Itamar, o malabarista
Itamar, o malabarista
Governador de Minas põe assessor na cordenação da campanha de Ciro. Depois de declarar apoio a Lula e reatar com o PSDB, tornou-se o eleitor preferencial dos candidatos
O governador de Minas Gerais, Itamar Franco, fez de tudo para ser candidato a presidente da República. Não conseguiu. Agora, investe o que pode para chegar a outubro como unanimidade. Depois que teve sua pretensão enterrada pelos manda-chuvas do PMDB, promete passar olimpicamente pela sucessão de Fernando Henrique Cardoso.
Elogiado e cortejado por todos os candidatos, Itamar tem hoje um pé em cada uma das quatro principais campanhas. Primeiro, articulou a candidatura a governador do deputado Aécio Neves (PSDB), presidente da Câmara. Aécio apóia a candidatura a presidente de José Serra, também tucano, e reaproximou Itamar de Fernando Henrique, rompidos há quase quatro anos. Depois, prometeu ingressar na campanha presidencial de Luiz Inácio da Silva (PT) em solo mineiro. É também amigo do ex-governador de Pernambuco, Miguel Arraes, presidente do PSB de Anthony Garotinho. Ontem, finalmente, entrou também na campanha de Ciro Gomes (PPS).
A aproximação com Ciro será feita por Omar Resende Peres, assessor especial de Itamar e ex-secretário de Indústria e Comércio do estado. Filiado ao PDT, Peres será um dos coordenadores políticos da campanha do ex-governador do Ceará em Minas Gerais. Na última terça-feira, Peres esteve na reunião do comando da Frente Trabalhista, no Rio de Janeiro. Do presidente do PDT, Leonel Brizola, e do próprio Ciro, ouviu diversos elogios a Itamar, que obviamente retransmitiu ao chefe.
Na reunião, Omar não precisou dizer nada. Só a sua presença foi suficiente para que Ciro entendesse que acabara de receber um aceno de Itamar à sua candidatura. ‘‘Itamar é um grande homem público. Mande a ele os nossos cumprimentos’’, disse Ciro ao assessor.
A notícia da presença do assessor de Itamar no comando de campanha da Frente Trabalhista chegou rápido aos ouvidos dos petistas. Por isso, logo na manhã de quarta-feira, do aeroporto de João Pessoa (PB), o candidato a vice de Lula, senador José Alencar (PL-MG), telefonou para o governador mineiro. Alencar fez questão de tornar público o telefonema e a declaração do governador, colocando-se como ‘‘soldado’’ da campanha de Lula. O PT fará agora um convite formal para que Itamar compareça ao lançamento do programa de governo do PT, dia 23, no Congresso Nacional.
A intenção foi mesmo arrancar um compromisso de Itamar com Lula para uma agenda comum em Minas Gerais e em outros atos pelo país. A declaração, Lula já conseguiu. Mas a agenda comum ficou para depois. A primeira sugestão, uma programação conjunta neste fim de semana, foi recusada por Itamar. A justificativa foi a de que não iria misturar a campanha presidencial com a de Nilmário Miranda (PT) ao governo mineiro, uma vez que ele, Itamar, já está no palanque de Aécio. Ontem, em Uberlândia, Itamar afirmou que ‘‘cabe a eles (os petistas) definirem sua participação na campanha’’.
Os petistas têm pressa em exibir Itamar ao lado de Lula. Querem que issoa conteça antes de o governador se encontrar com Ciro. Itamar é considerado uma espécie de padrinho de Ciro no quadro político nacional. Como presidente da República, Itamar levou o hoje candidato da Frente Trabalhista para o Ministério da Fazenda, em 1994, em substituição a Rubens Ricupero — autor da frase, captada por antena parabólica, ‘‘o que bom a gente diz, o que é ruim a gente esconde’’, a respeito das notícias econômicas.
Padrinho
Naquela época, o presidente Fernando Henrique Cardoso, candidato pela primeira vez ao Planalto e ex-ministro da Fazenda, monitorava o Plano Real pelo telefone, em suas viagens de campanha. Estava em Porto Alegre quando Ricupero caiu. Indicou o então presidente do Banco do Central, Pedro Malan, para o cargo. Mas Itamar optou por Ciro. Uma forma de contrabalançar o poder no PSDB entre Ceará e São Paulo e, ao mesmo tempo, tirar parte do comando da economia das mãos de Fernando Henrique.
