ESTADOS DEVEM USAR METADE DO DINHEIRO DA PRIVATIZAÇÃO NO PAGAMENTO DE DÍVIDAS
Depois de quatro horas de debate, o plenário do Senado aprovou hoje (19, quarta), por 33 votos favoráveis, 18 contrários e com 9 abstenções, resolução que obriga os estados e municípios a usarem 50% dos recursos obtidos com a venda de empresas estatais no pagamento de dívidas públicas. A comprovação desse uso terá de ser apresentada ao Senado caso o estado ou município pretenda tomar qualquer empréstimo ou rolar sua dívida.
Os senadores concordaram com uma proposta da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), mas decidiram aceitar uma emenda, votada em separado, do senador José Fogaça (PMDB-RS), que fixou em 50% o percentual exigido. O projeto original da CAE estabelecia 75%. O projeto de resolução, que entrará em vigor assim que o plenário votar sua redação final, não precisa de votação dos deputados, pois compete privativamente ao Senado legislar sobre endividamentos estaduais e municipais.
- A mudança é fundamental para o equilíbrio financeiro dos estados e municípios. Não conheço país que tenha se desenvolvido com dívidas tão elevadas e pagando juros tão altos - afirmou o senador Vilson Kleinübing (PFL-SC), um dos elaboradores do projeto e relator da matéria em plenário.
Dezesseis senadores discursaram durante a votação. "Os sacrifícios da crise desencadeada pela queda da Bolsa de Hong Kong têm de ser para todos, inclusive para os estados e municípios", sustentou o senador Jader Barbalho (PA), líder do PMDB.
Vários senadores ponderaram que a crise dos estados e municípios se deve, entre outras coisas, aos altos juros fixados pelo governo federal em sua política econômica e, assim, não havia justificativa para a exigência da nova resolução. O senador Jefferson Peres (PSDB-AM), pela CCJ, deu parecer favorável ao projeto.
Para o senador José Sarney (PMDB-AP), "o Senado tem a obrigação de defender os estados e não ser o seu algoz", lembrando que a resolução se aplica tanto aos estados que estão com suas finanças em dia, depois de muitos sacrifícios, quanto os estados e municípios que procuraram o caminho do endividamento. Sarney observou que, com a alteração, "não ganham os estados, nem a União e sim os banqueiros", que irão receber suas dívidas.
O debate começou depois que Vilson Kleinübing defendeu aresolução, afirmando que o Senado tem a obrigação de limitar o endividamento dos estados e municípios. "De outubro de 95 até agora a dívida pública cresceu R$ 100 bilhões. Não há forma mais criminosa de concentração de renda do que pagar juros altos."Kleinübing citou que o Parlamento do Canadá adotou, junto com o governo, medidas para acabar com a dívida pública e atingiu o objetivo. O Congresso dos Estados Unidos, acrescentou, também decidiu que até o ano 2002 o governo não poderá mais gastar acima da arrecadação.
Coutinho Jorge (PSDB-PA) afirmou que o projeto de resolução, em sua forma de substitutivo apresentado ao plenário pelo relator (que retirou o substitutivo durante o debate), era de "total casuísmo eleitoral, sem qualquer lógica administrativa". O substitutivo retirado previa que, nos anos de eleições, 75% do dinheiro obtido com privatização seriam usados no pagamento de dívidas. Nos outros anos, o percentual cairia para 25%.
O senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE) disse que a proposta estava "carregada de interesses políticos" e o assunto só prosperou no Senado depois que foi aprovada a emenda constitucional que permite a reeleição de governadores. "Por que estabelecer esse limite para os estados e municípios e deixar o governo federal usar como quiser o dinheiro da venda de estatais?", questionou.
Já Humberto Lucena (PMDB-PB) viu inconstitucionalidade na proposta, observando que o assunto deveria ser tratado em lei complementar, e não resolução. Lucena apontou ainda enfraquecimento dos estados e municípios. "Daqui a pouco, vamos extinguir a República Federativa."
Júlio Campos (PFL-MT) frisou que "o projeto é moralizante", citando os valores das quatro maiores dívidas estaduais - São Paulo (R$ 46,8 bilhões), Minas Gerais (R$ 10,8 bilhões), Rio de Janeiro (R$ 9,3 bilhões) e Rio Grande do Sul (R$ 8,7 bilhões). Júlio Campos disse que o governo federal tem usado recursos da privatização no pagamento de dívidas, como no caso da Vale do Rio Doce.
Para o senador Ronaldo Cunha Lima (PMDB-PB), se a crise dos estados e municípios se deve ao seu endividamento, é justo que o Senado exija que parte do dinheiro da privatização seja usado no pagamento de dívidas. "Se nada fizermos, daqui a 4, 6 ou 8 anos os estados não terão mais estatais e ainda estarão com suas enormes dívidas", afirmou.
Josaphat Marinho (PFL-BA), que a princípio não observou problemas de constitucionalidade na resolução, condenou o substitutivo de Kleinübing (retirado pelo autor pouco depois) que previa a destinação de 75% do dinheiro da venda de estatais nos anos de eleições e só 25% nos outros anos. "Pode-se fazer a discriminação por ano eleitoral? A veu ver,trata-se menos de cautela e mais de desconfiança em relação aos governadores e prefeitos."
Lauro Campos (PT-DF) constatou que os efeitos da resolução do Senado "serão como respingos em incêndio frente aos R$ 24 bilhões que o governo federal poderá gastar a mais com sua dívida por causa do aumento dos juros adotados depois da crise da Bolsa de Hong Kong".
Casildo Maldaner (PMDB-SC) perguntou se algum estado terá interesse em abater partes de dívidas que vêm sendo repactuadas pelo governo federal para pagamento em 30 anos, com juros de 6% ao ano. A seu ver, o uso de dinheiro da privatização com dívidas será desvantajoso para os estados.
José Eduardo Dutra (PT-SE), líder do Bloco Oposição, lamentou que ficará fora da exigência o estado que, ao invés de fazer leilões de privatização, venda ações de suas estatais no mercado, como Minas Gerais vem fazendo com a Cemig.
Por sua vez, o senador Esperidião Amin (PPB-SC), após salientar que a dívida pública pulou de R$ 60 bilhões "para quase R$ 300 bilhões" desde o início do real, observou que essa era a única oportunidade nesta legislatura para que o Senado introduzisse alguma forma de levar à redução das dívidas estaduais e municipais.
José Fogaça (PMDB-RS) sustentou que muitas estatais são patrimônio formado com endividamento público e, assim, "nada mais justo que usar o dinheiro da privatização para reduzir a dívida".
Bello Parga (PFL-MA) criticou a resolução, por tratar de forma idêntica tanto os estados que fizeram sacrifícios para equilibrar suas finanças quanto os governos que optaram por se endividar. Ele defendeu uma emenda do senador Edison Lobão (PFL-MA), que acabou rejeitada, excluindo da exigência os estados que não têm dívida mobiliária.
Roberto Freire (PPS-PE) frisou que os estados não podem continuar vendendo empresas estatais "e continuar com a farra de gastos e dívidas". Para ele, se a União cortou até incentivos fiscais para o Norte-Nordeste nas recentes medidas econômicas, o Senado tinha "a obrigação de fazer sua parte no ajuste fiscal do país".
19/11/1997
Agência Senado
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