Diógenes isenta Olívio e diz que deu carteiraço
Diógenes isenta Olívio e diz que deu carteiraço
Presidente do Clube de Seguros da Cidadania confessa que usou indevidamente nome do governador
Um dia depois de a CPI da Segurança Pública da Assembléia Legislativa trazer a público a gravação que relaciona o governo do Estado e o PT com o jogo do bicho, o presidente do Clube de Seguros da Cidadania, Diógenes de Oliveira, reapareceu para dizer que usou o nome do governador Olívio Dutra indevidamente.
Em entrevista coletiva no escritório do advogado Ricardo Cunha Martins, na Rua Uruguai, no centro da Capital, no final da tarde de sábado, Diógenes disse que deu “um carteiraço” ao chamar o então chefe de Polícia, delegado Luiz Fernando Tubino, para conversar na sua casa. Prometeu, ainda, fazer “revelações importantes sobre as verdadeiras questões de segurança pública” e sobre “onde está a lavagem de dinheiro no Estado”.
Na entrevista, que durou cerca de 30 minutos, Diógenes afirmou que pode ter se “expressado mal” ao fazer ilações sobre o envolvimento do governo e do PT com o jogo do bicho. Ressaltou que tinha amigos entre os bicheiros e queria ajudá-los. Na gravação divulgada pela CPI ele pede a Tubino que alivie a repressão ao jogo do bicho com a justificativa de que o PT sempre teve “uma relação muito boa, muito estreita, com esse pessoal”. Antes do início da entrevista, o advogado de Diógenes advertiu aos jornalistas:
– Pessoal, não vamos transformar essa entrevista numa segunda CPI.
Martins disse que seu cliente tem problemas de saúde – seqüelas da malária contraída na África e hipertensão arterial –, além de estar muito cansado por ter acabado de chegar de viagem à Espanha, mais especificamente da cidade de Sevilha, onde estava descansando (ao falar, mais tarde, Diógenes deu outra versão a sua viagem, dizendo que estava na Europa a trabalho).
Na entrada do escritório, todos os repórteres, cinegrafistas e fotógrafos foram convidados a escrever seus nomes, telefones e veículo para o qual trabalham em uma folha de papel em branco. A justificativa foi de que isso facilitaria o contato no caso de Diógenes ter alguma informação adicional para passar à imprensa e para manter uma “relação fraterna” com os jornalistas lá presentes.
Martins pediu que os jornalistas deixassem Diógenes falar primeiro tudo o que quisesse para só depois iniciarem as perguntas.
Confortavelmente sentado em uma poltrona antiga, diante de uma estante abarrotada de livros de Direito, Diógenes gesticulou muito. Aparentava nervosismo. Vestindo uma camisa de seda de mangas curtas verde bandeira, gravata vermelha quadriculada e calça azul marinho, ironizou algumas perguntas, tangenciou outras. Irritou-se em algumas interpelações dos repórteres sobre as gravações:
– Não vamos fazer debate aqui. Eu estou dando uma entrevista.
Ao admitir que conversou com o delegado Tubino em sua própria casa, no bairro Cidade Baixa, no início de 1999, negou ser ele o autor da gravação.
– Como a conversa foi na minha casa, e eu não iria gravar a mim mesmo e depois me auto-denunciar, tirem aí os senhores a ilação que quiserem sobre quem teria feito esta gravação.
Vieira da Cunha diz que PT está tentando preservar governador
A entrevista de Diógenes não convenceu o relator
O relator da CPI da Segurança Pública, Vieira da Cunha (PDT), apontou o que considera uma contradição nas declarações do presidente do Clube de Seguros da Cidadania, Diógenes de Oliveira, à imprensa.
– Ao mesmo tempo que ele diz que tentava dar um carteiraço, ele diz que não estava falando em nome do governo. Ele só poderia dar o carteiraço se tivesse esse poder – afirmou Vieira.
Em entrevista coletiva concedida à imprensa no sábado, Diógenes disse que não tinha autoridade para falar em nome do governador Olívio Dutra com o delegado Luiz Fernando Tubino, mas quis dar um “carteiraço” no policial.
A CPI investiga a possibilidade de a sede estadual do PT, na Capital, ter sido adquirida com recursos doados por bicheiros. O prédio, na Avenida Farrapos, foi adquirido pelo Clube e cedido, em regime de comodato, ao partido. As primeiras suspeitas em torno da transação surgiram com as declarações do ex-tesoureiro do PT Jairo Carneiro ao jornal Diário Gaúcho. Carneiro afirmou que bicheiros haviam contribuído para a compra do prédio e para a campanha eleitoral do governador Olívio Dutra
Vieira também identificou na entrevista a confirmação de sua tese de que está em curso uma estratégia para preservar a figura do governador Olívio Dutra.
– Diógenes de Oliveira, o governador e o Clube da Cidadania são figuras indissociáveis. A relação entre Diógenes e o governador vem de longa data – disse Vieira.
Vieira apontou o que considera uma contradição nas declarações de Diógenes à imprensa. Na entrevista, o presidente do Clube disse que tentava dar um “carteiraço” em Tubino para impedir a repressão ao jogo do bicho.
