PC derruba coordenador de Ciro









PC derruba coordenador de Ciro
Presidente do PTB é acusado de ter simulado venda de fazenda para justificar recebimento de US$ 15 milhões do esquema de Paulo César Farias, tesoureiro de Collor

Sob uma enxurrada de denúncias e sem conseguir explicar a origem do dinheiro que recebeu de Paulo César Farias, o PC, caixa da campanha de Fernando Collor em 1989, o presidente nacional do PTB, José Carlos Martinez (PR), foi levado a renunciar à coordenação-geral da campanha de Ciro Gomes à Presidência da República. Ontem, um dia depois de se reunir com Ciro em São Paulo, Martinez enviou uma carta ao candidato em que anuncia a decisão como se fosse unilateral. Em resposta, Ciro aceitou a decisão de Martinez, embora fazendo uma defesa veemente do aliado. Ciro disse estar chocado com a violência sofrida pelo presidente do PTB e até admite a hipótese de sua volta ao comando da campanha.

“Aceito sua renúncia como um sacrifício para que você demonstre a verdade, direito inalienável dado a toda pessoa. É nessa circunstância, e apenas nela, que aceito o afastamento que me pede. Tão logo consiga esclarecer os fatos, volte para integrar minha equipe”, disse Ciro na carta.

Apesar do gesto de Ciro, a possibilidade de Martinez voltar à coordenação é descartada pelos comandantes da campanha. E a carta, negociada palavra por palavra, foi fruto de uma operação que atravessou a noite de quarta-feira. Naquela tarde, Martinez recebeu um telefonema do diretor do Instituto Vox Populi, Marcos Coimbra, que lhe falou sobre o resultado de pesquisas qualitativas encomendadas para medir o impacto das denúncias sobre a candidatura. Devastador. Segundo Coimbra, a associação de Martinez com PC Farias contamina a candidatura de Ciro.

Após a conversa, Martinez foi ao encontro de Ciro, em São José do Rio Preto. Anunciou ao candidato a decisão de deixar a coordenação. Martinez reuniu-se, então, com integrantes do PTB e do núcleo da campanha de Ciro. Ao fim de três diferentes versões, aceitou assinar o documento distribuído ontem.

Ordem para não citar PC na carta
Uma das recomendações para a elaboração da carta era a de que não constasse em qualquer linha o nome de PC. Foi cumprida. Mas Ciro também teve que ceder. Irritado com o reflexo das denúncias na candidatura, ele pretendia escrever uma carta mais longa, falando de ética na política. Foi convencido a não fazê-lo.

Agora, Ciro terá que correr contra o tempo para montar sua nova estrutura de campanha, antes mesmo do debate de domingo. A idéia é que ele e o irmão, Lúcio Gomes, assumam o comando-geral. Abaixo deles, um operador e um staff de três a cinco integrantes.

Durante duas semanas, Martinez não foi convincente ao explicar as operações de compra da TV Corcovado, em 1991, com dinheiro recebido de PC. Ele corre risco de ter uma multa executada pela Procuradoria da Fazenda, em São Paulo. Após rastrear os cheques usados nas operações, a Receita decidiu multá-lo em US$ 15 milhões. Martinez recorreu, mas foi derrotado no conselho de contribuintes.

PC teria repassado US$ 15 milhões
Martinez também é acusado de ter simulado a venda de uma fazenda no interior do Amazonas para justificar transações de cerca de US$ 15 milhões que recebeu do esquema PC. A denúncia foi feita pelo “Jornal Nacional” de ontem com base em investigações do Ministério Público do Paraná e da Receita.

Martinez teria simulado a venda da fazenda em Silves, no Amazonas, por US$ 5 milhões para supostamente pagar parte do empréstimo de US$ 15 milhões que teria tomado de PC para comprar a TV Corcovado.

Procuradores e fiscais da Receita, que estavam investigando o caso, descobriram que a fazenda, que teria sido vendida por 33 vezes o seu valor de mercado em 1992, permanece em nome de Martinez.

