FHC abre contas da União para candidatos
FHC abre contas da União para candidatos
Objetivo é mostrar as dificuldades da economia nacional e justificar acordo com o FMI
BRASÍLIA - Numa rodada de encontros inédita na História do País, o presidente Fernando Henrique Cardoso abrirá hoje parte das contas do governo aos quatro principais candidatos ao Palácio do Planalto para mostrar as dificuldades da economia e as razões que levaram o governo a assinar um novo acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). O presidente pretende ainda obter dos candidatos uma posição clara sobre o que considera os fundamentos da economia: a estabilidade da moeda, o respeito aos contratos e a manutenção de superávits no orçamento para garantir o pagamento da dívida pública.
"É compreensível e aceitável que se queira mudar a política econômica, mas não se pode atacar os pilares da estabilidade", disse ao Estado o ministro chefe da Casa Civil, Pedro Parente. "Se alguém for contra esses fundamentos, que assuma sua posição perante a sociedade." Segundo Parente, Fernando Henrique também estará aberto a discutir com os candidatos uma agenda de medidas para ser submetida ao Congresso ainda neste ano, incluindo uma minirreforma tributária e projetos para recuperar a receita de impostos no ano que vem, quando se prevê queda de arrecadação de mais de R$ 10 bilhões.
De acordo com outro assessor presidencial, Fernando Henrique também anunciará aos candidatos os nomes de quem vai compor a equipe de transição de governo. Essa equipe trabalhará em sintonia com o futuro presidente, independentemente de quem for escolhido.
O ponto de partida das conversas será uma avaliação da situação econômica mundial, de seus reflexos no Brasil e da necessidade de referendar o acordo com o FMI para acalmar a instabilidade do mercado financeiro. Detalhes do acordo serão submetidos aos candidatos, para evitar que eles continuem alegando desconhecer seus termos. Na visão do presidente, independentemente de suas propostas políticas, os candidatos precisam assumir as responsabilidades que têm com o futuro do País.
Acompanhado dos ministros da Fazenda, Pedro Malan, e da Secretaria-Geral da Presidência, Euclydes Scalco, Fernando Henrique começa a série de reuniões às 12 horas, quando receberá o candidato do PPS, Ciro Gomes. É o encontro apontado como o mais tenso da rodada, pois Ciro é o que tem desferido mais ataques ao atual governo. Em seguida, às 13 horas, a conversa será com o petista Luiz Inácio Lula da Silva. Às 14 horas, será a vez do candidato do PSB, Anthony Garotinho. Por último, às 15 horas, o presidente conversará com o candidato do PSDB, José Serra.
Após cada encontro, os candidatos darão entrevistas. Fernando Henrique falará somente depois de terminadas todas as reuniões.
Testemunhas - Como os encontros serão realizados a portas fechadas, houve a preocupação de evitar que os candidatos dessem versões diferentes das conversas que vão ter com o presidente.
Daí a tática de autorizar cada um deles de levar dois assessores.
Da parte do governo, as "testemunhas" serão os ministros Malan e Scalco. Na sala de espera do gabinete do presidente estarão Pedro Parente, o presidente do Banco Central, Armínio Fraga, e o líder do governo na Câmara, deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP).
As assessorias dos candidatos asseguram que não haverá nenhum tipo de confronto no encontro com o presidente. Mudando o discurso que vinha fazendo até há pouco tempo, Ciro Gomes afirma que vai "mais para ouvir do que falar". "Vou sem reserva, não vou levar nada, mas direi ao presidente que sou um crítico do modelo econômico que gerou 11,7 milhões de desempregados no País", antecipou o candidato, que estará acompanhado dos consultores Roberto Mangabeira Unger e Mauro Benevides Filho.
O candidato petista proporá "ações firmes" para estimular o crédito para a exportação. Lula já deu seu apoio à proposta de aprovar uma minirreforma tributária e medidas para recuperar a receita de impostos no ano que vem, o primeiro do mandato do novo presidente. As perdas ocorrerão com o fim das alíquota extraordinárias de 27,5% do Imposto de Renda e de 3% da Contribuição sobre Lucro das Empresas. "Vou levar uma proposta e deixar tudo escrito, registrado", afirmou Lula. O presidente do PT, deputado José Dirceu, acompanhará o candidato.