O parlamentar tem prazo até o dia 14 de novembro para apresentar seu relatório. O texto deverá incluir o resultado das análises dos sigilos bancários e telefônicos dos dirigentes do Clube e do ex-tesoureiro do PT Jairo Carneiro. Segundo ele, os documentos apresentam dados importantes. Vieira não quis adiantar o teor das informações, alegando que as mesmas devem ser repassadas em sigilo ao Ministério Público.
Hoje, a CPI toma o depoimento do secretário substituto da Justiça e da Segurança, Lauro Magnago, do chefe de Polícia, José Antônio Araújo, e do comandante-geral da Brigada Militar, Gérson Nunes Pereira. Na quinta-feira, comparecem à audiência doadores do Clube da Cidadania. Entre esses, Vieira destacou a audiência com o representante da Associação Municipalista Brasileira (Ambras), que teria repassado R$ 50 mil à entidade:
– Ninguém nunca ouviu falar dessa associação.
Diógenes será ouvido no dia 5 de novembro, junto com o diretor de seguros, Daniel Verçosa Gonçalves.
PT avalia estragos provocados pela fita
O futuro de Diogénes de Oliveira no PT deve ser decidido amanhã, em reunião, pela executiva estadual
O destino de Diógenes de Oliveira no PT deve ser decidido amanhã, a partir das 9h, em reunião da executiva estadual do partido. A direção do PT deve fazer um balanço dos efeitos da divulgação do conteúdo da conversa entre Diógenes e o delegado Luiz Fernando Tubino, ex-chefe de Polícia.
Petistas com cargos de assessoria nos governos estadual ou municipal fizeram voto de silêncio no fim semana, desligando os celulares e não respondendo às mensagens deixadas nas caixas postais.
No sábado à tarde, 10 minutos depois de encerrada a entrevista coletiva de Diógenes no escritório de seu advogado, Ricardo Cunha Martins, chegaram ao prédio da Rua Uruguai o presidente eleito do diretório estadual do PT, David Stival, e frei Sérgio Görgen, ex-diretor de Assuntos de Assentamentos da Secretaria da Agricultura e Abastecimento. Ambos são da mesma corrente de Diógenes, a Articulação de Esquerda.
Em meio a um grupo de cerca de 10 pessoas, Stival e frei Sérgio se dirigiram rapidamente ao 13º andar e entraram no escritório de advocacia, que teve as portas fechadas e as luzes da recepção apagadas. Nesse mesmo momento, o prefeito Tarso Genro estava em seu gabinete, uma andar acima, reunido com assessores.
O advogado de Diógenes disse que não havia nenhuma reunião previamente combinada da corrente. Segundo Martins, o grupo estava na Feira do Livro quando um dos líderes petistas ouviu pelo rádio que Diógenes concedia entrevista naquele momento perto dali. Stival, o frei e outros correligionários teriam decidido ir até o prédio acompanhar a entrevista. Ontem, Stival e frei Sérgio não retornaram às ligações e re cados deixados em seus telefones por Zero Hora.
No Palácio Piratini, o governador Olívio Dutra tomou para si a tarefa de comentar o assunto.
Em duas entrevistas coletivas, na sexta-feira à noite e na tarde de domingo, antes de embarcar para Dacar, na África, onde participa de uma reunião do comitê internacional do Fórum Social Mundial, Olívio repetiu que não autorizou ninguém a falar em seu nome. O vice-governador, Miguel Rossetto, não quis se manifestar. Sua assessoria informou que ele poderá falar hoje, se for preciso.
No sábado pela manhã, o presidente estadual do PT, Júlio Quadros, não quis comentar o assunto. Na noite de ontem, porém, Quadros criticou a atitude de Diógenes e não quis antecipar qualquer comentário sobre uma eventual punição.
– Ele teve uma atitude desrespeitosa ao partido ao usar de uma autoridade que não possuía. Vamos discutir o assunto na executiva, mas ficou claro que este é um caso isolado e que nenhum outro fato está relacionado ao episódio. A responsabilidade por isso é do próprio Diógenes – disse.
O movimento Rede do PT, ao qual Tarso pertence, reuniu-se na tarde de sábado e divulgou uma nota de solidariedade a Olívio e ao governo “absolutamente confiantes em sua honestidade e integridade”. A Rede avalia o episódio como uma “possibilidade de armação política para atingir não só ao governo como a própria pessoa do governador” mas pede à direção do partido que dê início a uma “severa e completa investigação sobre os fatos”.
O vereador da Capital Adeli Sell, se considerou chocado e indignado com o que leu e viu sobre as supostas relações do PT com o jogo do bicho.
– Lancei há pouco tempo um manifesto chamado Tolerância Zero com as ilegalidades e hoje vejo como estava certo e como continuo certo ao combatê-las – diz o vereador, que defende uma “punição exemplar” caso seja comprovado qualquer ilícito neste caso apontado pela CPI da Segurança.
Líderes nacionais do PT saem em defesa do governador
Presidente do partido solicitou cópia da gravação da conversa entre ex-assessor de Olívio e delegado
Com um discurso ensaiado, lideranças do PT defenderam ontem, em São Paulo, o governador Olívio Dutra das acusações de suposto envolvimento com o jogo do bicho.
