Leia a íntegra da representação do PSOL contra o senador Gim Argello



Excelentíssimo Senhor Presidente da mesa diretora do senado federal - Brasília-DF.

O Partido Socialismo e Liberdade - PSOL, partido político de direito privado devidamente registrado no TSE, com sede em Brasília-DF e com representação e liderança no Congresso Nacional, por sua respectiva Presidente Nacional abaixo subscrita, vem diante de Vossa Excelência, com fundamento no art. 55, II e § 2º, da Constituição Federal e do art. 13 e seguintes do Código de Ética e Decoro Parlamentar - Resolução do Senado nº 20, de 1993, ofertar a presente

REPRESENTAÇÃO PARA VERIFICAÇÃO DA

QUEBRA DE DECORO PARLAMENTAR

em face do Senhor Senador Jorge Afonso Argello, brasileiro, senador da República pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB-DF), pelas razões de fato e de direito adiante expostas:

Preliminar de Admissibilidade da Representação

Não se trata a hipótese versada na presente Representação de um simples fato político já julgado pela vontade popular, mas sim de parlamentar que teve comprovado envolvimento e denúncias gravíssimas em esquemas milionários de corrupção, em tese maculando a imagem do Parlamento Brasileiro e contrariando a vontade popular. São fatos ilícitos e com potencialidade de ferir o decoro parlamentar as acusações que recaem sobre o Representado de irregular uso de dinheiro público, lesão ao erário, enriquecimento ilícito e demais condutas praticadas sob o "manto" da imunidade Parlamentar.

Em 1995, o líder do Partido dos Trabalhadores - PT, juntamente com representante do Partido Social Democrático Brasileiro - PSDB encaminhou ofício à Comissão Diretora do Senado Federal solicitando providências a respeito de atividades ilícitas atribuídas ao ex-senador Ernandes Amorim, sobre suposto envolvimento em delitos citados pela CPI do narcotráfico, por práticas anteriores ao início de seu mandato. Em substância, a consulta solicitava que a Comissão se manifestasse "sobre os procedimentos a serem adotados". No caso em apreço, os dois ofícios são claros quanto a seu alcance: a preservação do Senado - a recuperação da confiança do povo - PSDB, ou a manutenção do decoro - PT, com pedido de "providências", ou "providências cabíveis".

Apesar das supostas condutas terem sido praticadas anteriormente ao mandato, acerca da consulta manifestou-se o ex-senador Josaphat Marinho, que: "embora os fatos supostamente ocorridos antes do exercício do mandato, vinculam-se à imagem do Representante" e que "fica afastada, pela lógica e pela ética, a alegação, que poderia ser levantada, de se tratar de supostos acontecimentos anteriores e estranhos ao mandato e as ações que concernem ao decoro parlamentar e à previsão de perda do mandato devem ser, em tese, contemporâneas ao exercício da função. Não há que se negar ainda, porém, que atos e fatos passados, sobretudo se recentes, a depender de sua natureza e circunstâncias, podem projetar-se no tempo e alcançar e pertubar o procedimento do parlamentar".

Em cenário parecido, falta de decoro por práticas anteriores ao exercício de mandato parlamentar, o ex-Deputado Federal Pedro Talvane Luís Gana de Albuquerque Neto impetrou o Mandado de Segurança nº 23.388 no Supremo Tribunal Federal, contra ato emanado da Mesa da Câmara dos Deputados, endossado pela Comissão de Constituição e Justiça e Redação, que requeria a cassação do mandato do impetrante por comportamento incompatível com o Decoro Parlamentar, solicitando: o trancamento do processo político-administrativo em face da decadência do direito de punir em decorrência da extinção do mandato legislativo em que teriam ocorridos os fatos; e, alternativamente, a improcedência do pedido de perda do mandato.

O Ministro Neri Silveira, Relator do Mandado de Segurança, decidiu que "nada obsta que Deputado, autor de atos atentatórios ao decoro parlamentar em determinada legislatura, possa responder a procedimento disciplinar destinado à perda de seu mandato em legislatura subseqüente, para a qual se reelegeu, isto porque o dano à imagem do corpo legislativo, de ter no seu seio autor de fato indecoroso, persiste íntegro, independente da legislatura em que foi praticado aquele ato".

