Lula diz que Roseana pode ser "problema" para PT
Lula diz que Roseana pode ser "problema" para PT
Partido precisa saber como enfrentá-la, adverte pré-candidato, ao encerrar encontro
RECIFE - Pela primeira vez desde que a campanha eleitoral foi antecipada, Luiz Inácio Lula da Silva admitiu sua preocupação com o crescimento da governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), nas pesquisas para a Presidência. "A Roseana poderá ser um problema para nós e precisamos saber como enfrentá-la", afirmou Lula, ontem, no encerramento do 12.º Encontro Nacional do PT, em Olinda (PE). "É um dado novo no cenário político de 2002, que nós não tínhamos previsto." Lula disse ainda que, por enquanto, Roseana tem dado mais dor de cabeça ao ministro e presidenciável José Serra (PSDB). "Parece que o candidato do governo tem uma chumbada no pé: não consegue subir", provocou.
Um dia depois de ser inscrito para disputar uma prévia com o senador Eduardo Suplicy (SP), Lula disse que, de qualquer forma, o partido precisa ter "juízo, habilidade e competência" para fazer casamentos políticos com o centro e a esquerda, já que existe a possibilidade "real e concreta" de chegar ao Palácio do Planalto. "Possivelmente, não nos seja dada outra oportunidade", previu o virtual candidato.
Aclamado pela platéia como "presidente", Lula conclamou as mulheres petistas a entrarem em ação na campanha anti-Roseana. "Porque não basta ser mulher: é preciso ter compromisso com o povo pobre deste país e com as pessoas sofridas", avaliou. Para o ele, o PFL pôs Roseana na praça como "uma brincadeira", com o objetivo de indicá-la para vice na chapa do PSDB. Mas, aos poucos, o governo terá de "engolir" a candidatura dela.
Palanques - Com discurso pragmático, Lula pediu empenho do partido na busca de alianças. Falou em ganhar "corações e mentes" e pregou a necessidade de união das oposições. "Este não é o momento de fazermos experiências políticas", afirmou. Seu argumento é de que o PT precisa ser mais generoso e retomar as conversas com seus antigos aliados, com quem hoje vive às turras, como o PDT de Leonel Brizola. Além disso, Lula notou que, para o PT chegar ao poder, será fundamental ultrapassar as fronteiras da esquerda na montagem dos palanques estaduais. Tudo como manda o figurino aprovado nos três dias do encontro, que discutiu política de alianças e programa de governo.
Embora o documento final do evento não mencione o PL, a coligação com o partido do senador José Alencar (MG) - cotado para vice de Lula - pode receber sinal verde. "Precisamos abrir nossa cabeça para não ficarmos contra qualquer coisa", aconselhou o pré-candidato.
Opções - Lula disse estar disposto até mesmo a conversar com Brizola. "É preciso que alguém convença o Brizola de que a relação dele com o filho é biológica, não ideológica", comentou, numa referência a João Vicente, que trocou o PDT pelo PT. O presidenciável também defendeu a retomada do diálogo com outros políticos para os quais o PT "torce o nariz", como o ex-ministro Ciro Gomes (PPS) e os governadores do Rio, Anthony Garotinho (PSB), e de Minas, Itamar Franco (PMDB). "Dou de barato que Itamar não sai candidato porque o PMDB não quer", observou. "Se os outros partidos quiserem sentar-se à mesa conosco, estamos abertos para um debate", completou o deputado José Dirceu (SP), presidente do PT.
Depois de ter permanecido dois dias isolado, Suplicy foi chamado ontem para subir ao palco, juntamente com outras estrelas petistas, na solenidade de encerramento do encontro.
Lula e Suplicy trocaram poucas as palavras. "Eu não tenho nenhuma divergência com o Eduardo", discursou Lula. O senador sorriu: "Muito menos eu."
