicada na próxima terça-feira, 5 de março, fim do prazo para se fixar as regras das eleições de outubro. Até lá, os ministros do TSE ainda terão de se entender.
O texto da decisão da terça-feira passada é curto e pouco detalhado. Diz apenas: "Os partidos políticos que ajustarem coligação para eleição de presidente da República não poderão formar coligações para eleição de governador/a de estado ou do Distrito Federal, senador/a, deputado/a federal e deputado/a estadual ou distrital com outros partidos políticos que tenham, isoladamente ou em aliança diversa, lançado candidato/à eleição presidencial".
Na sessão, por cinco votos a dois, venceu a tese de que a ação dos partidos tem caráter nacional e, por isso, as decisões devem sem obedecidas de cima para baixo.
Resolução proíbe desmembrar aliança
Mas nem mesmo existe a certeza de que os partidos terão o direito de desmembrar nos estados, livremente, uma aliança nacional. A proibição está explícita na resolução 20126, de março de 1998 do TSE. Segundo a resposta à consulta de número 382, seria impossível que uma ampla aliança nacional fosse desmontada aos pares. "Não é admissível pluralidade de coligações para a eleição majoritária (governador e senador). Se seis partidos constituírem coligação ao pleito para governador, não será viável, por exemplo, que apenas quatro dentre esses partidos políticos formem coligação diferente para a disputa majoritária do cargo de senador", diz a resolução.
Segundo a resposta à consulta de número 382, numa aliança entre A, B, C, D e E, não seria permitida a coligação entre A e B contra C, D e E. Mas apenas a saída isolada de um ou mais partidos da aliança maior. Num caso concreto, se o PSDB se aliar a PMDB, PPB, PTB e PFL para a disputa presidencial, todos terão de estar juntos na Paraíba, ou, no máximo, será autorizada a saída dos partidos do bloco isoladamente. O PMDB, por exemplo, poderia lançar sozinho Ney Suassuna. Mas não poderia levar junto o PFL e o PPB, como negocia hoje, deixando o PSDB com o PTB.
PTB já pensa em abandonar Ciro
BRASÍLIA. A candidatura de Ciro Gomes, pelo PPS, pode ser a primeira a ser desestabilizada pela decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de exigir a unificação das coligações. Um grupo de deputados e senadores do PTB quer rever a decisão do partido de se coligar com Ciro para que os trabalhistas fiquem liberados para fazer alianças nos estados. Pela nova norma, ao apoiar Ciro o PTB ficaria impedido de se coligar com o PSDB, o PMDB e o PFL, por exemplo.
Preocupado com a hipótese de ruptura da Frente Trabalhista (PPS-PDT-PTB), Ciro se reuniu ontem com o presidente do PTB, deputado José Carlos Martinez (PR), e marcou para segunda-feira uma reunião com os dirigentes dos três partidos da aliança para discutir a questão.
— É lamentável que um poder não político tenha determinado isso. Mas o princípio da verticalização das coligações é bom — afirmou Ciro, tentando aparentar tranqüilidade.
A despeito das garantias dadas por Martinez de que o PTB não vai abandonar Ciro, a situação estaria complicada em vários estados.
— Nossa disposição é manter a aliança, mas há situações dramáticas. Estamos fazendo um levantamento dos problemas — resumiu o secretário-geral do PTB, deputado Luiz Antônio Fleury (SP).
— Mantida a coligação nacional, o partido vai perder cadeiras na Câmara. O que dá visibilidade ao partido é a bancada na Câmara — argumentou o deputado Iberê Ferreira (RN).
PFL diz que candidatura de Roseana é definitiva e une todo o partido
BRASÍLIA. O PFL reuniu sua executiva ontem para reafirmar que, apesar da decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que impõe a uniformização das coligações, manterá a aposta na candidatura presidencial da governadora do Maranhão, Roseana Sarney, que está em segundo lugar nas pesquisas. O recado de que a candidatura de Roseana é definitiva foi para públicos específicos: a base partidária nos estados e para os ainda aliados PSDB, PMDB e PPB.
O presidente do PFL, Jorge Bornhausen, divulgou resolução de quatro pontos aprovada pela executiva: manifesta “total discordância” com a mudança de regra sobre as coligações; apela ao TSE para que mantenha as regras das eleições de 1998; informa que, se consumada a decisão do TSE, recorrerá com medidas legislativas e judiciais cabíveis; e afirma que “nada afastará o partido do seu apoio integral e definitivo” à candidata Roseana.
