Britto e Tarso disputam hegemonia no Sul
Britto e Tarso disputam hegemonia no Sul
Polarizados, candidatos do PPS e do PT ao governo gaúcho investem no interior do Estado e trocam acusações
Mesmo sustentando a retórica da humildade e do respeito aos demais concorrentes, os candidatos ao governo do Rio Grande do Sul Tarso Genro (PT) e Antônio Britto (PPS) já vivem clima de segundo turno, em uma disputa acirrada e polarizada.
As estratégias de campanha terão costuras políticas e busca de apoio pelo interior do Estado. Ambas as coordenações de campanha vêm conversando com prefeitos de todos os municípios, independentemente do partido.
Segundo pesquisas locais, Britto e Tarso se alternam na liderança da corrida eleitoral, sempre acima da casa dos 30% das intenções de voto -na semana passada, levantamento de instituto da Universidade Federal do Rio Grande do Sul dava 38,8% a Britto, contra 31,7% de Tarso. Juntos, os outros candidatos não chegam a 15%.
Dois líderes já estão tendo atenção especial por parte de Britto e Tarso: o senador Pedro Simon (PMDB) e o ex-governador Leonel Brizola (PDT).
No caso de Britto, a tática é a da omissão -não responderá a ataques que os dois caciques lhe desfiram, diz seu coordenador de campanha, o deputado federal Nelson Proença. No de Tarso, é ação. ""Falamos vagamente com Simon. Com Brizola, conversaremos. Haverá horário próprio para isso", diz o coordenador da campanha de Tarso, o presidente regional do PT, David Stival.
Tarso também quer evitar que os demais candidatos, José Fortunati (PDT), Germano Rigotto (PMDB) e Celso Bernardi (PPB), unifiquem o discurso anti-PT. Já Britto conta com isso para amealhar mais apoio num eventual segundo turno.
Para atingir no interior do Estado a mesma popularidade que tem em Porto Alegre e na região metropolitana, Tarso aposta em pelo menos três caravanas temáticas. A primeira será a da agricultura, nas Missões, zona sul do Estado e serra; a segunda será sobre desenvolvimento econômico, em Porto Alegre, região metropolitana e serra. A terceira, sobre políticas sociais, visitará cidades como Soledade e Lajeado. Outras poderão ser feitas.
A preocupação de Britto também está no interior e visa a corrigir erros do passado, quando prefeitos eram menosprezados pelo então governador e candidato à reeleição. Por conta disso, ele perdeu popularidade. ""Em primeiro lugar, quando chegamos aos municípios, visitamos os prefeitos, sejam de que partido eles forem. É uma cortesia", diz Proença.
"Fiz o feijão-com-arroz", diz marqueteiro de Ciro
Publicitário acha errado colocar o candidato "para chorar"
Ao reduzir as chances de um segundo turno entre governo e PT, dado como provável até semanas atrás, o crescimento de Ciro Gomes (PPS) na disputa presidencial ameaça cancelar o embate final entre Nizan
Guanaes e Duda Mendonça, marqueteiros responsáveis, respectivamente, pelas campanhas de José Serra (PSDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em escalas diferentes, os candidatos das duas estrelas do marketing político experimentam refluxo nas pesquisas.
Enquanto isso, opera na campanha de Ciro um publicitário de perfil mais discreto. Einhart Jacome da Paz, 48, não se manifesta publicamente sobre estratégia, sua ou dos adversários.
Mas se permite uma estocada ao dizer que não vai pôr "Ciro para chorar ou fazer hino com todo mundo cantando". E outra ao observar que, "quando marqueteiro vira transformador do sério em sorridente e do informal no bem vestido, isso nada tem a ver com o trabalho e nos dá péssima fama".
Casado com a única irmã de Ciro (o candidato tem ainda três irmãos), Paz começou a trabalhar em política com alguns comerciais para as Diretas-Já.
Fez a primeira campanha de Tasso Jereissati para o governo do Ceará (1986) e as de Ciro para a Prefeitura de Fortaleza (1988) e a sucessão de Tasso (1990).
Trabalhou na primeira eleição de FHC (1994). No ano passado, conseguiu vitórias em duas campanhas para o PSD em Portugal.
Na entrevista abaixo, concedida no início da noite de sexta-feira, o publicitário afirma que os analistas superestimam o papel de Patrícia Pillar no movimento ascendente de Ciro, em detrimento de qualidades do candidato.
