Palanque eletrônico
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Candidato do PSDB a presidente da República, José Serra contrata publicitário que cuida da imagem de Fernando Henrique e fez os programas de TV que sustentaram a aventura de Roseana Sarney. É a guerra eletrônica na eleição
O senador José Serra, pré-candidato do PSDB à Presidência, abriu a guarda para o publicitário Nizan Guanaes, peso pesado do marketing político nacional. Os dois trabalharam juntos da eleição para a Prefeitura de São Paulo, em 1996, mas saíram daquela campanha derrotados e brigados. Agora, depois de alguma relutância, Serra acertou a entrada de Guanaes em seu time de marqueteiros. ‘‘Ele será o responsável pela área de criação (logotipos, slogans, comerciais de TV)’’, anuncia o também publicitário Nélson Biondi, coordenador de comunicação de Serra. O primeiro programa sob nova direção irá ao ar em maio.
A chegada de Nizan Guanaes à campanha produzirá algumas mudanças comportamentais no candidato. Até aqui, por obra de Biondi, Serra vinha conseguindo vencer a conhecida antipatia em suas andanças pelo país. A partir de agora, somará aos sorrisos e apertos de mão um discurso mais agressivo contra os programas econômicos dos adversários e mais generoso com o presidente Fernando Henrique Cardoso. A idéia a passar é de que o ex-ministro da Saúde é o candidato do governo e deve ser eleito porque é o mais capacitado entre os concorrentes.
‘‘Tenho certeza que vai ajudar muito, é um publicitário genial’’, opina o jornalista Antônio Martins, assessor de imprensa da pefelista Roseana Sarney enquanto ela ainda estava na corrida presidencial, ancorada por programas de TV produzidos por Guanaes.
O alto comando da campanha de Serra ainda não fala à vontade da montagem da equipe de comunicação. O assessor de imprensa Milton Coelho da Graça disse ao Correio que Nizan participará da campanha ‘‘dando palpites’’. Não é verdade. O publicitário assumirá toda a produção do programa eleitoral gratuito de Serra na TV. Ou seja, comandará o coração da campanha.
O cuidado com que o assunto está sendo tratado se explica pela guerra de egos envolvida. Biondi vem produzindo o marketing de Serra desde que ele foi declarado presidenciável, em fevereiro. ‘‘Fiz os programas de TV, eles foram aprovados, o Serra adorou, saiu de 8% para 19% nas pesquisas’’, lembra, sobre o programa partidário do PSDB, que foi ao ar no dia 6 de março passado.
Guanaes, porém, é famoso pelo método centralizador e autoritário de trabalho. Assim, é pouco provável que tenha aceitado entrar na campanha subordinado de Nélson Biondi, conforme a versão oficial.
Serra e Guanaes telefonaram ontem para Biondi tranqüilizando-o sobre notícia publicada pela Folha de S.Paulo, segundo a qual o presidenciável mudara o comando de seu time de marketing por estar insatisfeito com o trabalho produzido até agora. ‘‘Não é nada disso’’, reproduz Biondi. ‘‘Serra e Nizan começaram a conversar por sugestão minha, que quero a equipe de criação do Nizan a meu lado na campanha, mas eu continuo coordenando’’, completa.
A face oculta da sucessão
O publicitário Nizan Guanaes não põe muita fé nas chances do ex-ministro José Serra de se eleger presidente da República em outubro. Mas isso não o impediu de aceitar o convite de Serra para cuidar do marketing político da campanha dele.
Não há contradição alguma no gesto de Nizan. Ele é um profissional. E dos mais competentes que existem. Estava disponível no mercado desde que a candidatura de Roseana Sarney afundou. Que ele ajudou a criar. De resto, Nizan acredita no seu próprio taco.
Os marqueteiros são responsáveis pela imagem de um candidato ao longo da campanha. São eles quem, com base em pesquisas e no talento pessoal, aconselham seus clientes a se comportar dessa maneira ou daquela, a dizer isso ou aquilo.
