Jader tinha conta em paraíso fiscal
Jader tinha conta em paraíso fiscal
Ministério Público descobriu depósito de US$ 120 mil de José Osmar Borges para senador paraense em Liechtenstein
BRASÍLIA - O Ministério Público Federal descobriu que o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) abriu uma conta bancária em Liechtenstein, um pequeno paraíso fiscal vizinho à Suíça. A conta recebeu US$ 120 mil, enviados pelo empresário goiano José Osmar Borges, 42 anos, apontado como o maior fraudador da extinta Sudam (Superintendência para Desenvolvimento da Amazônia). O dinheiro foi enviado de uma agência do falido Banco Nacional, em Foz do Iguaçu (PR) por meio de uma CC-5, tipo de conta bancária autorizada pelo Banco Central para operações financeiras em moeda estrangeira para brasileiros que vivem no exterior.
Os procuradores da República que investigam as ligações entre Jader e Borges aguardam que o senador anuncie sua renúncia nesta semana para pedir ao Banco Central a cessão de técnicos especializados no rastreamento de movimentações bancárias no exterior. A confirmação da remessa do dinheiro resultará em uma ação contra o ex-presidente do Senado, com acusação de lavagem de dinheiro, além de reforçar as suspeitas sobre seu envolvimento com o esquema de fraudes na Sudam.
A remessa dos dólares é o segundo elo financeiro identificado pelo Ministério Público entre Jader e o suposto megafraudador da Sudam. Há dois meses, os procuradores da República identificaram um depósito de R$ 400 mil feito em 1996 por uma das empresas de Borges a favor do parlamentar paraense, conforme o Jornal do Brasil revelou na semana passada.
Quando descobriram a conta de Jader na Suíça, os procuradores tentaram obter do presidente do BC, Armínio Fraga, ajuda para rastrear o dinheiro enviado por Borges. Em razão de o senador ter direito a foro privilegiado de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), Fraga só autorizou a colaboração no levantamento dos extratos bancário de Borges, cujo sigilo foi quebrado em ação civil pública proposta em Mato Grosso, onde estão seis projetos dele financiados pela Sudam. Borges é acusado de ter desviado R$ 133 milhões da extinta superintendência.
Em caso de renúncia, Fraga disse aos procuradores que autorizará o rastreamento dos dólares remetidos por Borges, porque Jader passará a ser processado em primeira instância na Justiça Federal como um cidadão comum. O empresário nega as acusações. Na última quinta-feira, ele afirmou em entrevista ao Jornal do Brasil que nunca fez nenhum depósito a favor de parlamentar paraense, de quem se diz amigo.
Os dólares de Borges foram enviados a Liechtenstein por meio de uma sofisticada operação. Um doleiro de Foz de Iguaçu (PR) recebeu o dinheiro enviado pelo empresário. Ele usou uma conta CC-5 do Banco Nacional, extinto em novembro de 1995, para transferir a quantia a outro doleiro do Uruguai. De lá, o dinheiro foi repassado para outro doleiro no Paraguai, de onde foi remetido para a conta de Jader em Liechtenstein. ''O esquema foi montado de forma a não deixar rastros'', diz um graduado funcionário da Procuradoria Geral da República envolvido com as investigações do caso Sudam.
A confirmação da remessa dos dólares poderá levar Jader a responder a um processo o crime de lavagem de dinheiro. No caso do depósito de R$ 400 mil, caberia uma denúncia por sonegação fiscal, já que esse dinheiro não teria sido declarado ao Imposto de Renda.
Borges foi sócio da mulher do senador, Márcia Zahluth Centeno, no período de 1996 a 1998, em uma fazenda no nordeste do Pará. ''Eu a conhecia e a coloquei como minha sócia porque queria alguém que representasse a empresa no Pará'', disse Borges, referindo-se à Agropecuária Campo Maior.
Outra descoberta importante do Ministério Público sobre as fraudes na Sudam refere-se a uma emissão de US$ 800 mil para o exterior por empresários ligados ao senador que montaram projetos fraudulentos em Tocantins. Envolvia dinheiro liberado pela Sudam para a implantação dos projetos.
Mesa decide a sorte do senador
BRASÍLIA - A mesa diretora do Senado recebe hoje o pedido do Conselho de Ética para abertura do processo de cassação do senador Jader Barbalho (PMDB-PA). À noite, está marcada uma reunião para escolher o relator do processo e os favoritos são Carlos Wilson (PTB-PE) e Antônio Carlos Valadares (PSB-SE). Mas o escolhido pode ter pouco trabalho. No Senado, ninguém duvida que Jader vai renunciar antes de que o processo seja aberto. Ele tem 15 dias de prazo para renunciar e garantir a manutenção de seus direitos políticos. Amigos do senador avaliam que ele pode tomar a decisão bem antes disso. Talvez amanhã.