– Não tememos esta investigação. O governo Olívio Dutra está com as mãos limpas e combate o jogo do bicho – disse o presidente nacional do partido, José Dirceu.
Segundo Genoíno, Dirceu requisitou uma cópia da fita. A direção do partido também quer ouvir a defesa de Diógenes de Oliveira, que atuou na captação de recursos na campanha eleitoral de Olívio Dutra, em 1998
– É um episódio circunscrito à área policial. O governador não tem nada a ver com isso. Mas, se alguém no PT ou no governo teve algum contato ilegal, que pague a culpa – disse o deputado federal José Genoíno (SP), um dos pré-candidatos do partido para a disputa do governo de São Paulo.
Numa conversa gravada no início de 1999, entre Diógenes e o então chefe de Polícia, Luiz Fernando Tubino, o ex-assessor solicita que os bicheiros não sofram repressão, com o intuito de preservar as relações entre os contraventores e o partido. Ele diz ao delegado estar falando em nome de Olívio Dutra. A gravação foi divulgada pela CPI da Segurança, na sexta-feira.
No sábado, em entrevista coletiva concedida em Porto Alegre, Diógenes confirmou o teor do diálogo, mas disse que estava fazendo uma “bravata” ao citar o nome do governador. Ele afirmou não ter recebido a incumbência de conversar com o delegado.
– O nome do Olívio não aparece. Estão querendo envolvê-lo nessa história. Trata-se de uma conversa de um assessor com um delegado – disse Genoíno.
O mesmo argumento foi repetido pela prefeita paulistana, Marta Suplicy:
– É um caso de polícia. Já foi dito que o governador não tem nada a ver com isso, muito menos o PT. Que a polícia investigue e que isso seja apurado.
Genoíno afirmou estar preparado inclusive para que o episódio no Rio Grande do Sul seja usado na campanha do próximo ano, quando as atuais administrações petistas deverão servir de vitrine para as disputas estaduais e para a eleição presidencial:
– Vamos para uma campanha pesada, muito radicalizada. Estou preparado para o vale-tudo.
Não serei o primeiro a usá-lo, mas aprendi na política a dançar conforme a música.
O presidente de honra do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, foi procurado ontem por Zero Hora para se manifestar sobre o assunto, mas não foi localizado. Segundo a assessoria, o petista estaria com sua família e deverá se pronunciar hoje sobre as denúncias. Na sexta-feira, o presidente de honra do PT comemorou seu aniversário de 56 anos, numa festa que reuniu a cúpula petista e cerca de 1,8 mil pessoas em um restaurante de São Bernardo do Campo (SP).
“As pessoas têm seu momento ruim”
Entrevista: Olívio Dutra, governador do Estado
Antes de embarcar para Dacar, na África, o governador Olívio Dutra disse ontem que o secretário da Justiça e da Segurança, José Paulo Bisol, está autorizado a reunir todo o material sobre a “banda podre das polícias e da contraversão” e entregá-lo o à CPI da Segurança Pública. A seguir, os principais trechos da entrevista do governador:
Pergunta – Depois da entrevista de Diógenes de Oliveira, como o senhor avalia a denúncia de vinculação do governo ao jogo do bicho?
Olívio Dutra – Não há nenhuma remota vinculação de nosso governo com a contravenção e com o banditismo que desde janeiro de 1999 tentamos desmontar. Nenhuma ameaça e nenhuma chantagem nos impedirá de continuar neste combate à a banda podre das polícias.
Pergunta – Quem fala pelo governo?
Olívio – Ninguém foi autorizado por mim e nem por ninguém a representar ou falar pelo governo do Estado.
Pergunta – O senhor acha que Diógenes deve ser expulso do PT?
Olívio – As medidas cabíveis com relação à conduta de um filiado devem ser tomadas pela direção do partido. A atitude de Diógenes tem a nossa total reprovação e tenho certeza que o PT vai fazer o bom e duro combate àqueles que se conluiam com a banda podre e com a contravenção.
Pergunta – Como fica a imagem do partido?
Olívio – O partido tem um patrimônio que não é dinheiro, é ética e transparência. Não vamos abdicar um milímetro sequer de preservar esse patrimônio, mesmo que os ataques venham de forças poderosas da contravenção ou da banda podre da polícia.
Pergunta – Como estava sua relação com Diógenes até este momento?
Olívio – O Diógenes, até onde sei, é uma pessoa íntegra. Há muito tempo não conversava com ele. Foi um excelente secretário de Transportes no município de Porto Alegre. Não é só meu conhecido, ele é conhecido de milhares de pessoas e tem uma história na luta social política desse país. Agora, as pessoas têm seu momento ruim.
Genoíno larga na frente na disputa pela indicação
PT paulista escolhe candidato
O deputado federal José Genoíno (PT-SP) deve mesmo vencer a prévia petista para a escolha do candidato do partido ao governo do Estado de São Paulo. Até as 20h de ontem, Genoíno liderava a apuração, com 87,4% da preferência, entre 9,8 mil votos apurados.
