Ibope mostra Lula com 60% e Serra com 31%









Ibope mostra Lula com 60% e Serra com 31%
Comparada à última simulação de 2.º turno, vantagem de petista sobre tucano cresceu

O candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, aumentou sua distância em relação a José Serra (PSDB), segundo a última pesquisa nacional de intenção de votos do Ibope, divulgada ontem no Jornal Nacional, da Rede Globo. Lula tem 60%, enquanto Serra aparece com 31%. Os votos em branco e nulos somam 4% e 5% dos eleitores ainda não sabem em quem vão votar.

Com isso, a distância entre os dois candidatos passou de 20 para 29 pontos porcentuais. Na última simulação para o segundo turno que o Ibope realizou antes da votação do primeiro turno, o petista tinha 55% e o tucano, 35%. O levantamento foi feito entre 28 e 30 de setembro.

Se forem contabilizados apenas os votos válidos (soma de todos os votos menos os em branco e nulos), Lula tem 66% e Serra, 34%. No primeiro turno, Lula obteve 46,4% dos votos válidos, Serra recebeu 23,2%, Anthony Garotinho (PSB) ficou em terceiro lugar, com 17,9%, e Ciro Gomes (PPS) teve 12,0%.

A pesquisa, encomendada pela Rede Globo, foi feita entre sábado e segunda-feira. Foram entrevistados 3 mil eleitores em 203 municípios de todo o País. A margem de erro é de 1,8 ponto porcentual, para mais ou para menos.

Confirmação - O resultado do Ibope é semelhante aos dados das pesquisas do Datafolha e do Vox Populi, divulgados no final de semana. As duas sondagens apontavam uma tendência de distanciamento entre Lula e Serra, com crescimento do petista e queda do tucano em relação à última simulação para o segundo turno. O levantamento do Datafolha, feito no dia 11, mostra Lula com 58% das intenções de votos e Serra, com 32%. Em votos válidos, o petista tem 64% e o tucano, 36%. Na simulação para o segundo turno, feita nos dias 4 e 5, Lula tinha 56% das intenções de votos e Serra, 35%.

Já o Vox Populi, feito nos dias 10 e 11, mostra Lula com 60% das intenções de voto (66% dos votos válidos) e Serra com 30% (33% dos votos válidos). Na simulação de segundo turno feita no dia 4, o petista tinha 7 pontos a menos (53%) e o tucano, 4 pontos a mais (34%).


FHC chama Congresso a retomar votações
Presidente reuniu líderes ontem para definir pauta mínima para período após 2.º turno da eleição

BRASÍLIA - O presidente Fernando Henrique Cardoso começou a discutir com líderes aliados no Congresso, em reunião ontem no Palácio da Alvorada, uma pauta mínima de votação para depois das eleições. A reunião continua hoje. Fernando Henrique disse estar preocupado com a situação econômica, a alta do dólar e a possibilidade de volta da inflação. Por isso, acha que é necessário aprovar medidas no Congresso que possam ajudar na solução da crise.

Na conversa do presidente com os líderes governistas, foram colocados na pauta vários itens que há algum tempo tramitam no Congresso: regulamentação do sistema financeiro; Orçamento de 2003; projeto de previdência complementar do servidor; queda na arrecadação com a redução da alíquota do Imposto de Renda de 27,5% para 25% a partir de janeiro, mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e os projetos para o combate à violência.

Emergência - O líder do PT na Câmara, deputado João Paulo Cunha (SP), afirmou que qualquer votação no Congresso só terá condição de ser iniciada depois de 11 de novembro.

Mas assegurou que o PT aceita votar emergencialmente as mudanças para permitir que a regulamentação do sistema financeiro seja feita por leis complementares. "Não aceitamos, porém, votar tudo de uma única vez, porque o assunto é complexo", disse Cunha.

De acordo com o líder do governo no Congresso, deputado e senador eleito Arthur Virgílio (PSDB-AM), também deverão ser objeto de debates temas que estão em pauta na Câmara para serem votados, entre eles as 34 emendas provisórias que estão trancando a pauta. Com o período de eleições, as votações foram praticamente suspensas no Congresso.

O líder do governo na Câmara, Arnaldo Madeira (PSDB-SP), disse ao presidente que as votações dependem do resultado das eleições presidenciais.