Por modéstia e para não deixarem mal os candidatos, costumam afirmar que o marketing não elege ninguém. São os candidatos que perdem ou ganham eleições. Há uma dose de verdade nisso. E também uma dose de esperteza.
Porque vai que o candidato perde. E aí? Bem, nesse caso foi ele o culpado pela derrota. Fora o derrotado, nunca vi ninguém pôr a culpa no marqueteiro. Mas vai que o candidato ganhe. E aí? No mínimo, seu homem de marketing ganhou junto.
O mais genial marqueteiro é incapaz de ajudar a eleger um candidato sem boas idéias, que se comunique mal e não consiga estabelecer uma certa química com os eleitores. Mas o melhor dos candidatos perderá se não contar com um marketing eficiente.
É assim desde que a política no seu sentido mais amplo passou a ser operada via meios de comunicação de massa. E é por isso que também as campanhas trocaram as ruas pelos estúdios de rádio e de televisão. Esse é um caminho sem retorno nas sociedades modernas.
O voto ideológico é uma mercadoria cada vez mais escassa no mundo. Sozinho, em uma cidade como São Paulo, por exemplo, ele não elege meia dúzia de deputados estaduais. Os outros tipos de votos são movidos a dinheiro, comunicação e favores. Nessa ordem.
Metade ou pouco mais da metade do total de eleitores brasileiros só começará a definir seu voto depois que for inaugurado no rádio e na televisão o horário de propaganda gratuita dos candidatos. Quer dizer: a partir do dia 18 de agosto.
De Lula a Enéas, passando por Serra, Ciro Gomes e Garotinho, os candidatos dirão aos eleitores somente o que eles querem ouvir. Para isso se valerão de pesquisas. Quanto mais dinheiro tiver um candidato, mais pesquisas ele encomendará.
Quanto mais pesquisas ele puder pagar, mais reunirá informações preciosas para orientar seu discurso e suas ações. Se algum deles tiver convicção de que será obrigado a adotar medidas impopulares caso seja eleito, não dirá. Para não perder votos.
Todos se empenharão em só exibir suas virtudes. E, se necessário, todos acentuarão os defeitos e pontos frágeis dos adversários. Quem tiver melhor marketing poderá derrotar até mesmo quem tiver mais partidos e governos ao seu lado.
No momento, a face pública da sucessão presidencial é Lula, Serra, Garotinho, Ciro e Enéas. Mas tão importante quanto ela é a face oculta — a dos marqueteiros que monitoram todos os passos dos candidatos. É por isso que a entrada em cena de um deles é notícia.
Nizan desembarcará na campanha de Serra no melhor momento possível para ele, Nizan. Porque a campanha enfrenta uma série de dificuldades internas e externas, parte delas causada pelo estilo Serra de ser — centralizador e autoritário.
Se Nizan conseguir pôr ordem na área de comunicação da campanha e impedir que o candidato continue se metendo com o que não deve e com o que não entende, tudo por ali poderá correr melhor. Se Serra perder a eleição...bem, a culpa será de Serra.
Se ele ganhar, haverá o reconhecimento universal de que foi Nizan o principal responsável pela vitória. O perfil do marqueteiro que trabalhou para Fernando Henrique em 1994 e em 1998 não é o perfil de alguém modesto e discreto por natureza. Pelo contrário.
Será interessante acompanhar daqui para frente como se relacionarão duas personalidades habituadas a brilhar intensamente e a ocupar todos os espaços possíveis. Nizan e Serra já estiveram juntos quando Serra foi candidato a prefeito de São Paulo e perdeu.
Não se deram bem. É razoável imaginar que, dispostos a repetir a experiência, estejam se vendo agora com melhores olhos.
O número 1
Nizan Guanaes fez fama como um dos melhores publicitários do país com trabalhos realizados somente para clientes privados. Por muito tempo, esnobou as campanhas de governo e os políticos. Até conhecer Fernando Henrique Cardoso. Depois de fazer o marketing do candidato na eleição de 1994, entusiasmou-se tanto com o presidente que jurou-lhe fidelidade e prometeu trabalhar até de graça na disputa seguinte, em 1998.