Segundo o presidente do diretório estadual do partido, Paulo Frateschi, tudo indicava que havia quórum na prévia, contrariando as expectativas de baixíssimo comparecimento. No início da noite, o outro pré-candidato, deputado estadual Renato Simões, tinha 12,6% dos votos apurados. O resultado da prévia deve ser anunciado, segundo Frateschi, às 10h de amanhã.
Genoíno votou pela manhã, ao lado da prefeita Marta Suplicy e do deputado federal Aloísio Mercadante, no bairro de Pinheiros. A candidatura deverá ser oficiali zada no Encontro Estadual do PT, no fim de novembro. No encontro, deve ser fechada a política de alianças do partido, que espera ser cabeça de uma chapa que inclua PDT, PSB e PC do B. A grande expectativa é sobre a participação de Luiza Erundina (PSB), como vice-governadora.
– Queremos uma coalizão política, que discuta candidatos, programa, campanha e governo comuns – explicou Genoíno.
FH discute gestão econômica com Tony Blair
O presidente e sua mulher, Ruth, deixaram Madri ontem e pernoitaram na casa de campo do primeiro-ministro
Embora não integre a agenda oficial na Europa, o presidente Fernando Henrique Cardoso e a primeira-dama, Ruth, pernoitaram na casa de campo do primeiro-ministro da Inglaterra, Tony Blair, onde discutiram gestão econômica.
A viagem foi um convite do primeiro-ministro britânico. O ex-presidente norte-americano Bill Clinton também participou do encontro.
Opresidente desembarcou no início da noite de ontem em Chequers, a 70 quilômetros de Londres. Apenas FH e Ruth hospedaram-se com Blair, em sua casa de campo, localizada em Buckinghamshire.
Para receber FH e Clinton, um forte esquema de segurança foi organizado ao redor da área, impedindo inclusive que qualquer veículo estacionasse nas proximidades. Cercada por uma área de mil acres, a manor house (casa-grande) de Chequers é repleta de tradição. Historiadores acreditam que o local abriga uma edificação, reformulada ao longo dos séculos, desde os tempos do Império Romano e abrigou várias famílias de nobres até os tempos modernos.
A manor-house também foi propriedade dos Knights Hospitallers, uma ordem aristocrática religiosa e militar dos tempos das Cruzadas. Wirston Churchill utilizou muito a propriedade durante os bombardeiros aéreos alemães contra Londres na II Guerra Mundial. Vários presidentes norte-americanos foram hóspedes em Chequers, inclusive Richard Nixon, que lá permaneceu em duas ocasiões. Entre os tesouros da residência, estão um pedestal de carvalho utilizado por Napoleão Bonaparte, um relógio de Lord Nelson, um anel que pertenceu à rainha Elizabeth I e a máscara de morte de Oliver Cromwell.
No sábado, FH e o presidente espanhol, José María Aznar, analisaram a situação na América Latina. Os dois dirigentes discutiram as dificuldades enfrentadas atualmente por Argentina e Colômbia e o andamento do processo do Acordo de Livre Comércio entre as Américas. Aznar e FH não fizeram declarações ao término da reunião.
Durante o encontro, do qual participaram também o ministro das Relações Exteriores, Celso Lafer, e o ministro porta-voz do governo espanhol, Pío Cabanillas, os dois dirigentes estudaram a possibilidade de “potencializar uma só voz ibero-americana nos órgãos internacionais, especialmente ns financeiros”, e a necessidade de conseguir um diálogo menos formal e mais espontâneo entre os países durante as reuniões de cúpula ibero-americanas.
Desde a noite de quinta-feira, FH estava em Madri para participar na Conferência sobre Transição e Consolidação Democrática, que se encerrou sábado com a presença do rei Juan Carlos.
As relações bilaterais entre Brasil e Espanha também foram debatidas. Conforme o Itamaraty, os investimentos espanhóis no país somam cerca de US$ 22 bilhões. A Confederação Espanhola de Organizações Empresariais (CEOE) prevê investimentos de aproximadamente US$ 40 bilhões na América Latina, principalmente no Brasil, até 2006.
Na manhã de hoje, retoma a agenda oficial na Europa. FH segue para Paris, onde cumpre roteiro oficial de três dias. A agenda prevê que o presidente faça um pronunciamento na Assembléia-geral francesa.
Artigos
Pela terceira vez
PAULO BROSSARD
Como é sabido, e está documentado, quando candidato, o governador do Estado afiançou solenemente que não proporia a elevação de impostos em seu governo. Foi o compromisso assumido perante o Rio Grande. No entanto, eleito, já no primeiro ano tentou fazer o que se comprometera a não fazer. E o projeto de lei por ele enviado à Assembléia com essa finalidade foi rejeitado por larga margem.
Parece, contudo, que o ilustre governador não entendeu o sentido e alcance daquela rejeição, ocorrida em 1999 no primeiro ano de governo, tanto que, no ano seguinte, voltou a apresentar projeto mascarado com outro nome mas com o mesmo fito, de aumentar a arrecadação mediante o aumento do ICMS. O expediente se chamou Nova Matriz Tributária. Não houve quem não visse o artifício e, pela segunda vez, a Assembléia repeliu a tentativa de majoração tributária do desmemoriado candidato que se comprometera a não propor aumento de imposto uma vez eleito.