Crise - Segundo o líder do governo no Senado, Arthur da Távola (PSDB-RJ), na reunião de ontem, Fernando Henrique disse que o aumento na taxa de juros foi uma necessidade e que se não tivesse tomado essa providência poderia haver um estouro da inflação. O vice-líder do governo no Senado, Romero Jucá (PSDB-RR), que também participou da reunião, atribuiu a crise às expectativas sobre o resultado das eleições. Para ele, a alta do dólar "tem dia marcado para acabar e quem estiver especulando vai perder dinheiro". Para Jucá, o presidente deve se esforçar "para tocar o governo no rumo em que já vinha tocando".


Presidente comemora prêmio recebido da ONU
BRASÍLIA - Acusado pela oposição na campanha eleitoral de dar pouca atenção às questões sociais, o presidente Fernando Henrique Cardoso recebeu ontem com entusiasmo o anúncio de que foi escolhido pela Organização das Nações Unidas (ONU) para receber o Prêmio Mahbub ul Haq por Contribuição Destacada ao Desenvolvimento Humano.

Ele comemorou a notícia no Palácio do Planalto, durante evento em que premiava professores brasileiros de 1.ª a 4.ª série, numa solenidade informal que quebrou quase todas as regras do protocolo.

Do júri da ONU que escolheu Fernando Henrique, fez parte o prêmio Nobel de Economia, Joseph Stiglitz, um crítico contumaz das receitas do FMI. "É bom ver que o prêmio que leva o nome do fundador do Índice de Desenvolvimento Humano (o economista paquistanês Mahbub ul Haq) , presidido esse comitê pelo Stiglitz, o maior crítico do Fundo Monetário Internacional, vem lá e diz que foi aqui no Brasil que mais se avançou no Índice de Desenvolvimento Humano", discursou. "Só posso ficar feliz. Para mim, nada melhor do que isso."


Saldo de R$ 83 bi para sucessor está atrelado a mercado
Secretário do Tesouro esclarece que caixa depende 'fortemente' das condições até o fim do ano

BRASÍLIA - O secretário do Tesouro Nacional, Eduardo Guardia, esclareceu ontem que o saldo de caixa de R$ 83 bilhões a ser recebido pelo sucessor do presidente Fernando Henrique Cardoso "baseia-se em hipóteses que dependem fortemente das condições de mercado" para ser concretizado. Ele assegurou, no entanto, que o governo está trabalhando para assegurar uma transição administrativa "a mais tranqüila possível". Segundo o último dado disponível, existem aproximadamente R$ 117 bilhões no caixa do Tesouro.

Desses, R$ 60 bilhões estão reservados para resgatar títulos da dívida pública que vencem até o fim do ano.

Esses recursos só serão utilizados para quitar a dívida caso as condições de mercado estejam adversas e não seja vantajoso emitir novos papéis para "rolar" a dívida que vence. Restariam, portanto, R$ 57 bilhões em caixa para as demais despesas do governo. Os valores, porém, podem variar. O montante disponível para despesas que não são resgate da dívida só será de R$ 57 bilhões se, de setembro a dezembro, houver um rigoroso "empate" entre a arrecadação e as despesas do governo. No entanto, desde janeiro de 1999, o governo federal tem gastado menos do que arrecada.

Os R$ 83 bilhões são a soma desses R$ 57 bilhões, mais pelo menos R$ 26 bilhões que o governo entende ser possível deixar em caixa para pagar dívida. Esse é o total de títulos federais que vencem no período de janeiro a março de 2003.

Da mesma forma, os recursos destinados ao pagamento da dívida do início de 2003 podem oscilar conforme as condições de mercado. Essa reserva, ou "colchão de liquidez", será tão mais vultosa quanto mais tranqüilo esti ver o mercado financeiro até o fim do ano.

Hoje, a parcela do caixa disponível para pagamento da dívida é de R$ 60 bilhões. Segundo o secretário Guardia, essa reserva deve crescer mais cerca de R$ 25 bilhões até o fim do ano, graças a pagamentos que a União receberá de Estados e municípios, aos rendimentos que o governo federal recebe sobre a conta única que mantém no Banco Central e ao superávit primário do governo central (diferença entre receitas e despesas, exceto gastos com juros), que será de pelo menos R$ 7 bilhões de agosto a dezembro.

Margem - A soma dos R$ 60 bilhões disponíveis mais os R$ 25 bilhões em ingressos previstos dá R$ 85 bilhões, que é o valor aproximado da dívida federal que vence até dezembro. Se o Tesouro não conseguir vender um único título no mercado daqui até o fim do ano, ainda assim haverá dinheiro suficiente para resgatar os papéis que vencem. Se seguir vendendo papéis, como vem fazendo até agora, vai sobrar uma parcela do "colchão", que reforçará o caixa para o próximo ano.