Ainda, como anotado pelo Ministro-Relator em sua decisão, entender cristalizar-se o entendimento de que determinada legislatura não pode conhecer de fatos ocorridos na anterior, estar-se-ia estabelecendo período de verdadeiro "vale-tudo" nos últimos meses de todas as legislaturas.

Cabe ao Senado Federal a obrigação constitucional e regimental de zelar pela sua dignidade em consideração ao decoro, que diz respeito a decência, respeito, moral, dignidade, ética, conduta irrepreensível, confiabilidade, honorabilidade, correição, retidão moral, respeito a si mesmo e aos outros.

Em assim sendo, considerando que a manutenção da imagem do Poder Legislativo não pode se ater a critérios exclusivamente cronológicos, ligados à duração das legislaturas, pois a instituição parlamentar é permanente, tem-se também que o expurgo dos maus congressistas que maculam sua imagem, não deve se limitar à coexistência entre a prática dos atos indecorosos e o momento em que o poder censório da instituição faz operar seus efeitos.

O professor Pinto Ferreira define "falta de decoro parlamentar" como "o procedimento do congressista atentatório dos princípios da moralidade, ofensivos à dignidade do Parlamento".

Já Miguel Reale assim se expressa: "Quando a Constituição se refere a 'decoro parlamentar', entra pelos olhos que quer significar a forma de comportamento do parlamentar de conformidade com as responsabilidades das funções, perante a sociedade e o Estado. O status de Deputado, em relação ao qual deve ser medido (e será comedido ou decoroso em razão dessa medida) implica, por conseguinte, não só o respeito do parlamentar a si próprio, como ao órgão a que pertence, segundo fórmula política de Thomasius: 'Faça aos outros o que deseja que lhe façam'. No fundo, a falta de decoro parlamentar é falta de decência no comportamento pessoal, capaz de desmerecer a Casa dos Representantes, e falta de respeito à dignidade do Poder Legislativo, de modo a expô-lo a críticas infundadas, injustas e irremediáveis, de forma inconveniente."

Seguindo a verificação da possibilidade de quebra do decoro parlamentar por práticas anteriores ao início de mandato, relembramos a decisão auspiciosa e de forte conteúdo ético do Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Rio de Janeiro que negou registro a candidatos de censurável conduta.

Dando concreta aplicação e eficácia aos art. 5º, LIV e art. 14, 9º, ambos da Constituição Federal a mencionada decisão examinou a vida pregressa dos candidatos e verificou a regularidade dos deveres do homem e do cidadão.

Por seu turno, temos que a presunção de inocência (art. 5º, LVII da CF/88) impede a antecipação do juízo de culpa relativo ao delito - aqui no aspecto penal -, mas não inibe a avaliação do conceito social do que seja desfavorável ou o julgamento ético.

O Poder Judiciário na formação de sua convicção e na declaração da pena deve considerar os elementos e as provas produzidas no processo. Entretanto, por força de regras gerais de direito e de processo, são necessariamente considerados também os fatos públicos e notórios, os indícios e as presunções, os antecedentes civis e os criminais. Todos os elementos que apontem para uma eventual deficiência moral do agente público podem e devem ser levados em conta no julgamento ético-político.

A lógica de um processo de conteúdo ético na alçada política é a de averiguar a presença ou a ausência das condições morais do parlamentar para o exercício do mandato. Interessa a um justo e correto julga mento na seara ético-política, a vida pregressa do senador. Este interesse, em verdade, é indissociável de uma justa investigação e julgamento.

A vida pregressa de um parlamentar, então, deve antes garantir proteção à probidade administrativa e à moralidade no exercício do mandato. Deve garantir um governo bom, honesto, equânime, justo e decente. Um governo dos cidadãos dignos e honrados. Do contrário, podemos afirmar que as cláusulas programáticas do país restarão fortemente comprometidas.

De igual importância é o fato de que o senador Representado foi eleito juntamente com o titular Joaquim Roriz. Os atos de um membro da chapa desbordam, necessariamente no outros componentes da candidatura e a condição de suplente de senador lha dá a condição de parlamentar não empossado. O suplente de senador é um representante do povo brasileiro, eleito numa chapa e diplomado pela Justiça Eleitoral.

O TSE já resolveu que há vinculação inafastável da candidatura de senador com as candidaturas dos suplentes. Trata-se, por jurisprudência do TSE e dispositivo do art. 46, §3º da CF/88 e do 91, § 1º, do Código Eleitoral - CE, de uma só chapa, de uma só candidatura, de lista de candidatos única e indivisível, ainda que resulte a indicação de aliança de partidos.