Aos poucos, Jader vai perdendo todas as alternativas para escapar ao processo que, se levado até o final, levaria à sua cassação. Na semana passada, ele foi derrotado em duas votações para paralisar o caso. Primeiro, na Comissão de Constituição e Justiça e depois no Conselho de Ética. Nos dois casos, contou apenas com os votos do seu partido, o PMDB. Sua última esperança está depositada em uma perícia da Justiça nos documentos do Banpará, o Banco do Estado do Pará. Jader espera que a perícia conclua que é impossível provar que ele se beneficiou do dinheiro desviado do banco estadual.
O problema para Jader é o calendário. Os peritos ainda não foram nem designados pela Justiça. É impossível que ele terminem o trabalho antes de 15 dias, prazo máximo em que a Mesa do Senado abrirá o processo contra ele. Para ganhar tempo, ele voltou a apelar para o Supremo Tribunal Federal (STF), que já lhe impingiu uma derrota na semana passada. Ele pediu que o processo contra ele seja paralisado até a conclusão da perícia. A decisão do Supremo deve sair hoje, mas a tendência é que o pedido seja rejeitado. O STF não costuma interferir no andamento de questões internas do Congresso.
Sem o apoio da Justiça e isolado no Congresso, a única alternativa para Jader é a renúncia. A certeza de que ele abrirá mão de seu mandato é tão grande que o presidente do Senado, Ramez Tebet (PMDB/MS) pretende ter uma conversa com Jader antes de designar o relator para o caso. Se o senador paraense confirmar a intenção de deixar o Congresso, Tebet pode retardar a nomeação. Assim, esperaria por Jader e evitaria mais constrangimentos ao Senado. Há dúvidas sobre quem substituiria Jader no Senado, pois seus dois suplentes - seu pai Laércio Barbalho e seu ex-secretário Fernando de Castro Ribeiro - já demonstraram disposição de não assumir.
Caso Jader adie a renúncia, o caso segue na Mesa Diretora. O relator designado tem prazo máximo de sete dias úteis para apresentar seu parecer. Depois, os outros integrantes da Mesa contam com oito dias úteis para votar. Se todos os prazo forem seguidos ao extremo, a votação aconteceria no dia 24 de outubro. Depois deste prazo, o processo de cassação seria aberto e Jader perderia a possibilidade de renunciar. Jader passou o fim de semana no Pará onde, na sexta-feira, deu uma demonstração pública de prestígio ao participar de um ato público de filiação de seu ex-aliado, depois adversário e agora novamente correligionário, Hélio Gueiros, em Santarém. No encontro, aventou-se a possibilidade de Jader ser candidato a mais um mandato de governador do Pará. Neste caso, Gueiros tentaria uma vaga no Senado Federal.
PSB quer antecipar escolha de candidato
O PSB quer encurtar para ainda este mês o prazo para escolha de seu candidato à sucessão do governador Anthony Garotinho (PSB). O que torna cada vez mais oficial a candidatura do governador à presidência da República. Quem afirma é o presidente regional do partido, o deputado Alexandre Cardoso. Com isso, Garotinho teria mais tempo de associar sua imagem ao candidato até abril. O partido acredita que assim aumentam as chances de fazer o seu sucessor.
''Conversei com o governador em termos de antecipar o nome. Dá mais tempo para transferir a imagem de sucesso do governo a este nome. O que pode acontecer em outubro ou início de novembro'', disse ontem Cardoso, após participar da convenção municipal dos socialistas no Rio. Desta forma, se a candidatura escolhida não decolar até abril, o partido poderia mudar o nome até a convenção em junho.
Para Cardoso, a pré-candidatura de Garotinho à presidência da República não tem mais volta. Os socialistas têm quatro pré-candidatos: Fernando Lopes (Secretário estadual de Fazenda), Tito Ryff (Desenvolvimento Econômico), o deputado federal Paulo Baltazar e o estadual, Noel de Carvalho. Hoje, o nome mais cotado é o de Lopes, que já conta com a preferência do presidente regional. ''O meu candidato é o Fernando Lopes'', afirmou Alexandre Cardoso. Lopes desconversou: ''Fico satisfeito, mas os critérios para a escolha ainda não foram estabelecidos.''
