Desfalque no PMDB é o maior da História



Desfalque no PMDB é o maior da História Nem na criação do PSDB houve tantas baixas no Estado quanto as que devem ser oficializadas na próxima semana A saída do ex-governador Antônio Britto e de pelo menos seis deputados estaduais e um federal é o maior desfalque sofrido pelo PMDB gaúcho na sua história. Nem quando o partido rachou e os dissidentes fundaram o PSDB, em 1988, houve tantas baixas. À época, o senador Pedro Simon foi assediado por Mário Covas, Fernando Henrique Cardoso e José Richa, mas decidiu continuar no PMDB e manteve o partido coeso. A única defecção importante foi de João Gilberto Lucas Coelho. Desta vez, a parte que sai é maior do que a que fica na Assembléia. Seis dos 10 deputados estão de malas prontas para ingressar no PPS – Cézar Busatto, Paulo Odone, Berfran Rosado, Mario Bernd, Iara Wortmann e Elmar Schneider. Na Câmara dos Deputados, a única baixa é Nélson Proença, o mais votado na eleição de 1998. Nos próximos dias, o senador José Fogaça decide se acompanha o grupo ou se fica no PMDB, atendendo ao apelo de Simon. Fogaça vai passar o fim de semana meditando sobre seu futuro. Na sexta-feira, admitiu até não concorrer em 2002, desiludido com a manobra do PMDB que culminou com a eleição de Ramez Tebet para a presidência do Senado. – É muito difícil para mim pensar em sair do PMDB, mas devo reconhecer que minha permanência está ficando inviável. Fogaça deixou Brasília no final da tarde de quinta-feira para participar, à noite, da reunião na casa do ex-governador Antônio Britto. Saiu convencido de que a saída da maior parte do grupo é irreversível, mas no seu caso quer esperar um pouco mais para tomar a decisão. – Ainda estou abalado com os acontecimentos dos últimos dias e não quero decidir no calor dos acontecimentos. Não é bom decidir na véspera nem no day after – ponderou Fogaça. Mesmo com a saída do grupo, o PMDB deverá ter candidato próprio ao Palácio Piratini. O nome mais citado pelos líderes remanescentes é o do senador Pedro Simon, que está em campanha para sair candidato à Presidência da República, mas pode desistir com a debandada em seu Estado. Se Simon desistir de concorrer ao Planalto, o comando do PMDB vai tentar convencê-lo a concorrer a governador para reforçar os candidatos a deputado federal e esatdual. A EVOLUÇÃO DA CRISE Dezembro de 2000 – Em reunião na casa do deputado Nélson Proença, em Brasília, o ex-governador Antônio Britto se oferece para presidir o PMDB. Primeiro a falar, o senador José Fogaça aplaude a idéia. O senador Pedro Simon discorda. Diz que Britto deve se preservar para ser candidato ao Palácio Piratini. O ministro dos Transportes, Eliseu Padilha, diz que não pode se comprometer com a tese porque estimulou o lançamento de outras candidaturas. O então presidente da sigla, Odacir Klein repete o mesmo discurso. Janeiro de 2001 – O prefeito de Osório, Alceu Moreira, ligado ao minsitro dos Transportes, Eliseu Padilha, começa a percorrer o Interior em campanha para ser presidente do diretório regional do PMDB. As críticas ao governo Britto são a tônica do seu discurso. 18 de fevereiro de 2001 – O vice-prefeito de Farroupilha, Wilson Cignachi, registra sua candidatura e começa a fazer campanha com discurso crítico contra o governo Britto. 19 de fevereiro de 2001 – Zero Hora publica trechos de um documento assinado pelo deputado Cézar Busatto, denominado “15 Compromissos para o Novo Presidente Estadual do PMDB”. O documento questiona a “relação tíbia que o PMDB cultivou nos últimos seis anos com o governo federal”, propõe um “compromisso irrenunciável de lutar pela candidatura de Pedro Simon à Presidência da República” e decreta “tolerância zero com a corrupção, dentro e fora do partido”. O documento amplia as divergências entre os grupos que disputam o comando do PMDB. 6 de março de 2001 – Cezar Schirmer registra sua candidatura à presidência do PMDB. 6 de março de 2001 – O grupo do ex-governador Antônio Britto lança o deputado estadual Paulo Odone para concorrer à presidência do PMDB. Odone é apresentado como o candidato da ética. 11 de março de 2001 – Em entrevista a Zero Hora, Britto faz duras críticas ao comando nacional do PMDB, diz que o partido vive o seu pior momento, defende a criação de uma CPI para investigar denúncias contra membros do partido e critica o que chama de “jaderização do PMDB”, numa referência ao senador Jader Barbalho, acusado de uma série de irregularidades. 10 de abril de 2001 – Wilson Cignachi e Alceu Moreira retiram as candidaturas e anunciam apoio a Schirmer. 6 de maio de 2001 – Cezar Schirmer vence a eleição para a presidência do diretório regional do PMDB, com o apoio do senador Pedro Simon e do ministro dos Transportes, Eliseu Padilha. 15 de maio de 2001 – Britto avisa que qualquer decisão sobre sua possível saída do PMDB só será tomada em setembro, depois da escolha da nova direção nacional do PMDB. 20 de maio de 2001 – Britto é impedido de votar na convenção estadual do PMDB. A direção do partido alega que foi engano de uma funcionária. 26 de maio de 2001 – Simon, Britto e Fogaça se reúnem para discutir a crise no PMDB. Simon se compromete a apresentar respostas sobre as principais inquietações de Britto e Fogaça em relação ao futuro do partido. 