O pacto da transição









O pacto da transição
Lula, Ciro e Serra aceitam o convite do presidente para uma conversa sobre transição e só Garotinho ainda não deu uma resposta definitiva sobre o encontro

Diante da persistência da alta na cotação do dólar, o presidente Fernando Henrique decidiu chamar os quatro principais candidatos à Presidência — Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Ciro Gomes (PPS-PDT-PTB), José Serra (PSDB-PMDB) e Anthony Garotinho (PSB) — para conversar sobre o acordo com o FMI e a transição eleitoral. Serão encontros separados, ainda sem data marcada. Ciro já disse que vai. Lula e Serra mandaram avisar, por representantes procurados pelo ministro chefe da Casa Civil, Pedro Parente, que também comparecerão. Só Garotinho não deu resposta definitiva.

Segundo nota divulgada ontem à noite pelo Palácio do Planalto, o presidente conversará sobre os termos do acordo fechado com o FMI e o reflexo dele na transição. Na verdade, o governo espera o apoio dos candidatos ao acordo. Desde as primeiras negociações o FMI queria que os candidatos aprovassem a negociação, já que só parte dos US$ 30 bilhões emprestados pelo Fundo será usada pelo atual governo.

Segundo assessores do presidente, Fernando Henrique vinha resistindo à realização do encontro, mas mudou de idéia diante do nervosismo do mercado financeiro mesmo após o anúncio do acordo com o FMI.

Ciro: “Aceito conversar com o presidente sim”
O presidente determinou aos ministros Parente e Euclides Scalco, secretário-geral da Presidência, que organizem o mais rapidamente possível as conversas com os candidatos. Os contatos começaram no fim de semana. Parente telefonou para o coordenador da campanha de Ciro Gomes, Walfrido Mares Guia, no sábado, e este deu o sinal verde. Ontem à noite, em São Paulo, Ciro confirmou que irá ao encontro.

— Qualquer cidadão brasileiro, convidado pelo presidente da República para conversar, tem o dever de atender ao convite. Vou sem reservas — disse Ciro.

Ele afirmou que ainda não fora convidado oficialmente, mas foi taxativo:

— Aceito conversar com o presidente sim. O que pega é catapora; conversar não.

— Ciro está disponível para o diálogo, mas não pode dar simplesmente um aval ao acordo com o FMI — acrescentou Roberto Freire (PPS-PE), presidente do PPS e um dos coordenadores da campanha.

O Planalto não informou a data do encontro. Mas assessores disseram que o presidente está disponível para as conversas a partir de hoje. Não há intenção de realizar os encontros no mesmo dia. O Planalto optou por encontros separados para não constranger o tucano José Serra, que está em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto. Segundo um ministro do PSDB, o presidente acredita que, diante das farpas trocadas entre Serra e Ciro nos últimos dias, não haveria clima para um encontro com todos juntos.

Petista elogia o convite de Fernando Henrique
A pedido de Fernando Henrique, Parente também telefonou no fim de semana para o principal assessor
econômico de Garotinho, Tito Ryff. Ryff informou que Garotinho queria conhecer primeiro a pauta do encontro.

— Se for para referendar apenas o acordo com o FMI, não vou. O que o presidente Fernando Henrique quer conversar comigo? — disse o próprio Garotinho.

A estratégia e o tom dos encontros foram acertados ontem, numa reunião no Palácio da Alvorada entre Fernando Henrique, Scalco, Parente e assessores diretos. O presidente espera que o mercado se acalme diante de um sinal de que os candidatos se comprometem a manter o acordo. Parente encerrou a nota afirmando que "as autoridades brasileiras estão convencidas de que o acordo serve aos interesses do país e confiam que ele contará com o apoio dos principais candidatos à eleição presidencial".

Assessor econômico de Lula, o deputado Aloizio Mercadante (PT-SP) elogiou a decisão do presidente de abrir o diálogo. Mas afirmou que o acordo com o FMI não resolverá todos os problemas econômicos do país.

— Isso é positivo porque faltou diálogo nesses quase oito anos de governo — disse.