Não obstante, antes que o galo cantasse pela terceira vez, pela terceira vez o chefe do governo quebrou o juramento de candidato, pretendendo novamente a elevação tributária, agora sob o rótulo de Programa de Incentivo de Crescimento. Anuncia-se que, na primeira semana de novembro, o projeto de lei estará na Assembléia. Como se informa, o projeto será encaminhado a desoras, às vésperas da votação do orçamento e da clausura da sessão legislativa. Não me parece isto de bom alvitre, mas é de menos. O ponto que me parece capital reside no desequilíbrio da relação entre a carga fiscal a pesar sobre o contribuinte e o que este recebe da administração sob a forma de serviços públicos.
E ainda há quem pretenda aumentar a carga fiscal para, em contraprestação, receber o que não existe ou não presta
Com efeito, é penoso reconhecer, mas não se pode deixar de proclamar que nunca estiveram tão maus os serviços, enquanto a arrecadação nunca foi tão grande. A deficiência deles é inegável e alguns praticamente deixaram de existir. E são serviços da maior relevância. Não funcionam mesmo em relação a coisas menores. Chega a ser total o abandono do homem comum, que também é o contribuinte comum, diante de necessidades igualmente comuns.
Para ilustrar essa realidade, não é preciso sair do vazio da área da segurança. Pode-se dizer que o serviço da segurança deixou de existir entre nós. É chocante, mas não há dia em que a imprensa deixe de registrar cenas de verdadeiro vandalismo, incompatíveis com o nível de civilização que supúnhamos possuir. É constrangedor proclamar, mas a insegurança bateu todos os limites de suportabilidade. Ora, quando o governo deixa de assegurar o mínimo dos mínimos em matéria de segurança, falta ao governo legitimidade para pretender cobrar mais imposto de cidadãos, sejam quais forem, brancos ou pretos, pobres ou ricos, empregado ou desempregado, e a Assembléia, por sua vez, não encontra razões para mais esfolar o contribuinte, tirando de seu bolso um punhado de reais.
O fenômeno que se repete melancolicamente entre a fala do candidato e a ação do governante não é bom nem para os indivíduos envolvidos na cena, nem para a sociedade, que desacredita das pessoas e de seus propósitos, como não é bom ao regime democrático, que se baseia e fortalece na confiança e respeito recíproco que possa despertar entre governantes e governados. A meu juízo, a pedra de toque para aferição desse relacionamento pode encontrar-se na excelência ou deficiência dos serviços públicos que ao Estado cabe prestar.
Em outras palavras, na qualidade do serviço público. Serviço público que não funciona ou funciona mal não é serviço público, é contrafação e arremedo dele. De maneira geral, os serviços públicos estaduais, de que estou me ocupando, nem desejo misturá-los com outros, os serviços públicos locais deixam muito a desejar em matéria de quantidade e qualidade, e em relação a alguns deixam tudo a desejar. E ainda há quem pretenda aumentar a carga fiscal para, em contraprestação, receber o que não existe ou não presta.
A terra merece respeito
FRANCISCO TURRA
A comunidade agropecuária assiste de mãos praticamente atadas às surpreendentes decisões da Justiça sobre reintegração de posse na propriedade rural. Mesmo que manifeste incredulidade e desconforto com o desfecho judicial anunciado, quer através de posições de dirigentes, quer por meio de pesquisa de opinião, o mais grave é que a sociedade gaúcha está aprisionada em seu direito de ter um imóvel e simplesmente ser impedida de usufruí-lo. Apesar de uma propriedade ser considerada inviolável, a nova leitura sobre ocupações de sem-terra instalada há quase três anos no Estado, mais do que respeitar as diferenças políticas e ideológicas, instalou o desrespeito à terra sem precedentes no campo.
Não é preciso se socorrer de números para comprovar-se que as ações fortes e organizadas pelos sem-terra reproduzem apenas a intenção de surrupiar da terra o bem mais precioso para sustentar a humanidade, o alimento. Os ânimos estão em ponto de bala, e o bom senso longe de promover um diálogo civilizado. Com muito desalento se constatam não apenas irregularidades em áreas de assentadas pelo Incra, como proclama o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, mas principalmente a dor de se verificar que a fonte de produção, principal missão do solo, foi transformada em palco de uma guerra de idéias com origem em interesses duvidosos. É neste teatro que a população rural deixou de ser a protagonista principal, em um Estado que abandonou o orgulhoso posto de principal fornecedor de grãos no país, e passou a desempenhar o triste papel em uma peça que só amplia a insegurança dentro da porteira e ameaça a atividade primária.
No Brasil, falta objetividade, equilíbrio, sensatez para
se fazer uma reforma agrária
Em qualquer setor sabe-se sempre existir espaço para os bem-intencionados, os que querem trabalhar e se sentir honrados. O Brasil fértil ainda dispõe de cerca de 150 milhões de hectares de solo para aproveitar com culturas. Por isto é o país apontado por vários especialistas como o grande fornecedor de alimento para o mundo. Um celeiro que conta com várias fronteiras agrícolas, algumas já formadas, outras delineando o novo retrato de uma nação que foi concebida farta.