No mercado publicitário, tirou a agência DM9 da 93ªposição que ocupava em 1989 para colocá-la no posto de segunda maior agência do Brasil. De redator, passou a sócio da agência. Para dar esse salto, associou-se à multinacional norte-americana DDB, terceira maior agência do mundo, com faturamento anual de US$ 15 bilhões e escritórios em mais de 100 países. No Brasil, a DM9DDB faturou R$ 506 milhões em 2001.
Depois da campanha de 1998, Guanaes afastou-se da publicidade para fundar o provedor de Internet iG, que dirigiu até o início deste ano. Ao deixar o iG, recomprou sua parte na DM9DDB e, em seu primeiro dia de trabalho, demitiu 60 pessoas. Por e-mail.
Cultuado entre os publicitários por sua criatividade e capacidade de trabalho — quando um produto não o agrada, passa a madrugada na agência e diz que é para mostrar a todos como se faz —, é considerado um profissional de difícil trato. Tem crises de humor frequentes, mas odeia se dizem que ele dá chiliques. ‘‘Está pensando que eu sou Maria Callas?’’, brada quando pedem-lhe calma, referindo-se à estridência da voz e ao gênio difícil da falecida cantora lírica.
Os programas de TV que fez para o PFL foram o ponto alto da curta candidatura presidencial da ex-governadora Roseana Sarney. Parafraseando campanha de uma marca de cerveja, vendeu Roseana como a candidata ‘‘número 1’’. A propaganda caiu no gosto popular e triplicou as intenções de voto na candidata. Mas a queda de Roseana com a apreensão de R$ 1,3 milhão na sede de sua empresa, em São Luís, tirou também o sono do publicitário.
Procurado por uma revista semanal que dizia ter documento de que parte do dinheiro era para pagá-lo, Nizan ficou irado. Apostava que a origem das informações partira da assessoria da própria Roseana. Na sexta-feira que antecedeu a desistência da candidata, passou o dia ao telefone, à procura do jornalista Antonio Martins, a quem atribuía a falsa notícia. Martins saiu Brasília, foi a São Paulo, a Fortaleza e finalmente a São Luís para explicar aos cardeais pefelistas que a governadora jogaria a toalha no sábado. ‘‘Passei o dia em reuniões e aviões, mas onde desembarcava pegava um recado desaforado dele na caixa postal do celular’’, conta Martins.
Baiano, 43 anos e 115 quilos, Guanaes contradiz a folclórica tranqüilidade dos nascidos na boa terra. Agitado, está sempre à procura de um trabalho novo. No momento, pensa abrir serviço voltado para o atendimento da publicidade de governo, com um escritório atuante em Brasília. Governo e estatais gastam R$ 500 milhões por ano com propaganda.
Não deixe para a última hora
Cerca de 20% dos brasileiros não entregaram a declaração referente ao ano de 2001 e correm risco de enfrentar congestionamento na Internet. Prazo termina amanhã e não será prorrogado
Amanhã é o último dia para fazer a declaração de Imposto de Renda. O ideal é declarar o quanto antes para evitar filas nas agências dos Correios e congestionamentos telefônicos, que podem atrapalhar a vida de quem utilizar o Receita-fone ou a Internet. Quem não acertar as contas com o Leão até as 20h (no caso de quem vai declarar pela Internet) terá de pagar multa mínima de R$ 165,74 ou até 20% do valor da dívida com a Receita. Os contribuintes que não tiverem imposto a pagar terão de desembolsar o valor mínimo determinado pelo governo. A Receita Federal oferece quatro meios para declaração: formulário em papel, disquete, Internet ou telefone. A declaração é gratuita só para quem a efetuar pela Web ou por disquete.
O programa para quem vai declarar em disquete está disponível na versão simplificada e completa no site www.receita.fazenda.gov.br. A entrega pode ser feita em qualquer agência do Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. A outra opção disponível para os usuários de computador é a declaração on line, sem a necessidade de fazer o download do programa. Mas essa opção só é válida para a declaração simplificada.