30 de maio de 2001 – Em Brasília, Britto e Fogaça tomam café com o presidente do PSDB, José Aníbal, e recebem convite informal para se transferir para o ninho tucano. Os dois almoçam com o presidente do PPS, Roberto Freire, e ouvem uma longa exposição dos projetos políticos nacional e regionais do PPS. Freire não chegou a formalizar o convite, mas deixou registrada a importância da presença deles e do grupo que representam para o PPS. 9 de julho de 2001 – Simon reage às críticas de Britto ao PMDB com a afirmação de que o ex-governador “está atirando pedras na casa que lhe serviu de abrigo”. O senador opina que Britto não sairá do PMDB. 10 de julho de 2001 – Britto diz que continua aguardando as respostas prometidas por Simon dois meses antes. E acrescenta: – Os dois únicos lugares onde eu não sou bem tratado no Rio Grande do Sul hoje são no comando do PT e na cúpula do PMDB. 24 de julho de 2001 – Britto e Simon se reúnem por mais de três horas. Britto reafirma que não pretende concorrer a governador, sugere que o candidato seja escolhido até o final do ano e garante que não sairá do PMDB. 9 de setembro de 2001 – Michel Temer é eleito presidente nacional do PMDB com os votos da maioria dos delegados gaúchos. Britto não comparece à convenção. 13 de setembro de 2001 – Simon apela a Britto para que não deixe o PMDB e apresenta uma carta na qual Cezar Schirmer admite renunciar à presidência do partido para garantir a permanência dos dissidentes. 14 de setembro de 2001 – Britto toma café da manhã com o senador Roberto Freire e os dois conversam sobre a possibilidade de seu grupo migrar para o PPS. 19 de setembro de 2001 – O PMDB escolhe Ramez Tebet como candidato à presidência do Senado em detrimento de José Fogaça e aprofunda a crise no PMDB gaúcho. 20 de setembro de 2001 – Os dissidentes se reúnem no apartamento de Britto e decidem deixar o PMDB para entrar no PPS. Combinam de só anunciar a decisão na quarta-feira, para que cada um tenha tempo de comunicar as suas bases. O deputado Germano Rigotto avisa que continuará no PMDB. Fogaça pede tempo para decidir. Sigla governou Estado por oito anos Comandado pelo senador Pedro Simon, o PMDB gaúcho construiu uma sólida reputação Em mais da metade dos últimos 14 anos, o Estado do Rio Grande do Sul esteve sob o comando político do PMDB. Desde 1987, o partido elegeu dois governadores no Estado – Pedro Simon e Antônio Britto. Derrotado em 1982 por Jair Soares, na época filiado ao PDS, Simon venceu a eleição para governador em 1986, na esteira da popularidade do Plano Cruzado, que garantiu a vitória de candidatos do PMDB em 22 Estados. Simon governou de 1987 até abril de 1990. Britto assumiu quatro anos depois, em 1995. Ao longo dos anos, o partido construiu uma sólida tradição política na Capital, sob a liderança de personalidades como o vereador André Forster, que chegou a presidir a Câmara. Jamais conseguiu, porém, chegar ao Paço Municipal. O peemedebista que esteve mais próximo dessa meta foi Cezar Schirmer, derrotado por Tarso Genro no segundo turno da eleição de 1992 para prefeito. Oficialmente o PMDB surgiu no Estado no dia 23 de novembro de 1980, com a eleição da executiva regional. Deputado estadual na época, Simon foi escolhido presidente. Eram novos tempos para a sigla do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que ganhava também o P, de Partido. O MDB havia sido criado em março de 1966 pelo regime militar, para fazer oposição ao próprio regime. Para muitos, seria apenas uma folha de parreira para a ditadura militar instalada no país em 1964. Com a instalação do bipartidarismo e com oposição no Congresso, quem poderia dizer que o Brasil vivia sob uma ditadura? De qualquer modo, o MDB tornou-se o abrigo para os opositores do arbítrio e defensores da redemocratização. No Estado, o MDB dos anos 60 foi dirigido por Siegfried Emmanuel Heuser, cassado pela ditadura e substituído por Simon. Com o apoio de Forster, Simon criou o Instituto de Estudos Políticos e Sociais (Iepes), entidade responsável pela vinda a Porto Alegre de intelectuais e políticos como Paul Singer, Fernando Henrique Cardoso e Sobral Pinto. As conferências e debates realizados pelas personalidades são apontados pelos peemedebistas como a marca registrada do período. A partir de 1979, com a anistia e o ressurgimento do pluripartidarismo, o PMDB teria a oportunidade de sair do plano teórico e disputar o governo do Estado e a prefeitura de Porto Alegre. PPB define candidato ao Piratini no domingo Celso Bernardi e Fetter Júnior disputam prévias da sigla O primeiro candidato ao governo do Rio Grande do Sul nas eleições do próximo ano será conhecido neste domingo. Os filiados do PPB vão indicar entre Celso Bernardi, presidente licenciado do partido no Estado, e Adolfo Fetter Júnior, deputado federal, quem disputará a sucessão do governador Olívio Dutra (PT). É a segunda vez que o PPB define seu candidato a governador pelo voto direto dos filiados. A primeira vez foi em 1982, quando o então PDS escolheu por meio de prévia Jair Soares para concorrer ao