O Ministério Público sustenta ainda que parte do dinheiro amealhado por Martinez a partir do esquema PC foi mandado para a Cross e Accent, duas empresas com sede em paraísos fiscais, e para o paraguaio Victor Hugo Chamarro. O paraguaio teria apresentado endereço falso em documentos obtidos pelas autoridades brasileiras.

Para os procuradores, tudo indica que Martinez recebeu o dinheiro para tocar negócios de PC no Paraná. Eles chegaram a esta conclusão depois de encontrar 14 cheques, no valor equivalente a US$ 15 milhões, repassados por PC para Martinez a título de empréstimo. Vários desses cheques estavam assinados por Flávio Maurício Ramos, Manoel Dantas Araújo e Jurandir Castro de Menezes, três conhecidos fantasmas do esquema PC.

Depois da saída de Martinez da campanha de Ciro, o próximo alvo pode ser o sindicalista Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, também do PTB e candidato a vice na chapa. Cresce um movimento no PTB de Minas para que Paulinho seja substituído pelo senador Arlindo Porto (PTB-MG). O assunto já chegou a Ciro, que deu um voto de confiança ao seu vice, investigado pelo Ministério Público. Os petebistas mineiros alegam que a CUT tem um pacote de denúncias contra Paulinho.


Eu sou o chefe da campanha’
VARGINHA (MG) e SÃO JOSÉ DO RIO PRETO (SP). O candidato da Frente Trabalhista (PPS, PDT e PTB), Ciro Gomes, anunciou ontem que vai comandar ele mesmo sua campanha. Ciro descartou a idéia de passar a coordenação-geral para seu irmão, Lúcio Gomes, atual tesoureiro da campanha. Lúcio poderá participar da coordenação com Ciro. A estratégia do candidato, acertada pela Frente Trabalhista, é evitar desgastes para o deputado José Carlos Martinez (PTB-PR), que foi afastado ontem da coordenação.

— Eu sou o chefe da campanha. Posso, uma vez por semana, reunir a minha equipe, que é enxuta, dar as diretrizes e supervisionar. Eu fico no comando — afirmou.

Ciro voltou a culpar o “dragão da maldade”, numa referência ao candidato tucano José Serra, pelo desgaste.

Segundo ele, Martinez foi vítima de uma violência e precisou deixar a coordenação para se defender. O candidato também voltou a avalizar a honestidade de seu candidato a vice, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, da Força Sindical. Segundo ele, Paulinho não será substituído porque “não há absolutamente nada que o desabone”.


Serra promete criar oito milhões de empregos
Presidenciável considera sua projeção mais realista do que a do adversário do PT. Programa de governo do PSDB prevê um crescimento do PIB entre 4,5% e 5% ao ano

BRASÍLIA. O candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, anunciou ontem que seu programa de governo prevê a criação de oito milhões de empregos nos próximos quatro anos. O anúncio ocorreu durante visita à sede da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), quando o tucano também assumiu compromisso de aumentar os investimentos em pesquisa de R$ 1,4 bilhão para R$ 2,5 bilhões anuais.

Serra afirmou que a política econômica de seu governo estará voltada para aumentar as oportunidades de trabalho e que isso implicará estímulos às exportações e aos setores empregadores.

Serra diz acreditar em “estimativa conservadora”
Ao apresentar sua meta de geração de empregos, o candidato evitou criticar a proposta de Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT, que promete criar dez milhões de empregos, dizendo que esta seria uma meta desejável, mas que sua projeção é mais realista diante das condições da economia do país e dos cenários possíveis de crescimento. Os técnicos que trabalham no programa de governo de Serra trabalham com um crescimento do PIB entre 4,5% e 5%.

— Uma estimativa conservadora do ponto de vista econômico mostra que podemos, com uma política econômica correta, gerar no Brasil cerca de oito milhões de empregos — disse Serra.