Serra convida Ruth Cardoso para ocupar ministério da área social
FH participa do programa de TV do candidato, que contará também com o engajamento da primeira-dama

SÃO PAULO. Em entusiasmado discurso no evento "Mulheres que Fazem a Diferença", promovido pelo PSDB paulista, o candidato tucano à Presidência da República, José Serra, fez um convite à primeira-dama, a antropóloga Ruth Cardoso para que, se eleito, ela assuma um ministério da área social. Mesmo dizendo temer um "puxão de orelha", Serra, ao falar de suas propostas para o social, dirigiu a palavra a Dona Ruth, fazendo o convite.

— Provavelmente, vou tomar um puxão de orelha depois que falar o que vou falar agora. Mas, desde já, quero convidar a Ruth Cardoso para ocupar um ministério para a área social — disse Serra, no palco montado no Clube Pinheiros, em São Paulo, para receber as militantes tucanas.

Diante do convite, Dona Ruth apenas sorriu. Serra ainda emendou o convite comparando a primeira-dama e a candidata a vice na chapa governista, a deputada federal Rita Camata (PMDB) à dupla de atacantes da seleção brasileira:

— Dá para imaginar um governo com Ruth Cardoso e Rita Camata? É uma dupla melhor que Ronaldinho e Rivaldo.

Além de Dona Ruth e Rita, representavam a classe política as viúvas do governador Mário Covas, Lila Covas, e do ministro das Comunicações, Sérgio Motta, Wilma Motta. Do lado artístico, estavam as atrizes Beatriz Segall, Irene Ravache e a produtora cultural Ruth Escobar. A cantora Elba Ramalho, que puxou o hino nacional após os discursos, fez show para uma platéia de cerca de 1,5 mil pessoas.

Primeira-dama vai se engajar na campanha do tucano
Antes do ato público, Ruth Cardoso concedeu entrevista e afirmou que poderá subir no palanque de Serra e gravar programas eleitorais na TV para o tucano. Ela saiu em defesa do candidato e do governo. Perguntada sobre o destino do dinheiro arrecadado com as privatizações no atual governo — pergunta polêmica feita a Serra no debate da TV Bandeirantes — respondeu:

— O dinheiro da privatização serviu para pagar a dívida, o que fez com que aumentasse a rede de proteção ao social.

Engajada, diz que vai “fazer o possível” para tentar reverter o quadro.

— Eu já assisti a tantas campanhas nesse país em que o candidato no mês de julho e agosto está bem abaixo dos outros candidatos, inclusive nas campanhas de 94 e 98, que isso não me impressiona. Uma campanha não está decidida com essa antecedência.

Ao falar sobre o candidato da Frente Trabalhista, Ciro Gomes, dona Ruth levanta a voz, discretamente.

— Ciro não representa nada. Mas o meu objetivo hoje não é fazer uma análise política e nem um prognóstico baseado em quase nada — disse.

FH grava participação na propaganda de Serra
O presidente Fernando Henrique Cardoso gravou ontem de manhã no Palácio da Alvorada sua participação para o primeiro programa eleitoral de televisão de Serra. Nele, o presidente vai apresentar o seu candidato e fará uma forte defesa do seu governo exaltando a estabilidade econômica e os avanços alcançados na área social.


Ciro muda estratégia de olho na centro-esquerda
Mudança pretende atenuar a associação da imagem do político à de Fernando Collor de Mello e ressaltar a atuação do PPS de Roberto Freire na coordenação

BRASÍLIA. O time que acompanha Ciro Gomes, candidato da Frente Trabalhista, vai trocar de posição em campo. O PTB, hegemônico até aqui na condução da campanha à Presidência, sai da linha de frente. Agora, o PPS, partido de Ciro, terá o papel de dar um conto rno ideológico e programático mais nítido ao candidato. A mudança pretende atenuar a associação da imagem de Ciro à de Fernando Collor de Mello e ressaltar a atuação do PPS de Roberto Freire para dar um matiz mais de esquerda ao candidato. Ontem os principais integrantes do comando da campanha se reuniram em Brasília para fixar os novos rumos de Ciro.