Palácio Piratini. Ao definir com antecedência o representante, o PPB quer tempo para trabalhar na divulgação das suas propostas, com uma estratégia específica para os grandes centros urbanos. Com reconhecida penetração em médios e pequenos municípios, o PPB quer reverter a tendência de esvaziamento nas maiores cidades. Em Porto Alegre, desde 1985 – quando foi restabelecida a eleição direta para prefeito –, o PPB e suas duas siglas antecessoras (PDS e PPR) não conseguem chegar nas primeiras colocações. Fetter Júnior prega duas campanhas distintas, uma voltada para o Interior e outra para a Região Metropolitana. – O PPB tem sido mais fortalecido nos municípios onde a política é feita olho no olho, onde o eleitor conhece pessoalmente o político. O que tem nos faltado nos municípios grandes é justamente a clareza de bandeiras, exposição mais permanente na mídia, capacidade de comunicação – diz o deputado. Presidente do partido desde 1993, Bernardi concorda com a idéia de traçar uma estratégia para os municípios com mais de 100 mil eleitores, apesar de achar que o partido já esteja no caminho certo: – Evidente que nos pequenos municípios é mais fácil fazer a política da comunicação, porque está ligada diretamente com as pessoas, mas os resultados comprovam que o partido está chegando também nos grandes centros. Temos hoje credibilidade e o maior número de prefeitos e de vereadores do Estado. Apesar de nenhum dos dois nomes do PPB despontar nas pesquisas eleitorais, o PPB acredita que a candidatura própria é a única forma de garantir uma expressiva bancada de deputados estaduais e federais. O apoio ao candidato Antônio Britto na eleição de 1998 provocou uma das maiores crises no PPB. Adversários desde os tempos da Arena e do MDB, prefeitos e vereadores das duas legendas tiveram de engolir uma coligação abençoada pelos seus líderes. Para o próximo ano, o PPB vai buscar uma coligação com PFL, PSDB e PTB. O mais provável é que se alie somente ao primeiro. O PSDB decidiu no último dia 15 que também terá candidato próprio ao governo. Já o PTB está praticamente fechado com o PDT. Certos da força que terá um candidato do PT – seja ele o atual governador Olívio Dutra ou o prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro –, o PPB tem defendido entre a oposição o lançamento de três ou quatro candidatos a governador como forma de pulverizar o voto dos eleitores e, com isso, forçar uma decisão em dois turnos. Uma eleição definida em segundo turno colocaria os adversários do Palácio Piratini (PPB, PMDB, PDT, PTB, PSDB, PFL e PPS) no mesmo palanque. Produção está ameaçada Indústrias gaúchas temem a falta de matérias-primas importadas As oscilações econômicas dos últimos 12 dias quebraram as estimativas de crescimento da indústria gaúcha ancorada na importação de matéria-prima. Desde os atentados aos Estados Unidos, a instabilidade do câmbio brasileiro elevou os custos de produção e a paralisação parcial de aeroportos norte-americanos atrasou a remessa de componentes destinados a setores de tecnologia. A conseqüência é a redução imediata da produção e, inclusive, a suspensão temporária de fabricação de algumas mercadorias. Conforme o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Eletroeletrônica (Abinee), Gilberto Machado, poucos embarques de matéria-prima voltaram ao normal e há empresas aguardando a chegada de componentes. O problema se agravou porque as cargas oriundas da Ásia também estão paradas nos Estados Unidos, cuja escala é obrigatória. Por isso, as companhias trabalham com estoques baixos. – Se faltar uma peça, a produção pode parar mesmo – afirma. Segundo Machado, os atentados terroristas foram um segundo golpe na indústria eletroeletrônica neste ano. Antes dos ataques, a indústria de telecomunicações previa queda de 40% no segundo semestre, ante igual período de 2000. Agora, o tombo será maior. O presidente do Grupo Aeromot, Cláudio Barreto Viana, respirou com alívio na sexta-feira, quando fornecedores de componentes ligaram para avisar que os embarques de Miami serão retomados na segunda-feira. Os de Nova York, no entanto, ainda devem demorar uma semana. Se o atraso continuasse por mais 10 dias, Viana enfrentaria problemas para tocar a produção. A empresa é especializada na fabricação de motoplanadores e na manutenção de instrumentos, motores e rádios de aviões. O presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), Paulo Saab, está desanimado quanto ao desempenho do setor neste ano. A previsão de 6% de crescimento em janeiro já havia sido reduzida para 2% em junho, e agora não há dados para uma nova reavaliação. Apenas no primeiro trimestre, a variação do dólar aumentou os custos em 10%. Televisores de até 21 polegadas têm 15% da matéria-prima importada, índice que sobe para 65% nas superiores a 29 polegadas. O economista da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs) Nuno de Figueiredo considera preocupante, mas inevitável, o aumento dos custos e o repasse aos preços. O setor de fertilizantes é um exemplo. O presidente da Unifertil, Adair Schiavon, diz ser difícil absorver os novos custos, mas admite não saber como calculá-los: – A cotação