Petista avisa que não falará como candidato até prévia
RECIFE - O prefeito de Belém, Edmilson Rodrigues, desistiu de disputar a prévia, marcada para 3 de março, que escolherá o candidato do PT à Presidência. O anúncio foi feito ontem, ao mesmo tempo em que Luiz Inácio Lula da Silva garantia que não falará como pré-candidato até março.
Com isso, Lula confirmou que não pretende participar de debates com o senador Eduardo Suplicy (SP). "Não pensem que eu não me inscrevi na prévia por frescura ou por charminho, mas é que eu já fui candidato três vezes e, agora que vocês me inscreveram, vou deixar as coisas acontecerem."
Edmilson alegou que não teria espaço para tratar de suas propostas, bem diferentes das aprovadas no 12.º Encontro Nacional do PT, em Olinda (PE).
"Se não vai haver debate, essa prévia será esvaziada", comentou o prefeito, representante das facções radicais. Na prática, porém, ele não obteve as assinaturas necessárias para o registro.
Lula foi inscrito com apoio de 80,2% dos integrantes do diretório nacional, o dobro exigido pelo estatuto.
Diplomático, Suplicy afirmou que vai pedir apoio da chamada "esquerda" petista. "Será uma disputa construtiva, com amizade, e ainda espero convencer Lula da importância dos debates", disse. "Vamos ver, nesse time, quem tem melhor pontaria para marcar o gol."
A contratação do publicitário Duda Mendonça deve ser fechada na próxima reunião do diretório nacional, em fevereiro. "Vou pedir eqüidade de tratamento para minha campanha", afirmou Suplicy. O deputado José Dirceu, presidente do partido, atua agora como bombeiro: "Nossos adversários estão lá fora. Aqui são todos companheiros."
Governadora se prepara para 2002 sob fogo cerrado
Segundo ela, crescimento em pesquisas explica derrota na Assembléia e investigações no MA
SÃO LUÍS - Candidatíssima à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso, embora insista em que só vai pensar em eleições a partir de março, a governadora Roseana Sarney (PFL) enfrenta fogo cerrado de seus adversários no Maranhão, numa hora em que dispara nas pesquisas sobre intenção de voto.
"Isso não vem de agora, pois há muito tempo sou atacada, mas tem a ver com o crescimento de meu nome na preferência dos eleitores", disse ela, na quinta-feira, quando a imprensa de São Luís dedicava à sua administração manchetes capazes de tirar o sono de qualquer político.
Com exceção de O Estado do Maranhão, da família Sarney, os jornais maranhenses destacavam denúncias de irregularidades no governo estadual e uma rebelião de deputados da bancada da situação, que votou contra um projeto de lei de Roseana que aumentaria a alíquota do ICMS de 12% para 17%.
Foi a primeira vez que isso ocorreu, pois até agora Roseana controlava tranqüilamente a Assembléia Legislativa. Dos 42 deputados, 36 costumam votar com o governo. Na questão do ICMS, até os deputados do PFL votaram contra o projeto.
Na onda de denúncias, os deputados Aderson Lago (PSDB), Teresa Murad (PSB) e Helena Heluy (PT) pediram o impeachment de Roseana por improbidade administrativa, alegando que ela deixou de recolher R$ 6.408.632,52 para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef).
O que mais irritou a governadora, porém, foi a notícia de que o Ministério Público Federal ajuizou ação civil contra ela e seu marido, Jorge Murad, gerente de Planejamento do Maranhão. Eles são acusados de participação na aprovação do projeto irregular da Usimar, da extinta Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), que deu prejuízo de R$ 44 milhões aos cofres públicos.
"Essa ação tem conotação política", reagiu Roseana, argumentando que, como todos os demais governadores e conselheiros da Sudam, ela e Murad apenas defenderam interesses do Estado. O projeto previa a instalação, em São Luís, de uma fábrica de autopeças, com investimento de R$ 1,38 bilhão - R$ 690 milhões vindos da Sudam.