O dirigentes do PTB, como o deputado José Carlos Martinez (PR), presidente do partido, e o líder na Câmara, Roberto Jefferson (RJ), foram colaboradores muito próximos do ex-presidente Collor. Martinez deixou o comando da campanha depois de confundir-se em explicações sobre seus negócios com a família de Paulo César Farias, o PC, ex-tesoureiro de Collor.

Freire e dirigentes do PTB não escondem divergências
Os dirigentes do PTB nunca esconderam as divergências com o presidente do PPS, senador Roberto Freire (PE), hoje a companhia mais freqüente de Ciro em eventos. Consideram-no intransigente, tratam-no como “dinossauro” e citam como exemplo as dificuldades criadas por Freire para firmar alianças com o PFL. Mas cederam às necessidades do momento, em que Ciro se mantém em alta nas pesquisas e continua causando desconfiança no mercado e nos investidores internacionais.

— Ciro é como um técnico . Fizemos 5 a 0, somos goleadores, mas somos polêmicos como Romário. Então ele colocou um becão ideológico da roça que fica dando foiçada... — provoca Roberto Jefferson, numa alusão à foice que simbolizava o antigo Partido Comunista, origem do PPS.

PTB e PFL continuam atuando nos bastidores
Freire acredita que o período de costurar alianças passou e que, agora, é preciso que Ciro mostre perfil mais claro:

— Agora se exigem afirmações programáticas. As pessoas é que não queriam ver que o projeto de Ciro é de centro-esquerda. A perspectiva de vitória atrai adesões, mas o governo não pode ser essa grande aliança.

Chegamos a ela em função de um projeto.

Apesar da mudança nas aparências, o PTB continua trabalhando nos bastidores e em harmonia com o PFL. Ontem, no comitê de Ciro em Brasília, estavam juntos o deputado Walfrido Mares Guia (PTB-MG), o senador Geraldo Althoff (PFL-SC), o pedetista Manoel Dias, o publicitário Einhart Jacome da Paz, um representante do PPS e o jornalista Luís Costa Pinto, que assumiu a coordenação da comunicação da campanha.

Segundo um dos participantes, Ciro não subirá o tom para rebater ataques do tucano José Serra. Tampouco vai polemizar com o petista Lula. A ordem é manter o candidato “zen”. Os comandantes da campanha acham que é preciso evitar incidentes, como o ocorrido com um estudante negro, na semana passada. Atribuem os rompantes de Ciro, que já se desentendeu com fotógrafos e jornalistas, ao cansaço do candidato.


Garotinho promete repor perdas de servidor
Ex-governador afirma que acordo com o FMI não é impedimento para sua promessa e pergunta: ‘Dinheiro para banqueiro tem, mas dinheiro para o funcionalismo não tem?’

BRASÍLIA. Sem dizer como compatibilizar a proposta com as metas de ajuste fiscal e garantindo que continuará honrando o pagamento da dívida pública, o candidato do PSB à Presidência, Anthony Garotinho, prometeu ontem repor as perdas salariais do funcionalismo público federal registradas nos últimos oito anos.

Ele desconversou e não respondeu como conseguiria recursos para cumprir a promessa.

— A situação chegou ao fundo do poço. O funcionalismo público federal se encontra numa situação de humilhação. Estamos assumindo o compromisso com o funcionalismo de repor as perdas salariais assim como fiz no Rio de Janeiro, sendo o governador que mais recuperou as perdas dessa categoria — disse.

Perguntado se as restrições que existem no acordo firmado com o Fundo Monetário Internacional (FMI), como manter um superávit fiscal nas contas públicas de 3,75% do Produto Interno Bruto (PIB) no ano que vem, não atrapalhariam a promessa, o candidato do PSB disse que isso não é impedimento porque as perdas não serão pagas de uma única vez, mas obedecendo a um plano de reposição.

— O importante é que diagnosticamos que é preciso dar a reposição. Querer dizer que o Brasil não vai atingir a meta de superávit fiscal por causa do aumento ao funcionalismo é querer desviar o foco do principal. O Brasil gastou no ano passado, só em pagamento de juros, US$ 107 bilhões. Dinheiro para banqueiro tem, mas dinheiro para o funcionalismo não tem? — perguntou Garotinho, dizendo que tudo é questão de prioridades.