Tratado - Garotinho, que também esteve na convenção, disse que os partidos que compõem o governo terão que assinar uma carta de intenções, na qual se comprometem a formar uma frente - batizada de ''O Rio não pode parar'' - que decidirá quem será o candidato à sucessão estadual. ''Sendo eu candidato à presidência, algum partido pode mudar de idéia e isso pode criar problemas'', disse Garotinho numa referência ao PMDB, que cogita lançar o presidente da Assembléia Legislativa, Sérgio Cabral Filho, candidato ao Palácio Guanabara. O governador quer evitar uma briga de foice entre os partidos da base, quando Garotinho deixar o governo no início de abril - data limite para se desligar do cargo e concorrer à presidência. ''Ninguém é ou deixa de ser candidato. Vou propor que todos assinem a carta. Quem não quiser deve deixar o governo'', disse o governador, que participou ontem da convenção municipal dos socialistas no Rio. Ainda ontem, o prefeito de Duque de Caxias, José Camilo Zito dos Santos (PSDB), admitiu sua pré-candidatura ao governo do estado.
FH diz que apóia o ataque dos EUA
Presidente, em viagem ao Equador, afirma que defende politicamente, mas não militarmente, a ação contra o terrorismo
QUITO - O presidente Fernando Henrique Cardoso reiterou ontem, ao iniciar sua visita ao Equador, que o Brasil vai apoiar um eventual ataque dos Estados Unidos ao Afeganistão, mas não de forma militar, e sim numa política contra o terrorismo na América do Sul. O presidente afirmou que o Afeganistão foi ocupado por um grupo que apóia o terrorismo e esta é uma questão diferente.
''O Estado perde a base moral de ser o representante de um conjunto civilizado de nações'', explicou. ''Houve uma decisão das Nações Unidas que valida uma reação contra o terrorismo'', acrescentou.
Nos dois dias em que estará no país, o presidente assinará acordos de cooperação técnica, cientifíca e tecnológica.
Durante a visita, Fernando Henrique anunciará doação de aproximadamente 1.300 quilos de medicamentos, entre remédios contra malária, antibióticos, vacinas anti-rábica canina, soro antiofídico. Também será assinado protocolo de intenções na área de Defesa Civil. Na área de Ciência e Tecnologia, o Equador que recebe recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), tem interesse em manter intercâmbio com instituições brasileiras para ações conjuntas na área de Saúde, Engenharia, processos industriais, tecnologias de informação e comunicação, ciências agropecuárias e biotecnologia.
Ontem à noite, Fernando Henrique, que viajou acompanhado da primeira-dama Ruth Cardoso e do ministro das Relações Exteriores, Celso Lafer, ofereceu um jantar ao presidente do Equador, Gustavo Noboa, na residência oficial da representação brasileira em Quito. Hoje, Fernando Henrique receberá o título de Hóspede Ilustre e a chave da cidade na sede na municipalidade de Quito. Também participará de almoço oferecido pelo presidente Gustavo Noboa, no Salão dos Banquetes, no Palácio de Carondelet, residência oficial do presidente equatoriano. As homenagens não param por aí. Na capital equatoriana, Fernando Henrique receberá da Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais o título de Doutor Honoris Causa, em reconhecimento a sua trajetória política. Amanhã de manhã, ele retorna ao Brasil.
Mais do que uma cortesia, o presidente visitará um mercado brasileiro em crescimento na América do Sul. No ano passado, o Brasil exportou US$ 133 milhões em bens ao Equador e importou US$ 18 milhões. Em relação a 1999, as exportações brasileiras cresceram 30,6%, enquanto as importações caíram 2,7%. Nesse ano, o superávit comercial do Brasil com o Equador foi de US$ 115 milhões. Só perdeu para os resultado positivos entre o Brasil com a Colômbia (US$ 228 milhões) e com a Venezuela (US$ 127 milhões).
Segundo o Itamaraty, um componente importante comercial entre o Brasil e o Equador refere-se às exportações de serviços brasileiros, que em anos recentes superaram as a de bens. As principais empresas nacionais que atuam no Equador são as construtora Norberto Odebrecht, Andrade Gutierrez e Mendes Júnior'', que participam de projetos na área de infra-estrutura naquele país.
Lula compara PT com o campeão Shumacher
Antes de embarcar para a França, onde terá um encontro amanhã com o primeiro ministro Lionel Jospin, o presidente de honra do PT comparou sua candidatura à presidência da República ao campeão mundial de Fórmula-1, Michael Shumacher. ''O PT está como Schumacher, em primeiro lugar há muito tempo'', disse, referindo-se às pesquisas eleitorais que o colocam em primeiro lugar, com 31,1% dos votos.