Nas últimas cinco semanas, apesar das turbulências, o Tesouro captou uma média de R$ 2,1 bilhões semanais com emissão de papéis. Se o mercado mantiver o comportamento das últimas semanas - que, na avaliação do secretário, foram "extremamente tensas" - até o fim do ano, a captação total chegará a R$ 27,3 bilhões, ou seja, R$ 2,1 bilhões em cada uma das 13 semanas que restam.

Há, portanto, uma boa margem de segurança para afirmar que serão captados pelo menos os R$ 26 bilhões de que o futuro presidente precisará para quitar a dívida de janeiro a março e que os R$ 57 bilhões hoje existentes para a cobertura das demais despesas também estarão disponíveis no início do ano.


Lula reage a secretário dos EUA e cobra 'respeito'
Petista classifica declarações de Robert Zoellick sobre a Alca de 'desatino' e 'bobagem'

RECIFE - O candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, rechaçou as declarações do secretário de Comércio dos Estados Unidos, Robert Zoellick, e classificou-as como "desatino". Em entrevista ao jornal americano The Miami Herald, na edição de domingo, Zoellick afirmou que as opções do Brasil para acordos comerciais são a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) ou a Antártida - onde simplesmente não há o que negociar. Na entrevista, o secretário se referia a uma eventual vitória de Lula e a sua recusa sobre os termos de negociação da Alca como estão colocados hoje.

"Tem muita gente que fala bobagem a respeito do Brasil e, se Deus quiser, vão passar a respeitar o País daqui para frente", afirmou Lula, ontem à tarde, após desembarcar no Recife, onde participaria de uma caminhada. "O Brasil merece respeito, é soberano e não podem ficar dando palpites sobre as posições do partido." Lula frisou que quer para o Brasil o mesmo que os EUA buscam para si.

"Queremos salvaguardar os interesses da nossa indústria, da nossa agricultura. Queremos exportar mais, ter superávit comercial. Tudo o que eles querem nós queremos. E, por isso, vamos ter de negociar de acordo com os nossos interesses, não de acordo com os interesses deles", completou, depois de dizer que não responderia "ao sub do sub do subsecretário americano".

De manhã, em Natal, Lula disse acreditar num acordo com os EUA sobre a Alca:

"Nossa disposição é de sentar e negociar, vai chegar o momento em que vamos encontrar o ponto de equilíbrio e pode sair o acordo." O petista chegou ao Recife vindo de João Pessoa (PB), depois de pernoitar na capital potiguar e, após caminhada no centro da cidade, seguiria para Aracaju (SE). Ao desembarcar na capital pernambucana, definiu a onda de boatos que circula no Estado - anunciando o fim do Bolsa-Escola e programas sociais do atual governo no caso de sua vitória - como "terrorismo". "Esse terrorismo barato é coisa que os militares utilizaram contra os que hoje tentam utilizar contra mim", afirmou, referindo-se indiretamente ao tucano José Serra. Segundo Lula, o Bolsa-Escola foi criado pelo PT e sua intenção é aperfeiçoar as políticas sociais.

Juros - O petista voltou a criticar ontem o aumento da taxa de juros, de 18% para 21%.

"Nenhum país do mundo vai para a frente se os juros oferecidos pelo governo forem maiores que as taxas de lucros ganhos por uma empresa produzindo", afirmou, depois de apoiar Vilma Faria (PSB), que disputa o governo de Natal. Lamentavelmente, disse ele, a equipe econômica só enxerga essa saída. "Essa posição do governo tem um caráter muito recessivo."

Ele ressaltou, porém, não acreditar que a medida vá beneficiar sua campanha:

"Não creio que uma decisão dessas vá beneficiar ou prejudicar alguém tão rapidamente, é preciso saber qual o tempo que o governo vai manter essa posição." Se tiver uma longa duração, declarou, os efeitos "podem ser danosos ao povo brasileiro" e "vai ficar mais difícil o governo fazer discurso mais otimista para a sociedade". (Colaborou Valdir Julião, especial para o Estado)


Serra diz que é mais esquerda do que o PT
Candidato tucano promete que fará mais mudanças do que o adversário


Artigos

Segundo turno
Frei Betto

Eleição e mineração, só depois da apuração. O resultado do pleito de 6 de outubro comprovou que 76% do eleitorado quer mudanças. É fato que os ventos da esperança sopram em direções contrárias, mas sopram. Lula quase chegou lá; Garotinho e Ciro não conseguiram alijar o candidato do governo; Serra agora tenta convencer os eleitores de que ele não é clone de FHC e de que lhe sobra competência.

