ACM afirma preferir Lula a Serra
ACM afirma preferir Lula a Serra
O ex-senador e candidato ao Senado pelo PFL da Bahia, Antonio Carlos Magalhães, afirmou ontem que não existe a menor possibilidade de apoiar o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, em uma eventual disputa de segundo turno contra o petista Luiz Inácio Lula da Silva. ‘‘Se forem os dois (Lula e Serra), minha preferência pessoal é pelo Lula, embora possa não ser a preferência do meu partido’’, disse ACM. Ele disse acreditar, no entanto, que Ciro Gomes (PPS) disputará o segundo turno contra Lula. Embora não faça parte da coligação oficial, a direção do PFL apóia o candidato da Frente Trabalhista (PPS-PTB-PDT).
Perguntado sobre denúncias contra o vice de Ciro, o sindicalista Paulo Pereira da Silva, acusado de desvio de recursos do Banco da Terra no período em que presidia a Força Sindical, ACM evitou defendê-lo. ‘‘Paulinho tem o direito e a obrigação de se defender, de comprovar que não tem nada a ver com esse fato. Se demonstrar sua inocência, sai fortalecido. Se não, fica ruim para ele’’, comentou. E se ficar ruim para ele, perguntou o repórter. ‘‘Aí é um problema para o Ciro resolver. Não me meta nisso’’.
Em Guanambi, a 600km de Salvador, ACM foi alvo preferencial de aliados de Serra em comício no domingo à noite.. ‘‘Os baianos estão vivendo na miséria. Tenho a convicção de que esse estado não está no rumo certo’’, disse o líder do PMDB na Câmara dos Deputados, Geddel Vieira Lima (BA). ‘‘Chega de obras de fachada’’, acrescentou. Menos enfático, Serra disse que vários empreendimentos que beneficiaram a Bahia não foram realizados pelo governo estadual, mas sim pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. ‘‘Sem discriminar, Fernando Henrique fez muito pela Bahia’’, discursou. ‘‘Muitas vezes, a população não sabe que foi a gente que fez.”
Ciro é forte nos estados com a ajuda de pefelistas
O candidato do PPS e José Serra são os presidenciáveis que contam com o maior número de candidatos a governador na liderança das pesquisas
A disputa voto a voto entre os candidatos do PSDB, José Serra, e do PPS, Ciro Gomes, reflete-se nas eleições nos estados. Em queda nas pesquisas, Ciro ainda conta com candidatos fortes ao governo para manter-se na briga por uma vaga no segundo turno. Ele e Serra são os candidatos a presidente que têm o maior número de candidatos a governador na liderança nas pesquisas de intenção de voto. Dono da aliança política mais forte nessas eleições, Serra tem uma vantagem. Mas Ciro, em boa parte graças ao apoio que obteve do PFL, tem uma situação muito melhor do que poderia imaginar inicialmente um candidato de um partido pequeno como o PPS.
Em quatro estados, candidato do PPS tem palanques muito sólidos, com candidatos que devem vencer as eleições no primeiro turno. É uma grande vantagem. Nesses estados, subirão em seus palanques provavelmente governadores eleitos. E a ausência de disputa local diminui o ânimo da militância adversária. Um dos prováveis eleitos de Ciro é do PPS: Eduardo Braga, que lidera com folga as pesquisas no Amazonas. Graças ao PFL, Ciro também terá vitórias no primeiro turno na Bahia, com Paulo Souto, e em Sergipe, com João Alves. E o apoio do ex-governador cearense Tasso Jereissati deve colocar um governador eleito do PSDB no palanque de Ciro: Lúcio Alcântara.
Serra critica política econômica do governo
Candidato do PSDB elogia Pedro Malan mas diz que o Ministério da Fazenda não prioriza a geração de emprego. O tucano também põe em dúvida o modelo adotado para a privatização do setor elétrico, que deverá sofrer mudanças no futuro
Rio — O candidato da Grande Aliança (PSDB-PMDB) à Presidência da República, José Serra, criticou ontem a política econômica, de geração de empregos e até, em parte, de privatizações do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, que lançou a sua candidatura e a sustenta. Na primeira entrevista da série com os presidenciáveis na sede do jornal O Globo, o tucano afirmou que o crescimento da economia e a criação de postos de trabalho não foram prioridades do governo federal e reconheceu que a privatização do setor elétrico não deu certo. A falta de energia provocou racionamento no país.