muda tanto que ainda não sei como será o repasse. Os produtores de borracha também estão em alerta: temem a queda das exportações calçadistas, um dos principais clientes do setor. A borracha é utilizada nos solados e também pode ser empregada em outro segmento atingido pela crise, a eletroeletrônica. Como a estocagem de itens acabados é cara, a produção recuou. – Sem a previsão dos embarques dos componentes de informática não adianta produzir – destaca o presidente do Sindicato da Indústria da Borracha do Estado, Geraldo Fonseca. A hotelaria de luxo da Capital também se ressente do impacto dos atentados. Os clientes estrangeiros desapareceram nas duas últimas semanas no Sheraton Porto Alegre Hotel, e as reservas para setembro e outubro foram canceladas ou adiadas. Segundo o gerente-geral, Alex Vautravers, a taxa de ocupação em setembro está fraca, cerca de 30%. Os Estados Unidos no século 19 A primeira metade do século 19 nos Estados Unidos foi marcada pela busca de novas terras. Era o início da chamada “marcha para o Oeste”. Neste período, a população passou de cerca de 3,9 milhões, em 1790, a mais de 7 milhões, em 1810, sendo formada por uma sociedade basicamente agrária. A partir de então, a pecuária chegou a ocupar um quarto do território americano, em terras que se estendiam do Texas ao Canadá. Em 1829, a construção de ferrovias começou a ganhar força, barateando o transporte. Vinte anos depois, a descoberta de ouro na Califórnia estimulou o deslocamento populacional. Em meio a esse panorama, a expansão norte-americana ganhou reforço com uma nova política: a Doutrina Monroe, cujo lema era “a América para os americanos”. Enquanto ocorria a Revolução Farroupilha no Rio Grande do Sul, os Estados Unidos eram governados pelo general Andrew Jackson, que quebrou a tradição de presidentes vindos do patriarcado rural. Jackson causou temor, na época, ao entregar tarefas do Estado a homens simples e sem muito preparo. Ligado ao recém-criado Partido Democrata, defendia os interesses dos grandes fazendeiros do Oeste e de operários do Norte. Durante sua gestão, houve uma mudança estrutural no governo, na qual políticos que pertenciam a governos anteriores foram tirados do poder – processo que ficou conhecido como sistema de despojos (spoil system). A conquista de territórios acabou por desenvolver a economia norte-americana. A população também aumentou para cerca de 30 milhões de pessoas até 1860. Com isso, sociedades diferenciadas começaram a se formar dentro do próprio país. A Norte, surgiu uma poderosa burguesia industrial e comercial. Ao Sul, predominaram os grandes latifundiários. A diferenciação entre os dois extremos do território aumentaria a rivalidade entre os interesses díspares de nortistas e sulistas, o que culminou mais tarde em uma guerra civil. Artigos A metáfora farroupilha DÉCIO FREITAS Na sua obra clássica sobre os mitos gregos, Robert Graves diz que a cultura popular elaborou aquelas metáforas para estabelecer uma auto-imagem das comunidades em aspectos religiosos, filosóficos, sociais e culturais. As metáforas elucidavam as razões de certos costumes, validavam atos da vida cotidiana, ofereciam precedentes abonados pelos ancestrais, emulavam em exemplos de heroísmo e civismo, estigmatizavam a covardia e a torpeza. Configuravam, enfim, uma força definidora e coesiva da identidade comunitária. No 166º aniversário da Revolução Farroupilha, vale apreciar a metáfora que sobre ela elaborou a cultura popular. Metáforas comunitárias não são, obviamente, históricas; são antes, em muitos aspectos, não-históricas. Assim, a metáfora farroupilha gaba a Província de São Pedro como a única a se insurgir contra o Império, em prol da república e da federação. Na verdade, inscreve-se numa impressionante seqüência de insurgências similares, de norte a sul do Brasil. Nos tempos coloniais, sonhara-se uma Independência republicana e federativa. A Independência monárquica e centralista da dinastia bragantina decepcionou. O Nordeste (Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará) rebelou-se e proclamou a Confederação do Equador (1824/1825), que teve oito de seus líderes condenados à morte e cinco executados. Meses antes da revolta dos farrapos, eclodiu no Pará, que então abrangia toda a Amazônia, a Cabanagem (1835/1840), na qual os insurgentes tomaram e mantiveram o poder por mais de ano, sofrendo afinal uma repressão de mercenários estrangeiros que sacrificou a vida de um terço da população masculina. Na Bahia, deu-se a Sabinada (1837/1838). O Maranhão convulsionou-se na Balaiada, que se estendeu ao Piauí (1838/41). Afora quase duas dezenas de levantes menores, no Rio, em Minas e no Nordeste. Se a insurreição tivesse contado com apoio generalizado, dificilmente seria vencida A metáfora apresenta o quadro dum RS monoliticamente unido no apoio aos farrapos, quando na realidade houve uma divisão em que virtualmente metade da região manteve-se fiel ao Império. Se a insurreição tivesse contado com apoio generalizado, dificilmente seria vencida. A metáfora representa os farrapos como vitoriosos. Mas eles celebraram a paz por estarem praticamente derrotados, sem condições de