No Brasil, falta objetividade, equilíbrio, sensatez para se fazer uma reforma agrária. Faltam pessoas capacitadas e com convicção para que possam ser realmente produtores vitoriosos, e não fracassados. O pequeno agricultor precisa merecer uma atenção muito especial, mas que todos os que produzem são importantes porque cumprem uma grande função no contexto social.
O momento é de reconhecer o princípio da função social da propriedade rural, sem desconsiderar, porém, que cada indivíduo tem o direito de usar todas ou nenhuma peça de sua casa ou gleba de terra. Se o produtor sabe de suas obrigações em uma fazenda, o assentado que conquistou uma área junto ao governo também deve transformá-la em sustento para sua família. Em um momento tão frágil como o atual, em que o mundo desfralda o ódio para ceifar milhares de vidas, as diferentes interpretações da lei ou as diversas formas de conduzir a democracia entre os governantes não devem se desassociar da vinculação afetiva que o gaúcho tem pela terra, por seu patrimônio e pelo bem-estar de sua família.
Colunistas
ANA AMÉLIA LEMOS
América Latina
No primeiro momento, os analistas econômicos fizeram previsões sombrias sobre o futuro das economias dos países da América Latina. Entre outras coisas, disseram que a região, que havia sido apontada como prioridade da política externa do governo norte-americano, passou para segundo plano após os atentados de 11 de setembro. As atenções dos Estados Unidos se fixaram no combate ao terrorismo e à guerra contra o governo talibã no Afeganistão. Com o impacto da tragédia sobre a economia interna, especialmente na aviação comercial e na indústria do entretenimento, a administração George W. Bush foi obrigada a injetar recursos do Tesouro para evitar uma catástrofe.
A economia norte-americana, que já estava registrando queda no crescimento, entrou em recessão. Alguns setores temem a falência. A repercussão disso foi desastrosa sobre todas as economias, especialmente aquelas com maior vínculo com o mercado norte-americano, como é o caso da Alemanha. A América Latina, como área mais afastada dos focos terroristas, apesar dos conflitos localizados da Colômbia, passou a merecer atenção dos investidores internacionais. O Brasil, cujas taxas de risco vêm mantendo estabilidade, passa a ser uma boa alternativa para os capitais europeus.
Os vôos de São Paulo para os grandes centros econômicos, como Alemanha e França, continuam lotados nos dois sentidos, nesta época em que viajar de avião provoca pânico em muita gente. A maioria são executivos a serviço de grandes companhias que já operam no Brasil e nos países do Mercosul ou que estão chegando para fincar raízes.
No encontro com o primeiro-ministro da Espanha, José Maria Aznar, sábado, e com os empresários espanhóis que têm investimentos no Brasil, Fernando Henrique Cardoso não precisou falar muito sobre a situação econômica do país. Todos têm muita informação sobre a economia brasileira. A grande dúvida dos investidores repousa, agora, sobre a sucessão presidencial em 2002. Querem saber, por exemplo, se uma eventual vitória de Luiz Inácio Lula da Silva representa risco para os seus negócios no Brasil. Mas FH, com otimismo inabalável, tem garantido que fará seu sucessor.
JOSÉ BARRIONUEVO – PÁGINA 10
Com o aval do governador
Olívio cumpriu sua agenda ontem, incluindo uma visita ao congresso do PSB de Beto Albuquerque e viajou a Paris como se pairasse acima das graves acusações que pesam sobre seu governo, seu partido e um de seus amigos mais próximos. Ninguém tem dúvidas dentro do PT de que Diógenes de Oliveira agia desde a campanha eleitoral com seu aval.
É de se estranhar que o governador não tenha dito uma única palavra antes do aparecimento da fita, diante de declarações de diversos empresários e presidentes de associações de que doaram dinheiro ao PT e às obras sociais do governo. Os deputados da CPI não têm dúvidas: Diógenes agia em nome do governador, que tinha pleno conhecimento da sua movimentação e nada fez.
Dúvidas sobre o Clube da Cidadania
Para os deputados da CPI, o Clube da Cidadania buscava um tipo de contribuição que por razões políticas (doações de empresários e empreiteiras) ou legais (jogo do bicho) não podiam envolver o PT e o governo.
• Diógenes deixou de integrar o primeiro escalão do governo para comandar esta entidade que financiaria ações do PT e de outras entidades ligadas ao partido.
• O encontro de Diógenes de Oliveira com o chefe de Polícia ocorreu numa época em que o PT imaginava que podia tudo, como se tivesse vencido uma revolução e não apenas uma eleição. Foi dentro do mesmo espírito que a Ford foi expurgada do Estado.
• O advogado Ricardo Martins procurou conter seu cliente na entrevista de sábado. Pela verborragia de Diógenes, não teve sucesso. O que fez pode configurar, em tese, crime de corrupção ativa (insinuou vantagem – estabilidade no cargo – a um servidor público para que deixasse de reprimir a contravenção).
• Num governo em que uma escrivã de polícia dá ordem para uma major deixar de atuar na baderna do relógio dos 500 anos, que um sem-terra (Ailton Croda) ordena ao capitão Reinaldo Leal Ribeiro para que “tire seus homens agora” na invasão do prédio da Receita, não chega a ser surpresa que um amigo do governador, chame o chefe de Polícia a sua residência para tratar do jogo do bicho.