Ao lado do ministro da Agricultura, Pratini de Moraes, Serra usou a visita à Embrapa para fazer um aceno ao setor agrícola. O tucano afirmou que quem sustentou o Plano Real foi a agricultura brasileira e que hoje quem sustenta o balanço de pagamentos do país é o agronegócio. Por isso, afirmou que os empreendedores do setor agrícola terão tratamento privilegiado.

— O impacto da agricultura no emprego é muito importante. O investimento de R$ 1 milhão na agricultura rende em média 202 empregos. O mesmo investimento gera 149 empregos no comércio, 111 na construção civil e 85 na indústria automobilística. A agricultura irrigada gera dez vezes mais empregos do que as montadoras — afirmou Serra.

Ministro da Agricultura declara apoio a Serra
Depois de o ministro da Fazenda, Pedro Malan, ter declarado que votará em Serra, ontem foi a vez de o ministro da Agricultura, Pratini de Moraes, dar seu apoio. Ele recebeu o tucano na sede da Embrapa com elogios:

— Acreditamos no seu nome e no seu patriotismo. A presença de vossa excelência nessa disputa é uma oportunidade para aqueles que acreditam que o país precisa de responsabilidade e de coragem.

O coordenador da Comissão de Ética Pública do governo, João Geraldo Piquet Carneiro, disse ontem que a comissão vai analisar se o ministro da Agricultura descumpriu alguma norma do Código de Ética sobre a atuação de ministros em campanhas eleitorais pelo fato de a Embrapa ser um órgão público. Mas adiantou que não via problemas no fato de Pratini ter manifestado sua preferência.

— O fato de um ministro apoiar ou não um candidato faz parte da cidadania.


Rita e Serra na horta
BRASÍLIA. O tucano José Serra saiu da horta experimental da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que visitou ontem, com um nabo fresquinho, arrancado do pé por sua candidata a vice, Rita Camata. Demonstrando conhecer pelo nome cada um dos vegetais cultivados, a deputada também revelou destreza para os afazeres agrícolas.

Depois de passar por canteiros de rabanetes e espinafres, Serra, Rita, o ministro da Agricultura, Pratini de Moraes, e o presidente da Embrapa, Alberto Portugal, chegaram a um canteiro de nabos.

— Mas aqui não tem nabo! — exclamou Serra.

Num instante, Rita agachou-se, pôs os braços entre as folhagens, afastou alguns ramos e com uma das mãos puxou pelo caule o tubérculo, que estava embaixo da terra.

— Olha só o tamanho deste — afirmou Rita, passando-o em seguida para Serra.

O candidato, que já carregava desde o canteiro anterior uma berinjela, agarrou o nabo e anunciou bem humorado:

— Eu vou levar para casa.

O momento foi de grande descontração, sobretudo com o gesto inesperado de Rita, que estava se divertindo ao demonstrar suas habilidades e seus conhecimentos.

Eles passaram também por um canteiro de pimenta de cheiro e num de manjericão.

— Que perfume! — disse Serra, ao cheirar uma folha de manjericão.

O candidato arrancou então alguns ramos com as mãos e os enfiou no bolso do paletó. Depois disso, próximo à saída da horta, Rita, que havia conseguido uma faca, desbastou os ramos do nabo.

Serra recebeu então o nabo na forma em que ele é encontrado à venda nas feiras e pediu que o colocassem no porta-malas de seu carro.


Agenda dos candidatos à presidência
LULA • PT-PL
SÃO PAULO. Concede entrevista ao vivo no programa “Opinião Nacional”, da TV Cultura de São Paulo, a partir das 22h.

SERRA • PSDB-PMDB
MINAS. De manhã, o tucano visita instituição de reabilitação de deficientes mentais em Belo Horizonte e participa de carreata em Betim. À tarde, ele inaugura comitês de campanha em Belo Horizonte.

CIRO • Frente Trabalhista
BAHIA. Às 11h, o ex-ministro faz caminhada pelo Centro de Salvador e, às 15h, ele apresenta seu programa de governo no Centro de Convenções de Salvador. Às 20h, faz comício na Praça da Bandeira.