Anthony Garotinho pretende levar ao Planalto um documento no qual aponta os motivos de sua discordância em relação ao acordo com o FMI. "Queremos uma negociação que nos dê mais elasticidade, não essa camisa-de-força", disse o representante do PSB, que estará acompanhado pelo seu candidato a vice, José Antônio Almeida, e do assessor econômico, Tito Ryff.
A conversa com Serra deverá ser a mais descontraída. Além de ser amigo do presidente, ele estará acompanhado de dois aliados do governo, representantes da coligação que o apóia: os presidentes do PSDB, José Aníbal, e do PMDB, Michel Temer. Serra discutirá a proposta de criar 8 milhões de empregos, além de insistir na necessidade do governo continuar atuando para reabrir linhas de crédito para a exportação. Para Aníbal, o encontro com os candidatos vai mostrar aos investidores que as eleições no Brasil não ameaçam a economia. (Colaborou Odail Figueiredo)
Serra e Lula trocam afagos nos bastidores
De entrevistados, os candidatos passaram para o papel de espectadores. Lula e Serra sentaram-se na segunda fila, reservada aos políticos
Únicos presidenciáveis que prestigiaram seus candidatos a vice no debate de ontem, José Serra (PSDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegaram a trocar afagos. No primeiro intervalo, num corredor do estúdio, os dois se abraçaram e travaram o seguinte diálogo: “Conta aí, Serra, o que o presidente quer com a gente amanhã?” Serra sorriu. “Amanhã você vai saber.” Lula, então, se despediu. “A gente se vê amanhã”, disse. “É uma demonstração de que somos adversários, mas não temos nenhuma parede entre nós. Eu não confundo, nunca, disputa política com relação de amizade”, justificou Lula posteriormente.
De entrevistados, os candidatos passaram para o papel de espectadores. Lula e Serra sentaram-se na segunda fila, reservada aos políticos. Outros tucanos e petistas seguiram o clima de paz dos presidenciáveis, como o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) e o deputado José Aníbal (PSDB-SP), que conversaram ao pé do ouvido.
Suplicy aproveitou também a oportunidade para dar um conselho a Serra. Segundo ele, um motorista do tucano no Senado havia comentado com outros colegas que não entendia por que o presidenciável não estava conseguindo subir nas pesquisas, mas arriscava um palpite. “Ah, ele nunca me pergunta nada a meu respeito, nem como está minha família. Será que esse homem é bom?”, teria indagado o motorista, segundo a informação do senador. “Relatei isso ao Serra para que ele compreendesse um pouco por que não tem mais votos. Se ele quiser melhorar, tem que prestar atenção a pequenos gestos como esse. Dei uma contribuição a ele”, disse Suplicy.
O deputado federal João Herrmann Neto (PPS-SP) brincou com Lula num dos intervalos. “Ô, Lula, vote em mim para deputado, por favor! E a Marisa (mulher do petista) também.” Lula respondeu rapidamente: “Vou pensar, mas a Marisa é com ela.” O petista comentou que era melhor estar debatendo do que ouvindo seu candidato a vice. “É melhor jogar do que torcer.”
Serra passou o debate inteiro escrevendo bilhetes ao publicitário Nelson Biondi. O tema principal seria o programa gravado ontem e que o marqueteiro editaria durante a madrugada. Serra queria saber mais detalhes sobre a participação de Valéria Monteiro, que gravou sua parte à tarde. Em outro momento, Serra enviou um bilhete acompanhado de uma fivela de cabelo de sua mulher, Mônica Serra. Ele queria que o publicitário a entregasse à Rita, pois achava que seu cabelo estava caindo no rosto. Rita não entendeu a mensagem e não usou a fivela. Serra havia chegado dez minutos atrasados na TV Bandeirantes, acompanhado de sua assessora de imprensa. Mônica Serra havia chegado um pouco antes.