E prevê insucesso aos que tentarem derrubá-lo por meio da associação com Fernando Collor de Mello. Paz toma emprestado a saga de "Guerra nas Estrelas" para pontuar diferenças entre os dois políticos: na percepção do eleitor, o ex-presidente teria as características de Darth Vader, e Ciro, de Anakin Skywalker, o mesmo personagem quando jovem, antes de ser tentado pelas "forças do mal".
Folha - Há pouco mais de um mês, adversários e comentaristas diziam que os programas de TV de Ciro não tinham a qualidade técnica dos de Lula e Serra. À luz do que indicam agora as pesquisas, como o sr. analisa essas críticas?
Einhart Jacome da Paz - Campanha política deve visar eficiência, não pirotecnia. Fiz o feijão-com-arroz. Procurei transmitir, de forma simples e até um tanto repetitiva, a biografia do Ciro.
Sabíamos que o eleitor se lembrava dele, mas desconhecia sua trajetória ou havia se esquecido dela. Então os programas tinham de contar, sem mirabolâncias, onde ele nasceu, onde se criou, o que já fez e o que pretende fazer.
Não vou colocá-lo para chorar, não vou fazer hino com todo mundo cantando. Meu objetivo é comunicar que ele tem capacidade para ser presidente da República. E essa idéia é crível.
Folha - Ciro, como os demais antes dele, subiu por causa da TV?
Paz - No primeiro momento, sim. Só que os programas partidários terminaram há um mês, e a curva dele permanece ascendente. Isso ocorre porque a informação era boa, não tinha penduricalho para ficar mais bonitinha.
Folha - Olhando em retrospecto, o empenho dos tucanos para tirar Ciro do ar e a consequente entrada em cena de Patrícia Pillar foram benéficos à campanha?
Paz - É difícil avaliar. Em pesquisa feita muito antes dos programas, entrevistados, especialmente mulheres, diziam que achavam bonito o fato de o Ciro ter se afastado da campanha, no final do ano passado, para cuidar da Patrícia quando ela esteve doente. Outros reclamavam, achando que ele não estava suficientemente interessado na eleição.
Acho que a aparição da Patrícia pode ter significado, para muita gente, algo como "olha, ele esteve fora por minha causa, mas eu o estou entregando aqui de volta, e nós vamos ganhar juntos". O casamento do Ciro com a Patrícia não é uma estratégia de marketing. É um caso de amor.
Folha - Essa análise não lhe parece insuficiente para explicar o valor agregado de uma mulher com as características e a história pessoal de Patrícia Pillar?
Paz - Tivemos 40 minutos de comerciais em junho. Ela usou 15. Então não sei se esse foi o fator principal. Acho que o gesto bonito dela, permitido pelo medo do PSDB, sem dúvida teve um efeito.
Folha - Quinze minutos de Patrícia não seriam mais eficientes do que 25 de Ciro e de políticos do PTB exibidos nos programas?
Paz - Pode ser verdade, como pode não ser. De todo modo, sempre acredito que a eficiência está em um conjunto de ações. E, se o Ciro não fosse quem é, não ia adiantar a Patrícia. Basta ver qual foi o máximo crescimento pós-televisão de cada candidato. Ele superou todos. E superou também na duração do efeito.
Folha - Para isso não contribuiu o fato de ele ter aproveitado a última janela dos horários partidários? Esse calendário foi calculado?
Paz - Foi uma estratégia e uma necessidade, porque o Ciro só poderia usar o espaço dos partidos aliados -ainda assim com todas as dificuldades que tivemos- depois da convenção da Frente Trabalhista. O PTB e o PDT concordaram que valia a pena esperar.
Dizem que o Ciro é estourado, mas foi preciso f rieza para chegar a 9% e segurar a aliança contra os rumores que a imprensa divulgava o tempo todo: "O PTB está saindo", "o Brizola não vai mais".
Folha - Dentro dessa lógica, não teria sido melhor crescer um pouco mais tarde, evitando o custo de virar vidraça semanas antes do horário eleitoral gratuito?
Paz - Aí entramos no terreno do incontrolável. Eleição não se ganha na pesquisa, só na urna. Portanto, o momento ideal para ultrapassar o Lula seria na véspera da votação. Mas isso não é possível calcular. O Ciro subiu. Então a campanha que trate de criar apoios para segurá-lo.
Folha - Como o sr. vê a afirmação tucana de que tudo mudará no horário gratuito, já que o tempo disponível para Serra será muito superior ao dos adversários?