Chateações à parte, a governadora parece cada dia mais entusiasmada com o crescimento de seu nome nas pesquisas de inte nção de voto para 2002. Atenta aos índices que a deixam mais perto de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ainda mais longe dos demais presidenciáveis, ela não disfarça a disposição de entrar no páreo.
"Não tenho ambição, mas não posso desprezar os resultados das pesquisas. A época de Natal e Ano-novo deve ser um momento de reflexão, não se pode precipitar. Até março vou decidir e, se tiver de ser candidata, vou ser", disse, insistindo em que não se sente candidata.
Roseana ficou particularmente satisfeita com a pesquisa do instituto Sensus, que aponta empate técnico dela com Lula e que ela venceria no segundo turno.
"Gosto do Lula, ele tem uma biografia irretocável", comentou.
"Minha candidatura é um momento histórico, só pelo fato de uma mulher ser cogitada para a Presidência", acredita. Roseana adiantou que não tem pesquisas sobre preferência dos eleitores pelo fato de ser mulher, mas não teme ser alvo de preconceito.
Aliás, se fosse para pensar em preconceito, não seria só isso. "Além de mulher, sou nordestina, filha do Sarney e pertencente ao PFL." Se não pensa, é porque, conforme lembrou, as coisas mudaram, pelo menos no Maranhão. "Na campanha para o governo do Estado, em 1994, perguntamos ao eleitor se ele votaria em mulher. Saí com desvantagem, pois 11% responderam que não votariam. Ao disputar a reeleição, vi que não havia preconceito, pois tive 70% dos votos."
Quanto ao senador José Sarney (PMDB-AP), "que foi presidente em situação complicada", a intenção dela é aproveitar a experiência, "absorvendo o que deu certo e corrigindo o que não deu". Ela acredita que não seria difícil:
"Acompanhei de perto a administração em Brasília."
Juíza quer ser indenizada por procuradores do caso Jersey
Acusada de 'favorecer' Maluf, Adriana Pillegi decidiu processar cinco pessoas por danos morais
A investigação sobre existência de contas em nome do ex-prefeito Paulo Maluf (PPB) na Ilha de Jersey abriu caminho para uma tensa batalha entre procuradores da República e uma juíza federal. Irritada com a denúncia de que estaria favorecendo Maluf, a juíza Adriana Pillegi de Soveral entrou com ação ordinária de indenização por danos morais contra cinco procuradores que haviam representado contra ela ao Tribunal Regional Federal (TRF).
Os procuradores a acusam de "agir com parcialidade em favor de Maluf". É a primeira vez que procuradores são processados por um juiz por danos morais.
A ação provocou mobilização de centenas de procuradores, que repudiaram o "expediente de intimidação" e sugeriram aos colegas a adoção de providências contra a juíza.
Titular da 8.ª Vara Criminal Federal de São Paulo desde abril de 1997, Adriana presidiu ação penal contra Maluf por envolvimento em suposta fraude na emissão de títulos para pagamento de precatórios. Em outubro, acolhendo pedido da defesa, a juíza decretou o arquivamento do processo ao reconhecer a prescrição dos delitos atribuídos a Maluf: falsidade ideológica e crime de responsabilidade.
O processo dos precatórios era a base legal para a formalização e expedição das cartas rogatórias destinadas às autoridades da Suíça e de Jersey com solicitação de apreensão de documentos bancários e bloqueio de valores de Maluf.
Rogatórias - O procedimento de investigação sobre as contas foi instaurado em setembro, como apenso dos autos do processo judicial. Os procuradores suspeitam que recursos desviados de operações com Letras Financeiras do Tesouro Municipal teriam abastecido fundos em nome do pepebista e de familiares.
Em setembro, o juiz Fernando Moreira Gonçalves determinou a remessa das rogatórias, por via diplomática. Na época, Gonçalves conduzia os trabalhos da 8.ª Vara porque Adriana estava de férias.