Eis o §1º do art. 91 do Código Eleitoral:

"Art. 91. (...)

§ 1º O registro de candidatos a senador far-se-á com o do suplente partidário."

Decidindo registro de candidatura de chapa para as eleições ao Senado no RESPE 26.636-GO, entendeu o TSE que:

"(...), constatado que o Partido não apresentou substituto para a vaga de 1º Suplente de Senador, e não pode mais fazê-lo por absoluta intempestividade, criou-se óbice intransponível ao registro da Chapa, isto é, do candidato a Senador e respectivo 2º Suplente, ora em apreço."

O TRE-RJ, apreciando pedido de registro de candidatura de candidato a senador, decidiu por unanimidade:

ELEIÇÕES 2006. REGISTRO. SENADOR. ELEIÇÃO MAJORITÁRIA. IRREGULARIDADE CONSTATADA NO REGISTRO DE SUPLENTE. FALTA DE CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE NO QUE TOCA AO REQUISITO DA FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. UNICIDADE E INDIVISIBILIDADE DA CHAPA. ART. 91, §1º DO CÓDIGO ELEITORAL. REGISTRO INDEFERIDO.

No mesmo sentido temos ainda o RO-TSE 969 e RESPE 20.367, apenas para citar alguns julgados similares.

Vejamos, ainda, a disposições do art. 178 e §2º do art. 202, ambos do Código Eleitoral - CE:

Art. 178. O voto dado ao candidato a Presidente da República entender-se-á dado também a Vice-Presidente, assim como o dado aos candidatos a Governador, Senador, Deputado Federal nos Territórios, Prefeito entender-se-á dado ao respectivo vice ou suplente.

.........................

Art.202 .........................

§ 2º O Vice-Governador e o suplente de senador considerar-se-ão eleitos em virtude da eleição de Governador e do Senador com os quais se candidatarem.

Acerca da aplicação do §3º do art. 46 da Constituição Federal o Ministro Marco Aurélio, no julgamento do RE nº 128.518-4 - STF

"É de sabença geral que não cabe imprimir a texto constitucional assegurador de direitos, especialmente políticos, interpretação estrita, o que se dirá quanto à restrita. A aplicação respectiva há que se fazer tal como previsto no preceito, sendo impróprio presumir-se a ausência de esgotamento da matéria pelo legislador constitucional. O preceito do § 3º do artigo 46 em comento é explícito na disciplina que introduz".

Podemos concluir que o suplente é eleito, havendo significação política e repercussão social a condição de suplente eleito e diplomado. O suplente destaca-se da situação de ordinário cidadão, passando a condição de agente político, eleito e diplomado.

A diplomação é o ato de entrega do diploma ao candidato eleito, atestando assim sua aptidão para o exercício do mandato. Os suplentes recebem diploma no qual constam o nome do candidato, a legenda pela qual concorreu, o cargo para o qual foi eleito ou sua classificação como suplentes, ex vi do art. 261, C.E.

A diplomação legaliza, legitima e autoriza o ato da posse, inclusive para o suplente.

Desta feita, todos são diplomados na mesma data e nela inicia-se o prazo para interposição do Recurso contra a diplomação (art. 262 do CE) ou da ação de impugnação de mandato eletivo (vide art. 14, §§10 e 11, CF/88).

A diplomação serve como marco inicial do surgimento das incompatibilidades parlamentares tratadas no art. 54, I, "a" e "b" da CF e é também o marco inicial para a imunidade formal, consoante determina o art. 53, §1° da CF/88. Somente após a expedição do diploma, da diplomação, os Deputados e Senadores serão julgados pelo STF, além de tudo, o diploma garante a imunidade quanto à prisão disposta no §2° do art. 53, da CF.

A candidatura e eleição dos suplentes de senador desbordam na candidatura e eleição do senador titular, seja pelos aspectos da propaganda eleitoral, da prestação de contas, diplomação e, conseqüentemente, do próprio exercício do mandato.

Desta forma, está firmada e consolidada jurisprudência acerca do mencionado tema, tornando-se uma verdadeira lesão aos princípios constitucionais e ao Estado Democrático de Direito manter como representante do povo brasileiro e do Distrito Federal senador, eleito como suplente e que após a diplomação recaem indícios fortes e denúncias graves de prática de condutas indecorosas e lesivas ao patrimônio público, desrespeitando e tornando lesionada a imagem do Parlamento Brasileiro.