A mesma regra vale para a declaração pelo telefone (0300-780300 — R$ 0,27 o minuto para ligações completadas em telefone fixo e R$ 0,50 para quem liga de celular). A distribuição dos formulários está sendo feita nos postos da Receita. Para devolvê-los preenchidos nas agências dos Correios, os contribuintes terão de desembolsar R$ 2,50.
As pessoas que não optarem pela Internet deverão ficar atentas aos horários de recebimento de formulários e disquetes das instituições conveniadas com a Receita. Os Correios funcionam até às 17h. Já os bancos aceitarão declarações até o fim do expediente normal das agências. Até ontem, cerca de 80,5% dos contribuintes já haviam declarado, dos quais 95% usaram a Internet. Segundo a Receita, os declarantes on line serão os primeiros a receber a restituição.
Ao definir se vai preencher o formulário completo ou simplificado, o contribuinte deve prestar atenção a alguns detalhes. Na declaração simplificada, é possível abater até 20% sem a apresentação de comprovantes de despesas. Mas o valor equivalente a esses 20% não pode superar R$ 8 mil, independentemente da renda declarada. O formulário simplificado é ideal para pessoas com renda anual de até R$ 20 mil. Quem tem rendimentos superiores deve fazer os cálculos de todas as despesas dedutíveis.
Neste ano, a farmacêutica Andrea Santos Martins Monteiro, 27 anos, moradora do Guará, fez a declaração de renda pela primeira vez e optou pela simplificada. Ao obter maiores informações sobre o imposto, a marinheira de primeira viagem, que tem um salário de R$ 3 mil, descobriu que não podia deduzir tudo o que planejava. A principal decepção diz respeito às despesas do filho, Kevin, de dois anos. Andrea queria deduzir todas as despesas com a escola dele, que somaram R$ 3,9 mil. Mas, segundo a regra da Receita, ela só poderá abater, no máximo, R$ 1,7 mil (42% do que gastou). Andrea disse estar aborrecida porque é descontado mensalmente de seu salário 27,5% só de Imposto de Renda. ‘‘Acho que não precisávamos pagar tanto tributo como fazemos. Até se passarmos um cheque descontam do nosso dinheiro’’, reclama.
EUA querem invadir Iraque em 2003
O governo norte-americano está a todo vapor estudando como e quando atacará o arquiinimigo Iraque. Estima-se que 250 mil soldados irão ao front
Os piores temores do presidente iraquiano Saddam Hussein poderão transformar-se em realidade. Os Estados Unidos estão empenhados em invadir o Iraque. Segundo o jornal norte-americano The New York Times, a Casa Branca estuda a possibilidade de uma investida em massa que envolveria uma campanha militar aérea e a invasão por terra que contaria com o envio tropa de até 250 mil soldados.
Até alguns meses, o presidente norte-americano, George W. Bush, trabalhava com a alternativa de promover um golpe de Estado. A possibilidade foi descartada, porque as condições para que isso ocorresse eram muito remotas. Qualquer ofensiva provável será adiada para o próximo ano. Até lá os norte-americanos querem dar tempo para criar as condições militares, econômicas e diplomáticas necessárias para o ataque.
Os preparativos têm de levar em conta a chegada do inverno, os estudos de impacto nos preços do petróleo e até mesmo a solução do conflito entre israelenses e palestinos.
Os militares dos Estados Unidos preparavam-se para desencadear a ofensiva contra Saddam já no segundo semestre. Primeiro teriam de defender nas Nações Unidas que o chefe de Estado iraquiano se recusava a deixar a entrada de inspetores de armas químicas e biológicas verificassem os arsenais e fábricas do Iraque. Outro fator que atrapalhou os pl anos de Washington foi o desenrolar cada dia mais preocupante da guerra entre Israel e a Autoridade Palestina. A não-solução da rusga no Oriente Médio provocou um racha dentro de governo. A preocupação é se a ação militar poderá ser mal-aceita pelos países árabes justo em um cenário instável na região.