Ao reassumir o posto, ela mudou tudo. Autorizou os advogados de Maluf a terem acesso a documentos do procedimento administrativo do Ministério da Justiça, decisão que já foi revogada. Depois, reformou a sentença de Gonçalves.
Os procuradores levantaram a suspeição da juíza. Representaram contra ela perante o TRF, entregando cópias do documento a 23 desembargadores federais.
A representação foi arquivada por falha "no aspecto formal", ou seja, não foi examinado o mérito.
A juíza não aceita a acusação e decidiu entrar com ação contra Pedro Barbosa Pereira Neto, Denise Neves Abade, Melissa Garcia Blagitz, Denis Pigozzi Albarse e Fernanda Teixeira Souza Domingos. Ela diz que "procurou desempenhar suas funções de forma serena, imparcial e com respeito aos direitos dos acusados".
Relatório sobre fraude no DNER cita ex-ministro
BRASÍLIA - Um relatório da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre fraudes com pagamento de precatórios (dívidas judiciais) no Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) indica prejuízo de R$ 122,9 milhões aos cofres públicos. O documento, que veio a público no fim de semana, foi elaborado após auditoria na Consultoria Jurídica do Ministério dos Transportes e cita o ex-ministro Eliseu Padilha e o ex-consultor Arnoldo Braga Filho.
O texto, de 30 páginas, sugere que o ministério e o próprio ministro tinham conhecimento das irregularidades. Além de não respeitar a fila de pagamento das dívidas, haveria casos de liberação de verba antes mesmo de uma decisão da Justiça.
Padilha distribuiu ontem uma nota, em resposta às acusações. Ele diz que "informações preliminares" do relatório foram "extraídas fora de contexto".
Além disso, garante que foi envolvido "mentirosa e criminosamente em possíveis irregularidades que teriam sido cometidas por funcionários de terceiro escalão de uma autarquia vinculada ao ministério".
Há dois anos, segundo Padilha, órgãos de controle do governo, além do Judiciário e do Ministério Público Federal, apuram as denúncias e, desde 1999, determinou a abertura de sindicâncias. Ele diz que os resultados foram processos disciplinares, afastamentos e demissões.
A nota informa que as investigações foram determinadas pelo advogado-geral da União, Gilmar Mendes, e pelo próprio Padilha. "Se houve irregularidades nos atos dos funcionários, a Justiça haverá de descobrir."
Tucanos do Rio aprovam Aécio para a Presidência
RIO – O nome do presidente da Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), foi ontem novamente lembrado pelos tucanos para disputar a Presidência da República. Durante convenção do partido no Rio, que não contou com a presença de Aécio, foi feita uma pesquisa com 308 delegados: 126 optaram pelo deputado para concorrer à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso. Em segundo lugar, ficou o ministro da Saúde, José Serra, com 74 votos. Em terceiro, a opção “apoio à candidatura de Roseana Sarney”. A pré-candidata do PFL recebeu quase o triplo de votos do que governador do Ceará, Tasso Jereissati (65 contra 23 votos).
Artigos
A Tabela do Imposto de Renda
ALCIDES AMARAL
Os debates e discussões em torno do reajuste da Tabela do Imposto de Renda trouxeram sinais alentadores do Brasil moderno, bem como algumas indicações preocupantes do Brasil velho. O Brasil da negociata e do casuísmo.
Todos os brasileiros que declaram e pagam Imposto de Renda neste país sabem que de janeiro de 1996 para cá a tabela não foi ajustada, o que significou um peso maior no bolso de cada um. A defasagem de 35% na correção da tabela, que significou a inflação do período, transferiu, de acordo com o Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal, cerca de R$ 9,2 bilhões para os cofres do governo. E o que se pretendia agora era simplesmente ajustar a tabela à nova realidade, para que o problema não se perpetuasse daqui para a frente. Depois de muitos debates, e graças à pressão da mídia, chegou-se a um porcentual de 17,5% - cujo valor ninguém sabe de onde saiu -, que custará ao governo cerca de R$ 2,6 bilhões no próximo ano. Muito pouco em relação aos ganhos obtidos até aqui, mas, assim mesmo, não foi fácil a aprovação na Camara dos Deputados, em Brasília.