Não obstante a implicação de fatos e atos pretéritos na ética e no decoro parlamentar, para o caso particular do Representado, verifica-se que algumas de suas eventuais práticas supostamente ofensivas ao decoro foram praticadas depois de sua diplomação como senador, ou, mais precisamente, como suplente de senador.

Da Quebra de Decoro Parlamentar

As Acusações Contra o Representado

No dia 14 de junho do corrente ano foi executada a denominada "Operação Aquarela". Foi uma operação conjunta da Polícia Civil, da Receita Federal e do Ministério Público Federal do Distrito Federal e Territórios e resultou na prisão de 19 pessoas em São Paulo, Distrito Federal, Goiás e Paraná suspeitas de participarem de uma suposta quadrilha que desviava verbas públicas. Entre os presos estava Tarcísio Franklin de Moura, ex-presidente do Banco de Brasília (BRB).

Além das prisões, a polícia apreendeu 130 computadores, 95 relógios avaliados em cerca de R$ 1 milhão, US$ 200 mil em espécie, além de pedras preciosas e centenas de documentos. Duas das prisões foram em flagrante, por porte ilegal de armas.

Os suspeitos estavam sendo investigados há vários meses por crimes contra administração pública, fraude em licitação, peculato, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

O esquema revelado na "Operação Aquarela" tinha a participação de instituições financeiras, empresas e organizações não-governamentais, que, segundo a investigação, eram especializadas em lavagem de dinheiro.

Dos partícipes mencionados pela Polícia, o Sr. Tarcísio Franklin, ex-presidente do Banco de Brasília, esteve preso na "Operação Aquarela", justamente acusado em inquérito policial da prática de atos ilícitos contra a administração pública e financeira no BRB e junto à Associação Nacional de Bancos - Asbace.

Outra pessoa envolvida no caso é o Sr. Constantino Oliveira, que, por intermédio de grupo comercial e financeiro de sua família, possui relações contratuais e financeiras com o governo do Distrito Federal, recentemente chefiado pelo Representado. A família do dono do cheque sacado é proprietária de algumas das maiores empresas concessionárias de transporte público urbano em Brasília (p or exemplo é dona da Viação Pioneira e da Viação Planeta), dono de uma das maiores frotas de ônibus urbanos do país e conhecida concessionária de serviço público de transporte no Brasil. Segundo o Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários do Distrito Federal e conforme noticiado pelo jornal "Folha de São Paulo", as empresas controladas pela família do Sr. Constantino possuem cerca de 30% das concessões de exploração do transporte público no Distrito Federal.

Transcrição de conversas telefônicas e demais documentos e relatos da Polícia sugere fortemente uma combinação para fins supostamente ilícitos que envolveria o Representado, o ex-senador Joaquim Roriz, o empresário de transporte público, Sr. Nenê Constantino, o Sr. Franklin, além de outras pessoas, para o fim escuso da entrega e distribuição de mais de dois milhões de reais em dinheiro. O dinheiro teria sido sacado da conta do concessionário público Constantino de Oliveira, com cheque do Banco do Brasil descontado no BRB, banco presidido por Tarcísio Franklin, e à ser entregue ao ex-senador Roriz. É forte o indício de que o Representado, homem de reconhecidas posses, poderia ter usufruído facilidade de mobilização e auxiliado na realização do "negócio", ante sua anterior condição de presidente da Câmara Legislativa e da condição de suplente de senador.

O manuseio de alta quantia de dinheiro (mais de dois milhões de reais) por agentes públicos causa espécie, liminarmente, vez que o Representado, na sua próspera condição financeira, movimenta com facilidade somas generosas originárias de seus negócios imobiliários. Sob os envolvidos nas investigações policiais e judiciais recaem acusações da prática de crimes contra o erário, através de mecanismos não formais ou oficiais, e ainda envolvendo concessionário de serviço público. São elementos que, em conjunto, levantam a suspeita da prática de ilícitos, notadamente o de improbidade administrativa, do tráfico de influência, da corrupção e da lavagem de dinheiro.