‘‘A política de crescimento não esteve no centro da política econômica, (com) a expansão do emprego, como vai estar agora’’, declarou o candidato. Ele enumerou outras duas razões para a falta de emprego no país: turbulências da economia, como a crise russa, e o crescimento da população. Serra defendeu o que chamou de ‘‘alívios’’ para as empresas, possibilitando a cobrança das obrigações sociais não totalmente sobre a folha de pagamento, o que encarece a criação de empregos formais. ‘‘A pessoa custa (para a empresa) o dobro e recebe a metade’’, afirmou. ‘‘Nossa batalha é para criar 8 milhões de empregos formais.’’
O tucano também voltou a criticar a sobrevalorização do câmbio, de 1995 a 1999, explicando que a defendera como política inicial, não permanente, para evitar a inflação, mas elogiou pessoalmente o ministro da Fazenda, Pedro Malan, como ‘‘pessoa íntegra’’. O candidato afirmou também que a divergência em relação à política econômica foi sanada com a adoção do câmbio flexível. ‘‘A diferença é em relação a políticas mais deliberadas de crescimento’’, afirmou. Malan e a equipe econômica são contrários a qualquer tipo de política industrial ou de proteção a empresas brasileiras.
Questão complexa
O ex-ministro elogiou a privatização dos setores de telecomunicações, siderúrgico e petroquímico, mas disse que, no caso da área de eletricidade, a questão é mais complexa, por envolver geração, transmissão e distribuição. Ele contou que presidiu o Conselho Nacional de Desestatização por um ano e cinco meses, período no qual exigiu um modelo para o setor de energia. Até a sua saída, esse projeto não foi apresentado. ‘‘Acho que na área de elétricas a privatização não foi bem feita’’, disse. ‘‘Ficou no meio do caminho e isso vai ter que ser equacionado no futuro’’.
Sobre sua proposta de política industrial, que é apontada por especialistas como retrocesso e que criaria benefícios para um grupo de industriais, em geral paulistas, o tucano disse que é necessário substituir importações para diminuir o déficit externo e possibilitar a queda dos juros básicos da economia. ‘‘Houve (no governo FHC) uma medida de política industrial muito forte em relação à indústria automobilística, e você lembra que eu fui o (seu) principal defensor’’, disse. ‘‘Essa medida não só equilibrou a balança do setor, aumentou sua eficiência e descentralizou a indústria. ‘‘Na época, disseram: O Serra está fazendo isso para defender São Paulo. Quando na verdade a indústria foi descentralizada, foi para o Paraná, o Rio Grande do Sul.’’
Estevão pede registro
Cassado há dois anos, ex-senador alega que não está mais inelegível e tenta formalizar candidatura no TRE. Para especialistas, chances são remotas. Procurador diz que pedido é afronta ao país
O empresário e ex-senador Luiz Estevão decidiu tumultuar o processo eleitoral do Distrito Federal. Faltando menos de um mês para a votação em primeiro turno, ele protocolou, no final da tarde de ontem, um pedido de registro de candidatura ao Senado no Tribunal Regional Eleitoral do DF (TRE). O ex-senador, cassado em junho de 2000 por quebra de decoro parlamentar e declarado inelegível até 2014, garante que tem argumentos jurídicos para sustentar sua candidatura. Até que ela seja julgada em última instância, Estevão terá pelo menos 20 dias para fazer campanha e pode ter o nome incluído na ur na eletrônica.
O candidato ao Senado pelo PTN, Milton Cintra, renunciou à candidatura para abrir caminho a Luiz Estevão. No pedido de registro do empresário, Cintra consta como suplente. Eles foram pessoalmente ao TRE, por volta das 17h de ontem, acompanhados de advogados e de Marcos Arruda, candidato a vice-governador de Benedito Domingos (PPB). O pedido de registro foi imediatamente encaminhado ao juiz Amaro Senna, relator do processo.
