Debate sobre independência dos Poderes marca Conferência Internacional
Um dos temas mais discutidos pelos senadores em Plenário, nos últimos meses - a independência entre os Poderes - foi amplamente debatido na manhã desta quinta-feira (6) na Conferência Internacional sobre o 1º Censo do Legislativo Brasileiro, promovido pelo Programa Interlegis - a Comunidade Virtual do Poder Legislativo.
O jornalista Carlos Alberto Sardenberg avaliou no debate que o desgaste das relações entre os três Poderes é um grave problema sistêmico brasileiro. Para Sardenberg, tanto o Legislativo quanto o Executivo e o Judiciário têm suas razões nas discussões sobre as freqüentes queixas apresentadas pelo Congresso, de interferência dos outros dois Poderes em seu funcionamento.
- Quando escutamos isoladamente as dificuldades enfrentadas por um dos Poderes em relação aos outros, damos razão a ele. Mas, de repente, percebemos que os outros dois igualmente também têm suas razões e então descobrimos que o problema é o sistema - disse.
Sardenberg relacionou diversos casos concretos para exemplificar que a falta de harmonia entre os Poderes atinge diretamente o desenvolvimento econômico, social e político do país. O jornalista destacou a conseqüência que considera mais grave, que diz respeito ao adiamento de uma reforma ampla do sistema tributário brasileiro.
Sardenberg lembrou que a matéria está tramitando no Congresso Nacional e, sem um código que discipline a questão, o Executivo passa a legislar por meio de medidas provisórias, criando "uma colcha de retalhos" com a geração de tributos conflitantes entre si. O cidadão atingido apela ao Judiciário e sua ação passa a tramitar em diversas instâncias do Poder até uma sentença irrecorrível. Se a decisão judicial der razão ao cidadão - o que freqüentemente ocorre - promove um enorme desgaste aos cofres públicos, onerando o próprio Executivo.
- É um ciclo vicioso que tem de ser solucionado - concluiu.
O professor da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer avaliou que o problema enfrentado no Brasil é comum aos países que adotaram o sistema republicano, advindo da Teoria de Tripartição dos Poderes sistematizada pelo filósofo francês Montesquieu. A tese é conhecida pelo princípio de "pesos e contrapesos", que deveria promover o equilíbrio do sistema.
O cientista político lembrou o caso Watergate, que culminou na renúncia do então presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, em virtude de uma decisão da Suprema Corte daquele país, que obrigou o Executivo a revelar seus arquivos secretos.
Fleischer citou diversos exemplos atuais de interferência entre os Poderes que vão de encontro ao artigo 2.º da Constituição, dispositivo que prevê a harmonia e a independência entre Executivo, Legislativo e Judiciário. O cientista político destacou o funcionamento das Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), que têm seus trabalhos comprometidos por diversas decisões judiciais.
Mais de 80% dos investigados da CPI dos Correios, por exemplo, depuseram com habeas corpus preventivo. Além disso, a recente liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu o depoimento espontâneo do caseiro Francenildo dos Santos Costa na CPI dos Bingos, provocou intensa discussão entre os senadores sobre os limites da interferência do Judiciário.
Em outro recente episódio, recordou o cientista político, o Judiciário sentiu-se tolhido em suas atribuições, quando questões interna corporis foram alvo de profundas modificações, formuladas pelo Executivo e discutidas e aprovadas pelo Legislativo - a chamada Reforma do Judiciário (Emenda Constitucional n.º 45). A reforma chegou a criar um órgão de controle externo do Poder, o Conselho Nacional de Justiça.
Para Fleischer, um dos principais exemplos da peculiaridade brasileira na relação dos três Poderes é o caso das eleições, no qual um único poder - Judiciário - é o responsável pela condução de todo o processo.
O I Censo do Legislativo Brasileiro constatou um alto grau de dependência na esfera municipal, principalmente nas relações entre Legislativo e Executivo. Em muitos municípios, a sede da Câmara dos Vereadores funciona em prédios ligados à prefeitura ealguns dos vereadores não têm conhecimento de que não são subordinados aos prefeitos.
O debate promovido pelo Interlegis contou com a participação também dos cientistas políticos Argelina Cheibub, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro; José Francisco Sánchez López, da Universidad de Salamanca; Maria de Fátima Junho Anastásia, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); Stephane Monclair, da Universidade de Paris I - Sorbonne; e Timothy Joseph Power, da Universidade de Oxford.
06/04/2006
Agência Senado
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