Por definição usual, a 'lavagem de dinheiro' constitui em verdade um conjunto de operações comerciais ou financeiras visando a incorporação no patrimônio pessoal do acusado de recursos, bens e serviços que se originam ou estão ligados a atos ilícitos. São as práticas com que produtos de crime pareçam ter sido adquiridos legalmente.

A "Lavagem de Capitais" - para a Espanha blanqueo de capitales, para a França o blanchiment d'argente para os Estados Unidosmoney laundering- é, então, a denominação legal - trazida pela Lei nº 9.613, de 1998 - utilizada para um conjunto de operações, quase sempre originalmente escusas, mediante as quais os bens ou dinheiro nascidos de atividades delitivas, o "dinheiro sujo", sejam ocultados e integrados no sistema econômico ou financeiro e ao patrimônio pessoal dos criminosos, transformando-se em "dinheiro limpo" ou legitimado.

O bem jurídico tutelado pela lei de lavagem de capitais é amplo e protege o sistema financeiro, a segurança social-econômica, a moralidade e os bens jurídicos tutelados pelos crimes antecedentes.

Das circunstâncias dos fatos, das pessoas envolvidas e do modus operandi narrados, é possível ter havido, dentre outros ilícitos igualmente graves, a prática crime de lavagem de capitais, ante os indícios de ter o Representado, juntamente com outras pessoas com munus público, realizado as condutas vedadas em lei de ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação de bens, direitos ou valores provenientes de um dos crimes elencados na legislação penal e fiscal do país.

O senador Jorge Argello é apontado como intermediário da transação de R$ 2,2 milhões, considerada irregular por não ter sido declarada ao COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e um dos fatos que estimulou a renúncia do ex-senador Joaquim Roriz.

O Ministério Público do Distrito Federal e a Polícia Civil de Brasília investigam relatos de que o senador Jorge Argello teria recebido R$ 500 mil dos R$ 2,2 milhões sacados a partir do cheque repassado pelo empresário Nenê Constantino a Joaquim Roriz.

Segundo as investigações, o dinheiro teria sido entregue ao senador Argello pelo sr. Valério Neves Campos, assessor do ex-senador Joaquim Roriz, no pátio da empresa Nely Transportes, cujo dono é ligado ao ex-senador. O Representado teria sido o portador de uma parte destinada ao ex-presidente do Banco de Brasília (BRB), Tarcísio Franklin, preso na "Operação Aquarela".

A suposta entrega do dinheiro teria sido feita junto com o sr. André Campos do Amaral, ex-advogado do BRB, do deputado distrital Pedro Passos - acusado e preso na "Operação Navalha" da Polícia Federal - e atualmente advogado do sr. Tarcísio Franklin.

O Representado é acusado pela imprensa e investigado pelo Ministério Público e Polícia Civil, ainda, de participação em uma transação imobiliária suspeita durante a gestão do ex-senador e ex-governador Joaquim Roriz no Distrito Federal. Um terreno de 80 mil metros quadrados, comprado pelo empresário Wigberto Tartuce - o Vigão - de quatro fundos de pensão ligados a órgãos públicos do governo distrital, teria rendido R$ 23 milhões de lucro a Tartuce, que é ligado a Nenê Constantino.

Há a possibilidade de os mencionados R$ 2,2 milhões serem uma comissão pela venda do terreno para os participantes no negócio e flagrados na "Operação Aquarela".

Outra suspeita que recai sobre o senador Argello se refere às acusações de que o ex-senador Joaquim Roriz teria comprado uma sentença judicial para se livrar de punição por crime eleitoral no Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal. A revista "Veja", de julho de 2007, afirma que gravações mostram conversas sobre o assunto entre Joaquim Roriz e o senador Representado.

As graves denúncias, além de constituírem indícios da prática de atividades não lícitas pelo senador Representado, envolvendo órgãos e agentes públicos do Distrito Federal, práticas investigadas na "Operação Aquarela", caracterizam-se, por si somente, atitudes parlamentar que supostamente desprestigiariam o Senado e os seus membros, em flagrante prejuízo da já péssima imagem do Poder Legislativo Nacional.

Aos senadores, detentores de mandato eletivo, representantes direto do povo e dos Estados da Federação, e agentes públicos em período integral, são exigidos de modo permanente o decoro e a compostura adequada ao cargo que exercem.

Diferentemente dos demais cidadãos, ao senador é muito mais rigorosa a proibição legal de realizar atos e práticas abusivas ou contrárias à probidade, legalidade, moralidade, assim como às regras de costume e de comportamento.