‘‘A partir de agora, já posso fazer campanha’’, comemorou o ex-senador. Mas isso só acontecerá se o juiz der prosseguimento ao pedido (leia quadro). Desde o início do horário eleitoral gratuito, no mês passado, Estevão aparece em todos os programas da coligação Brasília com Respeito, a que o PTN pertence, no espaço cedido por Milton Cintra. Ontem à tarde, horas antes de pedir o registro, ele apareceu na TV dizendo: ‘‘O primeiro candidato ao Senado é Frejat. O segundo, vocês vão conhecer em breve.’’
O argumento jurídico usado por Estevão para justificar o pedido de candidatura é uma analogia sobre dispositivos diferentes da Lei Complementar 64, de 1990, que trata da inelegibilidade. Segundo essa lei, entre as causas que tornam um político inelegível estão a cassação de mandato e a rejeição de contas por tribunais de contas estaduais ou pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Ambas são decisões de órgãos do Poder Legislativo.
‘‘No caso da rejeição de contas, a inelegibilidade é imediatamente suspensa se houver recurso ao Poder Judiciário. Por analogia, isso também se aplica no caso da cassação de mandato, já que também se trata de ato do Poder Legislativo’’, explica o empresário. Nesse raciocínio, Estevão afirma que sua inelegibilidade foi suspensa quando ele apresentou um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo a anulação da sessão do Senado que cassou seu mandato. O mandado ainda não foi julgado pelo tribunal.
O argumento, no entanto, é rechaçado pelo Ministério Público Eleitoral. Na semana passada, ao ser procurado por advogados de Estevão, o procurador regional eleitoral do DF, Antônio Carneiro Sobrinho, afirmou que ‘‘não gastaria nem duas folhas de papel para desmontar totalmente essa tese’’. A notícia do pedido de registro irritou também o procurador eleitoral Franklin Rodrigues da Costa. ‘‘É uma afronta às instituições do país. Ao Senado, que cassou o mandato, e à Justiça Eleitoral.’’
Juristas ouvidos pelo Correio — o especialista em Direito Eleitoral Ney Teles, autor do livro ‘‘Novo Direito Eleitoral’’, e um ministro do TSE que preferiu não se identificar — também derrubam os argumentos do ex-senador. Segundo eles, a analogia feita por Estevão é pura balela. ‘‘Essa comparação não existe. As decisões de tribunais de contas e do Senado Federal são completamente diferentes. Uma tem caráter administrativo. A outra, político’’, explica Teles.
Ele acrescenta que uma decisão de Tribunal de Contas pode ser revista pelo Judiciário, mas o mesmo não se aplica à cassação de mandato. Para o ministro do TSE, é quase impossível que Luiz Estevão consiga o registro de candidatura. ‘‘O que ele quer é fazer barulho, chamar atenção’’, disse.
PRÓXIMOS PASSOS
O juiz eleitoral Amaro Senna, relator do pedido de registro de candidatura de Luiz Estevão, tem dois caminhos a seguir. Ele pode rejeitar o pedido e arquivar o processo. Nesse caso, o assunto não será apreciado pelo TRE e Estevão terá de recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Se ele der prosseguimento ao processo, o Ministério Público Eleitoral e os partidos do DF terão cinco dias para pedir a impugnação da candidatura. O pedido será apreciado em plenário. Se for concedido, Estevão poderá ter o nome incluído nas urnas eletrônicas como candidato ao Senado ou — se as urnas já estiverem lacradas — receber votos no lugar de Milton Cintra (PTN). Se o pedido for negado, ele poderá recorrer ao TSE e ao STF.
Roriz silencia sobre saída
O governador Joaquim Roriz (PMDB) se calou sobre o desafio da deputada distrital Maria José Maninha (PT) de abrir mão da presidência da Câmara Legislativa, se essa for a condição para o candidato à reeleição se licenciar do cargo. A parlamentar firmou o compromisso depois que o governador admitiu a possibilidade de recuar da promessa se o seu afastamento significar passar o controle da Câmara para a oposição.
‘‘O governador está à margem dessa celeuma feita na Câmara. Ele mantém o que disse, mas espera o momento certo para tomar uma decisão, sem ceder a pressões’’, disse o secretário de Comunicação, Weligton Moraes.
No dia 14 de agosto Roriz prometeu deixar o cargo. A decisão foi tomada depois que o vice-governador Benedito Domingos (PPB) garantiu não assumir o GDF em caso de licença do governador. O afastamento de Roriz teria início na próxima quinta-feira, mas no último sábado o candidato à reeleição informou estar enfrentando ‘‘problemas jurídicos’’ para deixar o cargo.