Segundo o candidato, isso não significa que ele esteja afirmando que seu governo não vai honrar o pagamento da dívida pública, mas sim que tentará reduzi-la para minimizar os gastos com esses compromissos.

— Vamos lutar para reduzir as taxas de juros para que se pague menos aos bancos e se possa repor os salários do funcionalismo — disse.

Se quiser repor os 93% de perdas do funcionalismo nos últimos oito anos, Garotinho terá de conseguir R$ 70 bilhões a mais por ano para cobrir a folha de pagamentos. Hoje o governo gasta por ano R$ 73 bilhões com o pagamento do funcionalismo, aí incluídos funções gratificadas, militares e funcionários terceirizados. De 1995 até agora, os gastos com o funcionalismo subiram de R$ 35 bilhões para R$ 73 bilhões este ano.

Pelos cálculos da equipe econômica, cada ponto percentual de aumento de salário do funcionalismo impacta a folha salarial em R$ 730 milhões por ano. Um aumento de 10%, por exemplo, custaria aos cofres públicos R$ 7,3 bilhões a mais por ano. Segundo o Sindicato dos Funcionários Públicos (Sindisep), a defasagem salarial da categoria chega a 93%, desde 1995, contra inflação pouco acima de 100%.

Carreata em Brasília e nas cidades-satélites
Garotinho participou de uma carreata, com cerca de 40 carros, que partiu do aeroporto de Brasília para as cidades-satélites de Núcleo Bandeirante, Taguatinga e Ceilândia. No centro da cidade, ele se misturou à população que acompanhava a carreta e pegou no colo Gabriel Moreno, de um 1 ano. A mãe do garoto disse que estava indecisa sobre seu voto para presidente.

O candidato ao governo do Distrito Federal pelo PPB, Benedito Domingos, participou da carreata, mas negou que tenha declarado apoio formal a Garotinho. O candidato do PSB ao governo, Rodrigo Rollemberg, rompeu com Garotinho por que ele estaria demonstrando apoio a Benedito Domingos.

— Tenho amizade por Garotinho e temos identidade religiosa sem conotação política — disse Domingos.

Evangélicos, Benedito e Garotinho participaram de um show gospel à noite. Já Rodrigo Rollemberg deu uma demonstração do rompimento com Garotinho não participando da carreata. A tendência de Rollemberg é não apoiar formalmente nenhum candidato à Presidência.


Petista pode ter problemas com TER
Ao participar da inauguração de dois projetos sociais no complexo esportivo do Maracanã ontem, a governadora Benedita da Silva pode ter arrumado um problema para a sua campanha. Embora tenham sido de iniciativa da ONG Nova Obra Social, presidida por seu marido, Antonio Pitanga, as ações tiveram a parceria da Suderj, um órgão do governo do estado. De acordo com o artigo 77 da Lei Eleitoral, é proibido aos candidatos a cargos do Executivo participar, nos três meses que precedem a eleição, de inaugurações de obras públicas, sob pena de cassação do registro.

Ministério Público já foi acionado sobre o caso
O Ministério Público Eleitoral já foi consultado — embora não tenha revelado por quem — sobre a possibilidade de Benedita ter usado a máquina pública para sua campanha. O o caso será analisado essa semana pelo procurador regional eleitoral, Antônio Carlos Martins Soares.

No Maracanã, Benedita puxou a fita que marcou a abertura da Oficina da Beleza, um curso profissionalizante para cabelereiros e manicure e, em seguida, fez um discurso para as alunas. Pouco depois, esteve na inauguração de um espaço para a terceira idade. Neste último, a governadora tomou o cuidado de não posar ao lado de Pitanga na hora em que ele descerrou a placa de inauguração, mas ficou a poucos metros dali, conversando com alguns idosos.

— Em tese, Benedita corre o risco de ter cometido um ato ilegal, embora o caso tenha de ser analisado concretamente para saber se esta inauguração foi uma abertura formal de uma obra — disse o advogado Ricardo Tosto, especialista em direito eleitoral.