— Nossa candidatura presidencial não nos preocupa. A eleição de presidente se faz na base do voto e não das regras. E o partido está unido, com apoio integral e definitivo a Roseana. O que nos preocupa é a situação nos estados — disse Bornhausen.
Segundo o pefelista, não é possível avaliar ainda as dificuldades para as eleições de governador, senador e deputados. Ele diz que a mudança de regra causa transtornos não só ao PFL, mas a todos os partidos. No dia 7 de março, quando a resolução do TSE estará publicada, o comando fará reunião com os dirigentes estaduais pefelistas para analisar caso a caso.
Serra: “Tomara que me beneficie”
RECIFE. O pré-candidato do PSDB à Presidência, senador José Serra, disse ontem, após encontro com o governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos (PMDB), que ficou surpreso com a decisão do TSE de uniformizar as coligações. Ele disse que, até agora, não conseguiu prever as conseqüências da medida:
— Não saberia prever os efeitos da decisão do TSE sobre os partidos e sobre as eleições. Tomara que me beneficie, mas não tenho certeza se isso acontecerá.
O tucano lembrou que a consulta ao TSE foi feita por um integrante da oposição, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ):
— Acho que ninguém ligado ao ex-governador Leonel Brizola agiria para beneficiar um candidato do governo.
Serra acrescentou que concorda com o TSE, mas considera que, em ano eleitoral, a medida é extemporânea:
— Antes havia uma grande mistura. Agora, os partidos terão que fazer uma mesma amarração de ponta a ponta, o que seria correto. Mas, às vésperas da eleição, isso é um elemento que vira as coisas de pernas para o ar — disse.
Recepção de artista em curso de enfermagem
Em Olinda, o tucano participou da aula de encerramento de um curso de enfermagem. O convite fora feito quando Serra ainda era ministro da Saúde. Ele chegou discretamente, mas acabou saudado como artista: foi aplaudido, beijado, abraçado e teve que tirar fotos com as enfermeiras.
Garotinho já negocia candidatura de Rosinha
BRASÍLIA. Na tentativa de atrair o apoio do PMDB à sua candidatura a presidente, o governador do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho, acenou com uma proposta: retirar a candidatura de sua mulher, Rosinha Matheus, ao governo do Rio, lançada na véspera. Apontado quase que por unanimidade como o principal prejudicado pela decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que restringe as coligações partidárias, Garotinho está usando todas as armas de que dispõe para reagir. Ele procurou ontem o presidente nacional do PMDB, deputado Michel Temer (SP), e ofereceu apoio à candidatura de Sérgio Cabral Filho ao governo do Rio pelo PMDB desde que o partido apoiasse sua candidatura ao Planalto. Em troca, Rosinha retiraria sua candidatura.
— A Rosinha não pretendia disputar o governo, mas foi levada a mudar seus planos com a decisão do TSE. Mas deixou claro que pode apoiar o Sérgio Cabral se o PMDB fechar uma aliança nacional com o PSB — disse Garotinho.
Temer diz que decisão sobre aliança só depois das prévias
O presidente do PMDB avisou que o partido não poderá assumir qualquer compromisso antes do dia 17 de março, quando será realizada a prévia que escolherá um candidato próprio à Presidência. Mas a cúpula do PMDB não fechou as portas para negociações.
— Nossa aliança preferencial continua sendo com Serra mas, se isso não ocorrer, temos de ter outra opção — disse um interlocutor do PMDB.
Garotinho aproveitou o encontro com Temer para apresentar um mapa onde a aliança entre o PMDB e o PSB seria mais do que desejável: Rio, Santa Catarina, Espírito Santo, Bahia, Rio Grande do Norte, Alagoas, Ceará, Pará e Amazonas. Sua avaliação é de que o acordo com os socialistas seria mais palatável do que com o PFL, tendo em vista os problemas que os peemedebistas teriam com os pefelistas em alguns estados, entre eles Bahia e Santa Catarina.
Garotinho saiu otimista:
— Hoje (ontem) foi dia de abrir um canal de diálogo com o PMDB. Dentro de uma aliança tudo é possível. Se juntarmos nossos potenciais, poderemos ter um grande desempenho nas eleições.