GAROTINHO • PSB
RIO DE JANEIRO. O ex-governador faz comício na Cinelândia a partir das 16h.


Lula vai passar o chapéu no setor empresarial
Partido pretende arrecadar R$ 36 milhões enviando dois mil kits com as propostas de governo do candidato a possíveis financiadores da campanha presidencial

SÃO PAULO. O PT vai entregar um kit a dois mil grandes empresários solicitando contribuição financeira para a campanha do candidato Luiz Inácio Lula da Silva. A iniciativa é inédita e, segundo o coordenador de Planejamento e Finanças do PT, Delúbio Soares, visa a arrecadar os R$ 36 milhões previstos pelo partido na declaração ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Se conseguir, será a campanha mais cara da história do PT.

Além disso, hoje o partido começa a enviar cartas aos 278 mil filiados e a simpatizantes da sigla.

Segundo Delúbio, os dois mil empresários que serão contatados pelo partido foram escolhidos na lista das 500 maiores empresas do país da revista “Exame” e entre as maiores em cada estado. Ele disse que será feito um contato telefônico para, depois, o PT enviar o kit. A caixa vermelha contém uma carta assinada por Lula e pelo seu candidato a vice, José Alencar, na qual são apresentados tópicos do programa de governo.

Junto com a carta será enviada uma fita de vídeo que lista os principais pontos das idéias de Lula. Os temas são: política externa, reformas (tributária, previdenciária, política e agrária), programas de erradicação da fome, para a redução do déficit habitacional e ainda planos para evitar novos apagões, entre outros itens.

Como brinde, os empresários receberão uma estrela dourada do PT numa caixinha vermelha. A manobra para atrair recursos começa hoje e as primeiras visitas devem acontecer na quarta-feira.

— É uma maneira de o PT ir ao mercado, usando a palavra da moda — brincou Delúbio.

Segundo o coordenador, o objetivo é fazer uma campanha de arrecadação com transparência. Segundo a lei, empresas privadas podem doar até 2% do faturamento no ano anterior ao da eleição. O PT não vai sugerir valores mínimos de contribuição.

— Serão procuradas pessoas das indústrias, do comércio e dos serviços. Nossa campanha é aberta, não temos restrições. Só não vamos aceitar dinheiro do jogo do bicho, do narcotráfico e do trabalho escravo — disse o coordenador.


Artigos

Fatos e mitos
Aluizio Borém e Roberta Jardim Moraes

As possibilidades de transformação gênica das espécies vegetais utilizadas como alimentos pelo homem são enormes: arroz rico em vitaminas, tomate contendo anti-oxidantes benéficos à saúde humana, amendoim sem proteínas alergênicas, bananas contendo vacinas, soja com óleo mais saudável para a dieta de pacientes cardíacos, etc. Enquanto a maioria dos cientistas percebe grande potencial de melhoria dos alimentos com a biotecnologia, parte do público, manipulado por ONGs vestidas de defensoras do meio ambiente, ainda se sente insegura com estes novos produtos.

A ansiedade do público tem, entretanto, diminuído com o melhor entendimento da tecnologia. Os principais receios dos céticos são o risco de escape gênico, isto é, risco dos transgenes se espalharem no meio ambiente por cruzamento natural entre as variedades geneticamente modificadas e seus parentes silvestres, tornando-as difíceis de serem controladas. Finalmente, alguns temem que os alimentos geneticamente modificados possam conter alguma substância que promova reações alérgicas. Estas e outras questões da segurança destes produtos são exaustivamente analisadas antes da liberação de qualquer um deles para o plantio e consumo.

O Brasil não pode se render à alienação tecnológica e continuar utilizando tecnologias ultrapassadas que contribuam para a poluição dos seus férteis solos com insetic idas e outros defensivos agrícolas altamente residuais. Excluir os produtores brasileiros das novas tecnologias que são seguras, e que apresentam vantagens ecológicas, é um desserviço à agricultura brasileira.