Paz - Para o bem deles, seria bom que estivessem certos. Para o nosso, espero que estejam errados. Mas isso é futuro, e eu não falo sobre o futuro. Seria errado falar até porque eu posso propor estratégias, mas as decisões políticas ficam acima de mim.
Folha - O sr. costuma dizer que o fator Collor não vai derrubar Ciro. De onde vem sua convicção?
Paz - Há 10% de eleitores que não votariam no Ciro de jeito nenhum. Esses o acham parecido com o Collor. Isso é ruim, mas não quer dizer que a conversa faça sentido para o restante do eleitorado. Com esses 10% ninguém vai conseguir ganhar a eleição.
Outro dia me ocorreu o seguinte. O Collor, quando foi eleito, representava a "força". Mas, na percepção das pessoas, acabou aceitando o "lado negro", como uma espécie de Darth Vader.
Mas do "lado bom", representado pelo Anakin Skywalker, as pessoas gostam. Cabe ao Ciro mostrar que ele não vai passar para o "lado de lá", que ele é diferente.
Folha - As equipes de Lula e Serra ignoraram o potencial de Ciro?
Paz - Não vou dizer que foi um erro, porque isso nos ajudou. Mas aconteceu. Agiram o tempo todo como se estivesse decidido o seu encontro no segundo turno, como se fosse possível ignorar um candidato bom de TV e que tem a menor taxa de rejeição. Mas, assim como não falo sobre as minhas estratégias, não quero analisar as dos outros.
Folha - Com a subida nas pesquisas, não pára de entrar gente na campanha, inclusive na sua área. Isso ajuda ou atrapalha?
Paz - Nossa equipe não tende a crescer muito. Gente batendo cabeça, sem ter o que fazer, só gera intriga. Se a equipe for enxuta e todos tiverem trabalho, ninguém fica pensando em fazer bobagem.
Folha - Há quem diga que o crescimento de Ciro coloca em xeque um modelo, em tese representado pelas campanhas de Lula e Serra, que daria excessiva importância aos marqueteiros. O sr. concorda?
Paz - Para mim, o bom homem de marketing é um tradutor de meios. Auxiliado por analistas, faz a informação chegar ao maior número possível de pessoas. Quando ele vira cirurgião plástico, alfaiate, produtor de eventos, transformador do sério em sorridente e do informal no bem vestido, isso nada tem a ver com o trabalho e nos dá péssima fama.
Como se o marqueteiro pudesse chegar e fazer acontecer. "Vou transformar você e você vai ganhar." Mentira. Eu me recuso a dizer isso a qualquer cliente. Faço um trabalho sério. Agora, não vou dizer que meu trabalho é mais importante que o do sujeito que vai pedir voto na rua, porque não é.
Folha - É mais complicado trabalhar para o cunhado?
Paz - Sim e não. Sim porque é alguém da família. Eu me dou muito bem com a família da minha mulher, mas também sou capaz de levantar da mesa e ir embora se o candidato não acreditar no que faço. Com uma família unida como a do Ciro, isso não é fácil.
O lado fácil é que, pelo menos eu imagino, ele confia mais em mim, porque sabe que eu não teria por que fazer algo contra ele.
Depois de Martinez, Ciro defende Paulinho
"Confio no Paulinho", afirmou o candidato sobre seu vice, acusado de usar um "laranja" para comprar um sítio
Depois de passar duas semanas defendendo de acusações o coordenador de sua campanha, José Carlos Martinez (PTB), o presidenciável Ciro Gomes teve de estender o apoio ao seu vice, Paulo Pereira da Silva (PTB).
Paulinho, como é conhecido o ex-presidente da Força Sindical, vinha sendo acusado de uso irregular de verbas do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador). Na edição deste fim de semana da revista ""Época", é apontado um suposto superfaturamento de pelo menos R$ 1 milhão na venda de uma fazenda para trabalhadores pelo programa Banco da Terra. Parte do dinheiro teria ido para a Força. Também é apontado o uso, por parte de Paulinho, de um ""laranja" para comprar um sítio.
"Eu confio no Paulinho, eu sei que ele está sendo vítima disso", afirmou Ciro em Fortaleza.
"Fazia parte da nossa estratégia: nós vamos crescer e quando a gente crescer os setores a serviço da plutocracia, da propaganda do governo, dos arreganhos do sistema financeiro internacional vão tentar agredir, atacar, levantar calúnia", disse o candidato.
Sobre a possibilidade do afastamento de Martinez, que, conforme a Folha revelou, contraiu um empréstimo com Paulo César Farias, ex-tesoureiro da campanha de Fernando Collor de Mello à Presidência, Ciro a negou.