O que de bom se viu nesse longo e custoso processo de negociação foi o novo nível de responsabilidade fiscal que impera neste país. Desde que a Constituição de 1988 entrou em vigor e que o débito tem de bater com o crédito nos Orçamentos da União, a preocupação legítima do sr. Everardo Maciel, secretário da Receita Federal, foi alertar seus superiores - no caso, o presidente da República - de que ajustes teriam de ser efetuados para compensar o gasto adicional. Como uma espécie de diretor-financeiro do "Brasil S.A.", esse é seu papel, seja ou não simpático à sociedade. O secretário é pago para zelar, tecnicamente, pelas contas públicas, ficando as decisões de ordem política para os políticos e o presidente da Republica.
No Brasil "velho", simplesmente mais papel-moeda seria impresso e, com um pouco mais de inflação, o problema estaria resolvido.
A participação efetiva do Congresso é outro avanço de que nos devemos orgulhar. Embora muitas vezes os políticos não assumam inteiramente o mandato que receberam do povo nas eleições, é fundamental para a democracia que assuntos polêmicos como esse sejam discutidos à exaustão. A correação da Tabela do Imposto de Renda é uma demanda da sociedade brasileira e, como tal, seus representantes são obrigados a se manifestar. Concordemos ou não com o resultado, o importante é que o processo funcione e os assuntos de ordem política - e esse saiu da área técnica - sejam decididos no âmbito do Congresso. E não entre quatro paredes, num gabinete qualquer de Brasília, como ocorria num passado não muito distante.
A negociata e o casuísmo na busca do porcentual aceitável para os cofres do governo trouxe lampejos preocupantes do Brasil que já se foi. Quando sabemos que tanto o Imposto de Renda devido quanto a devolução àqueles que pagaram em excesso quando do recebimento do holerite são corrigidos pela Taxa Selic, fica difícil aceitar a tese de que a correção demandada pela sociedade seria a volta da indexação, o que não é mais tolerável. A verdade é que o governo não quer abrir mão desses reais recebidos a maior dos contribuintes e utiliza a argumentação que lhe parece mais adequada. Portanto, os 17,5% aprovados estão longe de criar o risco de reindexar a economia, pois, se assim fosse, o porcentual não seria esse - 35 % é a defasagem real - e o ajuste seria efetuado anualmente, em vez de cinco anos depois.
Como mesmo o porcentual dividido ao meio não agrada ao governo, que terá de buscar recursos para tapar esse "furo de caixa" não previsto, a aprovação do Senado nesta semana é aguardada com expectativa. As chances de o projeto passar como está e ir à sanção presidencial são muito grandes. Afinal, temos em 2002 um importante ano político e os congressistas precisam estar de bem com os seus eleitores. A demanda da sociedade não foi totalmente atendida, mas, diante das circunstâncias, todos temos de estar felizes.
O que não pode é repetir-se uma história verdadeira que me foi contada por um ex-ministro do Brasil "velho": projeto de lei importante para o governo para ser votado, lá foi ele falar pessoalmente com as lideranças partidárias e solicitar apoio para a posição governamental. No dia da votação, galeria lotada, imprensa a postos, surpresa geral: o governo foi derrotado e aqueles mesmos líderes que prometeram apoiar o governo votaram contra. No dia seguinte, constrangido, o ministro foi ao Congresso indagar das lideranças o porquê daquela desagradável supresa. A resposta foi imediata: "Ministro, com a galeria lotada, aquela pressão toda, ficou impossível votar com o governo." E a conclusão, categórica: "Mas espero que o presidente da República vete o projeto."