É importante que os produtos desenvolvidos pela biotecnologia continuem sendo rigorosamente avaliados quanto à sua segurança para a saúde e para o meio ambiente, e aqueles que forem considerados seguros sejam disponibilizados para o produtor. Cientistas como o dr. Norman E. Borlaug, Prêmio Nobel da Paz em 1970, por suas pesquisas com variedades semi-anãs de alto rendimento, especialmente importantes para os países em desenvolvimento, defendem a utilização de OGMs. James C. Watson, também laureado com o Prêmio Nobel pela descoberta da estrutura do DNA, defende a adoção das variedades geneticamente modificadas, como forma de reduzir a aplicação de defensivos agrícolas na agricultura.

As universidades e os institutos de pesquisa nacionais precisam do apoio público e legal para o desenvolvimento de variedades adaptadas às condições brasileiras. Estas não só aumentarão a competitividade do produto brasileiro no mercado internacional, mas também reduzirão o uso de defensivos agrícolas nas lavouras.

O uso da biotecnologia para o desenvolvimento de novas variedades está promovendo uma revolução na forma de se produzir alimentos mais seguros para o homem e com menor agressão ao meio ambiente. Frustrar o avanço tecnológico quando ele é seguro e contribui para a preservação ambiental é uma agressão à inteligência humana. A primeira variedade assim desenvolvida foi colocada no mercado americano em 1994, após anos de testes quanto à sua segurança. Não existe nenhuma evidência de que as variedades geneticamente modificadas já em estudo por mais de 12 anos e em cultivo por mais de 8 anos em outros países façam mal à saúde humana ou ao meio ambiente. Os resultados na verdade indicam o contrário. Muitas destas variedades são mais saudáveis para a alimentação e seguras para o meio ambiente.

Após o desenvolvimento de uma nova variedade com o auxílio da biotecnologia, ela é submetida a análises laboratoriais em uma primeira fase, onde se analisa sua composição química para um grande número de componentes. Caso a variedade seja considerada segura, ela é então submetida a testes em condições controladas. Finalmente, as variedades consideradas seguras para a saúde humana e para o meio ambiente são testadas em condições de campo sob supervisão dos órgãos competentes. A liberação de uso comercial e consumo só ocorre após exaustiva análise do material.

Após avaliar a segurança da soja tolerante ao herbicida Roundup para o consumo humano e para o meio ambiente, e tendo concluindo que não havia quaisquer riscos, a CTNBio emitiu um parecer conclusivo favorável à desregulamentação desta variedade. O Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) e o Greenpeace obtiveram, entretanto, na mesma época uma liminar concedida pelo juiz da 11 Vara Federal de Brasília, proibindo à União autorizar o plantio comercial da referida cultivar. Em 26 de junho de 2000, o Juiz Dr. Antônio Souza Prudente, proferiu sentença obrigando o governo a exigir a realização do estudo de impacto ambiental, embora a CTNBio já houvesse analisado este assunto e considerado este procedimento dispensável no caso específico da soja. O processo ainda está em andamento.

A ofensiva ambientalista contra os transgênicos no Brasil é altamente incoerente, uma vez que as variedades GM atualmente disponíveis resistentes a pragas e doenças contribuem para a redução no uso de defensivos agrícolas (inseticidas e outros). A adoção destas variedades em outros países resultou em marcante queda no volume de pesticidas aplicados nas lavouras, resultando em menor poluição ambiental e menos resíduos nos alimentos. Estimativas de redução na aplicação de defensivos agrícolas em outras culturas são igualmente impressionantes.

A redução no consumo de defensivos agrícolas nos EUA e na Argentina, países que amplamente adotaram esta tecnologia, já inclusive resultou no fechamento de fábricas de inseticidas. Isto ajuda a entender a justificativa de algumas indústrias de defensivos, que não atuam em biotecnologia, a apoiarem algumas ONGs contrárias a variedades geneticamente modificadas.