Garotinho quase marcou encontro com Lula
Apesar de descartar a hipótese de abrir mão de sua candidatura, o governador do Rio admitiu a interlocutores que quase aceitou se encontrar ontem com o pré-candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva. A conversa entre os dois foi articulada pelo presidente nacional do PT, deputado José Dirceu.
Mas Garotinho acabou desmarcando a reunião depois da denúncia feita pelo deputado Jorge Bittar (PT-RJ) de que o governador estaria deixando um rombo nas contas do estado para a vice-governadora petista Benedita da Silva.
— Se fosse o Milton Temer ou o Chico Alencar, eu até entenderia. Mas o Bittar é uma pessoa ligada a você e ao Lula. Isso significa que vocês não querem dialogar — disse Garotinho ao ligar para Dirceu.
PT admite desistir do PL para tentar o PSB
BRASÍLIA. Está por um fio o sonho do pré-candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, de ter o senador José Alencar (PL-MG) como vice em sua chapa. A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de restringir as coligações partidárias nos estados pode afastar definitivamente o PT do PL, empurrando os petistas em direção ao PSB do governador do Rio, Anthony Garotinho.
O deputado Bispo Rodrigues (PL-RJ) adiantou ontem que, diante do novo quadro, seu partido não deverá apoiar formalmente nenhum candidato à Presidência. Essa situação só mudaria se Garotinho viesse a desistir da candidatura em favor de uma aliança com o PT. Ao mesmo tempo que reconhecem dificuldades para avançar na aliança com o PL, os petistas buscam um canal de diálogo com o PSB.
— Fica difícil a aliança com o PL. O alvo prioritário passa a ser o PSB — disse o senador José Eduardo Dutra (PT-SE), da executiva nacional do partido e um dos entusiastas da aliança com o PL.
Líder informal da bancada evangélica na Câmara, Bispo Rodrigues só vislumbra uma hipótese de o PL e o PT ficarem juntos: se Garotinho integrar a aliança.
— Com a chapa PT-PSB e PL, ninguém tira o governo da gente — disse Rodrigues.
Prevalecendo a decisão do TSE e Garotinho mantendo sua candidatura, Bispo Rodrigues descarta qualquer aliança formal a nível nacional:
— A solução é não ter candidato nacional e deixar o partido livre para fazer suas coligações em cada estado.
O presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto (SP), um dos principais articuladores da aliança com o PT, considera provável que o PSB acabe apoiando Lula:
— Com esse novo quadro, o PSB caminha para o lado de Lula — disse.
Cúpula petista está dividida em relação ao PL
O problema para levar adiante as conversas entre PT e PL será quebrar as resistências da cúpula petista, rachada em relação à aliança. O senador José Eduardo Dutra acha que há conexão direta entre a crítica do deputado Walter Pinheiro à proposta de emenda constitucional (PEC) do Senado para tentar anular a decisão do TSE e a possibilidade de o PT fechar aliança com o PL. No Senado, Dutra queixou-se do rótulo de casuísmo que Pinheiro atribuiu à PEC.
— Muitos estão detonando a proposta de emenda porque querem acertar melhor suas alianças no estado ou querem aproveitar para enterrar a possibilidade de aliança com o PL — queixou-se Dutra.
Visivelmente animados com a chance de abandonar o PL e voltar a conversar com o PSB, Pinheiro e a senadora Heloísa Helena não resistiram:
— É dez vezes melhor uma aliança com o PSB do que uma com o PL.
Artigos
Barreiras jurídicas a investimentos
Melhim Namem Chalhub
Afuga de investimentos do Brasil por causa de entraves jurídicos e administrativos, em torno de 10 bilhões de dólares por ano, segundo recente estudo do Banco Mundial, recomenda detida reflexão sobre nossa legislação relativa a segregação de riscos patrimoniais.
Com efeito, a segregação de riscos, mediante afetação patrimonial, possibilita ao investidor conhecer a medida de suas dívidas e obrigações, pois elas ficam limitadas ao negócio no qual investiu. Isso, obviamente, encoraja o investidor, pois pela afetação ele tem a garantia de que não responderá por dívidas estranhas ao negócio afetado.