Após o término da batalha em torno do correção da Tabela do Imposto de Renda, ficaremos sabendo, com certeza, se o Brasil realmente mudou.
Colunistas
RACHEL DE QUEIROZ
O nono lugar
O grande escândalo deste fim de ano, que rendeu manchetes em quase todos os jornais do País, foi o caso do pedreiro analfabeto que tirou o nono lugar no vestibular de uma faculdade de Direito. Diz o reitor dessa universidade que só havia nove candidatos para 20 vagas; e que, portanto, o pedreiro tirou o último lugar.
Fora isso, o resto foi normal: a moçada, como de costume, na sua grande maioria, sabia pouco ou nada do que lhe foi perguntado. E além do escasso saber, mostrou-se particularmente esquiva aos exames de acesso ao terceiro grau - que é, como em linguagem técnica se chama o ensino universitário.
As causas. Bem, há tanta causa para isso que o problema maior será escolher a mais importante entre elas.
As dificuldades econômicas que acossam as famílias, obrigando os adolescentes a procurar trabalho a fim de ajudar no orçamento, serão talvez a principal causa para o pouco rendimento na vida escolar. Até para a classe média menos desfavorecida já é difícil manter os filhos nas universidades particulares.
Em seguida - ou será paralelamente? - vêm duas causas gravíssimas para o problema: a) o baixo nível do ensino do segundo grau, em praticamente todo o País; b) o grevismo instituído como rotina e desencadeado por motivações que vão das mais justificáveis às mais injustificáveis. Quero dizer a greve que traduz o desespero da classe dos professores, ante a impossibilidade de sobreviver com os ínfimos salários que por quase toda parte lhes são pagos; e a greve por motivação política - já que a politização é um dado impositivo dentro da categoria dos docentes.
Os maus salários produzem maus profissionais, é claro. Porque os bem-dotados, os brilhantes, os competentes dificilmente se deixam prender a uma profissão tão pouco compensadora. Ficam os menos capazes, os tímidos, os despreparados - que também tiveram o seu aprendizado prejudicado pela incompetência do ensino que receberam. A tal história do círculo vicioso.
E então assistimos a essa fuga dos jovens ante o ensino superior. Mal alfabetizados, mal atendidos no primeiro e segundo graus por um professorado sem estímulo ou sem preparação efetiva (nunca esquecer, porém, os abnegados e sábios mestres que continuam teimando em honrar o seu ofício, sejam quais forem as pedras do caminho), que condições têm esses rapazes e moças para enfrentar um curso superior?
Dizem os examinadores que o descalabro principalmente se registra no que diz respeito à língua portuguesa. Os meninos não são capazes sequer de formular uma frase, de expressar um pensamento coerente. E, evidentemente, essa deficiência básica na comunicação prejudica o estudante em todas as outras disciplinas. Até para explicar uma reação química, é preciso saber falar - ou escrever.
O remédio? O remédio seria começar tudo de novo. Desde o pré-primário. Reciclar os mestres, fazer uma seleção penosa, mas indispensável, encaminhando os menos capazes para outras atividades.
E, acima de tudo, descobrir uma fórmula para reacender a mística, a devoção, a vocação dos que procuram o ensino como profissão. Padre, médico, professor - é tudo sacerdócio. Muitos zombam dessa palavra - sacerdócio! -, mas sem ela não se cumprem as grandes tarefas sociais. Se o ofício exige santos, que venham os santos. E talvez haja escondidos por aí muito mais santos do que imaginamos.