Disse ainda que a defesa do afastamento de Martinez da campanha, promovida pelo presidente nacional do PPS, Roberto Freire, não teria ocorrido. ""Não, isso quem deu foi a Folha de S. Paulo", disse.
Ontem Freire reafirmou à Folha ter dito a Ciro que Martinez deve se afastar da campanha. "Talvez ele Ciro" não tenha percebido que eu falei que Martinez deve se afastar", afirmou.
"Provavelmente, Ciro não deve ter fixado -em razão dos compromissos de campanha- o que eu disse para ele", completou o senador do PPS.
Apesar das negativas, Ciro declarou que "comigo é o seguinte: quem for podre que se arrebente, sempre foi assim".
Na entrevista, Ciro foi claro ao dizer que aceitaria financiamento de bancos para a sua campanha, algo que teria renegado antes. "Todos os brasileiros empreendedores, de qualquer setor, estarão disponíveis a colaborar se concordarem com o nosso programa. Não discrimino este nem aquele."
O coordenador da área econômica do programa de governo de Ciro, Mauro Benevides Filho (PPS), aproveitou a entrevista para amenizar as críticas de Ciro às metas de inflação. ""Não é isso que Ciro seja contra". Apenas vamos aliar ao sistema de metas de inflação o sistema de metas de emprego", afirmou. Ciro havia dito que o sistema de metas era o pior meio de combater a inflação.
Almoço com Tasso
A Folha apurou que Ciro almoçou ontem com seu padrinho político, Tasso Jereissati (PSDB). Pela manhã, Ciro negou que fosse se encontrar com Tasso. Em seguida, porém, quando foi embora com seu irmão Cid Gomes (PPS), prefeito de Sobral, que dirigia o carro, seguiu a caminho da casa de Tasso, exatamente o sentido oposto de seu apartamento, do outro lado da cidade -Tasso vive no bairro de Dunas, enquanto Ciro reside na praia de Iracema.
O carro de Ciro chegou a entrar na rua da casa de Tasso. Ao notar a presença da reportagem, desviou. O candidato só chegou a seu apartamento uma hora e meia após despistar os repórteres.
Ciro vai encontrar Tasso e ACM em SP
O ex-senador Antonio Carlos Magalhães (PFL) e o ex-governador Tasso Jereissati (PSDB) têm encontro marcado para hoje em São Paulo com o candidato do PPS à Presidência, Ciro Gomes.
Na pauta, as "boas novas" da campanha, como a adesão do pefelista Joaquim Francisco, deputado federal que desertou em Pernambuco, único Estado onde o candidato do PSDB, José Serra, mantinha intacta, graças à força do governador Jarbas Vasconcelos (PMDB), a Grande Aliança, como é batizada a sua coligação.
Um assunto indigesto também será posto na mesa: a permanência ou não do presidente do PTB, deputado José Carlos Martinez (PR), como coordenador da campanha da Frente Trabalhista.
Segundo a Folha revelou, Martinez tem uma dívida, ainda em aberto, com a família de Paulo César Farias, o PC, pivô do impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello, em 1992.
ACM deve sugerir a Ciro que o candidato assuma o comando geral da campanha, retirando das direções dos partidos, PTB e PDT, que formam a aliança com o PPS, o status que mantêm hoje à frente da coordenação eleitoral.
Seria uma maneira "elegante" de destituir o amigo de PC Farias. De quebra, reduziria o poder do senador Roberto Freire (PE), dirigente do PPS, chamado internamente de "quinta coluna" pelos aliados de Ciro Gomes. Para não causar atritos com o PDT, Leonel Brizola, líder do partido na aliança, seria avisado da estratégia.
No papel de conselheiro informal da campanha da Frente Trabalhista, o pefelista ACM tem conversado praticamente todos os dias com Jereissati. Juntos, ajudaram Ciro a conquistar apoios importantes, como o de Joaquim Francisco, que compromete a força política do senador Marco Maciel (PFL-PE) no seu Estado.
"O Serra está perdido. Não adianta o Nizan Guanaes (também baiano e marqueteiro do PSDB) fazer tudo bonitinho se o produto é ruim", disse ACM ontem à Folha. "Dessa tenda não sai milagre, não adianta".
Segundo o ex-senador, que ri sarcasticamente quando o tema é o desempenho de Serra, Ciro está no segundo turno das eleições.