prosseguir na luta. A representação que os faz vitoriosos estriba-se em não ter havido rendição incondicional, como nos levantes de outras regiões. Deu-se uma paz negociada – e honrosa. Os líderes da insurgência não foram punidos, como os das outras regiões. O Império via avizinharem-se, entre o Brasil e os vizinhos platinos, conflitos nos quais o apoio dos empresários-guerreiros (os estancieiros) da região jogariam, como de fato jogaram, papel decisivo. Os insurrectos asseguraram à região, ainda que de fato, não de direito, autonomia política quase federativa. Ganho importante foi a revogação de iníqua política tarifária que comprometia os interesses econômicos da região. Movia os insurrectos do Nordeste e do Norte a convicção de que a prevalecer o centralismo imperial, organizado espoliativamente em benefício do Sudeste, sobretudo São Paulo, seriam condenados a futuro de empobrecimento e atraso, o que de fato aconteceu. A revolução minimizou na região os efeitos mais funestos do centralismo imperial. É compreensível que a metáfora desse os farrapos como vitoriosos. O projeto farrapo exprimia uma revolução política liberal, abeberada na Revolução Francesa, a saber, república e federação. Nada mais supinamente idiota do que cobrar deles, como o fazem alguns monomaníacos ideólogos, um projeto de revolução marxista avant la lettre, quando o próprio Marx ainda era apenas um imberbe estudante sem outro horizonte político que o liberalismo. Claro, a metáfora idealizou os combatentes farrapos como heróis perfeitos e imaculados, eliminando quanto pudesse enfear-lhes a imagem. Os farrapos se autodenominavam “continentinos” ou rio-grandenses; jamais admitiriam ser chamados gaúchos, termo pejorativo que indicava o pobre-diabo da Campanha. Ao batizar os farrapos como gaúchos, a metáfora criou um orgulhoso gentílico para todos os habitantes da região, qualquer que fosse a origem. Engendrou um folclore associado à Revolução. Assim também, oficializou-se a metáfora do irredento autonomismo da “pátria gaúcha”, através do feriado, do hino e da bandeira. A metáfora farroupilha, em suma, construiu nossa peculiar identidade cultural. Está sempre a se enriquecer: Netto Perde sua Alma, o filme de Beto Souza e Tabajara Ruas, não se abstém duma licença poética ao atribuir aos farrapos o objetivo de promover a abolição e a democracia. De resto, em vários instantes, perpassa no filme o forte sopro épico que sempre foi apanágio da metáfora farroupilha. O autonomismo gaúcho sofre hoje os maus-tratos dum crasso e maldisfarçado neocentralismo. O sistema federativo funciona de forma cada vez mais defeituosa, assim pelas intrusões do poder central na esfera do nosso peculiar interesse, como por política econômico-financeira que nos constrange a mendigar alguns dos mais genuínos interesses da região. O 166º aniversário deve fazer pensar sobre esta empobrecedora e humilhante regressão centralista. Eleição direta no PT LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA O Partido dos Trabalhadores inovou mais uma vez positivamente a política brasileira ao se tornar o primeiro partido a realizar eleições diretas em todas as instâncias partidárias, da direção nacional às zonais, envolvendo centenas de milhares de militantes em todo o país. O primeiro turno das eleições foi realizado no domingo, 16 de setembro. Como é característica do PT, houve disputas acirradas. Nada menos de sete chapas concorreram à direção nacional. Dirigentes e militantes debateram com firmeza suas posições, como sempre fazem, mas participaram das eleições em clima de festa e de unidade partidária. A vitória do companheiro José Dirceu, reelegendo-se pelo voto direto para a presidência do partido, foi reconhecida pelos outros candidatos concorrentes mesmo antes da finalização da apuração. O PT sabe que para derrotar as políticas conservadoras é necessário fazer alianças Com essa iniciativa, o nosso partido não apenas consolida as posições políticas básicas que já vem defendendo, como dá mais uma significativa contribuição à construção e ao fortalecimento da democracia no Brasil. Basta lembrar o papel que o PT desempenhou nas lutas para vencer a ditadura militar e realizar a redemocratização, bem como a liderança que exerceu na campanha das “Diretas Já!” em todo o país. O processo de eleições diretas resolveu de forma transparente para os petistas e para a sociedade a questão da representatividade dos dirigentes do partido. As teses políticas, de todas as tendências, foram divulgadas e debatidas amplamente, permitindo que as posições existentes entre os militantes sejam conhecidas em profundidade, assim como o apoio e a adesão que têm dentro do partido. Além da oxigenação e do revigoramento da militância, o PT mostrou à sociedade brasileira que a maioria do partido reafirma a trajetória vitoriosa que levou aos significativos resultados positivos nas eleições municipais de 2000 e que está alicerçando as condições para vencer as eleições gerais em 2002. Em poucas palavras, o PT demonstrou mais uma vez que está cada vez mais preparado para governar o Brasil. A democracia no PT é questão de princípio. O partido tem uma linha política