O tucano, quando não fazia anotações, ficava amarrando e desamarrando sapatos, como se fosse um tique nervoso. Ele elogiou a performance de sua vice: “Achei muito humana a apresentação da Rita.” Mônica Serra tentou animar a platéia e puxava aplausos para a Rita.
Sonolento – O desânimo foi tomando conta da platéia ao longo do debate. No penúltimo bloco do programa, mas de 20 pessoas já haviam abandonado o estúdio. O deputado José Aníbal chegou até a cochilar.
Justificando a ausência dos concorrentes Anthony Garotinho (PSB) e Ciro Gomes (PPS), Lula usou a ironia: “As más línguas estão dizendo que só vieram ao debate os candidatos que confiam nos seus vices.”
O deputado Michel Temer (PMDB-SP) passou o debate inteiro sentado sozinho, isolado dos tucanos. Apenas no final do programa ele e Serra trocaram algumas palavras.
Vice clona Garotinho como franco-atirador
Deputado do PSB ataca adversários em debate da Bandeirantes, como presidenciável havia feito
O candidato a vice na chapa encabeçada por Anthony Garotinho (PSB), José Antônio de Almeida (PSB-MA), repetiu a estratégia adotada pelo seu companheiro de partido e tentou constranger todos os adversários que questionou no primeiro debate entre os candidatos a vice-presidente da República, transmitido ao vivo ontem pela TV Bandeirantes, com pico de 4 pontos no Ibope. Menos contundente do que a de Garotinho, a estratégia adotada por Almeida não foi suficiente para quebrar a monotonia..
O primeiro alvo do vice do candidato do PSB foi o líder sindical Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, escolhido por Ciro Gomes (PPS) para compor a sua chapa à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso. Almeida pediu a Paulinho que esclarecesse a denúncia de supostas irregularidades no uso de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) destinados aos cursos de requalificação profissional mantidos pela Força Sindical – um inscrito no curso aparecia 32 vezes nos registros com um único CPF.
Paulinho respondeu que houve um erro do sistema e que o Ministério do Trabalho e do Emprego isentou a Força Sindical de qualquer responsabilidade sobre o fato. O vice de Garotinho insitiu, alegando que o vice de Ciro não havia respondido a pergunta, e Paulinho, além de repetir a resposta, aproveitou para dizer que Ciro, se eleito, ampliará para o todo o País os cursos de requalificação profissional dos trabalhadores.
Mudança de alvo – Depois, a deputada Rita Camata (PMDB-ES), vice do tucano José Serra, tornou-se o alvo. Almeida perguntou a Rita como Serra quer criar emprego, se, quando administrou o Ministério da Saúde, dispensou as pessoas contratadas como mata-mosquitos.
Rita saiu em defesa do candidato do PSDB e disse que ele contribuiu, como ministro da Saúde, para a criação de novos empregos com a abertura de vagas para atuar nos programas Saúde da Família e Agentes de Saúde. “Não vou aceitar essa pecha que o senhor quer impor ao Serra ”, afirmou Rita. “Vamos criar 500 mil empregos na área da saúde.” Almeida voltou à carga afirmando que Serra não era o autor da Lei dos Genéricos. Rita reagiu novamente, explicando que o candidato do PSDB foi responsável por colocar a medida em prática.
Relação – Se teve de defender Serra contra a crítica do vice de Garotinho, Rita não enfrentou o mesmo problema com o vice do candidato Luiz Inácio Lula da Silva, o empresário e senador José de Alencar (PL-MG).
No segundo bloco, Alencar perguntou a Rita qual seria a sua proposta para resolver o problema do déficit na Previdência.
Rita disse que a primeira ação será estimular o crescimento da economia para aumentar a contribuição e, em senguida, estimular o retorno ao sistema regular. O vice de Lula elogiou a posição defendida por Rita e aproveitou a resposta para tentar explicar a proposta do PT, mostrando que o clima amistoso que havia entre Lula e Serra nos bastidores influenciou os respectivos vices.
Segurança – Outro tema abordado pelos candidatos foi a segurança. Alencar foi o primeiro a responder e sublinhou a importância da atenção sobre o crime organizado e o contrabando de armas. Almeida também reforçou a idéia de fortalecer as fronteiras do País. Paulinho apontou o desemprego como causa principal da criminalidade e Rita disse acreditar que as polícias estaduais e a Polícia Federal devem atuar juntas.