Lula considera que o jogo eleitoral só começa efetivamente em março do ano que vem, mas mesmo assim, o petista não fez questão de esconder o otimismo: ''Estamos em posição muito confortável'', afirmou.
Ao iniciar seu périplo pelo exterior, Lula deu as pistas de como será a política externa de um possível governo seu. ''Temos uma classe dirigente que pensa que tem que ficar sorrindo para o exterior. O Brasil não tem noção de sua importância a nível mundial'', disse Lula.
Em sua viagem, Lula vai tentar fortalecer o Fórum Social Mundial, que será realizado no início do ano que vem, apoiado pelo PT, e que pretende ser um aglutinador dos movimentos antiglobalização.
Lula diz que em sua viagem à Eruopa vai conversar com os ''aliados históricos'' da esquerda. Depois de encontrar-se com Jospin, na França, tem audiências marcadas com o português Antonio Guterres, o chanceler italiano, Renato Ruggiero, e o ex-primeiro ministro italiano Massimo DAlema.
Presidenciáveis são contra um ataque
Oposicionistas e candidatos vinculados ao governo acreditam que os EUA nãodevem retaliar
BRASÍLIA - Os candidatos à sucessão do presidente Fernando Henrique não apoiam um ataque generalizado dos Estados Unidos ao Afeganistão, como retaliação aos atentados terroristas de setembro. Embora endossem o combate ao terrorismo, os presidenciáveis são contra atos de vingança. A postura cautelosa une oposicionistas e candidatos vinculados ao governo.
O petista Luiz Inácio Lula da Silva defende investigações aprofundadas sobre a autoria dos atentados antes do uso da força. ''Penso que esse combate deve acontecer a partir de conclusões comprovadas sobre os fatos; dentro das leis e dos acordos internacionais''. Ele alerta para o risco da inversão dos papéis entre governos e terroristas:''Os Estados não podem confundir suas ações e métodos com os dos terroristas. É preciso deixar claro que os povos querem paz e não a guerra e que ninguém em sã consciência é obrigado a aderir à barbárie''.
Lula critica a reação do governo brasileiro ao ultimato do presidente George W. Bush, de que quem não estiver com os Estados Unidos estará como o terrorismo. Para ele o governo do Brasil ''não tem que respaldar ou fazer alinhamento automático com ações que não sabe quais são''.
Já o ministro da Saúde, José Serra, disse que não concorda com vingança contra nações que abriguem terroristas. ''Ele (Bush) disse que os americanos só querem justiça. Quando fazem justiça nós estamos do lado deles'', afirmou Serra.
O senador Pedro Simon (PMDB-RS) concorda com a tese do não alinhamento incondicional ao presidente norte-americano George W. Bush em sua batalha internacional para vencer o terrorismo. ''Não podemos dar a ele um voto em branco. É preciso analisar caso a caso'', opina.
Segundo Simon, os países têm de se unir para combater o terrorimso, mas com medidas avaliadas pela Organização das Nações Unidas (ONU). Simon jura que se fosse presidente da República protestaria em todas as situações de excesso, com diplomacia. A governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), diz que está na torcida para que não haja guerra. ''Como católica, estou rezando pela paz e espero que a diplomacia do mundo inteiro faça por todos os meios o restabelecimento do clima de paz'', prega.
Para Enéas Carneiro, potencial candidato à presidência da República pelo Prona, George W. Bush está equivocado em seu ultimato ao mundo. ''Providências e medidas contra o terrorismo não implicam, sob nenhuma hipótese, a declaração de guerra ou, pior ainda, a invasão a um país soberano'', afirma. ''Uma coisa é sermos todos contrários a atividade terrorista, outra coisa, muito diferente, é nos atrelarmos a uma política beligerante, de dimensões e conseqüências imprevisíveis, que pode, inclusive, levar-nos à terceira guerra mundial'', avalia.
O senador petista Eduardo Suplicy (SP) assegura que, como presidente, não se aliaria ao Estados Unidos. ''Seria solidário com as vítimas da tragédia, mas teria uma conversa franca com o governo americano dizendo que nenhuma ação de guerra seria referendada pelo governo brasileiro'', afirma Suplicy.
Paulo Renato Souza, ministro da Educação e pré-candidato pelo PSDB, se diz contra a retaliação ao povo afegão. ''O terrorismo é insuportável e precisa ser combatido, mas sou contra a guerra de retaliação. Torço para que os Estados Unidos resistam à pressão para uma reação deste tipo''.