PT decide associar Ciro a Collor
Para reforçar a vinculação de Ciro Gomes (PPS) com o ex-presidente Fernando Collor, o PT decidiu comparar o histórico dos dois na abertura da economia.
Alarmados com a subida repentina de Ciro, petistas vêm relembrando a relação dele com políticos que apoiaram o ex-presidente, bem como mencionando a semelhança de personalidade entre os dois -jovens e intempestivos.
Os petistas não querem, no entanto, que Luiz Inácio Lula da Silva enverede pelo terreno da comparação de personalidades, porque isso significaria "rebaixar" politicamente o presidenciável. Também haveria o risco de uma abordagem agressiva deixar sequelas que inviabilizem aproximações futuras.
A saída encontrada é Lula fazer a comparação entre os dois pelo lado programático. Uma estratégia é relembrar o "acordo de Ouro Preto (MG)", que Ciro assinou quando ministro da Fazenda, em 1994, e fazer um paralelo com a abertura econômica promovida por Collor no início dos anos 90.
Ambas, segundo os petistas, foram responsáveis pela desnacionalização da indústria, quebradeira nos setores produtivos e explosão do desemprego.
O "acordo de Ouro Preto" rendeu a Ciro uma saraivada de críticas. Pelo acordo, assinado na cidade mineira em dezembro de 94, a Argentina podia exportar livremente automóveis para o Brasil, enquanto as exportações brasileiras eram limitadas por cotas. Também no fim de 1994, sob Ciro, foi reduzida a alíquota de importação automotiva de 35% para 20%, o que, na visão do PT, fragilizou a indústria nacional, com impacto sobre o emprego.
As medidas adotadas por Ciro e a abertura feita por Collor, que também reduziu drasticamente alíquotas de importação de bens de consumo, serão colocadas "dentro de um mesmo pacote ideológico", do qual o petista vai procurar se diferenciar.
FHC se assume como cabo eleitoral de Serra
Após almoçar com tucano, presidente elogia seu "conhecimento internacional" e compara eleição atual com a de 98
Fernando Henrique Cardoso deu ontem nova demonstração de que participará ativamente da candidatura à Presidência de José Serra (PSDB). Cumpriu um roteiro preparado pela campanha para atribuir ao tucano características que parte do eleitorado enxerga no principal oponente do momento, Ciro Gomes (PPS).
Após almoço no Palácio da Alvorada, o casal FHC e Ruth Cardoso posou ao lado da chapa Serra-Rita Camata, na primeira aparição pública de FHC ao lado de Serra desde o início oficial da campanha, em 6 de julho. Ele elogiou Serra. Ruth enalteceu Rita (PMDB-ES). Os candidatos não falaram, obedecendo roteiro para aferir ao máximo o efeito das presenças de FHC e Ruth.
Ao explicar por que o ministro Pedro Malan (Fazenda), com quem se reuniu ontem, votaria em Serra, FHC disse que o tucano é "homem confiável, experiente, tem capacidade administrativa demonstrada e tem conhecimento da situação internacional".
Essas características também são atribuídas a Ciro pelo eleitorado, segundo pesquisas do PSDB. A intenção do PSDB é "desconstruir" Ciro. Ao compará-lo a Collor, tenta criar dúvida sobre a confiabilidade dele. Sobre capacidade administrativa e conhecimento internacional, os tucanos buscam mostrar maior bagagem de Serra.
Em seguida, o presidente disse que "estamos vivendo um momento delicado no mundo todo, com reflexos no Brasil". Nesse momento, segundo FHC, "precisamos de um presidente que tenha capacidade de levar adiante o país". Após os elogios, FHC disse: "Vamos ganhar, e a Rita vai ajudar bastante aqui nessa briga".
A Folha apurou que, durante o almoço, FHC recomendou calma a Serra, dizendo que há tempo suficiente para virar o jogo.
Tasso e Ruth
Indagado sobre a "rebeldia" do ex-governador Tasso Jereissati, tucano que tem ajudado Ciro em articulações políticas e empresariais, FHC não respondeu. Mas Ruth disse: "Ah, dá uma folga".
A respeito da posição desfavorável de Serra nas pesquisas, FHC disse: "É como o câmbio, sobe e desce". Para ele, a situação irá mudar quando começar o horário eleitoral gratuito, em 20 de agosto.
Na TV, segundo FHC, é que se vai ver "quem é confiável, quem realmente diz coisa com coisa, quem blefa, quem promete o que não vai cumprir". Para ele, "Serra é o oposto disso" e é "pessoa firme, vai fazer o que disse que vai fazer porque sabe das limitações e, portanto, também sabe que é possível mudar para melhor".