Da mesma forma que não imaginou à época que Ciro seria hoje candidato a presidente, Itamar, sinceramente, não planejou abertamente botar um pé em cada campanha. Mas acabou chegando a todos os candidatos por fatores, como o ódio que cultiva de quem considera ter puxado seu tapete na política.
A pitada de ódio rendeu a Itamar um pé no PSDB e outro no PT. Explica-se: Itamar brigou com o vice-governador de Minas, Newton Cardoso (PMDB), que comanda o PMDB e negou-lhe legenda para disputar a reeleição, e com a cúpula do PMDB, que sequer o aceitou como vice de José Serra. Brigado com Newtão, Itamar desfiliou-se do PMDB e apoiou Aécio. Irritado com a cúpula do partido, declarou apoio a Lula.
Os pés nas campanhas de Ciro e de Garotinho vieram por outras pontas. De Garotinho, veio da relação antiga de Itamar com Arraes. No caso de Ciro, além da gratidão do ex-ministro da Fazenda para com o ex-presidente, Itamar tem uma série de amigos no PDT, que integra a Frente Trabalhista. Ali estão Israel Pinheiro Filho, Omar Peres e Manoel Costa, filiados ao PDT e que permaneceram no partido por causa da possibilidade de Itamar sair candidato a presidente pela legenda. Itamar decidiu ficar no PMDB na última hora do dia 5 de outubro de 2001, último prazo para a troca de filiação partidária.
Em abril, quem analisou as equações feitas por Itamar, distribuindo aliados por vários partidos e, mais tarde, brigando com Newtão e com a cúpula do PMDB, jurava que tudo tinha dado errado. Hoje, quem entende o jeito de ser e fazer política de Itamar, jura que a matemática do governador lhe será proveitosa. E ele já começa a colher os frutos.
A aproximação com o PSDB, em princípio, tinha apenas o objetivo de irritar Newton Cardoso e tirar votos do PMDB mineiro. Agora, já rendeu ao ex-presidente uma homenagem pública por parte de Fernando Henrique no aniversário do real, no Rio de Janeiro. Além disso, pode representar ajuda financeira da União a Minas e a total cordialidade de Serra para com Itamar e vice-versa.
Agora, com Omar Peres na coordenação política de Ciro, ganha influência na campanha da Frente Trabalhista (PPS-PTB-PDT). Apontado hoje como o maior eleitor de Minas, Itamar sonha em sair do governo elogiado e talvez até com um convite para ocupar uma embaixada pelo presidente da República eleito. Seja ele quem for.
O que os vices têm
Roriz (PMDB), Magela (PT) e Cariello (PSTU) apostaram na força do eleitorado feminino ao escolher os nomes para vice-governador
Até a última hora houve brigas internas nos partidos para a indicação dos melhores nomes. No final, os oito vice escolhidos são quase todos desconhecidos e novos no mundo da política. A definição seguiu critérios diferentes. O PT, do candidato Geraldo Magela, e o governador Joaquim Roriz, que tenta a reeleição, preferiram apostar na matemática do eleitorado brasiliense e escolheram uma mulher como vice.
O voto feminino representa 53% do eleitorado no Distrito Federal. Apesar da estatística do Tribunal Regional Eleitoral, apenas três mulheres conquistaram a vaga. A professora Niedja Albuquerque é a vice de Orlando Cariello, do PSTU. Os demais candidatos optaram por outras escolhas ou tiveram de se conformar com a alternativa que sobrou. O PSB, de Rodrigo Rollemberg, indicou o nome de um policial militar para deixar mais claro a prioridade na área de segurança.
‘‘Segurança traz qualidade de vida’’, explica o coronel Juan Mendes, que disputa pela primeira vez uma campanha eleitoral. Carlos Alberto Torres, do PPS, tem como vice o empresário Abidel Karajah, um palestino que mora em Brasília desde 1965. Não era o melhor nome para a vaga, mas nem a coreógrafa Gisele Santoro nem o cineasta Wladimir de Carvalho aceitaram entrar na disputa por conta de atividades culturais já programadas.
Katea Puttini, do PT, e a tucana Maria de Lourdes Abadia também não foram escolhas fáceis. A Articulação, a tendência mais representativa do PT, ameaçou até não apoiar a campanha de Magela. O grupo liderado pelo ex-governador Cristovam Buarque apoiava o nome da ex-deputada federal Maria Laura. Já o nome de Abadia desagradou ao vice atual de Roriz, o evangélico Benedito Domingos. Até o dia do registro das candidaturas, Roriz tentou aliança com o PPB.