A assessoria do candidato do PPS, Ciro Gomes, disse que ele não daria entrevista sobre o assunto. O governador mineiro Itamar Franco, que disputa a indicação pelo PMDB, está em viagem pela Europa e não foi localizado.
Artigos
Um consenso com a sociedade
Lúcio Alcântara
O receituário do Consenso de Washington pretendia remodelar os Estados nacionais dos países em desenvolvimento, com maior participação da ''mão invisível'' do mercado em setores produtivos até então sob propriedade pública, permitindo, pelo menos em tese, o direcionamento das forças desses Estados às suas ''tarefas clássicas''. A prioridade máxima seria o controle da inflação que, articulado ao conjunto de medidas modernizadoras, garantiria maior competitividade e taxas mais elevadas de crescimento.
As recomendações revelaram-se limitadas. A ameaça de instabilidade persiste. O controle da inflação é mantido a custos sociais insustentáveis. A experiência não legou um processo distributivo consistente, já que a ênfase do Consenso estava focada exclusivamente no ajuste e no crescimento.
Nesse quadro, surge o Dissenso de Washington, uma comissão que, ao contrário do que se poderia imaginar, não é uma iniciativa de nacionalistas tradicionais, mas de atualizadas lideranças da América Latina, técnicos do FMI, assessores do Banco Mundial e que soma a experiência direta de governantes à observação sistêmica de especialistas vinculados às fontes inspiradoras do Consenso para propor uma ousada revisão, com especial atenção aos aspectos de eqüidade social.
O Dissenso recomenda, inicialmente, maior regulamentação da disciplina fiscal, pois são sempre os mais pobres que pagam a conta quando os governos gastam mais do que arrecadam. Prevê ainda mecanismos que garantam maior previsibilidade aos ciclos econômicos, com menor variação nas taxas anuais de crescimento. Nos períodos de expansão, os pobres se beneficiam menos, com vantagem para quem possui ativos reais e financeiros, mas são os primeiros a perder postos de trabalho com a recessão.
Outro aspecto apontado é a necessidade de criar redes de proteção social e cita-se o programa Bolsa-escola, no Brasil, como um exemplo a ser perseguido. A Educação é uma referência central nas recomendações do Dissenso, com ênfase na autonomia, programas pré-escolares e acesso aos recursos digitais. Estudos do BID estimam que o aumento em um ano na escolaridade média da força de trabalho seria capaz de produzir um crescimento econômico de um ponto percentual por ano.
Na questão tributária, a comissão defende um sistema que privilegie os impostos progressivos, como o de renda para pessoa física, desonerando as faixas sociais mais pobres. Isso se justifica, quando observamos que a média de arrecadação da América Latina é de 18% do PIB, contra 30 a 50% dos países avançados.
O Dissenso sugere a ampliação do crédito e a desburocratização dos procedimentos para pequenas empresas, que criam cerca de 70% dos novos empregos nos países em desenvolvimento. Por outro lado, reclama garantias sociais para compensar a desregulamentação das regras trabalhistas.
Ao propor mais ênfase na ampliação do crédito e eliminação de impostos para o mercado de terras, o estudo lembra que 60% dos pobres do continente vivem em áreas rurais, mas o que produzem participa em apenas 8% do PIB.
Por fim, orienta os serviços públicos para uma efetiva proteção aos direitos do consumidor, combatendo monopólios e garantindo oferta de serviços nas áreas de baixa renda.
O relatório da comissão conclui reclamando aos países ricos um compromisso com o desenvolvimento das nações periféricas, propondo a redução de políticas protecionistas, uma reivindicação permanente abaixo da linha do Equador.
Os resultados ali apresentados indicam uma reação independente e equilibrada às tentativas insuficientes de impor às nações regras uniformes, regulares e pretensamente permanentes. Apenas procedimentos internacionais cooperativos e processos internos abertos e participativos podem dar bom curso a um projeto sustentável de desenvolvimento para a região.
É isto o que propõe o Dissenso: um consenso com a sociedade.
Lúcio Alcântara, senador (PSDB-CE), é presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado
Love me or leave me
J. Roberto Whitaker Penteado
Nos anos 60, morei três anos em Nova York, quando o Empire State ainda era o maior edifício do mundo e - acredite - o WTC não existia nem como projeto. Nem eram muitos os brasileiros por lá. Trabalhava, como estagiário, na J. Walter Thompson, uma agência de propaganda em Midtown. No 11° andar havia as salas dos executivos de conta, que eram pessoas importantes e tinham altos salários. Um deles - que cuidava da Northeastern Airlines - tinha o hábito de chamar-me para compartilhar um café e falar de política. Fazia-me muitas perguntas, mas a principal era: ''Por que os outros não gostam de nós?''