Acordo com o FMI
FHC disse que um acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional) "parece ser" a condição para que a taxa de juros não dispare e a "população tenha um horizonte de tranquilidade". Segundo ele, o Brasil tem o apoio do FMI e dos presidentes de bancos centrais do G-7 (grupo dos países mais ricos do mundo). "Vou assumir minha responsabilidade. Depois, cada um assuma a sua."
Ele lembrou que, na campanha de 1998, em meio a crise financeira, o governo apertou o cinto e fez acordo com o Fundo. "Alguns reagiram e outros não, mas o Brasil superou aquela dificuldade. Então agora é a mesma coisa."
FHC não deu data para o acordo, alegando evitar especulações, e disse que a fragilidade hoje é "de toda a economia mundial".
Gás
FHC voltou a dizer que o preço do gás de cozinha não será mais afetado diretamente pelo dólar. Serra critica a Petrobras, que aumentou o preço do produto. "Eu acho que não há razão para fazer transferências automáticas da variação de câmbio para o preço do gás de cozinha", disse FHC.
No começo da noite, Serra e Rita voltaram para nova reunião com FHC, agora com participação de políticos aliados. O deputado Pimenta da Veiga (PSDB-MG), coordenador político da campanha de Serra, disse que foi feita uma avaliação positiva da campanha e se definiram estratégias.
Uma estratégia, disse, é o combate a "excessos" cometidos por outros candidatos. Pimenta disse que algumas propostas de Lula e Ciro são "até desejáveis, mas que não podem ser cumpridas". "São candidatos que não têm compromisso com a verdade."
Para ajudar tucano, FHC fará autocrítrica na TV
Obedecendo à estratégia que aproxima cada vez mais o governo da campanha de José Serra (PSDB), o próprio presidente Fernando Henrique Cardoso fará autocríticas de sua gestão no horário eleitoral gratuito, que começará em 20 de agosto.
Essa fórmula de participação presidencial na TV deverá coroar uma série de eventos que tiveram início nas duas últimas semanas para ajudar o can didato. Mais do que ligar Serra a FHC, é o governo que se liga à campanha.
Primeiro foi a queda dos juros, um pedido de Serra. Depois, a intervenção para baixar o preço do gás de cozinha, outro pedido. Na última sexta, por incentivo de FHC, Serra almoçou com o ministro Pedro Malan (Fazenda), seu antigo desafeto. Ontem, FHC cumpriu roteiro feito pela campanha de Serra para tentar ferir indiretamente o principal adversário da hora, Ciro Gomes (PPS). Atribui a Serra características que o eleitorado vê em Ciro.
As autocríticas de FHC na TV tentarão tirar o caráter de ambiguidade da candidatura Serra perante os cerca de 30% da população que aprovam o governo. Segundo pesquisas do PSDB, Ciro tem votos do eleitorado simpático ao governo, fatia que, potencialmente, deveria preferir Serra.
Reparos de FHC ao governo pretendem avalizar as críticas de Serra, tirando delas uma marca de deslealdade, como entende parte da fatia do eleitorado que aprova FHC e que estaria confusa.
Ao mesmo tempo, essa estratégia permitirá ao marqueteiro de Serra, Nizan Guanaes, manter o discurso da mudança. Para Nizan, se perder o mote da mudança, o tucano naufragará. FHC ontem falou que Serra é o mais capaz para fazer a mudança.
Sugestão de fala na TV levada por aliados a FHC e a Nizan, segundo a Folha apurou, é a seguinte: o presidente diria que avançou o que pôde em oito anos, que algumas coisas não puderam ser feitas pois seriam irreais e difíceis e que também ocorreram erros.
FHC, então, poderá dizer que um erro foi deixar o preço do gás de cozinha subir tanto (472% desde julho de 1994, segundo o IBGE), mas que Serra o alertou, e ele determinou uma intervenção no mercado. Até o horário eleitoral, o preço do gás deverá cair.
FHC reforçou a ajuda a Serra por avaliar que ele terá de chegar ao horário eleitoral com 17% ou 18% nas pesquisas para manter a expectativa de virada e segurar os aliados. Hoje, pesquisas mostram Serra com menos de 14% e Ciro em empate técnico com Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Por isso, FHC tentará dar boas notícias econômicas, irá a atos de campanha e reforçará as articulações políticas nos Estados.