programática de atuação, mas constrói os seus programas de governo nos debates políticos internos e com a sociedade, considerando as alterações na conjuntura. O PT é um partido orgânico, de militantes, mas é também um partido de massa, de filiados, que tem atuação direta nas entidades e organizações da sociedade. É um partido que dirige suas bancadas de parlamentares e que interage com seus governadores e prefeitos. É um partido que nasceu das lutas sociais e continua e continuará nelas. A sociedade brasileira quer outro rumo para o país. O PT luta para mudar o modelo econômico e retomar o desenvolvimento, gerando empregos, combatendo a fome, a violência e a desigualdade social. Tudo isso com ética na política e ferrenho combate à corrupção. O mundo está mudando e o Brasil tem um papel soberano a cumprir não somente na América Latina como na reordenação multipolar que deverá ocorrer em nível internacional. O PT sabe que para conseguir derrotar as políticas conservadoras é necessário fazer alianças. Já vem fazendo isso e os resultados estão aí para que todos vejam. Acredito que vamos construí-las com todas as forças que se opõem às políticas neoliberais do governo FH. Sonho que isso possa ocorrer ainda para o primeiro turno. Mas, se não for possível, certamente isso se dará no segundo turno ou, na pior das hipóteses, depois da esperada vitória de um dos candidatos das oposições. O Brasil precisa disso para mudar. “Outro Brasil é possível”. Com esse título, a tese defendida pela chapa de José Dirceu propõe somar forças com quem tem objetivos políticos, sociais, éticos, semelhantes aos do PT. Isso significa combater a corrupção do atual sistema de poder e a subserviência desse sistema aos centros econômicos e políticos de poder no mundo. Significa também resgatar a soberania nacional, com desenvolvimento econômico e distribuição de renda. Colunistas JOSÉ BARRIONUEVO – PÁGINA 10 Ciro ganha estrutura com 24 deputados na AL O ingresso de uma dezena de integrantes do primeiro escalão do PMDB gaúcho no PPS é o mais importante apoio recebido por Ciro Gomes nos últimos tempos como candidato à sucessão de Fernando Henrique Cardoso. A opção dos dissidentes pelo partido de Bernardo de Souza reforça no Estado o apoio arquitetado por Sérgio Zambiasi ao ex-ministro, que tem em Leonel Brizola, líder maior do PDT, um de seus principais articuladores em nível nacional. A frente a ser montada, que envolve também o governo do Estado e as vagas de senador, ganha força com o ingresso do grupo no PPS. Com o apoio de 24 deputados estaduais (10 do PTB, sete do PDT e sete do PPS), a candidatura de Ciro deve deslanchar no principal reduto do PT no país. Padilha e Fogaça debatem no Polêmica O ministro Padilha e o senador José Fogaça estarão frente a frente segunda-feira debatendo a crise no PMDB nacional e estadual. O confronto está marcado para o programa Polêmica, da Rádio Gaúcha, a partir das 9h30min, sob o comando de Lauro Quadros. Bernardo lidera nova bancada Depois de trocar o PSB pelo PPS por divergências com o governo Olívio, o deputado Bernardo de Souza se reencontra na próxima semana com antigos companheiros do MDB e do PMDB. Pelo PMDB, Bernardo foi prefeito de Pelotas e conquistou seu primeiro mandato de deputado, tendo comandado a Secretaria da Educação no governo Simon. Não haverá dificuldades de entrosamento com seis (ou sete) novos companheiros na bancada do PPS, que passará a ter sua maior representação do país na Assembléia gaúcha. Prefeitura em 2004 Dois vereadores que trocam de partido se aquecem para concorrer à prefeitura de Porto Alegre em 2004: Fortunati, pelo PDT, e Clênia Maranhão, pelo PPS. Bogo reavalia Com a ida do grupo do PMDB para o PPS, é mais provável que Vicente Bogo opte pelo PDT. Atração fatal Simon tem dois caminhos a seguir: acompanhar o movimento rumo ao PPS de Ciro e Bernardo ou se aliar ao PT. Não será surpresa se fizer a segunda opção. No segundo turno. Dupla cresce Com a saída do grupo de Antônio Britto e Paulo Odone, o PMDB deverá optar por Cezar Schirmer e Germano Rigotto para a eleição majoritária. O partido deverá repetir no Estado a aliança que fará em nível nacional. Líder na Câmara Nome natural para concorrer ao Piratini, Padilha prefere retornar à Câmara com a certeza de que será um dos mais votados do Estado. Habilidoso articulador, tem vaga reservada na liderança do PMDB na Câmara na próxima legislatura. Apuração rápida – Contrastando com a apuração do PT, que ainda não foi concluída, o PPB pretende indicar quem será o candidato a governador antes da 22h deste domingo. Nesta sexta, em Gramado, Celso Bernardi e Fetter Júnior participaram da última reunião preparatória para a convenção. Em Porto Alegre, duas chapas concorrem ao diretório metropolitano. Hugo Mardini deverá ser o novo presidente. Governador busca recursos em Brasília O governador Olívio Dutra e o secretário Adão Villaverde acampam em Brasília a partir de quarta-feira. Juntamente com a bancada federal gaúcha, pretendem assegurar recursos para o Estado no Orçamento da União. Contarão com o apoio da senadora Emília Fernandes, com quem Villaverde conversou esta semana em Porto Alegre. Tem