Em visita ontem ao restaurante popular da Central do Brasil, a candidata ao governo do estado pelo PSB, Rosinha Matheus, adotou um tom ainda mais áspero para criticar os quatro meses de administração petista de Benedita. Rosinha afirmou ontem que existe o risco de o estado atrasar os salários de seus funcionários por causa da “incapacidade da equipe da governadora na arrecadação fiscal”.

— A arrecadação de ICMS de abril para cá vem caindo no estado. E a política de aumento real de arrecadação que fizemos foi desmantelada. Benedita desmantelou a inspetoria para cobrar empresas de grande porte na Secretaria de Fazenda — disse ela.

Rosinha citou a questão dos royalties do petróleo, que, segundo Benedita, foram comprometidos para alongar a dívida com a União.

— Quando Garotinho ofereceu parte dos royalties à União, nós governamos três anos e três meses pagando esses royalties . Nem por isso deixamos de tocar todas as obras e todos os investimentos que fizemos — disse ela, que acordou cedo para participar de um corpo-a-corpo na Central do Brasil e ainda teve fôlego para andar depois pelas ruas do Centro.

Benedita: “Estamos minando a estratégia deles”
Benedita reagiu, insinuando que a administração de Garotinho deixou propositadamente um problema de caixa.

— Ela está dizendo isso porque sabe do estrago que eles fizeram no governo anterior. Eles armaram tudo para que não acontecesse nada na nossa gestão. Mas estamos minando a estratégia deles e, aos poucos, vamos realizando ações — disse Benedita.

A candidata acrescentou que acredita num pequeno aumento de arrecadação do governo este mês, graças a cortes de custeios e à cobrança de inadimplentes. Ela prometeu apresentar esta semana uma prestação de contas dos quatro meses de seu governo, em que deve fazer mais críticas à gestão de Garotinho.


TSE autoriza o governo a veicular propaganda de sete programas

BRASÍLIA. Contrariando a lei eleitoral, que proíbe a propaganda institucional três meses antes das eleições, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) autorizou o governo federal a veicular publicidade de pelo menos sete programas. Dois deles são do Ministério da Saúde, pasta comandada pelo candidato à Presidência da coligação PSDB-PMDB, José Serra, até 15 de fevereiro.

O presidente do TSE, Nelson Jobim, afirmou em seu despacho que os pedidos se enquadram na exceção da lei: seriam casos graves e urgentes de necessidade pública.

O Ministério da Saúde está autorizado a reimprimir e distribuir cartilhas do projeto Alvorada na Saúde, lançado em 2001, para o trabalho dos agentes comunitários, mesmo que o país não sofra hoje qualquer epidemia. O pedido foi feito pela Secretaria de Comunicação do Planalto. Deverão ser excluídas do material citações e referências ao presidente, ao ministério e às logomarcas do governo, o que foi proposto pelo próprio ministério.

Jobim disse que os pedidos não têm repercussão no resultado das eleições para prejudicar ou beneficiar qualquer candidato, partido ou coligação. Segundo disse, não há razão para que a propaganda fique sujeita às restrições.


Artigos

Três vivas para o Brasil
Joseph Stiglitz

Os mercados mundiais parecem estar torcendo o nariz para o Brasil neste exato momento. Podem estar tão enganados a respeito do Brasil como os especialistas em futebol mundial no começo do verão. Quando a Copa do Mundo começou, você recorda, a seleção brasileira era considerada talentosa, mas falha. No entanto, de alguma maneira o Brasil mais uma vez se tornou o vencedor da Copa do Mundo. O país, da mesma maneira, também poderá demonstrar que é tão surpreendente e cheio de recursos.

Realmente, nos anos recentes, o Brasil criou uma democracia vibrante com uma economia sólida. Ele merece um voto de confiança dos investidores e dos líderes políticos.

Como em qualquer democracia vibrante, existem opiniões divergentes. Nem todos os americanos estão empolgados com a acelerada conversão do superávit de três trilhões em déficit, promovida por Bush, assim como a maioria não apóia a sua proposta de privatizar o sistema de seguridade social da América, que tanto fez pela erradicação da pobreza entre os americanos idosos.