Não houve jeito. Benedito só desistiria da candidatura própria em troca da vice. Ele não só levou adiante a candidatura como capturou para vice o ex-distrital Marcos Arruda (PTN), que desistiu de sair isolado para a campanha ao GDF. A aliança do PTN com o PPB foi costurada pelo senador cassado Luiz Estevão, antigo aliado e hoje desafeto de Roriz. Estevão é o presidente regional do PTN.
Sem o apoio de Benedito, Roriz esforça-se para não perder votos do segmento evangélico. Maria Abadia é católica e a base eleitoral dela é a Ceilândia, cidade que administrou de 1975 a 1985. A cidade tem 287 mil eleitores e é o maior reduto eleitoral do DF.
Embora haja disputas para o posto, ser vice na política brasiliense é uma missão ingrata, de pouca projeção. Desde as primeiras eleições no DF, em 1990, que os vices sofrem derrotas. Márcia Kubistchek, filha do presidente Juscelino, era vice de Roriz, mas perdeu a disputa para o Senado em 1994. Arlete Sampaio, vice de Cristovam tentou a mesma vaga em 1998, mas a vitória ficou com o então distrital Luiz Estevão, do PMDB.
Apesar do posto de pouca visibilidade, todos prometem brigar por espaço no governo. ‘‘Não serei a sombra de Roriz e muito menos um vasinho de flores no Buriti’’, avisa Maria Abadia. ‘‘Se Magela não me der espaço, vou conquistá-lo’’, assegura Katea Puttini, que planeja investir em programas de assistência à mulher e aos jovens.
Calmante do FMI
Viagem da vice-diretora do Fundo Monetário ao Brasil aumenta expectativa de que o país está prestes a fechar acordo de transição
São Paulo — Bastou o mercado financeiro saber ontem que a poderosa Anne Krueger, vice-diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), virá ao Brasil na próxima semana, para a especulação com o dólar perder força. A moeda norte-americana, que chegou a bater em R$ 2,902 durante o dia, cedeu e fechou a R$ 2,851. Desde o dia 11 a cotação não caia. A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) fechou em discreta alta de 0,54%, refletindo a imensa aversão a risco dos investidores estrangeiros.
Com a notícia do bom humor no mercado brasileiro, os títulos da dívida externa começaram a ser comprados. O C-bond, o mais negociado em Nova York e Londres, subiu 2,7% e fechou em US$ 0,6430. Como conseqüência dessa elevação, o risco-país diminuiu 2,4%, para 1.510 pontos. Esse indicador mede quanto é pago a mais de juros por um título de país emergente em relação a papéis emitidos pelo governo norte-americano com prazo semelhante de vencimento. Os juros futuros também baixaram. A taxa anual para janeiro caiu de 21,95% para 21,17% nos contratos negociados na Bolsa Mercantil e de Futuros (BM&F).
Muitos analistas internacionais estão seguros de que a crise de confiança dos investidores no mercado de ações e títulos da dívida externa de países emergentes é muito grave e deverá levar pelo menos alguns meses para passar. Nesse cenário negativo, ficará muito difícil para países muito dependentes de dólares, como o Brasil, captar recursos no exterior para honrar seus compromissos. Por ano, o país precisa de perto de US$ 50 bilhões para fechar suas contas externas — pagar importações e fretes de navios. Hoje, os financiamentos de comércio exterior estão reduzidos em 40%, fato que nunca ocorreu na história.
Se o mercado está seco de dólares e as despesas internacionais são praticamente inevitáveis, o dinheiro para cobrir tais contas tem que sair de algum lugar. É por isso que os investidores julgam inevitável um novo acordo com o FMI antes mesmo da posse do novo presidente da República. Nesse cenário, a notícia de que Anne Krueger terá uma série de encontros entre Rio, São Paulo e Brasília na próxima semana, causou tão boas expectativas no Brasil.
Caso faltem recursos para o país pagar suas contas no exterior, o Fundo e outras instituições, como o tesouro dos Estados Unidos, estariam dispostos a ajudar. A contrapartida, como foi dito a Arminio Fraga, presidente do Banco Central, na semana passada em Washington e Nova York, seria o compromisso dos candidatos à Presidência de manter as linhas mestras da atual política econômica: controle das contas públicas, inflação baixa e pagamento das dívidas externa e interna.