reunião marcada com Sampaio Dória (PSDB-SP), relator do projeto. Ordem – O governador do Estado baixou uma ordem para que os secretários viajem semanalmente a Brasília para acompanhar nos ministérios o andamento do Orçamento e os recursos que estão sendo destinados ao RS em 2002. Quer evitar o encolhimento das dotações na undécima hora por falta de mobilização política. Mirante • Um detalhe: os deputados que estão deixando o PMDB ocupam a linha de frente em plenário. João Osório é o único que restou na bancada que é aguerrido no debate. • O PTB vai para cima do deputado João Osório, abrindo espaço para que o hoje peemedebista se eleja deputado federal. • Ex-chefe da Casa Civil, Mendes Ribeiro é quem ainda segura João Osório no PMDB. • Há uma razão que leva José Fogaça a examinar melhor sua ida para o PPS: no Senado, a bancada integra o bloco de oposição que é comandado pelo PT, que detém a bancada majoritária. • Brizola gostaria de contar com Fogaça. O líder do PDT chega neste sábado ao meio-dia, reunindo-se ainda no aeroporto com a cúpula do PDT. • Brizola segue para Ivorá, onde encerra na noite deste sábado a semana de debates sobre o centenário de Alberto Pasqualini. • O ingresso do grupo peemedebista no PPS não muda os planos de Brizola de contar com José Fortunati como candidato a governador ou a senador. Sem Britto na majoritária. • Estranho o rompimento de Britto com o Planalto. Foi seu aliado de primeira hora. FH lançou a última campanha para presidente da República no Gigantinho ao lado do ex-governador. • O grupo de deputados que ingressará no PPS passa o fim de semana dando satisfação às bases e buscando nomes para integrar a nominatas proporcionais para a Assembléia e a Câmara em 2002. • Presidente da Federação de Servidores Públicos, Sérgio Arnoud também pretende ingressar no PPS. Para concorrer. • Sebastião Mello e Fernando Zachia permanecem na bancada do PMDB da Câmara da Capital. Clênia vai recriar a bancada do PPS, que foi extinta com a saída de Lauro Haggemann, hoje no PT, que não concorreu à reeleição. ROSANE DE OLIVEIRA Sucessão começa a se definir Com a escolha, neste domingo, do candidato do PPB ao Palácio Piratini, a sucessão estadual começa a tomar forma. O PPB primeiro definiu que teria candidato próprio. Celso Bernardi e Fetter Júnior entraram em campo para tentar conquistar os votos dos filiados. A preocupação do PPB é largar na frente e difundir suas propostas enquanto os outros partidos negociam alianças. Não está nos planos do PPB aderir ao frentão anti-PT que está sendo costurado pelos dissidentes do PMDB com o PPS, o PTB e o PDT. A avaliação dos dirigentes é de que a candidatura própria é necessária para reforçar o número 11 na campanha e assim conquistar maior número de cadeiras na Assembléia e na Câmara. Em 1998, o PPB apoiou a candidatura de Antônio Britto, ofereceu José Otávio Germano como vice, mas não se coligou na eleição proporcional. Fez 11 deputados estaduais e cinco federais. O PPB pretende se aproveitar do desgaste do PMDB, que está para perder o ex-governador Antônio Britto e pelo menos seis deputados estaduais e um federal para ampliar sua força no Interior. Como o PMDB, mesmo desfalcado, também deve apresentar candidato próprio para garantir a sobrevivência como legenda, o cenário mais provável em 2002 é de um primeiro turno com quatro candidatos de partidos representativos e mais os nanicos, que nunca faltam. No primeiro turno serão três de oposição contra Olívio Dutra ou Tarso Genro, do PT. O segundo é outra história. Se o candidato do frentão for Britto, filiado ao PPS, e chegar ao segundo turno contra o PT, terá assegurado o apoio do PPB, mas não o dos líderes do PMDB remanescente. – Se Britto for candidato por outro partido, será tratado como um traidor – avisa um dos líderes da facção que se contrapõe ao ex-governador. Os aliados de Britto têm certeza de que alguns dos antigos companheiros serão capazes de votar no PT para impedir a vitória do ex-governador. Outros, podem até fazer campanha, principalmente se o vencedor da prévia for o prefeito Tarso Genro. Editorial Ameaça às liberdades Além das incalculáveis perdas de vidas humanas e dos prejuízos materiais e morais impostos aos Estados Unidos e ao mundo, o terrorismo ameaça transformar em vítimas algumas das mais caras tradições norte-americanas. Dentre elas, estão a própria liberdade de imprensa e as liberdades civis de maneira geral. Em períodos em que a retórica de guerra predomina, como vem ocorrendo na América do Norte desde a agressão que se transformou num marco divisório das relações globais, os direitos individuais de maneira geral acabam, infelizmente, sendo confrontados com algum tipo de restrição. Reconhecida como um parâmetro de isenção, a ponto de ser apontada como uma espécie de poder nos EUA, a própria imprensa não conseguiu escapar de equívocos ao se deixar envolver em excesso pelo fervor patriótico. Nem mesmo um profissional como Dan Rather, âncora e editor do principal jornal da rede de televisão CBS, conseguiu escapar à polêmica. Além de chorar durante uma entrevista diante das câmeras, não hesitou em se colocar integralmente à disposição do