No Rio, Ciro ataca política econômica de FHC
Presidenciável diz que País "está de joelhos diante da agiotagem internacional"
O presidenciável Ciro Gomes (PPS) fez ontem, no Rio, duras críticas à política econômica do governo. "Posso lhes dizer com muita tristeza que o nosso País, rico e cobiçado no mundo inteiro, está posto de joelhos diante da agiotagem internacional", disse Ciro, num rápido discurso para cerca de mil pessoas que participaram da carreata que o candidato fez pela orla de Copacabana, na zona sul.
Ciro aproveitou para criticar a especulação que o mercado financeiro vem sofrendo, com base nas pesquisas eleitorais que apontam a fragilidade da campanha do candidato José Serra (PSDB).
"Não temos o direito de votar livremente. Quem o povo acha que deve eleger, eles não querem permitir. É o terror econômico. É a tentativa de domesticar o pensamento rebelde do povo brasileiro."
Ele não deu entrevistas por causa do encontro que terá hoje com Fernando Henrique Cardoso. O candidato desfilou em carro aberto do Leme ao Posto 4 e parou em frente ao prédio onde mora o presidente nacional do PDT, Leonel Brizola, que participou da carreata com outros políticos e a atriz Patrícia Pillar, mulher de Ciro.
Scheinkman - O economista José Alexandre Scheinkman, professor das Universidades de Princeton (EUA) e de Sorbonne (França), entrou na equipe de Ciro com um discurso próprio para dar tranqüilidade aos investidores e analistas estrangeiros que ainda se arrepiam com a candidatura do presidenciável. "Neste momento, o Brasil não necessita renegociar ou reestruturar sua dívida pública, pois isso traz custos para a economia", disse à Agência Estado, em Nova York.
Trata-se de uma versão mais moderada em relação às idéias do candidato.
"A dívida interna requer atenção, mas estamos longe de uma situação de falta de sustentabilidade.
O que há hoje em Wall Street é uma aversão extrema ao risco Brasil, que não é justificável com base nos fundamentos da economia brasileira." Scheinkman deu ainda uma forte sinalização de apoio ao acordo com o Fundo Monetário Internacional e ressaltou que o nível de superávit primário de 3,75% para 2003 "é desejável e possível".
Para chegar a esse superávit, ele afirma que "importa muito a quantidade de poupança que o governo gera e a quantidade de investimentos". Ele acredita que é possível crescer a uma taxa entre 5% a 6% ao ano. "Como os recursos externos estão relativamente escassos, a única maneira de conseguir isso é elevar a poupança interna." Sobre a reforma tributária, ele disse que primeiro é preciso reduzir a informalidade da economia. Ele defende ainda o aumento das exportações e importações, além do aperfeiçoamento do sistema de metas de inflação.
Acordo com FMI obriga Estados a manter contenção
Meta de superávit de 3,75% limita gastos e também vai atingir municípios
BRASÍLIA - Os governadores que forem eleitos em outubro terão dificuldade para cumprir suas promessas eleitorais, se elas exigirem grandes despesas. A renovação do acordo com o Fund o Monetário Internacional (FMI) vai obrigá-los a manter, nos próximos anos, o arrocho nos gastos dos Estados.
O mesmo problema será enfrentado pelo novo presidente da República, mas são as administrações estaduais e municipais que vão arcar com o ajuste adicional nos próximos três anos, previsto no acordo com o FMI. Com a manutenção até 2005 do superávit primário - o saldo das receitas menos as despesas, não incluído pagamento dos juros da dívida pública - em 3,75% do Produto Interno Bruto (PIB), exigirá uma economia extra de R$ 3,3 bilhões por ano nas contas do setor público.
Esse esforço deve recair sobre a parcela que cabe aos Estados e municípios.
Governadores e prefeitos, que antes teriam de obter saldo de caixa de R$ 9 bilhões por ano, agora terão de conseguir R$ 12,3 bilhões.