Instituir uma afetação é estabelecer uma destinação específica para determinado bem, significando que ele não pode ser utilizado para outra finalidade. É o caso do bem de família: o proprietário de um imóvel pode afetá-lo para moradia da família e, por essa afetação, o imóvel só pode ser ocupado para essa finalidade e só pode ser penhorado por dívidas vinculadas ao imóvel (IPTU, empregados da casa etc), ficando imune às demais dívidas do proprietário.
A idéia se aplica às mais variadas formas de investimentos, como, por exemplo, os fundos de investimento. Para proteger os bens e as rendas dos investidores contra os riscos econômico-financeiros da empresa administradora, a lei determina que os direitos e as obrigações de cada fundo fiquem segregados num patrimônio de afetação, separado do patrimônio da administradora. Em razão da segregação, o risco que os investidores correm é o do negócio no qual investiram, não sendo atingidos pelos riscos da empresa administradora.
Os benefícios sociais desse mecanismo são evidentes, especialmente pelo aumento de arrecadação de impostos daí decorr ente e pela proteção de patrimônios sociais, como o FAT e o FGTS, além dos fundos de pensão em geral. Nos Estados Unidos, o meio utilizado para segregação de riscos é o trust, e isso certamente contribui para o desenvolvimento da economia americana.
No Brasil, a idéia está presente nos mais variados campos, sendo adotada para investimentos e garantias desde a estruturação do mercado de capitais, em 1965, pela lei 4.728/65. O atual governo adotou a afetação como instrumento de uma política de estímulo aos investimentos, estendendo-a ao direito societário, ao financiamento imobiliário, à securitização de créditos e a inúmeras outras relações jurídicas merecedoras de tutela especial.
Surpreendentemente, entretanto, a medida provisória n 2.158, na 35 edição, de 24.8.01, inverteu a política de segregação de riscos, pondo uma barreira jurídica no caminho dos investimentos.
Com efeito, de acordo com o art. 76 e seu parágrafo único dessa M P, os bens e as rendas dos patrimônios de afetação de qualquer natureza passam a ficar comprometidos com dívidas alheias, estranhas ao negócio afetado, isto é, dívidas fiscais, previdenciárias e trabalhistas da pessoa física ou jurídica (uma empresa administradora de um patrimônio alheio, por exemplo) que estiver exercendo uma propriedade sob afetação, mesmo que não seja beneficiária daquele patrimônio. Assim, as rendas de determinado patrimônio de afetação podem ser desviadas para pagar, por exemplo, débito de Imposto de Renda alheio, estranho ao negócio objeto da afetação.
A mudança de rumo surpreende mais ainda quando se verifica que não há nenhuma razão que justifique a colocação de novas barreiras. Em primeiro lugar, porque não há risco de perda de receita tributária ou previdenciária, nem de eventual diminuição dos direitos trabalhistas, pois todos esses direitos continuam preservados com a mesma preferência legal. Em segundo lugar, porque não há lacunas a preencher na legislação sobre fraudes, pois toda essa legislação incide sobre a afetação, de modo que, pela legislação já existente, se uma afetação for constituída em fraude perderá validade, do mesmo modo que, se uma hipoteca for constituída em fraude também perderá validade, um penhor etc. Em suma, a MP 2.158 sacrificou toda uma política de investimentos por nada.
No que tange ao bem de família, o impacto social é ainda mais grave, pois, ao negar efeito às normas sobre afetação “de qualquer natureza”, a MP 2.158/01 põe o bem de família em posição vulnerável em face de quaisquer dívidas fiscais, previdenciárias e trabalhistas, mesmo que não relacionadas com a moradia da família, colidindo com a lei 8.009/90, pela qual a moradia da família só pode ser penhorada para cobrança do IPTU, taxas e contribuições relacionadas ao imóvel, salários e contribuições previdenciárias dos trabalhadores da residência, entre outras exceções.
Talvez não haja saída para a família, para o pequeno investidor e para os fundos sociais, mas o grande investidor, este, ao ver-se impedido de identificar seus riscos, sairá mundo afora, em primeiro lugar, buscando mercados em que lhe seja “permitido” tomar conhecimento dos riscos que irá assumir e, em segundo lugar, realizando negócios em que seja obedecida a lógica universal dos direitos patrimoniais, ou seja, a elementar correlação entre direitos e obrigações — os direitos são limitados e as obrigações são, também, correlativamente limitadas.