Eu, que gostava dele e de muitos outros norte-americanos, tentava explicar, pela ótica dos meus 18 anos e muitas simpatias por Cuba, que acabara de fazer sua Revolução: ''É que vocês, sob o pretexto do anticomunismo, apóiam governos de ditadores e tiranos, pelo mundo, que maltratam, torturam e matam os seus povos''.
''Mas - retrucava - como é que nós vamos cuidar do mundo inteiro? Temos os nossos problemas, nossas prioridades.''
Tentando ter a sua visão, da Avenida Lexington - e da casa, em New Haven, onde morava com a mulher loura e três filhos -, tinha de reconhecer que era difícil a minha tarefa.
Passadas quatro décadas, pude assistir à mesma perplexidade dos jornalistas da CNN, entrevistando, a distância, gente de pele escura, na América Latina e no Oriente - e mesmo um francês rosado, em Paris - que lhes dizia substancialmente as mesmas coisas. Não conseguiam entender: ''Why people hate us?''
Tanto os jornalistas - apesar de suas responsabilidades específicas - como o executivo fazem parte de um estrato superior do que podemos considerar como o ''povo'' americano. Já era difícil, para eles, aceitar que fossem odiados - e, sobretudo agora, entender por que.
Exausto da guerra de imagens, minha mulher e eu colocamos um vídeo na TV: uma história baseada no romance de 1814 da inglesa Jane Austen, Mansfield Park. O filme é recente e se passa na mansão de uma família nobre e abonada..
Ninguém trabalha - a não ser a criadagem - e parte do enredo lida com o fato de que as rendas da família provêm de uma plantação de açúcar nas Antilhas, operada por escravos.
Uma coisa que assusta, na releitura da longuíssima história da escravidão no mundo - ocidental e oriental - é a naturalidade com que a instituição quase sempre foi aceita, desde os tempos de Aristóteles, passando pelos domínios das religiões cristãs e chegando ao iluminismo. As idéias de liberdade individual e de direitos do homem são recentes; estão, ainda, na infância. Na sua origem, os escravos eram estrangeiros, capturados nas batalhas - essas, em geral, movidas por motivos de expansão territorial e formação de impérios.
Desde sempre, os povos imperiais viveram da mais-valia de outros povos. Não há exceções. Fossem como escravos presenciais ou como populações inteiras forçadas a produzir para seus tiranos locais e os dominadores distantes. A revolta era quase sempre contida - e o terrorismo puramente local. As populações dos impérios gozavam de ''paz'' e ''prosperidade''.
Minha caixa de correspondência, na internet, tem andado cheia de explicações para os dias de terror e compunção que estamos todos vivendo. Há, contudo, uma clivagem clara entre os artigos, cartas e documentos escritos por afegãos, muçulmanos, latinos, outros orientais e europeus e os textos produzidos nos EUA - com minúsculas exceções de um ou outro estudioso. Para nós, do lado de fora, mesmo os que simpatizamos com a dor da perda humana - e que considerávamos a Ilha de Manhattan como um pouco nossa - houve um ato de vingança, que se consubstanciou nas explosões de 11 de setembro, resultado de ódios antigos e mortais, direta ou indiretamente criados pela afluência econômica do único Império remanescente do século passado. Para eles, contudo, houve violência incontida e inesperada, o medo e a dor. Seguidos pela descoberta, por parte da maioria, de que são amados e odiados, como nação e como povo. Talvez bem mais odiados do que amados.
Será que dá para entender? Será que dá para nós entendermos o que tantos deles estão sentindo e pensando?
Colunistas
COISAS DA POLÍTICA – DORA KRAMER
A falta que o vice não faz
Está passando da hora de se imprimir um pouco mais de seriedade e senso de realidade ao debate sucessório no que tange à discussão sobre a disputa da vaga de candidato a vice-presidente. Se não, vejamos: quantos votos mesmo Marco Maciel deu a Fernando Henrique Cardoso e que grande contribuição o cargo de vice deu à carreira política de Marco Maciel? FH ainda se beneficiou da estrutura do PFL, mas Maciel sofreu forte subtração eleitoral.
Está como o Nestor para quem, na canção, pede-se a Antonico que lhe preste socorro: em grandes dificuldades. Deve por isso, abster-se de disputar votos em Pernambuco para ocupar provavelmente uma vaga no Supremo Tribunal Federal. O que não desabona em nada Marco Maciel, ao contrário, foi e é o vice dos sonhos de qualquer presidente: fiel, discreto sem deixar de ser atuante. Mas no bastidor.