Há ainda preocupação do presidente em controlar membros do entorno de Serra que buscam um fato em relação a Ciro similar ao que abateu a pré-candidatura presidencial da pefelista Roseana Sarney em março. Na época, o PFL acusou FHC de usar o aparelho do Estado em benefício de Serra e rompeu com o governo.
Artigos
Um país atrasado
Fernando Rodrigues
BRASÍLIA - Há várias formas de medir o desenvolvimento de um país. A ONU divulga regularmente o IDH, que mostra o grau de desigualdade. Outra maneira, não muito ortodoxa, é examinar o tempo de vida de um escândalo, bem como o tamanho de sua repercussão.
Nesse quesito, o Brasil não vai bem. É grande a nossa capacidade de olhar com desdém as mazelas do cotidiano. Tome-se o caso do Sivam, que documentos oficiais do governo dos Estados Unidos mostram ter sido uma história de favorecimento à empresa Raytheon.
O correspondente da Folha em Washington, Márcio Aith, obteve centenas de papéis oficiais. Ali está registrado que um integrante do governo brasileiro favoreceu a Raytheon, vencedora da licitação de mais de US$ 1 bilhão para a implantação de radares na Amazônia.
É difícil haver um caso com tanta comprovação oficial. Não se trata de uma entrevista secreta. Não é documentação sem origem confirmada. A reportagem baseou-se apenas em papéis fornecidos legalmente pelo próprio governo dos EUA.
A reação do presidente Fernando Henrique Cardoso foi a previsível. "Vi de perto, nos momentos de grande dificuldade, quando se procurava embaralhar a compreensão de um processo limpo, através de intrigas, de infâmias, eu o vi sempre altivo, atento e respondendo com dignidade a todas as informações que eram veiculadas e que não correspondiam à realidade", declarou o presidente a respeito do oficial da Aeronáutica envolvido no escândalo.
A reação do presidente é compreensível. O estado de abulia do país não é novidade. Quase nada tem consequência aqui. A mídia chapa-branca defender o governo nessas horas também é comum. Tudo somado, essa anorexia de indignação é um retrato do atraso do Brasil.
Agosto, o mês aziago, começa nesta semana. É quando deve decantar a tendência do eleitorado. Pode ser a redenção ou o fracasso de Serra.
Colunistas
PAINEL
Via indireta
O PSDB usará seus primeiros programas eleitorais em SP para denunciar um suposto acordo entre Lula e Paulo Maluf. Com isso, os aliados de Geraldo Alckmin querem forçar o PT a atacar o candidato do PPB e impedir que ele vença no primeiro turno.
Pragmatismo palaciano
FHC disse a interlocutores que, se ficar evidente que já no início do horário eleitoral José Serra não terá mais chances de recuperação, não irá participar de sua campanha na TV.
Apoio em tamanho
Enquanto nos outdoors de José Genoino (PT-SP) há uma foto grande de Lula, nos de Geraldo Alckmin (PSDB-SP) aparece apenas o nome de José Serra. Em letras bem pequenas.
Bancada petista
Orestes Quércia diz que proibirá os candidatos a deputado do PMDB-SP de pedir votos para José Serra na propaganda eleitoral. Usará o argumento de que o partido está "dividido" em SP entre Serra e Lula.
Cenas históricas
Quércia quer fazer dois comícios ao lado de Lula em SP, para usar as imagens em seus programas de campanha ao Senado.
Temperamento
O comitê de Ciro Gomes já está preparado: além de Fernando Collor, ele será comparado pelos adversários a Jânio Quadros.
Fumaça de baixaria
Rodrigo Rollemberg, candidato do PSB ao governo do DF, apresentou queixa ao TRE contra o governador Joaquim Roriz (PMDB), que tenta a reeleição. Em um comício em Ceilândia, Roriz chamou Rollemberg de "o rapaz que gosta de maconha".
Novos tempos
Zeca do PT se elegeu com ataques à "bandalheira do PMDB" que governava o MS. Agora pede votos ao ex-governador Marcelo Miranda (87-91), hoje candidato a federal pelo PL.
Riqueza alagoana
A campanha de Fernando Collor (PRTB) ao governo de Alagoas pretende gastar R$ 2,5 por eleitor no Estado, que tem 102 municípios. Em São Paulo, com seus 645 municípios, Paulo Maluf (PPB) e Geraldo Alckmin (PSDB) prometem desembolsar, cada um, R$ 0,70 por eleitor.