Logo quando foi confirmado que Anne Krueger virá ao Brasil, no meio da manhã, a indústria do boato começou a especular sobre os motivos reais da viagem. Circulou por tesourarias de bancos em São Paulo e Nova York que ela desembarcará no país para dar os retoques finais num pacote de ajuda emergencial, que seria de US$ 10 bilhões. A assessoria de imprensa do FMI em Washington informou ao Correio que nenhum novo acordo com o Brasil está em curso.
Segundo o FMI, Krueger vem ao Brasil para participar do encontro latino-americano da Sociedade Econométrica, que ocorrerá de quarta-feira a sábado em São Paulo. Contudo, a assessoria do ministro da Fazenda, Pedro Malan, confirmou que ela estará em Brasília na terça-feira. Nesse dia, a vice-diretora-gerente do Fundo almoçará com Malan e, às 17h, se encontrará com o presidente Fernando Henrique Cardoso no Palácio do Planalto.
Sai restituição do IR de 1999
A Receita Federal libera hoje um lote de declarações de Imposto de Renda de 1999 (ano-base 1998), que estavam retidas na malha fina. Nesse lote foram processadas 47.421 declarações, sendo 6.443 com saldo a restituir, no valor de R$ 8,9 milhões. As restituições virão corrigidas em 54,42%. Na terça-feira, a Receita faz o depósito do sétimo lote residual do IR de 2001 (ano-base 2000). Do total de 87.472 declarações, 42.215 são restituições, no valor total de R$ 64,9 milhões, que virão com correção de 20,71%. O último lote residual de julho, é do exercício 1997, ano-base 1996, que será liberado dia 25. O contribuinte que não informou na declaração o número da conta corrente para o depósito da restituição, deverá ir a uma agência do Banco do Brasil ou ligar para 0800-785678 e agendar o crédito da restituição em qualquer banco do qual seja correntista.
Brasília cria 4,3 mil empregos
A taxa de desemprego total no Distrito Federal recuou um pouquinho entre os meses de abril e maio deste ano, passando de 21,1% para 20,9%. De acordo com a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), divulgada ontem pela Secretaria do Trabalho do GDF e pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese), foram criados 4,3 mil novos postos de trabalho, o que diminuiu o número de desempregados em 1,5 mil pessoas. A PED de abril também mostrou diminuição na taxa de desemprego em relação a março, resultando em dois meses consecutivos com saldo positivo — o que era previsto pela coordenadora da pesquisa pelo Dieese, Graça Ohana. ‘‘Os primeiros meses do ano são difíceis. Só depois de março os índices começam a melhorar’’, explica. Os setores que mais abriram postos de trabalho foram comércio, serviços e administração pública. Indústria e construção civil tiveram saldo negativo.
Queima geral na cidade
Brasilienses terão 16 dias corridos de promoções no comércio, a partir de 23 de agosto. Os descontos abrangerão de roupas a material de construção
O comércio do Distrito Federal iniciou contagem regressiva pa ra uma megaliquidação que começará em 23 de agosto e se estenderá até 7 de setembro. Serão 16 dias corridos em que materiais de construção, móveis, vestuário, corridas de táxi e até diárias de hotéis e flats estarão com descontos de 5% a 40%. É o Liquida Tudo, a primeira edição do evento criado pela Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) e que já acontece com sucesso em Belo Horizonte, São Paulo, Porto Alegre, Aracaju e Salvador.
‘‘Vamos criar uma data para incorporar no calendário promocional de Brasília’’, diz o presidente da CDL, Pedro Américo. A megaliquidação tem apoio da Federação do Comércio e da Associação Comercial do Distrito Federal, além da participação das financeiras e das administradoras de cartão de crédito com taxas de juros menores e prazo maior para a clientela pagar as contas. O objetivo é zerar o estoque do comércio com grande impacto nas vendas.
Antes da grande liquidação atingir o bolso do consumidor, o segmento de moda já havia começado a dar grandes descontos nos shoppings da cidade. Desde o início do mês, lojas exibem na vitrine descontos de até 70% na coleção de inverno. A razão para uma liquidação em pleno inverno é justamente a falta de frio.