Colunistas

PANORAMA POLÍTICO – Tereza Cruvinel

Daqui para a frente
Depois do clima de fim do mundo nos mercados, arrefecido ontem pelo anúncio oficial de um novo acordo com o FMI, a campanha eleitoral fica definitivamente atrelada aos acontecimentos da economia. A crise deixa de ser do atual governo e torna-se problema de todos os candidatos e forças políticas, podendo seus desdobramentos afetar a disputa e o resultado.

No melhor e mais provável dos cenários, o acordo é fechado nos próximos dez dias, o aporte do fundo tranqüiliza os investidores e garante-se a travessia para o novo governo sem que o pior nos aconteça. Ainda que o atual governo tenha feito a coisa certa — até porque parece não haver outra saída — sob a ótica eleitoral, isso pode não ajudar seu candidato nem reduzir o desejo de mudança do eleitorado. O PT testou essa hipótese em suas pesquisas qualitativas, concluindo que as pessoas apreciam o realismo de Lula quando diz que não poderá mudar em oito dias uma política de oito anos.

Nessas avaliações preliminares, feitas ontem sob o impacto da deterioração do quadro econômico, alguns tucanos pensam o contrário. Que Serra pode se beneficiar da insegurança do eleitor, seguindo a estratégia de colar-se ao governo e apresentar-se como o mais credenciado para gerenciar a crise. Tal benefício, dizem os adversários, poderia ocorrer, mas sob outro cenário, o pior deles. Aquele em que o atual governo não conseguisse o apoio do Fundo e da comunidade internacional. E esse é o cenário menos provável, nem o fim de governo desejado por Fernando Henrique.

Havendo o próprio porta-voz do FMI dito ontem que será importante “um comprometimento” dos candidatos com os termos e as exigências de um acordo que vigore até o fim de 2003, chegou para eles a hora de enfrentar a onça, não cabendo mais evasivas e tergiversações sobre esse assunto, que entrou em debate no início de julho.

Mas uma primeira mudança no comportamento dos candidatos já pôde ser percebida nas últimas horas. Ciro Gomes, cujas declarações vinham elevando em proporções argentinas a insegurança dos investidores, uma vez que se tornara um competidor com chances de vitória, começou a moderar seu discurso, mitigando declarações como aquela sobre as contas CC-5 e buscando canais com o governo, inclusive com o presidente Fernando Henrique. José Serra capitalizará o fato de, desde a semana passada, estar defendendo o novo acordo. Não teve, portanto, que mudar nada em seu discurso. Lula, desde que assumiu compromissos explícitos com uma transição gradual, com os contratos e os chamados fundamentos econômicos, teve reduzidas as apreensões que desperta. Ontem Lula admitiu tratar da situação econômica com o atual governo, desde que convidado. Ou ele ou José Dirceu. Mas isso, ouve-se no PT, não pode ser tomado como disposição de subscrever inteiramente um acordo negociado pela atual equipe sem discutir suas premissas principais. Até porque ontem não estava muito claro que tipo de comprometimento seria esperado pelo Fundo.

Candidatos não têm legitimidade para assinar nada. Mas podem, naturalmente, fazer compromissos para o caso de serem eleitos, de forma mais protocolar. Talvez fique nisso o pacto de transição que agora foi imposto pela situação.O emissário através do qual o candidato Ciro Gomes mandou dizer ao presidente Fernando Henrique que se eleito não fará caça às bruxas foi o ministro Pedro Malan.

Os bancos levaram
Em outros tempos, os partidos de oposição estar iam com uma ação popular contra o Banco Central, que permitiu aos bancos, durante oito anos, aplicar menos que o estipulado, dos fundos de caderneta de poupança, em financiamento habitacional. Dinheiro que aplicaram, a juros maiores, em outras transações financeiras.

Mas como os tempos são de transição, e todos acham que podem vir a ser governo, vão deixar isso de lado.

A nova regra aparentemente vai ajudar os sem-teto, levando mais dinheiro ao mercado. Mas, se os juros não caírem, o crédito continuará inacessível. A uma taxa de 20% ao ano, um empréstimo vai dobrar a cada quatro anos. Prova disso, a alta inadimplência do SFH, que está em 27%.