Nas questões fundamentais dentro do Brasil, no entanto, existe um amplo consenso político (não unanimidade, mas ninguém pode esperar isso) e ele inclui todos os principais candidatos nas próximas eleições presidenciais que acontecerão em outubro.

Há um consenso, por exemplo, em torno de sólidas políticas fiscais e monetárias: ninguém deseja retornar à hiperinflação das décadas anteriores. A política monetária do Brasil foi administrada extraordinariamente bem por Armínio Fraga (meu ex-aluno), mas por trás dele existe uma instituição poderosa, com as capacidades analíticas de um banco central de primeiro mundo.

A iniciativa tomada pelo Banco Central do Brasil para aumentar a transparência e a abertura é um modelo para bancos centrais ao redor do mundo — no mundo desenvolvido assim como no menos desenvolvido. Certamente, podem existir desentendimentos a respeito dos ajustes de sintonia fina da economia, mas são rotineiros em qualquer democracia. Também reina um amplo consenso de que enquanto os mercados estiverem no centro de uma economia bem-sucedida, haverá um papel importante para o governo.

O governo do Brasil, por exemplo, promoveu uma das mais bem-sucedidas privatizações nas telecomunicações, mas também se empenhou por uma concorrência mais acirrada e por políticas de regulamentação. Ao contrário da América, quando o país enfrentou uma crise de eletricidade, não ficou sentado à toa, dizendo deixem que as forças dos mercados (que, nos EUA, significavam manipulação do mercado pela Enron e pelas demais) “tomem conta” da questão; em vez disso, o governo apareceu com ações enérgicas.

Como americano, observei com inveja como o Brasil encontrou o seu caminho em meio a uma situação muito difícil.

O Brasil é um país dotado de recursos humanos e materiais extraordinários. Ele pode ser chamado de mercado emergente, porém conta com instituições de pesquisa, educacionais e financeiras de primeira classe. As discussões sobre a economia em São Paulo são tão sofisticadas como em Nova York. Os seminários universitários no Rio são tão animados como os de Cambridge, de Massachusetts ou do Reino Unido.

O país fabrica um dos mais requintados aviões do mundo — tão bom que os concorrentes nos países mais industrializados vêm tentando impor barreiras comerciais. Mas o Brasil, com todos os seus pontos fortes, tem uma fraqueza crítica: um elevado grau de desigualdade. É uma fraqueza que (ao contrário da América) também goza de um amplo consenso: a maioria concorda que ela precisa ser equacionada e que o governo tem a obrigação de fazê-lo.

O governo atual obteve avanços extraordinários na educação. Há dez anos, 20% das crianças em idade escolar no Brasil não estavam freqüentando as escolas; agora, esse número caiu para 3%. Seja quem for o vencedor da eleição, quase certamente continuará a incrementar os investimentos em educação .

Da mesma maneira, agricultores sem terra representam um problema econômico e social, e a administração atual se incumbiu declaradamente de seguir adiante com uma emocionante reforma agrária baseada no mercado, que até recebeu apoio do Banco Mundial. Seja quem for o ganhador da eleição, muito provavelmente dará seqüência a um vigoroso programa de reforma agrária.

No tocante à epidemia de Aids, o Brasil enfrenta desafios ao seu sistema de saúde e, apesar de podermos concordar ou discordar dos métodos específicos adotados pelo governo brasileiro, uma coisa é certa: todos reconhecem que se trata de uma grande responsabilidade do governo. Além disso, qualquer que seja o vencedor desta eleição, seguramente espelhará esse vasto consenso nacional.

A dívida brasileira em relação ao PIB é moderada — melhor do que a registrada nos EUA quando Bill Clinton se tornou presidente e muito melhor que a do Japão e de vários países europeus. Diferentemente de seu vizinho ao sul (antes da crise da Argentina), o Brasil tem um regime cambial flexível: sua moeda não está supervalorizada — pelo contrário, está depreciada. Com exportações vigorosas, não deverá ter nenhum problema em cumprir suas obrigações com a dívida, contanto que as taxas de juros não disparem a níveis que transformem o problema em uma profecia que se auto-realiza.