Mudanças - A estreita margem de manobra dos orçamentos estaduais já está levando alguns candidatos a defender mudanças nas regras do jogo. Um deles é o tucano Aécio Neves, forte candidato ao governo de Minas Gerais, um dos Estados mais importantes da Federação. Para Aécio, um dos defensores da Lei de Responsabilidade Fiscal, o artigo que proíbe o governo federal de prestar socorro financeiro a Estados e municípios, precisa ser modificado.
Pior, essa economia terá de ser obtida numa cenário de baixo crescimento econômico, segundo o consultor de Orçamento e Fiscalização da Câmara dos Deputados, José Cosentino Tavares.
Embora a expectativa seja a de que em 2003 a economia deve crescer mais do que o magro 1,8% esperados para este ano, a expansão dos negócios não deve ser tão grande a ponto de impulsionar de forma significativa a arrecadação.
Medidas - Para tentar conter a crise do dólar, o governo federal elevou a meta anual de superávit primário para todo o setor público de 3,5% para 3,75% do PIB no período que vai de 2002 a 2005.
Essa meta foi incorporada pelo acordo com o FMI.
Assim, União, Estados, municípios e empresas estatais passarão a economizar, em conjunto, R$ 49 bilhões por ano, em vez dos R$ 45,7 bilhões anteriormente previstos.
No entanto, a participação da União e suas estatais nesta meta global - 2,80% do PIB, ou R$ 36,7 bilhões - foi mantida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2003. O secretário-executivo do Ministério da Fazenda e chefe negociação com o FMI, Amaury Bier, disse que o bom desempenho das finanças estaduais e municipais é que vai garantir o complemento esperado.
Garotinho vai criticar acordo com FMI
Candidato do PSB diverge do limite de investimentos para estatais
RIO - O candidato do PSB à Presidência da República, Anthnoy Garotinho, vai manter o discurso de oposição ao acordo do Brasil com o Fundo Monetário Internacional (FMI) durante o encontro de hoje com o presidente Fernando Henrique Cardoso, em Brasília. Para o encontro, Garotinho preparou um documento no qual critica o aumento da dívida pública e o piso de reservas cambiais fixado no acordo com o FMI.
"Apenas US$ 5 bilhões de reserva é muito preocupante e deixa o próximo governo em situação muito delicada", disse. Além disso, o candidato fez questão de dizer que o documento defende mudanças no acordo, como a liberdade para as estatais investirem.
Segundo ele, o último acordo firmado com FMI impediu que as estatais fizessem investimentos, porque isso também seria contabilizado como gasto público. Para Garotinho, essa estratégia acabou resultando em problemas, como a crise de energia no Brasil em 2001. "Furnas tinha R$ 4 bilhões em caixa e não podia investir", disse.
É nesse tom que Garotinho pretende debater o acordo. "Não há nada a comemorar no acordo entre o Brasil e o FMI, pois é um banco e, quando se vai a um banco, é porque a situação está difícil."
Além do governo, o sistema financeiro é o grande alvo das críticas do candidato do PSB. "Este governo foi um Papai Noel para os bancos", disse o candidato.
"Nunca eles ganharam tanto", afirmou.Garotinho considerou positivo o governo decidir fazer a minirreforma tributária.
Mas, em seguida, criticou o Executivo, lembrando que Fenrnando Henrique Cardoso teve oito anos para aprovar essa reforma e só decidiu se esforçar no "apagar das luzes."
Artigos
Imprensa, memória da cidadania
Carlos Alberto di Franco
Perguntam-me alguns, em seminários e debates, se o jornalismo de denúncia não estaria extrapolando as suas funções e assumindo tarefas reservadas à polícia e ao Poder Judiciário.
Outros, ao contrário, preocupados com reiterados precedentes de impunidade, gostariam de ver repórteres transformados em juízes ou travestidos de policiais.
Um exame sereno, no entanto, indica um saldo favorável ao esforço investigativo dos meios de comunicação. O despertar da consciência da urgente necessidade de uma revisão profunda da legislação brasileira, responsável maior pelo clima de imoralidade nos negócios públicos, representa um serviço inestimável prestado pela imprensa deste país.
O ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, para citar um caso que já pode ser analisado sem nenhum tipo de paixão, não é, como alguns imaginam, um solitário gênio da corrupção. Armado de notável desenvoltura na prática do desvio de verbas públicas, ele aproveitou como ninguém as brechas abertas pelo próprio sistema. Foi um elo, certamente o mais expressivo, de uma disciplinada linha de montagem que dá suporte à indústria da corrupção.
Setores do governo e da oposição tiveram, voluntariamente ou não, alguma participação na aprovação dos créditos suplementares para a construção da sede do TRT de São Paulo.
A denúncia, para além das gravíssimas evidências de corrupção, levantou importante questionamento a respeito da fragilidade do esquema de elaboração do Orçamento. A imprensa não ficou na denúncia do crime. Foi às raízes do problema. Mostrou os vícios de uma estrutura que precisa ser mudada. Caso contrário, delitos análogos reaparecerão com muita freqüência.
A exposição da chaga, embora desagradável, é sempre um dever ético. Não se constrói um país num pântano. Impõe-se o empenho de drenagem moral. E só um jornalismo de denúncia, comprometido com a verdade, evitará que tudo acabe num jogo de faz-de-conta. Os meios de comunicação existem para incomodar. Um jornalismo cor-de-rosa é socialmente irrelevante. A imprensa, sem precipitação e injustos prejulgamentos, está desempenhando importante papel na recuperação da ética na vida pública.
Mas o jornalismo de denúncia, numa rigorosa prestação de serviço, pode e deve ir ainda mais longe. Resgato hoje, neste espaço opinativo, uma sugestão editorial que venho defendendo há anos. Não seria má idéia inaugurar o Placar da Corrupção. Mensalmente, por exemplo, a imprensa exporia um quadro didático dos principais escândalos: o que aconteceu com os protagonistas da delinqüência, as ações concretas ou as omissões dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Não se trata de transformar a mídia numa espécie de contrapoder, mas numa instância de uma sociedade freqüentemente abandonada por muitas de suas autoridades.
Inauguremos também o Mapa das Promessas. É fácil. Basta recorrer aos arquivos e bancos de dados. Os políticos, pródigos em soluções de palanque, não costumam perder o sono com o rotineiro descumprimento da palavra empenhada. Afinal, para muitos deles, infelizmente, a política é a arte do engodo. Além disso, contam com a amnésia coletiva. Ao jornalismo cabe assumir o papel de memória da cidadania. Precisamos falar do futuro, dos projetos e dos planos de governo.
Mas devemos também falar do passado, das coerências e das ambigüidades. É absurdo, por exemplo, que ex-governantes, conhecidos por sua histórica capacidade de destruir patrimônios, endividar administrações e inviabilizar a gestão de seus sucessores, reapareçam como exímios tocadores de obras. A imprensa tem o dever de refrescar a memória do eleitor.
O Brasil depende, e muito, da qualidade ética da sua imprensa. A opinião pública espera que a mídia, apoiada no crescente aprimoramento dos seus recursos humanos e nas balizas éticas, prossiga no seu ânimo investigativo.
Colunistas
RACHEL DE QUEIROZ
Um prato de feijão
Eu nunca me meti nesse assunto de distribuição de terras, porque imagino que cada caso é um caso, ou, pelo menos, que cada região é uma região. No meu tipo de Nordeste (o Sertão Central do Ceará) não temos ou, então, não tínhamos (agora é assunto nacional) o problema do lavrador que não consegue terra para plantar. Lá as culturas são pequenas; ainda havia alguma fartura nos tempos em que se plantava algodão.
Mas o besouro "bicudo" acabou com os nossos algodoais e não se fala mais nisso. Fecharam-se as fábricas descaroçadoras, deixou-se de produzir o "resíduo" (a torta do caroço de algodão comprimido para lhe tirarem o óleo) e o "resíduo" era o principal recurso para alimentar o gado quando secava o pasto. Agora, pasto secou, fazendeiro fica no ora e veja.
Lá pelos nossos lados, não sabemos o que são os grandes latifúndios. Um fazendeiro gaúcho ou mineiro olharia para as nossas terrinhas como para um quintal pequeno.