Interessante é observar que o Brasil levanta essa barreira no exato momento em que os países da União Européia afastam barreiras para que a circulação do euro facilite o fluxo de capitais. Pode o Brasil dar-se ao luxo de desprezar investimentos que seriam capazes de impulsionar o desenvolvimento? Convém à sociedade pôr em risco a proteção patrimonial da família, dos fundos sociais e da economia popular?
O debate concentra-se no Congresso Nacional, ao qual cabe apreciar Projeto de Lei de Conversão da MP 2.158/01 e dar ao art. 76 e seu parágrafo o destino adequado.
Colunistas
PANORAMA POLÍTICO – Tereza Cruvinel
Maior a cobiça, maior a briga
A decisão do TSE sobre coligações deixou mortos e feridos. E em situação peculiar o PMDB, que se tornou mais cobiçado e ao mesmo tempo mais rachado. Na teoria conspiratória alimentada pelas vítimas, a medida teria o objetivo de garantir seu apoio ao PSDB e enfraquecer a candidatura do PFL, forçando a reunificação da aliança governista. No entanto, as contradições internas fortalecem a hipótese de, repetindo 1998, o PMDB não apoiar ninguém para presidente, podendo assim coligar-se à vontade nas eleições estaduais.
— Se fizermos isso, estaremos perdendo a chance de resgatar nossa condição de partido, defendendo um projeto nacional, e nos conformando com a condição de agrupamento — diz o presidente da Fundação Ulysses Guimarães, Moreira Franco, defensor de uma aliança com o PSDB.
Para Moreira, a possibilidade de o PMDB ficar ao largo da eleição presidencial para praticar a poligamia nos estados está sendo alimentada por adversários e pelos que internamente querem apenas servir-se do partido. Isso ocorreu em 1998, diz ele, porque a divisão impediu qualquer deliberação. Os que derrotaram a candidatura de Itamar Franco não conseguiram aprovar a coligação com o PSDB de FH.
Mas esse risco persiste, na medida que os defensores da candidatura própria, se derrotados, vão preferir apoiar Lula, Roseana e outros. Ajudados pelas contradições locais, podem novamente inviabilizar a aprovação de qualquer coligação oficial. Ontem mesmo um dos pré-candidatos do partido, senador Pedro Simon, avisava que se as prévias fracassarem, ele se apresentará à convenção de junho, quando as candidaturas e as coligações devem ser aprovadas oficialmente. Itamar e seus seguidores também não serão contemplativos.
A situação real aponta 14 estados em que a coligação com o PSDB de José Serra seria pacífica, como é o caso de Pernambuco e Bahia. Mas a mesma aliança é inimaginável no Ceará, entre os opostos Tasso Jereissati e Sérgio Machado; em Minas, entre Eduardo Azeredo e Newton Cardoso ou Itamar; em Goiás, entre Marconi Perillo e Íris Rezende; no Pará, entre Jader Barbalho e Almir Gabriel.
Num sinal de que decisão do TSE fez subir o valor do PMDB, Garotinho apresentou ontem sua proposta de aliança. Mas, em sinal de radicalização da divisão interna, os não-governistas decidiram fazer uma convenção própria no fim de semana.
Depois do terremoto, um grande silêncio. Os políticos foram às bases, mas de lá voltarão, semana que vem, trazendo a verdadeira reação ao maremoto produzido pelo TSE.
Sinais do Supremo
Embora a Câmara não esteja com o mesmo ânimo do Senado para aprovar uma emenda constitucional anulando a uniformização das coligações, ganhou corpo ontem a esperança de que o STF venha a derrubar a decisão. Baseiam-se, esses esperançosos, em sinais vindos do próprio STF, como as declarações sutis mas insinuantes do presidente, Marco Aurélio de Mello. Da visita que lhe fez ontem, saiu otimista o presidente do Senado, Ramez Tebet, que lhe antecipou o envio de uma ação direta de inconstitucionalidade.
Outros interlocutores têm a mesma percepção e parecem ter ouvido um argumento jurídico a que se deve prestar atenção: o de que a lei eleitoral de 1997 foi aplicada ao pleito de 1998 sem a interpretação agora dada. Alega o TSE que daquela vez não foi consultado. Ainda assim, haveria quem entenda, no STF, que o TSE deveria ter externado sua interpretação nas instruções que baixa antes de todo pleito, cujo prazo termina dia 5.. Seu papel seria zelar pela correta aplicação da lei, ainda que não provocado.