No Conjunto Nacional, 60 lojas do total de 320 estão liquidando com até 70% de desconto. Segundo o gerente de marketing do shopping, João Marcos, as lojas aguardam a chegada da nova coleção para ocupar as vitrines. ‘‘O inverno curto provocou a queima antecipada do estoque.’’ As lojas do Pátio Brasil se anteciparam mais ainda. Entre os dias 3 e 7 deste mês, o shopping parou para liquidar tudo, até a alimentação. De acordo com o gerente de marketing do Pátio, Renato Horne, 40 lojas ainda continuam vendendo com descontos de até 50%.
As grandes marcas também começaram a liquidar. Há dez dias o Grupo Magrella, que engloba as famosas Zoomp, Forum, Triton, Le Lis Blanc e os grandes estilistas, oferece descontos de até 40%. Na hora de gastar o dinheiro, o superintendente de Vendas, Karla Rosa, aconselha a compra de roupas em tons pastéis e tecidos leves, tendência forte para o verão.
O desconto nas grandes marcas chamou a atenção da dona-de-casa Ana Cristina Rojas, 32 anos. Ontem ela saiu de casa pensando que gastaria até R$ 300 para comprar uma blusa e um sapato, mas ficou surpresa ao desembolsar apenas R$ 100 com os dois artigos. ‘‘Está melhor do que eu imaginava’’, comemorou. As lojas das entrequadras agradaram mais ao oficial aposentado Bolívar Mazon, 63 anos. Preparando-se para viajar a São João Del Rei (MG) e ver o filho e a neta, o oficial decidiu atualizar o guarda-roupa. Depois de andar pelos shoppings, optou pelas lojas da entrequadra 304/305 Sul. ‘‘Os preços estão melhores. Comprei por R$ 95 uma calça que no shopping custa R$ 120.’’
Artigos
Eleições entre futricas e bacharéis
Octaciano Nogueira
A década de 80, culminando com a derrubada do Muro de Berlim, foi considerada perdida em termos de progresso econômico. Para os países emergentes, porém, restou o consolo de ter sido consagrada como a era da restauração democrática. Os anos 90 chegaram promissores, prenunciando, segundo o vaticínio de Francis Fukuyama, ‘‘o fim da história’’ e dos regimes militares na América Latina. À exceção de Cuba, a democracia parecia uma árvore frondosa no continente, capaz de dar sombra e abrigo, na feliz comparação de Otávio Mangabeira, referindo-se ao Brasil de 1946. Daí o paraíso que parecíamos fruir no ano jubilar de 2000, aquele em que a globalização econômica, o fim dos conflitos armados e rápidas transformações sociais prenunciavam um doce e desfrutável milênio.
A insanidade humana, os radicalismos que todos supúnhamos sepultados e a vaidade incontida de líderes políticos e governantes se encarregaram de mostrar, não as primícias de uma nova era, mas as dores e angústias de um século que começou anunciando o reino da estupidez coletiva. A democracia começou com pequenos tropeços, mostrando raízes que não tinham chegado a medrar. A economia deu sinais de alarme por toda parte, a despeito do irracional argumento de serem ‘‘sólidos’’ os seus fundamentos, quando mais frágeis se revelam os seus alicerces. E o direito claudica em todas as partes do mundo. Por que haveríamos de ser diferentes?
O naufrágio argentino, os sismos que nos deixam céticos com relação ao nosso próprio desempenho; os perigos que rondam o Uruguai; as turbulências que continuam a sacudir a Venezuela e seu insensato bolivarianismo; as nuvens que toldam o futuro político da Colômbia; os riscos por que passa a Bolívia às voltas com suas últimas eleições; a ameaça visível e palpável do governo Toledo ao fim de seu primeiro ano de mandato; os tropeços do Equador; os problemas cada vez mais visíveis do Paraguai, e o fantasma de Pinochet que continua a alarmar o Chile, cada vez que dá sinais de sua presença, não são bons presságios. A América do Sul vive o medo da instabilidade e a do Norte a síndrome da hecatombe, todo dia anunciada. E quanto mais crescem as medidas de segurança, de maiores sinais de decadência e desprezo padecem os direitos humanos.
É nesse ambiente que vamos disputar as eleições sob regras cuja inviabilidade já se tornou evidente, antes mesmo do início de nossa longa campanha eleitoral que se prolonga, ao contrário do que pratica a maior parte das democracias, por quase um ano, ainda que legalmente circunscrita aos 90 dias que precedem o primeiro turno. Os ventos da inquietação que sopram em toda parte não podiam deixar de se manifestar por aqui. As culpas são várias e os culpados são muitos. A começar pela imposição de uma regra decretada por essa variante dos sete sábios do Sião, que são os ministros do TSE, sobre alianças eleitorais simétricas, num país com a enormidade, a diversidade e a pluralidade e a assimetria brasileiras. A idéia pode até ser calcada em bons, ainda que ingênuos propósitos, o de dar aparente disciplina e racionalidade ao caótico quadro partidário com o qual já nos conformamos, mais do que nos habituamos.