‘Não vi mas gostei’
Os candidatos a presidente até gostaram da proposta de Aécio Neves, de transferir do Ano Novo para 6 de janeiro o dia da posse. “Não vi mas gostei”, brincou um deles. Mas a votação não seria agora, e sim depois da eleição. Importante é só que os partidos estejam de acordo, para que a emenda tramite.

Exatamente por causa da crise, diz Aécio, será importante que a posse traduza apoios internacionais ao Brasil com a vinda de chefes de Estado.

DALÍ NA CÂMARA: Aécio Neves abriu ontem a exposição das cem gravuras da coleção “Divina Comédia”, um tesouro que andou oculto em Goiás durante anos. As gravuras pertencem ao fazendeiro Lover Ibaixe, que as adquiriu de Gala, viúva de Salvador Dalí, nos anos 60. Foram feitas por encomenda de um editor, para ilustrar a obra de Dante. A coleção fica exposta até o fim de agosto no Museu da Câmara, em Brasília.


Editorial

NA MÃO DE BRUXOS

A comunidade acadêmica e os políticos há muito tempo discutem como adaptar as instituições financeiras multilaterais, principalmente o Fundo Monetário Internacional, a um mundo globalizado onde enormes massas de dinheiro migram digitalmente, em movimentos que podem desestabilizar países. Pois agora têm mais um exemplo para alimentar as discussões: o Brasil e a atual crise deflagrada por um desses surtos de especulação financeira.

Esta crise tem um pedigree especial: ela ocorre no exato momento em que os chamados fundamentos da economia estão em processo de recuperação. Isso confere à atual turbulência um caráter próprio. Não é a economia real que a promove; é a órbita financeira que ameaça provocar uma crise na economia real. A fragilidade da economia brasileira medida pelo déficit em conta corrente (comércio externo de bens, serviços e pagamento de juros da dívida externa) era mais do que conhecida. Porém, depois de ter-se aproximado de 5% do Produto Interno Bruto, esse déficit começou a cair nos últimos meses — e em alta velocidade — por força do aumento dos superávits comerciais. Por ironia, a atual bolha de especulação surgiu no momento exato em que esse déficit já se aproximava de 3% do PIB. E cairá mais, pois a previsão de um superávit comercial de US$ 5 bilhões este ano deverá ser ultrapassada em larga margem. E além de tudo isso, a dívida externa do setor público (de US$ 93 bilhões) não é reconhecidamente de alto risco.

Outro parâmetro que poderia preocupar é o superávit primário das contas públicas (a comparação entre despesa e receita dos governos e empresas estatais, sem contar os juros da dívida interna). Ele mede a capacidade do setor público de pagar seus compromissos. Ora, o país já vinha atingindo a meta de um resultado positivo primário equivalente a 3,5% do PIB, ampliou-a para 3,75% e dá sinais de ter fôlego para chegar aos 4%. Mas bastou a coincidência de temores eleitorais com uma retração financeira mundial provocada pela aceleração da queda da Bolsa de Nova York, para ocorrer uma desmedida aversão ao real.

Todos os parâmetros da pessoa estão bons (batimento cardíaco etc.), mas há o temor de que ela entre em colapso. A imagem está aquém do que ocorre na vida real. Nela a economia está em recuperação, mas poderá ir mal porque há um medo pairando no ar de que ela possa ir mal. Nos mercados financeiros, as profecias tendem a se auto-realizar. Ora, uma alta de mais de 20% do dólar em apenas um mês (como em julho) produz um choque no lado real de uma economia com baixa inflação capaz de concretizar profecias negativas feitas no passado.

Economistas e políticos dedicados a debater a reforma dos organismos multilaterais estão diante de um caso em que seria necessário um socorro muito mais rápido do que o que pode hoje ser dado pelo FMI. Faz clara falta um mecanismo de empréstimo imediato para essas situações. Para que as maldições não se automaterializem. E para que o mundo não viva o absurdo de anunciar: o paciente estava muito bem — mas morreu.


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08/02/2002


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