O PT pode tudo. Até quando?
Primeiro voto
Cerca de mil filiados participaram ontem nas eleições dos diretórios distritais do PDT em Porto Alegre, com a to na Câmara de Vereadores que se transformou em comício de lançamento de José Fortunati a governador. O vereador mais votado do Estado deu seu primeiro voto no PDT ajudando a eleger Almerinda Thomé para presidente do diretório da 1ªZona Eleitoral. Os 10 presidentes dos 10 diretórios foram escolhidos por consenso. Em dezembro, será escolhido o diretório metropolitano.
Adelmo Genro no encontro do PSB
Pai do prefeito Tarso Genro, Adelmo Genro foi uma figura de destaque no congresso estadual do PSB, encerrado ontem em Porto Alegre. O encontro foi prestigiado por Olívio Dutra e o prefeito de Porto Alegre.
O PSB pretende participar da aliança com o PT indicando Beto Albuquerque para uma das vagas do Senado. Adão Villaverde (secretário do Planejamento, do PT), Adelmo, Beto e Paulo Ferreira (secretário-geral do PT).
Aliança branca
Durante jantar de comemoração do jornal Florense, de Flores da Cunha, José Fortunati e Germano Rigotto, sentados lado a lado, conversaram sobre as próximas eleições e uma eventual aliança do PDT com o PMDB. Independentemente de acerto na coligação, ambos sabem que o voto pode ser cruzado nas três vagas de cargos majoritários (dois de senador e o de governador).Voltam a conversar.
Fortunati é natural de Flores da Cunha.
Mulheres protestam por segurança
Militantes da ala feminina do PPB, a Ação da Mulher Progressista, promoveu uma manifestação na manhã de sábado para exigir segurança em Porto Alegre. A passeata começou na Praça Carlos Simão Arnt, a Praça da Encol, no bairro Bela Vista, e seguiu pela Avenida Nilo Peçanha até o Shopping Center Iguatemi. O protesto, que deve se repetir em outros bairros, recebeu o apoio da Farsul, em razão das invasões a fazendas no Interior. Os vereadores Beto Moesch e Pedro Américo Leal e o presidente do diretório metropolitano do PPB, Hugo Mardini, participaram da mobilização.
Conforme a presidente da Ação da Mulher Progressista, Tereza da Cunha, a passeata foi convocada para mobilizar os moradores do bairro e pressionar o governo do Estado a tomar providências para reduzir o número de assaltos e seqüestros-relâmpago na Porto Alegre.
Mirante
• Moderados estão convencidos de que o episódio envolvendo Diógenes Oliveira afasta em definitivo a candidatura de Olívio Dutra à reeleição.
• Diógenes foi quem implantou o plus tarifário, que permitiu a renovação das frotas dos ônibus, incluindo a Carris. Quase todos os ônibus foram comprados da Marcopolo, que tinha o melhor preço.
• Quando deixou a secretaria dos Transportes, Diógenes aceitou um cargo na Marcopolo.
• A partir de Diógenes de Oliveira, foram muito boas as relações da prefeitura de Porto Alegre com a ATP – uma entidade maldita na avaliação do PT, como oposição. Nunca mais houve problemas na fixação das tarifas de ônibus.
• Uma boa idéia, o Clube de Seguros (da Cidadania), concebida por Carlos Samuel Siqueira, foi desvirtuada. O autor cobra indenização na Justiça.
• Olívio faz o trajeto Paris-Dacar hoje (de avião), uma viagem que servirá para divulgar o Fórum Social Mundial, poderoso instrumento de marketing da esquerda. Vai acompanhado de uma assessora de imprensa, de um coordenador local do evento e do ajudante-de-ordens. Tudo pago pelo Estado. Olívio permanece seis dias ausente das atividades de governo.
• Berfran Rosado (PPS) entende que o governador, antes de enxovalhar a polícia, deveria se empenhar em combater a banda podre do governo.
• Partidos de oposição se reuniram ontem. Decidiram não interferir nos episódios que envolvem o PT e o governo, considerados grave demais para sensacionalismos. Um assunto para a CPI.
• Alguém lembrou Ulysses: “Com tantos substantivos, não há necessidade de adjetivos”.
• A pedido do vice-presidente Elmar Schneider, a CPI deve pedir hoje às emissoras de TV a íntegra da entrevista de Olívio
• A CPI não encerra seus trabalhos dia 14, para evitar o risco de cometer injustiças.
• Brizola chega amanhã para receber o prêmio Líderes e Vencedores. Faz roteiro pelo Estado até sexta, acompanhado de Fortunati.
• Quem saiu bem do episódio foi o secretário Arno Augustin.
• Primeira entrevista do ex-tesoureiro Jairo Carneiro virou vade mecum da CPI. Depois da gravação da conversa de Diógenes comTubino, tudo se encaixa.
• O chefe de polícia só foi casa de Diógenes, rápido, quando convocado, porque sabia que o interlocutor tinha poder de fogo.