Os problemas levantados por assessores jurídicos do governador são a perda de dois deputados da base do governo e a possibilidade de a presidência da Câmara ser ocupada por Maninha. Na avaliação dos advogados de Roriz, os deputados Gim Argello (PMDB) e Edimar Pireneus (PTB), presidente e vice-presidente da Câmara, teriam de abandonar os mandatos para não assumir o governo. Os dois ficariam inelegíveis se sucedessem Roriz.
Sem os parlamentares, a bancada do governo ficaria com 15 deputados, número insuficiente para aprovar a licença do vice-governador Benedito Domingos. Além disso, a deputada Maninha, 1ªsecretária da Câmara, poderia assumir a presidência.
Sem argumentos
Roriz aguarda uma análise jurídica definitiva do assunto para se decidir. Advogados de concorrentes do governador, porém, contestam os argumentos utilizados para justificar uma eventual desistência do candidato à reeleição de se afastar do governo. ‘‘Não tem base jurídica. O Benedito não precisa de licença para deixar de assumir o governo e nem o Gim e o Pireneus têm de abandonar os cargos. Basta que eles manifestem que não pretendem suceder o governador’’, defendeu Herman Ted Barbosa, advogado do PPB.
O advogado citou consulta feita pelo presidente da Câmara dos Deputados, Aécio Neves, ao TSE. No documento, os ministros responderam que o deputado não precisaria acompanhar o presidente Fernando Henrique em viagens internacionais para não assumir o cargo. Bastaria declinar de substituir o presidente.
Ligações suspeitas
Envolvimento da Força Azul, grupo formado por apoiadores de Joaquim Roriz, na falsificação de urnas eletrônicas será investigado pelo Ministério Público Eleitoral. Suspeita foi levantada após apreensão de equipamentos em São Sebastião
O envolvimento de candidatos na fabricação e distribuição de urnas eletrônicas falsas, usadas para ensinar os eleitores a votar, será investigado pelo Ministério Público Eleitoral. A principal pista que aponta essa ligação é o depoimento de uma das pessoas detidas durante a apreensão de urnas falsificadas em São Sebastião, na semana passada. Ela disse ser integrante da Força Azul — grupo criado há pouco mais de um ano por apoiadores do governador Joaquim Roriz (PMDB).
Os integrantes da Força Azul são peças importantes na estratégia de reeleição do governador. A missão deles é bater de porta em porta, divulgar as qualidades de Roriz e convencer o eleitor a se inscrever no grupo. Na ficha de inscrição é necessário colocar o número do título de eleitor e identificar a seção onde vota. Agora, a Força é suspeita de participar do esquema de urnas falsas e de ensinar o eleitor a votar nos candidatos do governo.
O procurador eleitoral Antônio Carneiro espera a conclusão do inquérito da Polícia Federal, que investiga o caso, para apresentar representação contra os políticos que tiverem indícios de envolvimento. Carneiro enviou, ontem, à Superintendência da PF um ofício pedindo dedicação exclusiva do delegado Giácomo Santoro ao inquérito.
“Estou à espera de elementos para tomar as providências. Estou correndo atrás deles no inquérito aberto pela PF”, disse o procurador. Se as investigações apontarem o nome do responsável pela compra e uso das urnas, ele pode responder a processo por abuso de poder econômico. A pena para o candidato é a inelegibilidade.
Para a PF já foi enviado o depoimento de André Luiz Silva de Moura, apontado como o dono de duas urnas apreendidas em São Sebastião na última quinta-feira. Ele disse ser da Força Azul.
No comitê central de Roriz, no SIA, há representantes da Força Azul que atendem o telefone para prestar informações. O próprio presidente regional do PMDB, Divino Alves, aponta o comitê como local para obter mais detalhes sobre o grupo. Mas ele faz questão de desvincular a Força do partido. ‘‘É um grupo específico de apoiadores do governador. Entre eles, pode até haver um peemedebista. Mas essa é uma força que atua de forma independente.’’
Um dos organizadores do grupo, que fundou até uma ONG pró-Roriz, é o ex-presidente do Instituto Candango de Solidariedade (ICS) Wiliam Cavalcante — nomeado diretamente por Roriz. Ele foi procurado ontem pelo Correio e não foi localizado.