O Brasil abriu uma trilha que não está baseada em ideologia ou em políticas econômicas excessivamente simplistas. Ele aproveita oportunidades ao mesmo tempo em que confronta e lida com duras realidades, quer sejam de falta de educação, de terras, ou a Aids. Ao traçar com êxito o seu próprio curso, o Brasil criou um vasto consenso interno, respaldado em uma economia de mercado equilibrada e democrática. A vitória do Brasil na Copa do Mundo pode não ter nenhuma relação com essas reformas, mas a criatividade daquela equipe vencedora diz muito sobre o espírito do país.


Colunistas

PANORAMA POLÍTICO – Tereza Cruvinel

Pulando etapa
Na próxima terça-feira estará começando a propaganda eleitoral no rádio e na televisão, dando início à contagem regressiva para a eleição em primeiro turno. Os 19 programas podem efetivamente alterar o quadro atual, polarizado entre os candidatos Lula (PT) e Ciro Gomes (PPS), mas é com a possibilidade de uma disputa entre os dois que a classe política começa a trabalhar.

Lula mantém a estratégia de preservar-se, guardando distância do combate que o tucano José Serra ainda dará ao candidato da Frente Trabalhista. Mas começa também ele a recordar com freqüência o segundo turno de 1989, em que foi derrotado por Collor, como fez novamente ontem em entrevista na “Folha de S.Paulo”.

A divisão das forças políticas num segundo turno entre Ciro e Lula já se tornou objeto de discussão nos partidos, no governo, no empresariado e entre os próprios eleitores.

O possível apoio do presidente Fernando Henrique e da maioria do PSDB a Lula é hoje uma possibilidade clara, da mesma forma como, ao mercado e ao empresariado, o discurso de Lula e do PT (sobretudo no episódio do acordo com o FMI) vem se apresentando como mais coerente e previsível do que o do candidato da Frente Trabalhista. Por outro lado, Ciro terá o apoio maciço do PFL e de seus grandes eleitores, tais como Antonio Carlos Magalhães, Jorge Bornhausen, família Sarney e outros. Quase uma dezena de governadores devem ser eleitos no primeiro turno e serão também cabos eleitorais especialíssimos no segundo turno presidencial. Muitos deles estão com Ciro.

Essa discussão antecipada do segundo turno passa o carro adiante dos bois, dando como estabilizado um quadro que a televisão e o rádio podem alterar. Decorre sobretudo do mau desempenho de Serra nas pesquisas e da consolidação do voto em Ciro. As pesquisas desta semana estabelecerão a ordem de largada dos candidatos na etapa que começa na próxima semana. Amanhã devemos ter um novo Ibope e até o fim da semana outra pesquisa CNT/Sensus. O Vox Populi de domingo, entretanto, trouxe pela primeira vez Ciro com oscilação negativa de um ponto, o que não pode ser ainda tomado como indicador de queda ou estagnação.

Certa, mesmo, só a presença de Lula no segundo turno. Que começa a ser preparado agora, e que teoricamente favorece o petista, na medida em que ele se tornará o desaguadouro natural dos que perderem a batalha pela segunda vaga.Nem todos no PSDB concordam, mas o núcleo mais próximo de Serra acha que o melhor mesmo é que Tasso Jereissati assuma seu apoio a Ciro Gomes. No Ceará isso é segredo de polichinelo.

Ciro reforça estruturas
Agora que se sente consolidado em segundo lugar na disputa presidencial, o candidato Ciro Gomes ouve os conselhos para tornar sua estrutura de campanha mais ágil e profissional. Na área de comunicação e imprensa, será criado um núcleo de apoio em Brasília, que deve ser coordenado pelo jornalista Luís Costa Pinto, atual diretor de redação do “Correio Braziliense”. Os entendimentos estavam sendo concluídos ontem, em reuniões que levaram a Brasília parte do comando de campanha de Ciro.