Editorial
Uma vitória contra a seriedade
Há sete anos o Brasil venceu a hiperinflação. Durante esse tempo, conseguiu evitar novos surtos inflacionários, mesmo em fases de grande instabilidade financeira. Enfrentou com êxito uma grande mudança cambial, em 1999, e mostrou ao mercado que a política monetária, neste país, passou a ser coisa séria. Vale a pena consolidar essa imagem, facilitando a transição para um novo governo? O presidente da República e sua equipe econômica têm dito que sim. A oposição, liderada pelo PT, sustenta o contrário. Ninguém há de impedir que o próximo presidente, se for petista, possa cultivar uma inflação mais alta. Compromisso com a estabilidade, segundo essa oposição, é engessamento. Por isso, petistas comemoraram, nos últimos dias, a desistência do governo de conseguir a votação, ainda este ano, de um projeto essencial para a ordenação do setor financeiro. Tirado agora da pauta de prioridades, esse projeto dificilmente será votado em 2002. Foi mais uma vitória oposicionista, segundo o deputado José Genoíno. Vitória contra quem, contra que e em nome de quê?
O mesmo partido que tem defendido o protecionismo europeu, contra os interesses comerciais do Brasil, mostra agora, de modo indisfarçável, seu desapreço às idéias de estabilidade e confiabilidade. Para bem avaliar essa história, convém lembrar alguns dados. O Brasil tem hoje um setor financeiro de reconhecida solidez. É um importante fator de segurança num mundo sujeito, como se viu nos últimos anos, a crises de grande virulência.Uma condução firme e confiável da política monetária também é fundamental, quando se quer manter a credibilidade interna e externa.
Falta algo, no entanto, para se completar a mudança realizada, com muito trabalho, em mais de meia década. É um arcabouço legal, que deve redefinir o status do Banco Central (BC) e consolidar as regras de operação do sistema financeiro.
Para construir esse arcabouço, é preciso regulamentar o artigo 192 da Constituição. Como sabe, no entanto, qualquer pessoa razoavelmente informada, não se pode resolver esse problema com apenas uma lei complementar. Aquele artigo, com oito incisos e três parágrafos, trata de questões complexas e muito díspares.
Em dez anos não foi possível produzir uma regulamentação. A saída, portanto, é recorrer a mais de uma lei complementar, mas, para isso, é preciso emendar o texto constitucional.
Uma das leis deve dispor sobre a organização, o funcionamento e as atribuições do Banco Central. O governo propôs a adoção de um modelo semelhante ao utilizado, com êxito, por vários países. Nesse modelo, a diretoria do BC tem mandato. Uma vez indicados pelo Executivo e confirmados pelo Congresso, seus integrantes só podem ser demitidos em circunstâncias bem definidas, sem ficar sujeitos à oscilação dos humores e dos interesses políticos do presidente ou do ministro da Fazenda. Além disso, a instituição tem autonomia operacional para tentar cumprir as metas de inflação. Essas metas, como hoje, seriam definidas pelo poder político.
Esse esquema desagrada à oposição. Segundo seus argumentos, criar agora um BC autônomo seria engessar o próximo governo. Por isso, os petistas não aceitam sequer a emenda necessária para facilitar a regulamentação do artigo 192. Essa emenda já foi aprovada pelo Senado e por uma comissão especial da Câmara. Faltariam duas votações no plenário.
É um tanto estranho que os petistas se considerem vitoriosos. Afinal, tudo que realmente conseguiram foi retardar uma tarefa importante para o País e não apenas para este governo. A mensagem que enviaram ao mercado é no mínimo preocupante. Ninguém duvida de que a atual diretoria do BC esteja comprometida com a meta de inflação fixada para 2002 - uma taxa de 3,5%, com tolerância de 2 pontos. A meta para 2003 também está definida, pois é essa a regra em vigor desde 1999: 3,25%, com a mesma tolerância. Nem terminou 2001, mas, apesar disso, as cabeças econômicas do PT parecem julgar que a inflação adequada para 2003 deve ser maior. Essa é uma atitude de quem não é capaz de distinguir os interesses permanentes do País dos objetivos ocasionais de um governo.
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12/17/2001
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