Apreensão
A suspeita de ligação da Força Azul com as urnas clandestinas foi levantada depois que os agentes da 30ª DP encontraram as máquinas falsas na casa do desempregado José Edmilson Lopes de Oliveira, 33 anos, na quadra 203 de São Sebastião. Em depoimento, José Edmilson disse que André Luiz esteve na casa dele, e se ofereceu para ensinar à sua família como votar na urna eletrônica.
Na ‘‘aulinha’’, o que se ensinava era votar em Roriz para governador, Paulo Octávio (PFL) e Jofran Frejat (PPB) para o Senado, em José Roberto Arruda (PFL) para deputado federal e em Durvalino da Silva (PPB) para distrital. Para presidente, o voto era para José Serra (PMDB).
André Luiz Silva de Moura foi identificado como um jornalista de 42 anos. Ele afirmou aos policiais da 30ªDP que faz parte da Força Azul e tentou justificar a ilegalidade: ‘‘A Justiça Eleitoral falha na hora de ensinar os eleitores a votar. De cada dez pessoas, quatro erram.’’ Segundo o delegado Nivaldo Oliveira da Silva, André negou ser vinculado a partidos.
O porta-voz de Roriz na campanha, Weligton Moraes, disse que o governador não pode ser responsabilizado por atos de grupos independentes que o apóiam. ‘‘Não há orientação alguma da coordenação de campanha para atos ilegais como esse. Esses movimentos como Força Azul são voluntários e independentes. O governador quer que se apure e que sejam responsabilizados os culpados, mesmo que sejam seus apoiadores.’’
Artigos
Agora ou jamais
Jarbas Passarinho
Há quem diga ter ouvido de Lula que, se não vencer desta vez, encerrará sua carreira política. Não respondo pela fonte, mas há na conduta do maior líder que os trabalhadores tiveram, em qualquer tempo, uma conduta perfeitamente verossímil com a versão. Deve realmente estar jogando a última cartada. Daí as mudanças surpreendentes. Nem de longe é aquele ardoroso orador das portas das fábricas convocando para as greves, desacatando as decisões do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, cuja legitimidade não reconhecia. Creditam-lhe bravura por essa rebeldia, pelo desacato intencional, mas pacífico, à lei. Quando Lula iniciou a desobediência civil, já a Emenda Constitucional nº 11, de 13 de outubro de 1978, havia revogado o AI-5 e todas as medidas de exceção. Os que dizem hoje que Lula foi preso e ‘‘perseguido pela ditadura’’ faltam à verdade, deturpam a história. A imprensa era livre e o Congresso ativo. Vigente, contudo, era a lei de greve, que o deputado Ulysses Guimarães relatou em junho de 1964. Desrespeitada sistematicamente a lei, o ministro Macedo interveio no sindicato de Lula, que perdeu a imunidade sindical. Servindo-se da lei, o patrão o demitiu. Graças a isso, Lula desfruta hoje de uma aposentadoria do INSS, superior a R$ 2.000, a título de ressarcimento por perseguição e demissão despótica.
Tudo hoje deveriam ser páginas viradas na história, o Brasil reconciliado pensando no presente e no futuro, se a anistia tivesse sido recíproca. Porque Lula já não é mais o mesmo carbonário das portas das fábricas, di-lo amestrado um concorrente à Presidência, que foi ‘‘amestrador’’ no regime militar. Um renegado, devem julgá-lo os nanicos da Causa Operária e do PSTU, que ainda pregam o ódio da luta de classes, a suspensão do pagamento da dívida externa e um salário mínimo de 1.500 reais. Ressentidos ficam os radicais do PT da linha ‘‘socialismo ou barbárie’’. Magoada deve ter ficado sua aliada CNBB, por não ter o PT aderido ao ‘‘plebiscito’’ de condenação da Alca, pois ‘‘o PT não deve ficar brincando de plebiscito’’... Até sobre o FMI, a visão demoníaca já não é a mesma. Limita-se a preservar a idolatria por Fidel Castro, do que não abre mão, e a simpatia por Chávez, nutrido por um antiamericanismo que lembra Gabriela Mistral: ‘‘Temos grande amor por nossa língua e uma permanente suspeita quanto às intenções dos Estados Unidos’’.