A conclusão de uma completa investigação, em sede de processo disciplinar pode, ainda, vir a demonstrar abuso das prerrogativas de imunidade e abuso no exercício do mandato pelo Representado, mesmo que na condição de suplemnte diplomado de senador.

Ao Conselho de Ética e Decoro do Senado cabe, em virtude dos indícios fortes e provas em poder do Ministério Público Federal e Polícia Civil do Distrito Federal, preservar a dignidade do mandato parlamentar. Mais que uma prerrogativa, trata-se, em verdade, de um poder-dever, que conseqüentemente traz a responsabilidade institucional inafastável de investigar e eventualmente punir os senadores que tenham quebrado o decoro parlamentar.

Destarte, estão presentes os elementos de prova suficientes o bastante para justificar a abertura de processo de quebra de decoro parlamentar junto a esse Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, assim permitindo o esclarecimento dos fatos.

Da Vida Pregressa do Representado

Entende-se por vida pregressa a conjugação de ações e omissões da pessoa pública, jurídica ou física, a partir dos 21 anos, para a vida civil, 18 anos, para efeitos penais e 16 anos, para os fins e leitorais. A vida pregressa pode constar de declarações, depoimentos, escrituras, gravações, laudos periciais, registros penais, inquéritos, ações judiciais, banco de dados, fotos, arquivos, jornais, revistas, filmes, reportagens e programas de rádio e televisão.

Essas fontes relatarão se o senador cumpriu ou descumpriu seus deveres para com a família, a sociedade e o Estado. Assim, caso no exame da vida pregressa se constatar a prática de conduta inidônea que de alguma forma comprometa o bom nome e a honradez, ou que venha a ofender ou denegrir a imagem do Senado Federal, a pessoa não deveria sequer ser investida em cargo público. O direito exige administração pública orientada pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (CF, 37).

Durante o governo de Joaquim Roriz, o Representado foi presidente da Câmara Legislativa e Secretário do Trabalho.

Por sua atuação neste período responde a processos na Justiça do Distrito Federal por grilagem de terras, por superfaturamento em licitações e é suspeito de receber propina para regularização de terrenos enquanto presidia a Câmara Legislativa.

Em 2002, o senador Gim Argello foi acusado de ter recebido 300 lotes para facilitar a regularização do condomínio Alto da Boa Vista. A denúncia foi feita numa fita de vídeo pelo então secretário de Assuntos Fundiários e deputado distrital licenciado Odilon Aires, que se queixava do fato de ter ficado com "apenas" 50 lotes.

A gravação foi realizada pelo empresário Márcio Passos, que se encarregou depois de divulgar o vídeo. Márcio Passos é irmão do deputado distrital Pedro Passos, preso pela Operação Navalha e apontado como um dos principais grileiros de terras no Distrito Federal. O caso suscitou a ação popular (ação de nº 2002.01.1.034497-2), que aguarda julgamento no Tribunal de Justiça do DF.

O Ministério Público também investiga o senador por um suposto superfaturamento de contrato de informática enquanto era presidente da Câmara. Há denúncia de que teria o Representado provocado um prejuízo de R$ 1,7 milhão à Câmara Legislativa por meio de contratos públicos firmados na área de informática. O assunto também se encontra em análise no Tribunal de Contas do Distrito Federal.

O senador ex-presidente da Câmara Legislativa é réu em um total de cinco ações ou inquéritos judiciais. Suas pendências judiciais incluem um processo de execução fiscal por dívidas com a Receita Federal e outro de crime contra o sistema financeiro.

O senador teve seu nome mencionado durante a crise do mensalão, no ano de 2005. Conforme registros contábeis da SMP&B; Comunicação, do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, a agência arcou com as despesas do senador e seu sucessor na presidência da Câmara Legislativa, deputado Benício Tavares (PMDB), durante viagem que ambos fizeram a Belo Horizonte. No período de 2003 a 2005, a SMP&B; foi a agência de publicidade da Câmara Legislativa, da qual recebeu mais de R$ 10 milhões nos contratos firmados. O processo público de contratação foi iniciado pelo senador Argelloe finalizado pelo deputado distrital Benício.