No século passado, tivemos alguns latifúndios de tamanho razoável (como as terras do coronel Dadá, as do velho Miguel Francisco de Queiroz, as dos Paulas Pessoas em Quixeramobim. Mas a filharada dos donos era numerosa e, ao cabo de duas gerações, as terras estavam repartidas em lotes de meia légua, ou menos. Meu avô herdou muitas terras do seu tio Miguel Francisco. Mas, ao morrer, o avô deixava viúva e dez filhos. Cada um ficou com a sua fazenda; e só depois da morte de nossa avó (de quem herdei o nome) se repartiu a parte dela.
Nas fazendas, na nossa região, insisto, não há produção que se possa chamar de lucrativa. Um gadinho, em geral enxertado de zebu, sobrevive como pode aos longos verões, quando tudo o que era verde fica sem uma folha nos galhos, tal como o Alasca no inverno. Só nos meses em que chove é que os moradores plantam o milho e o feijão e um pouco de mandioca. A quantidade maior não se arrisca, só a que vai ser consumida pelo resto do ano, até chegar o inverno seguinte, quando se planta de novo. O dono, que também tem o seu roçado, faz o mesmo. E qual é o regime reinante entre o dono e o morador? O dono dá ao morador a casa para morar (antigamente era só de taipa, mas hoje, com a madeira ficando escassa, usa-se mais tijolo). Dá o roçado, e tantas tarefas quanto o morador ache que pode utilizar, já que não tem capital para maiores aventuras, como por exemplo, pagar diaristas, alugar tratores, etc. Ele próprio, o morador, antes fazia a cerca do roçado.
Hoje não: o dono tem de dar o roçado cercado e aradado. Mesmo assim, só raramente o morador aproveita todo o terreno de que pode dispor. A serviço da fazenda, quando solicitado, ele dá três dias de trabalho (pago), o que também é raro hoje, pois os donos plantam cada vez menos. Esse três dias têm um nome herdado dos tempos do cativeiro: chama-se a "sujeição". Os outros três dias são livres.
Terra tão pobre, clima tão incerto, nada de oficial para o combate às pragas (vide o caso do "bicudo"), ali o que menos falta é terra. Nunca ouvi falar em fazendeiro que negasse terra de plantar a morador. Na verdade, os moradores tendo o feijão para a panela, uma camisa para vestir, estão satisfeitos. Não sei de um que plante árvores frutíferas em redor de casa.
Rarissimamente e só no inverno as mulheres erguem um canteiro onde, nos meses de chuva, plantam cebolinha e coentro.
Um filho mais ambicioso emigra, vai para São Paulo. Os demais ficam, pouco mais que índios. Lá, algum dono mais moderno compra tratores, constrói silos - mas no fim de contas não vai saber como pagar as prestações do banco.
É, terras devolutas é o que ali não falta. E as experiências que o governo faz nos seus assentamentos até agora não deram certo. Sei de uma "comunidade" que, quando o banco viu, tinham vendido tudo: arados, tratores, vacas e o mais que lhes foi dado. Voltaram a viver como antes, plantando uma tarefa de feijão com o caco da enxada.
Não digo que não haja injustiças, que todos vivam num mar de rosas: ao contrário, só há por lá pobreza e falta de futuro. Mas o auxílio oficial deveria ser muito mais bem planejado e estudado, levando-se em conta as peculiaridades de cada região. Quem tem 10 mil hectares ou até 100 mil no Mato Grosso, e só os usa para um vago pastoreio, não tem nada a ver com os "latifundiários" do sertão do Ceará, que, quando têm uma légua quadrada são chamados de ricos.
Editorial
UM TESTE PARA OS CANDIDATOS
Hoje, quando entrarem no Palácio do Planalto, para os seus encontros com o presidente Fernando Henrique, os candidatos a governar o Brasil pelos próximos quatro anos poderão fazer uma de duas coisas: ou encarar a participação nessa iniciativa sem precedentes na história da República como uma valiosa ocasião para faturar votos, ou conduzir-se como se esta segunda-feira fosse o primeiro dia de seu mandato. E cada um deles, queira ou não, será julgado pela alternativa que escolher. Nenhum dos candidatos, em outras palavras, poderá fugir ao teste definitivo de maturidade política em face da crise, que consiste na atitude, oportunista ou responsável, que assumirem nas reuniões marcadas para começar esta manhã e nos pronunciamentos que fizerem em seguida à imprensa.