O erro, cometido em cima da omissão do Congresso, que na atrofia de sua principal missão se recusa a legislar, padece do pecado de ser calcado no falso e falacioso argumento de que as regras devem ser iguais para todos os partidos e todos os pleitos. Esqueceram os ministros de separar o joio do trigo, estabelecendo regras idênticas, para eleições diferentes. Assim, o que passou a valer para eleições majoritárias prevaleceu, também, para eleições proporcionais. Uma heresia, não só de cunho jurídico, mas uma ortodoxia que atenta contra as regras mais elementares da teoria política. É como se, na doutrina jurídica, estabelecêssemos o mesmo padrão de justificativa moral, impondo o mesmo fundamento ético para o direito público e o direito privado, pondo fim à diferença entre a justiça comutativa e a justiça distributiva!
Os eminentes magistrados se encerraram em sua torre de marfim e se recusaram a contemplar, com sua incontestável experiência jurídica, a realidade da política que os rodeia e que, há séculos, campeia entre nós aqui fora. O mal que fizeram à cultura cívica do país é incontestável, mas felizmente não é irreparável. Se eles mesmos não corrigirem o seu erro, circunscrevendo suas decisões ao que é material e não bacharelescamente controverso, correm o risco de ter contribuído, mais uma vez, para caracterizar a diferença que, no Brasil, como no Portugal de Eça, separa o país entre ‘‘futricas’’ e bacharéis. Os últimos destinados a mandar. Os primeiros condenados a sempre obedecer por mais absurdas que sejam as regras que lhes sejam impostas.
Editorial
UM EXEMPLO DE MATURIDADE
O encontro do presidente do Banco Central, Armínio Fraga, com o de putado petista Aloizio Mercadante marca o início de uma nova etapa da política brasileira. O fato revela um salto de qualidade nas relações entre governo e oposição em plena campanha eleitoral, período em que o acirramento das disputas costuma aprofundar as divergências. O país só tem a ganhar com dirigentes que se dispõem a colocar os problemas nacionais acima dos interesses partidários.
As dificuldades atravessadas pela economia brasileira, agravadas pelo cenário internacional, foram determinantes para o estabelecimento de uma nova postura de governistas e oposicionistas. Os dois lados perceberam que as diferenças de opinião sobre os rumos do país são menores do que a necessidade de construir um futuro sólido para os brasileiros. A sensibilidade do mercado financeiro num mundo globalizado torna ainda mais frágeis nações em desenvolvimento como o Brasil.
A incapacidade dos partidos em realizar um pacto político levou a população da Argentina às ruas para derrubar o presidente Fernando de la Rúa. Como conseqüência, fica impossível prever quando o país resgatará a estabilidade social perdida desde a descoberta de que o modelo econônico adotado era inadequado para enfrentar a realidade internacional.
Três décadas de intolerância mergulharam a Colômbia numa guerra civil sem precedentes na América do Sul. Todas as tentativas de diálogo foram interrompidas por demonstrações sangrentas de radicalismo político. Hoje, os colombianos não sabem quando o conflito vai acabar para que o país tenha um futuro de paz e estabilidade.
As boas relações entre governo e oposição no Brasil foram construídas ao longo dos últimos vinte anos. A anistia concedida no final dos anos 70 devolveu aos adversários do regime militar os direitos políticos perdidos quinze anos antes. O gesto permitiu a antigos inimigos trabalharem juntos para produzir uma Constituição para todos, sem distinção de ideologia.
O exemplo brasileiro engrandece a política e enriquece a biografia dos que a praticam. Quando Fraga e Mercandante se encontram, demonstram a maturidade da democracia brasileira, sólida o suficiente para comportar a alternância no poder em clima de normalidade.
Outros encontros entre Armínio Fraga e os candidatos à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso, ou seus representantes, devem ocorrer nas próximas semanas. Os gestos de boa vontade tranqüilizam os eleitores por sinalizar que o governo atual e o futuro estão desde já preparando uma sucessão sem traumas para a economia e a democracia do país.
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07/19/2002
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