Contas de campanha
Collor declarou ao Tribunal Regional Eleitoral que pretende gastar R$ 4 milhões na sua campanha ao governo de Alagoas, que tem 1,6 milhão de eleitores. Em SP (com 25,6 milhões de eleitores), Maluf e Alckmin indicaram ao TRE, cada um, teto máximo de R$ 18 milhões.
Governismo abastado
Ronaldo Lessa (PSB), candidato à reeleição de Alagoas e adversário de Collor, prevê gastar um pouco menos do que o ex-presidente, R$ 3 milhões.
Veneno baiano
Slogan do deputado Waldir Pires (PT), adversário de Antonio Carlos Magalhães (PFL) na disputa ao Senado pela Bahia: "Um senador sem fraude".
Longe de casa
Marina Silva (PT-AC), candidata ao Senado, fará um jantar em São Paulo, em agosto, para arrecadar recursos financeiros para sua campanha.
Pau-brasil
Líderes pataxós da BA irão ao STF nesta semana para pedir que seja julgado de uma vez por todas o processo que tenta anular títulos distribuídos pelo então governador ACM na década de 70. O processo, que se arrasta desde março de 1983, é relatado pelo ministro Nelson Jobim.
Chacina
Os pataxós também procurarão o ministro Paulo de Tarso (Justiça) e o novo presidente da Funai, Arthur Mendes, para denunciar que desde 1982, quando começaram a retomar as terras indígenas, ocorreram 17 assassinatos de índios na região, geralmente em embo scadas.
TIROTEIO
Do secretário-geral do PSDB, deputado Márcio Fortes (RJ), criticando os tucanos que pedem para que Serra seja "mais simpático" na campanha:
- Não dá para mudar o Serra agora. Não dá para fazer psicanálise no candidato nesse momento da campanha.
CONTRAPONTO
Disco riscado
Logo que assumiu uma vaga na CPI criada em Santo André para investigar supostos casos de propina, o vereador Osvaldo Moura (PMDB) recebeu da imprensa o apelido de "Barbosa", personagem da extinta "TV Pirata", da Rede Globo. "Barbosa" sempre repetia as frases dos seus interlocutores.
O vereador passou a CPI repetindo perguntas de outros vereadores, daí o apelido. Para se livrar da fama, Moura decidiu mudar de tática no depoimento do empresário Sérgio Gomes da Silva, no último dia 16. Lendo um papel, pediu para fazer a primeira pergunta:
- Sérgio Gomes da Silva, o senhor é ou já foi filiado a algum partido político?
Após o empresário ter respondido que fora filiado ao PT até 1999, Moura disparou:
- O senhor é ou já foi filiado ao PT?
A platéia caiu no riso.
Editorial
POLÍTICA DOLORIDA
Em artigo que esta Folha publicou na quarta-feira passada, o economista americano Paul Krugman fazia recomendações enfáticas às autoridades norte-americanas. A Alan Greenspan, o presidente do banco central dos Estados Unidos, propunha um novo corte na já praticamente nula taxa de juros daquele país. Ao presidente Bush, que amplie ainda mais o gasto público. Nada mais razoável para quem conhece a história dos ciclos econômicos do capitalismo e sabe distinguir o papel concernente ao Estado: tentar evitar os efeitos mais danosos dos "crashes" e/ou acelerar a saída da crise.
Na mesma edição, este jornal informava ao público sobre a decisão do governo brasileiro de aumentar para R$ 4 bilhões os cortes no Orçamento deste ano. Isso no contexto de taxas básicas de juros de 18% ao ano. No entanto, os sinais de fraqueza, no que tange aos dados do chamado lado real da economia, são, também no Brasil, contundentes: queda continuada e acentuada da renda, do emprego e da produção da indústria.
Mas o Brasil, como todos os países endividados outrora chamados de "emergentes", está impedido de adotar o receituário proposto por Krugman. Pior: é obrigado a adotar o seu oposto. Se os sinais da economia são de debilidade, o Estado aqui é levado a se retrair e a tomar medidas que não raro sufocam a própria retomada do crescimento.
É compreensível que os investidores estrangeiros com dinheiro aplicado no Brasil pensem tão-somente no retorno dessas transações. O que não faz sentido é a instituição que foi criada para amortecer crises internacionais impor aos países devedores programas baseados nos ajustes recessivos. No momento em que o Brasil está próximo de ter de pedir socorro ao FMI novamente, esse tipo de ponderação soa, infelizmente, como a crônica de uma dor anunciada.
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07/29/2002
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