O planejamento agora prevê um amplo uso de bases das forças norte-americanas na Turquia e no Kuweit, com o Qatar como substituto para o centro de operações aéreas na Arábia Saudita. Omã e Bahrein também terão papéis importantes. Mesmo antes da tensa reunião de Bush com o príncipe Abdullah da Arábia Saudita na semana passada, o Pentágono já trabalhava com alternativas quanto ao uso das instalações no reino.
Os EUA precisarão de autorização para usar o espaço aéreo saudita adjacente ao Iraque. Não se sabe se Bush tratou desse assunto com Abdullah quando falaram sobre o Iraque. Donald Rumsfeld, secretário de Defesa norte-americano, que se encontrou com o líder saudita um dia antes de Bush, disse que o acesso às bases ‘‘não foi abordado’’ no seu encontro.
As autoridades turcas disseram que não houve nenhuma negociação para o uso de bases por tropas americanas na nova campanha contra o Iraque; as autoridades americanas confirmaram isso, dizendo que as conversas são prematuras. A posição do Kuweit também é incerta.
Quanto à reação diplomática na região, o vice-presidente, Dick Cheney, o secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, e seus principais conselheiros argumentam que os líderes árabes protestariam publicamente, mas secretamente comemorariam a queda de Saddam — desde que a operação seja decisiva. Sua derrubada facilitaria o trabalho de acalmar a violência entre Israel e os palestinos.
Derrubar Saddam por meio de um golpe militar liderado por iraquianos é algo remoto para os Estados Unidos. Muito se economizaria. De acordo com uma fonte do governo, ‘‘ocorreram pelo menos seis tentativas de golpe nos anos 1990, e todos fracassaram’’. Em cada caso, disse esta autoridade, oficiais iraquianos dissidentes ‘‘nos sinalizaram, ‘Nós estamos prontos para o golpe’, e em seguida tomamos conhecimento de que estas pessoas foram assassinadas, ou falharam ou desistiram no final e deixaram o país’’.
A estratégia militar norte-americano no Iraque envolveria os curdos no norte e os xiitas no sul. Mas as forças armadas de Saddam, apesar de disporem de apenas um terço de sua força pré-Guerra do Golfo, são fortes o bastante para derrotar qualquer adversário. Os Estados Unidos não contam com uma frente de aliados, somente a Grã-Bretanha se habilitou em comprar essa briga.
Outra questão que incomoda o Pentágono é a possibilidade de o Iraque usar armas químicas e biológicas contra os soldados norte-americanos. ‘‘Uma das coisas que poderíamos fazer é dizer que qualquer oficial ou soldado iraquiano que lançar armas químicas ou biológicas contra nós seria pessoalmente responsabilizado’’, disse Eliot A. Cohen, professor da Universidade Johns Hopkins que dirigiu o estudo definitivo da Força Aérea sobre a Guerra do Golfo Pérsico. Esse argumento desmobilizaria parte do pessoal de Saddam.
Petróleo vira arma de guerra
Mais complicado que tirar Saddam Hussein do poder é segurar os preços do petróleo, caso estourasse uma guerra contra o Iraque neste momento. O crescente sentimento anti-americano entre os países árabes pode complicar o abastecimento nos Estados Unidos.
Segundo o presidente do Conselho de Assessores Econômicos da Casa Branca, R. Glenn Hubbard, o governo examinou os possíveis efeitos de uma disparada nos preços do petróleo. Hubbard afirmou ao The New York Times que uma inquietação no Oriente Médio ou uma invasão ao Iraque deixariam os mercados em polvorosa.
A Arábia Saudita e outros produtores árabes se sentiriam obrigados, devido à pressão interna, a cortar suas exportações para os Estados Unidos. Ele ressalta ainda que o próprio combate afetaria o fluxo do petróleo.
Para complicar, onde antes existia simpatia, a situação está mudando. Na América Latina, a Venezuela é o único país membro da poderosa Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). Nesse caso, não só o mercado regula o preço. No que se refere à Opep, seus líderes controlam o fornecimento e as cotações.