Muitas surpresas trouxeram a abertura das urnas: velhos caciques, como Maluf, Brizola, Quércia, Íris Rezende, Bernardo Cabral e Newton Cardoso, foram repudiados pelos eleitores, bem como Fernando Collor de Mello e sua "república de Alagoas". Por ora, o Brasil está livre da ameaça de ver Collor disputar as eleições presidenciais de 2006.

O voto popular, contudo, trouxe de volta ACM, Jader Barbalho e José Roberto Arruda. Enéas, aquele cujo nome ninguém esquece, ganhou 1,5 milhão de votos, catapultando para a Câmara dos Deputados mais cinco candidatos do Prona que, apesar de terem recebido votações inexpressivas, vão representar o Estado de São Paulo.

O PT cresceu, elegendo no primeiro turno dois governadores (Acre e Piauí) e conduzindo ao Senado dez novos senadores e cerca de 90 deputados federais.

O eleitor deu sinais de maturidade. Prova disso é que inibiu os marqueteiros de apelarem para baixarias. As raras tentativas de furar a barreira do decoro foram repudiadas e tiradas ao ar, como a cena em que o deputado José Dirceu estaria incitando a turba a agredir o governador Mário Covas.

Tentou-se, em vão, associar diploma universitário e competência administrativa. A história está repleta de líderes que nunca pisaram numa universidade, como Tiradentes, que comandou doutores laureados pela Universidade de Coimbra; Machado de Assis, que fundou a Academia Brasileira de Letras; e Chico Mendes, paradigma da luta pela defesa do meio ambiente, em especial da Amazônia.

O eleitor está mais criterioso, sensível às exigências de ética na política, embora resista às mudanças nos bolsões da oligarquia e redutos do coronelismo. As oscilações e o nervosismo do mercado não afetaram as tendências reveladas nas pesquisas eleitorais, dando mostras de que a população não quer mais uma economia dissociada de conquistas sociais efetivas. O brasileiro cansou de se decepcionar com os seus eleitos, aprendeu a valorizar o seu voto e, agora, presta mais atenção a programas de governo que ao denuncismo rasteiro de quem pensa que xingar não é tão imoral quanto merecer as ofensas proferidas.

Agora é partir para o segundo turno e decidir quem governará o Brasil: Lula ou Serra? PT ou PSDB? Quem fará, e de que modo, as reformas tão propaladas e sempre adiadas: trabalhista, previdenciária, tributária, agrária, política, etc.

Segundo o IBGE/2000, a população economicamente ativa é de 76,1 milhões, dos quais 64 milhões têm emprego. Desses, 55,2% têm carteira assinada e 36,3% não têm vínculo formal. Dos 17 milhões de aposentados, 13 milhões recebem por mês até um salário mínimo; 65% dos recursos da Previdência vão para aposentados que pertencem à esfera dos 20% mais ricos da população - os 40% mais pobres ficam com apenas 9% dos recursos. Mais da metade dos recursos do seguro-desemprego vai para os 40% mais ricos. Os 20% mais pobres ficam com apenas 3%.

Quanto aos tributos, os 20% mais ricos da população se apropriam de 64,1% da renda nacional, enquanto os 20% mais pobres ficam com 2,2% (Banco Mundial/2002). A carga tributária equivale a 34,07% do PIB.

De acordo com o Incra, as propriedades agrícolas ocupam 353 milhões de hectares das terras do País, dos quais 178 milhões são pastagens; 94 milhões, matas e florestas; 50 milhões, lavouras; 16, terras produtivas não utilizadas; e 15 milhões, terras inaproveitáveis. Só na Região Sudeste há 90 milhões de hectares improdutivos. Se essa área fosse cultivada, o Brasil triplicaria a sua produção agrícola. O potencial de terras ociosas daria para produzir 250 milhões de toneladas de grãos, 30 milhões de toneladas de frutas e 9 milhões de toneladas de carnes.