E aí é que reside a impossibilidade real de permanecermos presos ao raciocínio de que figuras como Roseana Sarney ou Jarbas Vasconcellos possam ambicionar para os próximos oito anos (para argumentar com a hipótese permitida por lei) a condição de sombra.
Os partidos, PMDB e PFL, obviamente querem o cargo. Como também é óbvio que alianças rendem ganhos eleitorais. É bastante provável que o partido parceiro de chapa agregue votos ao titular. Mas isso não guarda, necessariamente, relação com o nome de quem é escalado para a missão.
Por mais que seja robusta uma chapa de dois grandes nomes, essa robustez, além de nem sempre ser eficaz (a parceria Lula-Brizola comprova a tese), tem prazo de validade. Que se expira no dia mesmo da posse. O eleitor não vota em vice, vota no presidente. Isso é um fato. E o vice, pela própria natureza da função, tem a obrigação constitucional e pessoal de aparecer o menos possível e atuar, de público, apenas quando se apresente uma necessidade específica.
Ora, seria absurdo imaginar que dois partidos como o PFL e o PMDB, que estão necessitando de novas referências de imagem junto à sociedade, admitissem jogar exatamente as duas melhores figuras de que dispõem num cargo que se exerce quase às escondidas.
Tanto Roseana Sarney, para o PFL, quanto Jarbas Vasconcellos, para o PMDB, só funcionam se tiverem exposição máxima. E, para isso, ou precisariam ser candidatos à presidência ou se eleger senadores para, daquela tribuna, ajudarem a conduzir os processos de reconstrução interna, depois que a briga de Antonio Carlos Magalhães e Jader Barbalho os levou ao desgaste total.
Não é por outro motivo que ambos insistem em dizer que não estão dispostos ao papel de coadjuvantes. Não se trata de arrogância de nenhum dos dois, mas de consciência do papel que representam e ainda podem representar para suas respectivas legendas.
Da mesma forma, para os partidos é mais negócio preservar suas jóias da coroa e escolher alguém que some o valor específico que se espera de um vice - também não pode ser qualquer um que tenha má figura e se transforme numa arma para o adversário, tirando o foco de cima do candidato principal.
Em resumo, principalmente nessa eleição, nenhum partido poderá desperdiçar os quadros de boa aceitação popular. Considerando que esse tipo de pedra preciosa anda em falta no mercado da política, para ocupar a vaga do vice, a munição nem precisa ser de prata. Embora não possa também se constituir numa bala de festim.
Última forma
O presidente do Senado, Ramez Tebet, estava de conversa marcada para este fim de semana com Jader Barbalho. Vencidos os constrangimentos do cargo, se Tebet disser a Jader o que só anda dizendo oficialmente ao travesseiro, é possível que o senador paraense nem espere mesmo o prazo regimental de 15 dias para renunciar ao mandato.
Nesse tempo, a Mesa diretora do Senado dirá se concorda ou não com a abertura de processo no Conselho de Ética.
Ramez Tebet faz uma conta simples, levando em consideração a composição partidária da Mesa. Ele é o único do PMDB e, ainda assim, só vota em caso de empate. Considerando que apenas o partido de Jader lhe tem conferido votos favoráveis e todos os outros lhe fazem oposição, o resultado da decisão da Mesa é mais óbvio que o produto da soma de dois mais dois.
Começar de novo
O PMDB, na realidade, está louco para que Jader Barbalho renuncie o mais rápido possível. É que, na avaliação do partido, o Senado só se pacifica com a saída do personagem da guerra que sobrou depois da renúncia de Antonio Carlos Magalhães.
Esquecem-se, porém, de que ambos contam voltar ao campo de batalha pelo voto no ano que vem. E se o eleitor - cujos valores regionais nem sempre acompanham os critérios nacionais - deixar, vai começar tudo de novo.
A oposição, que tanto se regozija com a confusão na base governista, não deve perder de vista que, em 2002, se vencer a eleição presidencial, poderá ser a próxima vítima.
Editorial
Tarefas Urgentes
Tudo indicava que 2001 seria um ano de prosperidade e bem-aventurança para economia brasileira. Até fevereiro, as previsões apontavam para crescimento do PIB superior a 3,5%, talvez acima de 4%. Este era o resultado do que o governo plantou nos últimos anos em termos de reformas e responsabilidade fiscal. Havia unanimidade entre os economistas: desenhava-se à frente do país um círculo virtuoso de desenvolvimento. Àquela altura, nem o mais pessimistas dos políticos da oposição seria criativo o bastante para prever a conjunção de eventos funestos que rapidamente se abateram sobre a economia.