O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, não é um simpatizante dos Estados Unidos, ainda mais depois do golpe de Estado que sofreu há poucas semanas e que suspeita-se tenha havido participação norte-americana, por meio de Otto Reich, subsecretário do Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado.
O conselheiro econômico da Casa Branca disse que a alta nos preços do petróleo em si provavelmente não teria um grande efeito sobre a economia norte-americana. Mas seria difícil avaliar os efeitos possíveis sobre a confiança dos consumidores e dos empresários. Uma das lições da guerra do Golfo, disse Hubbard, foi a recuperação da confiança dos consumidores assim que os Estados Unidos deixaram claro que visavam expulsar as forças iraquianas do Kuwait e garantir a segurança dos campos de petróleo sauditas.
Bush ordenou em novembro que a Reserva Estratégica de Petróleo do governo fosse preenchida até a sua capacidade máxima. Um estudo sobre o prazo de entrega para a reserva mostra que as maiores cessões mensais são registradas entre setembro e janeiro. Esse é outro motivo para deixar a realização da ofensiva contra o Iraque para o início do próximo ano. ‘‘Nós queremos estar em uma posição de poder intervir nos mercados caso os especuladores comecem a elevar o preço do petróleo, podendo fazer com que abaixem rapidamente’’, afirmou uma autoridade da administração Bush.
Artigos
Pesquisadores e futuro
Roseli Fischmann
Alfred Schütz ensina que se entrelaçam memória e projeto na construção de identidade. Memória, entendida como elaboração das múltiplas e complexas vivências que são mais do que passado, já que atuam no presente, ainda que invisíveis. Projeto como futuro que se constrói com base no vivido, presente ou pretérito, já relativizado como passado.
A construção das identidades brasileiras sofreu tentativas de homogeneização em estereótipos de ‘‘identidade nacional’’, em particular no início do século XX. A motivação era política e o desvendamento foi feito pelas ciências sociais e humanas, em sua trajetória e evolução no Brasil. Trata-se de exemplo de como a elaboração científica coopera ativamente na compreensão da história, propiciando redefinir rumos que contemplem perspectivas democráticas de inclusão.
O exemplo evidencia que a teoria é mais do que reza o senso comum banalizado. Atitudes de suspeita com relação à pesquisa científica são comuns e lamentáveis. Há os que supõem que ciência seja artigo de luxo, absolutamente supérfluo em países como o Brasil. Há também quem sustente que bastaria privatizar universidades públicas que tudo se resolveria.
A situação em que se encontra a maior parte das universidades públicas demonstra o equívoco do Estado e da sociedade. A infra-estrutura encontra-se em estado lamentável, fruto de décadas de abandono. Embora a política de buscar recursos fora do país tenha sido incentivada, há dificuldades que advêm da exigência de contraparte, quando se encontram financiadores externos.
É no campo dos recursos humanos que as dificuldades enfrentadas mostram-se mais graves, porque talvez irreversíveis. A competitividade e a acumulação, típicas do sistema capitalista, foram exacerbadas pela globalização. Jovens que se formam vão em busca de empregos que remunerem imediatamente, em detrimento de fortalecer a formação. Como no mercado de modelos, em que a aposentadoria vem cedo, vive-se o paradoxo de uma socied ade que aumenta a esperança de vida, enquanto usa jovens profissionais, no mercado, como produto de consumo. Os lucros são imediatos, no que se refere ao capital financeiro, e as perdas irreversíveis, no plano humano.
Assim é o cenário de quem decide escolher a vida de pesquisador no Brasil. Além de ter valores baixos, sem qualquer relação com o mercado, o quadro de bolsas se tem reduzido drasticamente. É exemplo a situação do Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas-Biofísica, responsável pelo primeiro título de doutor da UFRJ, em 1966. Formou, até abril de 2002, 520 mestres e 404 doutores. Enfrenta, atualmente, falta grave de bolsas para pós-graduandos e pós-doutores, que ameaça o funcionamento.