Muito além dos mercados, é a sociedade que cobra dos presidenciáveis - sobretudo dos que competem pelo papel de crítico mais veemente do governo - a disposição inequívoca de serem parte da solução e não do problema que a todos atinge, pois não há vacina capaz de imunizar a saudável economia real do País contra o contágio da turbulência financeira. Desnecessário lembrar que o mandato do presidente Fernando Henrique vai até o 31 de dezembro - e a ele caberão os créditos ou débitos de tudo o que fizer nesses 135 dias para restabelecer a confiança dos investidores no Brasil. Mas tampouco deveria ser necessário lembrar que a desconfiança nasceu, única e exclusivamente, do medo de que Ciro Gomes ou Lula da Silva - nesta ordem - venha a ser o próximo presidente e suspenda os pagamentos da dívida.
Não bastasse esse dado de realidade, o primeiro vinha dando a impressão de desejar que a crise persista. Ele agia como se partisse da premissa de que José Serra seria o principal beneficiado pelo refluxo do clima de nervosismo. Se, afinal, qualquer rumor de recuperação do tucano nas pesquisas faz o dólar baixar e a Bolsa subir, na medida em que os mercados se acalmassem a tendência seria formar-se um círculo virtuoso favorável ao ex-ministro da Saúde. Mas fomentar a crise para ganhar uma eleição, além de representar um inconcebível ato de lesa-pátria, acabaria por se converter, inevitavelmente, num tiro pela culatra: nenhum candidato, em sã consciência, há de querer assumir o governo numa situação de calamidade econômica instalada.
Seja por isso, seja por uma avaliação mais prudente do quadro eleitoral, o fato é que, na última sexta-feira, numa surpreendente reviravolta, Ciro desmentiu que iria propor ao presidente mudanças no acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). O candidato desautorizou o senador Roberto Freire, presidente do PPS, partido ao qual está filiado, e o seu assessor econômico Mauro Benevides Filho, que um dia antes haviam divulgado os seus supostos reparos ao acordo. E, como de praxe, culpou a imprensa: "Os jornais, não conseg uindo extorquir (sic) de mim declarações, porque estou rigorosamente calado sobre esse assunto, têm dado grande destaque a declarações de militantes da minha causa, que não represento necessariamente."
Ciro negou ainda que se opunha à minirreforma tributária concebida pelo Planalto, apoiada pelos agentes econômicos - e por Lula - como informara a sua assessoria, também na quinta-feira. Disse que, embora não soubesse do que trataria a minirreforma, apóia "tudo que for positivo para o País". E fez questão de se esmerar no tom ponderado, ao falar da reunião de hoje, cuja realização elogiou. "Sou um candidato de oposição, mas respeito a autoridade e a liderança institucional do presidente da República", afirmou.
"Não vou com nenhuma reserva. Vou ouvir muito mais do que falar." Ciro pode ter concluído que a moderação lhe trará mais lucros do que prejuízos eleitorais.
De fato, mesmo os eleitores insatisfeitos com a era Fernando Henrique não repudiarão o candidato que se mostre comprometido com o interesse geral a ponto de participar de uma transição compartilhada. E a parcela do eleitorado que aprova o presidente, mas diz que pretende votar em Ciro Gomes, mudará de idéia se achar que ele representa um obstáculo à normalização econômica. Ainda mais ao perceber que, convocando os candidatos para debelar uma crise antes que ela inviabilize o futuro governo, Fernando Henrique dá a maior prova de que "está pensando não na próxima eleição, mas na próxima geração", como se diz dos estadistas. Passarão pelo teste que hoje aguarda todos os candidatos só aqueles que se demonstrarem capazes, como o presidente, de colocar os interesses do País acima dos seus próprios.
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08/19/2002
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