Do Direito

O art. 2º do Código de Ética e Decoro Parlamentar, Resolução nº 20, de 1993, parte integrante do Regimento Interno, estipula que são deveres fundamentais do Senador, dentre outros os de:

Art. 2º São deveres fundamentais do Senador:

I - promover a defesa dos interesses populares e nacionais;

II - zelar pelo aprimoramento da ordem constitucional e legal do País, particularmente das instituições democráticas e representativas, e pelas prerrogativas do Poder Legislativo;

III - exercer o mandato com dignidade e respeito à coisa pública e à vontade popular; (...).

Por óbvio, ante a regra interna e regras de costume e de comportamento, o Representado deveria ter respeitado as normas, inclusive as usuais de conduta e de trato com concessionários e permissionários do poder público sob os quais recaem denúncias de fraudes e mal versação de dinheiro público, e, no mínimo, zelar pelo prestígio e imagem do Senado Federal (art. 48, II do Regimento Interno do Senado).

O art. 55, II e parágrafo 1º da Constituição Federal estipula que:

"Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:

II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;

§ 1º - É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas."

Já o Regimento Interno do Senado, em complemento, determina no art. 32, II que:

"Art. 32.Perde o mandato o Senador (Const., art. 55):

II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;"

Como acima exposto, as denúncias indicam que os atos do Representado podem vir a traduzir-se em abuso às regras de moralidade, probidade, boa conduta e respeitabilidade e, ainda, ferirem a imagem e o prestígio do Senado Federal.

De ressaltar-se, também, que são atos que significam abuso das prerrogativas de imunidade (art. 53, CF), vez que a inviolabilidade do parlamentar refere-se a suas opiniões, palavras e votos, respondendo ele por atitudes indecorosas.

Por fim, caracterizam-se, em tese, práticas criminosas típicas, entre as quais podemos destacar corrupção passiva (art. 317, do CP), improbidade administrativa (art. 9º, 10 e 11 da Lei 8.429, de 1992, podendo estar sujeitos às penas do art. 12 da mesma lei), formação de quadrilha (art. 288 do Código Penal), tráfico de influência (art. 332 do Código Penal) e eventuais práticas criminosas prevista na Lei nº 9.613, de 1998.

Dos Pedidos

Diante de todo o exposto, requer-se:

I - o recebimento da presente Representação pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar e a competente instauração do Processo Disciplinar, ante a suposta quebra de decoro parlamentar do Senador Jorge Afonso Argello, com a designação de relator ou nomeação de Comissão;

II - a notificação do Representado em seu Gabinete do Senado Federal, ou ainda, se necessário, por Edital, para que responda, se lhe aprouver, a presente Representação no prazo regimental;

II - sem prejuízo da defesa técnica, o depoimento pessoal do Representado ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal;

III - com fundamento nos artigos 15, IV e 19 da Resolução 20, de 1993, a solicitação, para a instrução probatória do processo disciplinar, de cópia do relatório da denominada "Operação Aquarela" da Polícia Federal;

V - requer-se que cópia do Relatório da denominada "Operação Aquarela" da Polícia Civil e demais documentos integrantes do mencionado Relatório, relativamente ao Representado, façam parte integrante das razões de pedir e fundamentos da presente Representação;

VI - requer-se oitiva de testemunhas e demais pessoas envolvidas, especialmente as seguintes:

- Sr. Constantino de Oliveira - Presidente do Conselho de Adminsitração da empresa GOL Transportes Aéreos;

- Sr. Tarcísio Franklin de Moura - ex-presidente do Banco de Brasília - BRB e do Conselho de Administração do BRB;

-Sr. Valério Neves Campos, assessor do ex-senador Joaquim Roriz;

- Sr. Fabrício Ribeiro dos Santos, major da Aeronáutica do Brasil.

VII - propugna-se pela produção de provas por todos os meios permitidos em lei, principalmente perícia contábil, formal e ideológica, dos eventuais documentos juntados aos autos e, nos termos da Lei Complementar 105, de 2001 e seus regulamentos, a transferência para o Conselho de Ética dos dados e informações bancárias do Representado, no período de 10 a 22 de março de 2007;

VIII - ao final, a procedência da presente Representação com a recomendação ao Plenário do Senado das sanções cabíveis.

Nestes termos,

pede o deferimento,

Brasília,de julho de 2007.

Heloísa helena Lima de Moraes Carvalho

Presidente do PSOL



17/07/2007

Agência Senado


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