Artigo de Walter Zin, diretor do Instituto de Biofísica, sede do Programa, informa que ‘‘a pesquisa biomédica tem contribuído poderosamente para a nossa compreensão dos meios e métodos para diminuir a morbidade e a mortalidade infantis’’. Para falar da importância social, aí estão temas ainda urgentes no Brasil, ligados aos direitos fundamentais — no caso, o básico direito à vida das crianças brasileiras.
Valorizar cientistas que trabalham em todas as áreas do saber é exigência impostergável que se coloca para o Estado brasileiro. Priorizar a formação de quadros de docentes-pesquisadores é compreender o futuro que se faz hoje. O tempo do ensino e da ciência é distinto do que há no campo da produção econômica. Basta lembrar como foram recebidas as primeiras contribuições da mecânica quântica e o que hoje representa.
Divulgar e debater os resultados da Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia, realizada em 2001 em Brasília, por exemplo, pode ser articulador de esforços. Trata-se de realização do Estado brasileiro que incorporou trabalho de memória-possibilidade de projeto, como em Shütz.
Rever e reorganizar o sistema de financiamento à pesquisa é tarefa que o Poder Legislativo deve chamar a si, em cooperação com o Executivo. Sobretudo no que se refere ao incentivo à formação de pesquisadores, em todos os níveis, de forma a expressar de forma efetiva o futuro que se quer para o Brasil. Vivemos ano de eleições. Que as pautas incorporem a discussão, com seriedade e compromisso.
Editorial
OS SUBSÍDIOS E A ALCA
Mais uma vez os Estados Unidos atropelam sua pregação em favor das liberdades comerciais e abertura dos mercados. O Senado e a Câmara de Representantes acabam de acertar a aprovação de projeto que aumenta em US$ 4,5 bilhões anuais os subsídios à agricultura. A dotação vai vigorar pelos próximos seis anos. Agrava-se, assim, a violação costumeira às regras exigidas pela Organização Mundial de Comércio (OMC) conforme as decisões da Rodada Uruguai do extinto Acordo Geral de Tarifa e Comércio (Gatt). Washington, eis a ironia, foi dos parceiros que mais trabalharam em favor do pacto.
O favorecimento aos agricultores equivale ao fechamento do mercado norte-americano à concorrência internacional. Fere em particular os interesses dos fornecedores tradicionais de gêneros e insumos alimentícios. O Brasil se insere como principal prejudicado na América Latina. É impossível competir em área onde a formação de preços não resulta do livre jogo capitalista, mas da pressão baixista dos subsídios.
Mais grave é que eventual exportação de mercadorias produzidas com o suporte de subsídios caracteriza-se como dumping, prática que os EUA consideram uma das formas mais ultrajantes de competição desleal. Por isso mesmo, quando decidem proteger segmentos obsoletos de sua indústria, sobretudo a siderurgia, recorrem a acusações de dumping para barrar importações. O Brasil é uma das principais vítimas de expedientes do gênero. A imposição recente de sobretaxas causará às siderúrgicas brasileiras frustração de faturamento da ordem de US$ 410 milhões anuais.
As estatísticas disponíveis mostram que os subsídios do governo norte-americano a produtores agrícolas chegaram a US$ 32 bilhões em 2000. Ano passado foram bastante superiores, embora se ignore ainda em que bases percentuais. Qualquer que seja a previsão de gastos na rubrica orçamentária do ano corrente e seguintes, sabe-se que será acrescida de US$ 4,5 bilhões até 2007.
Dentro dos próprios Estados Unidos, economistas e especialistas em integração econômica não atinam de que forma o presidente George W. Bush pretende obter a solidariedade dos parceiros para a formação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Ele quer vê-la em funcionamento em 2005. Mas barreiras alfandegárias, subsídios a produtores, uso matreiro das acusações de dumping e outras hipóteses protecionistas impedem a livre concorrência.
E não há maneira de alcançar livre intercâmbio comercial entre países soberanos sem competição aberta, isenta de restrições.
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04/29/2002
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