O publicitário Einhart Jacome da Paz, cunhado de Ciro, continua responsável pelo programa de rádio e de televisão, que será produzido em São Paulo. O jornalista Egydio Serpa, assessor de imprensa do candidato, continuará exercendo a função e acompanhando-o nas viagens. Mas a assessoria será reforçada para evitar a repetição de comportamentos que vêm travando a relação de Ciro com os meios de comunicação. Nos últimos dias ele desligou o gravador de um repórter de rádio, chamou jornalistas de babacas e envolveu-se num conflito danoso com um estudante negro na UnB, que lhe está rendendo protestos do movimento negro.

Em outra frente, Ciro é aconselhado a medir mais suas palavras, sobretudo em relação à conjuntura econômica. As declarações contraditórias sobre o acordo com o FMI acabaram fortalecendo no mercado e nas elites a idéia de que seja mais imprevisível do que o candidato do PT.

Os traíras
Para evitar que a aliança entre o PT e o PSDB se reproduzisse no Acre, ainda que informalmente, burlando a verticalização, o PMDB local exigiu a intervenção no diretório tucano, forçando o apoio ao candidato peemedebista Flaviano Melo. Resultado, uma desfiliação em massa de tucanos-fundadores, que agora estão organizando comitês de apoio a Serra para presidente, Jorge Viana (PT) para governador e Marina Silva (PT) para senadora. Enquanto isso, os peemedebistas, que em Brasília vestem a camisa de Serra para pedir verbas ao governo, começam a trabalhar para Ciro Gomes.

— Aqui eles já são chamados de traíras — diz o tucano dissidente Sued Chaves.

Traíra é um peixe de rio que come a isca mas não morde o anzol.

A AERONÁUTICA vai mesmo indicar o avião Grippen, de produção sueca, ao Conselho de Defesa Nacional, que decidirá sobre a compra dos novos caças da FAB, descartando o Mirage, que seria fabricado no Brasil pelo consórcio Embraer-Dassault. Muita gente no governo continua tentando adiar o negócio, prevendo a exploração do tema por Lula, que vem batendo duro na compra, pela Petrobras, de plataformas à Noruega.


Editorial

JOGO DE PACIÊNCIA

O efeito prático do acordo com o Fundo Monetário Internacional é que o Banco Central assegurou volume de recursos suficiente para, na hipótese drástica de o crédito no exterior continuar retraído, o país ter em caixa reservas cambiais suficientes para irrigar o mercado e os compromissos em moeda estrangeira serem honrados.

Portanto, o acordo com o FMI elimina a possibilidade de um default na dívida externa, que poderia ocorrer caso o Brasil ficasse completamente sem financiamentos. Afastando-se o risco do não-pagamento, a tendência é que o mercado v enha a se acalmar, e o risco de renovação de empréstimos a empresas brasileiras volte a diminuir.

Trata-se de uma tendência natural porque efetivamente os recursos agora existem para garantir equilíbrio ao balanço de pagamentos. O Brasil se preveniu diante da possibilidade de agravamento da crise e obteve um dos maiores empréstimos da história do Fundo.

Mas esse reforço de caixa não significa que o país deva restabelecer o regime de bandas no câmbio. O sistema adequado para o ajuste da economia brasileira é o flutuante — ainda que tal sistema possa trazer muitos incômodos em fases de grande volatilidade do mercado, como no momento.

A atuação do Banco Central para evitar movimentos especulativos é necessária. Porém não cabe ao BC criar preços artificiais: o câmbio precisa refletir os fluxos de entrada e saída de moeda estrangeira, pois somente assim as contas externas se ajustarão à realidade econômica do Brasil. O fluxo tem sido temporariamente negativo porque as linhas de crédito externo permanecem travadas e há antecipação de pagamentos e compromissos por parte de devedores que desejam aproveitar deságios favoráveis nos seus títulos.

O desequilíbrio é mesmo temporário porque o saldo na balança comercial é crescente, e já se prevê que possa ultrapassar a casa de US$ 6 bilhões este ano. Além disso, o estoque de papéis disponíveis para compra com deságio vem minguando e em breve não será mais atrativo o resgate antecipado desses títulos. Então é preciso ter paciência e esperar que o mercado se reequilibre.


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08/13/2002


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