ROSANE DE OLIVEIRA
A caminho do sacrifício
A estratégia de defesa do PT, esboçada a partir de sexta-feira, será desqualificar Diógenes de Oliveira como interlocutor do partido e do governo. O próprio se antecipou ao depoimento que dará no dia 5 de novembro e disse que deu um “um carteiraço” quando chamou o delegado Luiz Fernando Tubino, então Chefe de Polícia, para pedir que aliviasse a repressão ao jogo do bicho.
Diógenes admitiu ter cometido um erro, mas não pediu desculpas pelos estragos que suas declarações diante do delegado Tubino estão provocando no patrimônio ético do PT. Ao contrário, manteve a arrogância quando disse que repudia com veemência “qualquer tentativa solerte, matreira ou mal-intencionada de ligar este governo com a contravenção”. Repudia-se a si mesmo, pois. Quem falou em “relações estreitas e muito boas com esse pessoal do Carnaval e do jogo do bicho” foi ele e não os detratores do PT.
A expulsão é o mínimo que espera o ex-secretário municipal dos Transportes – se de fato agiu por conta própria, como declarou em sua primeira aparição pública depois da divulgação da fita. Até ontem não tinha aparecido ninguém para defender Diógenes publicamente. Nada transpirou do conteúdo da conversa a portas fechadas com o presidente do PT, David Stival, e com o frei Sérgio Görgen, 10 minutos depois de encerrada a entrevista coletiva de Diógenes.
Na entrevista, Diógenes anunciou que em seu depoimento à CPI vai fazer “revelações importantes sobre as verdadeiras questões da segurança pública no Estado”. Reina grande expectativa, já que na gravação Diógenes faz críticas ácidas ao “experimentalismo” na área da segurança pública e diz que a secretaria está repleta de amadores a quem chama de “bando de aprendizes de feiticeiros”. Ou, pior: “bando de gente que não entende nada do riscado”.
Como também atacou o secretário da Fazenda, Arno Augustin, é improvável que Diógenes venha a receber clemência da Demcoracia Socialista – corrente do vice-governador Miguel Rossetto, do ex-prefeito Raul Pont e do próprio Arno.
Editorial
A crise argentina
Alguns episódios dos últimos dias colocaram a nu, como em momento algum até aqui, a extrema gravidade da crise argentina. Talvez nada seja mais eloqüente a esse respeito do que os frustrados contatos que o ministro Domingo Cavallo tentou manter com autoridades do governo em Washington. Desaconselhado a empreender a viagem, mesmo assim o czar da economia do vizinho país dirigiu-se a Nova York, onde acabou formalmente comunicado pelo FMI de que os meios oficiais norte-americanos nada tinham a tratar com ele. O fracasso de sua missão, que segundo algumas fontes visava a obter um reforço ao Tesouro idêntico aos US$ 10 bilhões aprovados pelo organismo em agosto, para a reestruturação da dívida externa, não foi seu único dissabor.
De retorno a Buenos Aires, de mãos vazias, esperavam-no novas turbulências em suas complexas relações com as províncias, cujo ajuste fiscal é essencial para que a Argentina supere os efeitos mais agudos da difícil conjuntura que a avassala. Os desentendimentos produziram um tenso encontro com os governadores na quinta-feira, que se resumiu, segundo se noticia, a seis horas de xingamentos e bate-bocas. O resultado ficou patente no dia imediato, quando Cavallo anunciou que não só não enviará os repasses reclamados por seus interlocutores como os denunciará à Justiça. Ainda não foi tudo: ainda na sexta-feira, em entrevista à imprensa, disparou fortes críticas ao Brasil, que segundo ele “faz o que quer com a sua moeda”. A decorrência evidente foi a suspensão, por Brasília, das negociações que o embaixador extraordinário José Botafogo Gonçalves mantinha com o governo De la Rúa sobre as salvaguardas comerciais do Mercosul.
Longe de serem só econômicas, as dificuldades de Buenos Aires
tornaram-se hoje sobretudo sociais
Com suas políticas condenadas acerbamente até mesmo pelo ex-presidente Raúl Alfonsín, supostamente um situacionista, crescem as dificuldades do polêmico ministro de chegar a outra solução para os desafios argentinos do que a dolarização. Seria esse um melancólico fim para uma crise que longe de ser somente econômica – o país caminha para o quarto ano de recessão – é sobretudo social. O desemprego bate em 20%, aumenta alarmantemente a faixa de pobreza, a violência urbana, um problema antes sem maior expressão, se expande, amplia-se o contingente dos sem-teto.
Abrir mão da emissão da própria moeda e transferir a tarefa de garantir a liquidez interna para o Fed norte-americano seria atrelar de vez a economia à dos EUA. Mais do que isso, representaria duríssimo golpe para uma nação que já se situou entre as sete mais prósperas do planeta, com elevadíssimo padrão de bem-estar social.
Por isso mesmo, é do maior interesse do Brasil e do futuro do Mercosul que a situação de nossos parceiros não chegue a esses extremos e muito menos ao default. Pois neste último caso a débâcle seria de tal ordem que provocaria conseqüências seriíssimas no bloco regional e muito além das fronteiras deste.
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10/29/2001
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