Mas esses são sinais captados por quem tem muito desejo de ver o STF anulando a decisão. Ao contrário do sexo dos bebês, cabeça de juiz continua sendo um mistério.
Pensando bem
Sob o primeiro impacto, todos acharam que Ciro Gomes seria o candidato menos afetado pela decisão do TSE, por já ter uma coligação com o PTB e o PDT. Agora está se vendo que, pelo contrário, corre sério risco de perder o apoio do PTB, que, para preservar as bancadas, teria que fazer coligações distintas nos estados.
Mau casamento
O quadro político nacional é uma soma das situações regionais. A coincidência entre as eleições presidencial e de governadores tumultua o processo e produz as coligações heterogêneas, ditadas pelo interesse regional. Logo que voltar à Câmara, o ministro Francisco Dornelles apresentará a emenda que já tem pronta suprimindo a nefasta coincidência.O grupo HSBC iniciou ontem uma parceria de 50 milhões de dólares com três organizações ambientalistas para apoiar projetos ao redor do mundo. No Brasil, serão investidos U$S 5 milhões no Programa de Conservação e Gestão de Água Doce.
O PT esperneia, mas no fundo tem o que agradecer ao TSE. Ninguém mais fala em aliança com o PL, em crise interna e em queda de Lula. Agora é jogo zerado.
O PFL, quem diria, também é capaz de uma divisão interna. A indignação dos dirigentes nacionais não tem a mesma intensidade da de Roseana Sarney.
OS TUCANOS foram politicamente corretos e afinados durante o terremoto causado pelo TSE. José Aníbal, Jutahy Júnior e Aécio Neves falam a mesma coisa: a medida tem sua virtude, mas atropelou o calendário eleitoral, principalmente por estar vencido o prazo de filiação partidária. Nem por isso vão para o confronto.
Editorial
PEQUENA CHAMA
Com um governo eleito de forma indireta para cumprir um mandato-tampão e sob pressão permanente das ruas, a Argentina precisa o mais rapidamente possível de uma blindagem institucional interna que possibilite ao país negociar a ajuda internacional. Tal apoio é indispensável para que a Argentina não continue na direção de uma depressão econômica calamitosa, quadro que deve ser evitado de todas as maneiras, pois significará ainda mais sofrimento para o povo argentino e instabilidade no continente. Não existe fundo do poço nesse tipo de crise.
Sem um arcabouço institucional que viabilize a governabilidade, dificilmente o Fundo Monetário Internacional ou o G7 (grupo dos países mais ricos) estarão dispostos a liberar recursos para o país. Em termos relativos, nossos vizinhos acumularam os mais elevados percentuais de endividamento externo do planeta, e desse modo não estarão aptos a contrair novos empréstimos a não ser que provem real capacidade de recuperar a economia.
E essa recuperação não seria possível com os governadores das províncias batendo pé firme para obter do governo federal repasses de verbas incompatíveis com a realidade do país. O sistema tributário centraliza nas mãos do governo federal grande parte da arrecadação, mas, diferentemente do Brasil, a participação das províncias nessa receita não era proporcional ao valor dos impostos recolhidos mês a mês.
Para se proteger contra essa centralização, as províncias asseguraram no passado o direito de receber uma quota fixa. Dessa forma, se a arrecadação caísse em decorrência da política econômica, o custo seria somente do governo federal. Porém, diante da gravidade da crise no momento, o cumprimento dessa regra não é mais factível. Os calotes têm se sucedido. Muitos governadores parecem insistir em ignorar a realidade: essa crise não é do governo federal, nem de uma facção política, mas sim do país. Sem uma solução de ordem geral, ninguém terá condições de se safar por conta própria. Daí que o acordo agora firmado com o governo federal, pelo qual todos passam a ser solidários na distribuição da receita tributária, acende uma pequena chama de esperança.
Topo da página
03/01/2002
Artigos Relacionados
PPB e PFL estudam coligação
PPB e PSDB não farão coligação
PT e PL negociam os termos da coligação
CCJ vota fim de coligação em eleições proporcionais
Vai ao Plenário fim de coligação em eleições proporcionais
Arraes e Humberto analisam coligação