Algo surpreendente, porém, é a reação causada às recentes declarações de Lula sobre o período militar, feita por quem se desconhece que perigo correu no autoritarismo mas é quase certo ter freqüentado os gabinetes do poder à época. Ora, o que Lula disse é a verdade. De fato sob Médici ‘‘vivemos o maior boom de empregos da história a um crescimento (do PIB) de 10% ao ano’’, e nos tempos dos militares houve planos nacionais de desenvolvimento. Podem merecer reparos, mas os dois PNDs, sucessivamente nos governos Médici e Geisel, foram congruentes, harmônicos, asseguraram crescimento sustentado e nos colocaram na oitava economia do mundo. A crítica candente recaía sobre a má distribuição de renda. Hoje, caímos da oitava para a décima primeira economia do mundo, com a pior distribuição de renda. Os ressentidos não se conformam com a verdade expressada por Lula. Esquecem que, dos guerrilheiros comunistas e terroristas, raros eram trabalhadores. Na constituinte, o deputado Genoíno destacou-se no bom relacionamento com os militares, o que mantém até hoje. E foi um guerrilheiro prisioneiro dos militares no Araguaia. Não guarda o mesmo rancor dos que provavelmente nunca pegaram em armas para defender convicções — se é que as têm — e só servem para nutrir a cizânia.
Estaria Lula se inspirando na advertência de Miguel Arraes, no exílio, quando disse que o erro deles em 1964 foi terem combatido os militares, em vez de cooptá-los, dadas as múltiplas identidades nacionalistas, exceto o comunismo?
Editorial
URNAS CLONADAS
O derrame de urnas falsas no Distrito Federal constitui fato inquietante. Em primeiro lugar, por ser crime. Apenas a Justiça Eleitoral, segundo determinação do TSE, pode utilizar simuladores para ensinar os eleitores a usar a urna eletrônica. Ninguém mais.
Em segundo lugar, por sugerir nomes de candidatos a presidente, governador, senador e deputado federal ao pleito de outubro. Na simulação legal, os nomes são fictícios, em geral de personalidades mortas.
Mais. É uma incógnita o número de engenhocas fabricadas e distribuídas na capital da República. Até quinta-feira, seis aparelhos ativos foram apreendidos em Brazlândia, Sobradinho, Ceilândia e São Sebastião. Antes, 80 carcaças tinham sido encontradas no Lixão da Estrutural — prova da escala que a produç ão vem alcançando.
Ao tomar conhecimento do episódio, o procurador eleitoral do Distrito Federal, Antônio Carneiro Sobrinho, declarou ser esse o mais grave caso de falsificação eleitoral de que teve notícia. A pena para o crime, segundo o Código Eleitoral, é de até três anos de prisão e, dependendo das circunstâncias, a perda do mandato.
Apesar da gravidade de que se reveste, porém, a fraude eletrônica não vem merecendo a atenção devida das autoridades competentes. A polícia do Distrito Federal não só se negou a investigar o caso, mas também mandou jogar no lixo os componentes localizados. Agora, as averiguações passaram à alçada da Polícia Federal.
O mau exemplo do Distrito Federal mostra que a informática não é fortaleza inexpugnável. Acende a preocupação de que possam ocorrer fraudes mais amplas no processo eleitoral. Fala-se no risco de que sejam usadas urnas clonadas em algumas seções enquanto as verdadeiras estejam sendo alimentadas com votos falsos.
Seria a adaptação tecnológica de velhas práticas. Na República Velha, antes de 1930, as eleições eram feitas em livros — as famosas atas, em que o eleitor assinava o nome e consignava o voto por escrito. Os fraudadores substituíam os livros verdadeiros por outros nos quais imitavam a assinatura dos eleitores e elegiam quem quisessem, geralmente candidatos do governo.
Em 2002, o Brasil não pode voltar aos velhos tempos da eleição a bico de pena. Nenhuma suspeita pode pairar sobre a lisura do pleito. Daí a urgência de jogar luz sobre o episódio. Apurar os fatos não se apresenta tarefa difícil. A polícia sabe quem distribuiu as urnas e tem os meios para chegar aos responsáveis. Só não terá êxito no processo se lhe faltar vontade e determinação.
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09/10/2002
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