O impensável aconteceu. O desaquecimento da economia dos Estados Unidos mostrou-se pior do que a encomenda, a Argentina acelerou o passo rumo à moratória, o Congresso brasileiro deixou-se paralisar por casos de falta de decoro e corrupção, a crise de energia surpreendeu e ganhou a forma de racionamento, e, por último, aviões de passageiros foram usados como bombas em ataques a Nova York e Washington, no maior ataque terrorista da história. O resultado não poderia outro. Foi adiada a promessa de abundância.
Os sinais mudaram e o Brasil tem de se preparar para tempos de escassez. Porém, lembrou bem o presidente da Associação Brasileira de Bancos Internacionais, Alcides Amaral, em artigo no JB, a sociedade não pode se render ao catastrofismo, às versões segundo as quais o Brasil é a bola da vez e está destinado ao fracasso. Não é verdade. Sim, os atentados agravaram os problemas, à medida que levaram os investidores a adotar posições defensivas e a concentrar suas aplicações nos países desenvolvidos. Com a retração no fluxo de capitais, países emergentes terão maior dificuldades para honrar compromissos externos. Todo mundo sabe que o cenário internacional não é o mesmo depois de 11 de setembro. Mas a vida continua.
O Brasil acumulou reservas na segunda metade dos anos 90. Avançou com o programa de privatização, a reforma da Previdência e seguidos superávits fiscais. Fez a lição de casa e muito bem. E, com isso, conseguiu resistir a um rosário de crises, desde a do México até a mais recente, na Argentina. Mas ainda há muito que fazer. O que leva à conclusão de que só existe uma maneira de resistir aos cataclismos: o reforço dos fundamentos da economia. Em resposta aos eventos adversas, o presidente Fernando Henrique tem que radicalizar a agenda de reformas que serviu de base para sua reeleição. Quanto mais o governo aprofundar a privatização e o redesenho do Estado melhor para o Brasil. Menos vulnerável ficará às crises.
A hora não é de retórica vazia e discursos pessimistas que levam à paralisia. Ao contrário. O governo Fernando Henrique deve se inspirar no exemplo dos Estados Unidos e da Europa e buscar medidas que reanimem a atividade econômica. Se não for possível liberar recursos e cortar impostos como está fazendo o presidente Bush, que sejam estudadas alternativas compatíveis coma realidade brasileira. Uma coisa é certa: o Brasil tem de acompanhar o passo da comunidade financeira internacional, para não ficar em situação de desigualdade.
Existem tarefas concretas e urgentes a serem executadas. Uma delas é a implementação do esforço exportador. À falta de capitais externos para cobrir as necessidades do balanço de pagamentos, a solução é aumentar ao máximo o volume de exportações. Não é impossível obter um superávit de US$ 5 bilhões na balança comercial no ano que vem. Mas, para chegar lá, os mecanismos de crédito e compensação dos bancos devem ser agilizados imediatamente. Exportar é preciso. E quem fala de rever o projeto de abertura da economia brasileira, por considerá-la excessiva, é ruim da cabeça ou doente do pé.
Topo da página
10/01/2001
Dirigente do Flamengo diz que clube tinha R$ 908 mil em 1998 em paraíso fiscal
SUPLICY NÃO ACREDITA NA EXISTÊNCIA DE CONTA EM PARAÍSO FISCAL
Antonio Dunshee de Abranches nega que Flamengo tenha conta em paraíso fiscal
Tereza Grossi diz que ex-funcionário do BC tinha conta no FonteCindam
JADER BARBALHO DIZ QUE O PRESIDENTE DO SENADO TINHA O DIREITO DE REAGIR
Paraíso fiscal é 2º investidor no País
10/01/2001
Artigos Relacionados
Dirigente do Flamengo diz que clube tinha R$ 908 mil em 1998 em paraíso fiscal
SUPLICY NÃO ACREDITA NA EXISTÊNCIA DE CONTA EM PARAÍSO FISCAL
Antonio Dunshee de Abranches nega que Flamengo tenha conta em paraíso fiscal
Tereza Grossi diz que ex-funcionário do BC tinha conta no FonteCindam
JADER BARBALHO DIZ QUE O PRESIDENTE DO SENADO TINHA O DIREITO DE REAGIR
Paraíso fiscal é 2º investidor no País