Malgrado as diferenças sociais e as disparidades de renda, esse banho de democracia revela que somos, hoje, uma nação madura. Resta expulsar de casa estas duas irmãs siamesas, a imunidade e a impunidade, de modo a impedir que os corruptos sofram apenas breves quarentenas de ausência do cenário público.

Em 27 de outubro, o eleitor brasileiro dirá o que espera do futuro deste país abençoado por Deus.


Editorial

PENSANDO NO PRÓXIMO GOVERNO

A inesperada decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de elevar a taxa básica de juros da economia de 18% para 21% - o mesmo nível de junho de 1999 - causou controvérsias e foi recebida com resignação ou ceticismo. No entanto, julgue-se como se queira a pertinência da medida, no âmbito técnico, o fato é que, pelos seus óbvios efeitos negativos sobre o nível da atividade e a capacidade aquisitiva da população, ela representa uma péssima notícia para o tucano José Serra, o candidato do presidente Fernando Henrique que precisa como nunca de boas notícias no front econômico para ajudá-lo a chegar às urnas do próximo dia 27, sem ter perdido antecipadamente a batalha pelo voto popular para o favorito Lula da Silva.

A história política do País não é propriamente pródiga em exemplos de atos do Executivo - no plano federal, estadual ou municipal -, a menos de duas semanas de uma eleição, que possam prejudicar os candidatos dos governantes de turno. O oposto é que sempre foi o padrão dominante - daí o enraizamento da expressão "uso da máquina" no léxico político nacional e daí a enorme massa de leis e regulamentos destinados a neutralizar a influência dos detentores do Poder nas disputas pela sua sucessão. O máximo de isenção que a sociedade brasileira poderia esperar de suas autoridades, durante uma temporada eleitoral, seria elas adotarem uma posição de negligência benigna, por assim dizer: inibidas, por qualquer razão, de tomarem decisões claramente favoráveis aos candidatos cujo êxito eleitoral lhes seria vantajoso, também se absteriam do contrário - mesmo que o interesse nacional o recomendasse.

Invocam-se essas conhecidas características dos costumes políticos do País para ressaltar como contrasta vivamente com elas o comportamento do governo Fernando Henrique. Na reta final da competição pelo Planalto, tem-se um candidato oposicionista que não se cansou de repetir, durante a campanha, que existe algo de muito errado com um modelo que proporciona aos agentes econômicos que se dediquem à especulação financeira retornos mais polpudos sobre o capital investido do que obteriam se aplicassem os mesmos recursos na produção, devido ao patamar estratosférico da taxa de juros. Pouco importa que esse enunciado seja um monumento de simplificação, para não dizer de má-fé, na medida em que dá a entender que os juros estão onde estão por uma decisão autônoma e proposital do governo. O fato é que essa versão simplória parece ter sido acolhida por ampla parcela do eleitorado. Pois bem: como se desejasse deitar a derradeira pá de cal nas chances de seu candidato, o governo fornece munição adicional para o seu adversário.

É o preço a pagar quando o que se deseja, na realidade, é criar o menos conturbado ambiente para a próxima administração, seja qual for o seu titular. A cada dia fica mais claro que as preocupações essenciais da equipe econômica do presidente Fernando Henrique estão voltadas não apenas para o que poderá suceder ao País nestes 77 dias de mandato que lhe restam, mas, principalmente, para as condições com as quais o novo governo terá de se haver. Mais de meio ano de disparada do dólar e de retração dos investimentos recolocou em cena a ameaça da inflação. E, entre tentar debelar esse risco, elevando a taxa de juros, e poupar a candidatura Serra de novos dissabores, a autoridade econômica parece não ter pensado duas vezes. Basta atentar para a urgência com que o presidente do Banco Central, Armínio Fraga, convocou em caráter extraordinário os membros do Copom, na manhã de segunda-feira, tão logo as cotações da moeda americana abriram em alta, para aviarem a amarga receita de elevar o nível nominal da Taxa Selic.

E não se pode esquecer que, na véspera, o secretário do Tesouro, Eduardo Guardia, havia anunciado que o próximo governo contará com um "colchão de liquidez" de R$ 83 bilhões para honrar, com tranqüilidade, os compromissos que vencem no primeiro trimestre de 2003.

Se o remédio da alta dos juros funcionar, apesar dos seus notórios custos sociais, e caso se confirmem as previsões da eleição de Lula, ele só terá a agradecer ao governo contra o qual tanto investe a oportunidade de um início de mandato em que a tendência dos preços não constitua um perigo real e presente.


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10/16/2002


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