presidente George W. Bush, argumentando: “Como americano, ele terá o que quiser de mim”. Não é esse um exemplo isolado: a maior rede de rádios do país, a Clear Channel Communications, listou 162 músicas que não devem ser executadas porque suas letras seriam questionáveis. O índex inclui de New York, New York, celebrizada por Frank Sinatra, à pacifista Imagine, de John Lennon. É importante não perder de vista que o inimigo é o terror, e não o direito Sob o impacto da agressão fulminante, também a sociedade americana busca refúgio na fé patriótica. A crença, revelam as pesquisas, é que, dessa forma, irá concorrer para a reparação da violência a que foi submetida. Diante dessas condições, a Casa Branca arma-se para pressionar o Congresso a ampliar os poderes do Serviço Nacional de Imigração e Naturalização. Abre-se também o caminho para intervenções como a monitoração de computadores, revistas com detector de metais em espetáculos e até mesmo proibições como a de portar mochila em parques. Quando uma nação se vê transformada em alvo de um ataque inominável, é imperativo que se tomem as precauções possíveis para proteger a população, exterminar as fontes de risco e punir os culpados. Em períodos de guerra, as exceções são inevitáveis, mas o risco maior é de que acabem se tornando permanentes. No caso específico, porém, é importante não se perder de vista que o inimigo é o terrorismo, nunca a liberdade. Nenhuma catástrofe é motivo suficiente para que soneguem informações à opinião pública. Essa é aliás uma distorção permanente, em qualquer época, em países sob regimes ditatoriais, a começar pelo Afeganistão, cujos habitantes, em maioria, sequer sabem a enormidade da repercussão mundial dos ataques suicidas. Tal não pode ocorrer no entanto nos EUA nem em outras sociedades democráticas. Já em 1923 a Sociedade Americana de Editores de Jornais estabelecia em seu código de ética que “a liberdade de imprensa deve ser protegida como um direito vital da humanidade. Ela é o direito indiscutível de discutir qualquer coisa que não seja explicitamente proibida por lei, inclusive a sabedoria de qualquer estatuto restritivo”. Quase 80 anos depois, não há motivos para alterar uma linha dessa declaração de princípios. Realismo na incerteza Diante de um clima equivalente ao de crash nas bolsas de valores e de um mercado pouco permeável a qualquer otimismo, autoridades monetárias vêm-se empenhando nos últimos dias em incutir alguma dose de confiança nos investidores. Em depoimento no Senado, o presidente do Federal Reserve – o banco central norte-americano – admitiu prejuízos inevitáveis devidos particularmente à retração dos consumidores e às dificuldades de setores como o de aviação, embora restritos ao curto prazo. Reconheceu o senhor Alan Greenspan, porém, que a inédita adesão de países aos Estados Unidos contra o terrorismo favorece, mais do que nunca, a rodada mundial de negociações comerciais. Na véspera, o diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Horst Koehler, já havia sugerido ao Brasil “não exagerar o pessimismo”. São acenos importantes, mas que precisam redundar em efeitos práticos imediatos para que consigam se contrapor ao pessimismo. Dentre o conjunto de ações preocupadas em reverter o ânimo dos mercados financeiros, às voltas com uma safra inquietante de sucessivos maus resultados, sobressai-se a intenção do presidente George W. Bush de adotar um programa de incentivos para reativar a economia norte-americana. Uma iniciativa bem-sucedida nesta área acabaria favorecendo países em desenvolvimento com sérias dificuldades para assegurar níveis mínimos de expansão da atividade econômica como o Brasil. Ainda que o país se apresente hoje com os fundamentos de sua economia mais sólidos, como reconhece o próprio FMI, as incertezas do cenário internacional e a redução dos investimentos estrangeiros agravam a situação das contas públicas. Nesse cenário, resta ao país investir no aumento da produtividade e exportar mais, como reconhece o presidente do Banco Central, Armínio Fraga. Mesmo vagas, as ações para impedir que os mercadoscaiam no marasmo têm o mérito de conter os prejuízos Mesmo vagas, portanto, as ações para impedir que os mercados caiam no marasmo têm pelo menos o mérito de conter os prejuízos. É importante, portanto, que o país se mantenha atento a esses sinais externos, persistindo mais do que nunca nas medidas que contribuam para reduzir a vulnerabilidade de sua economia, como a excessiva dependência de recursos internacionais. Momentaneamente, as condições externas não poderiam ser mais adversas para um país como o Brasil, que, para equilibrar o seu balanço de pagamentos, precisa ampliar consideravelmente as exportações. Se as estimativas do guardião da moeda norte-americana se confirmarem, as barreiras comerciais impostas pelo mundo rico aos países em desenvolvimento podem estar paradoxalmente mais próximas do fim, em meio às dificuldades. O Brasil precisa estar preparado para não ficar à margem quando esse momento, finalmente, se confirmar. 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09/23/2001


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