Polêmica marca aprovação do relatório da MP da Lei da Seca
A comissão mista de deputados e senadores que analisa a Medida Provisória (MP) 623/2013 aprovou, nesta terça-feira (29), o relatório do senador Cícero Lucena (PSDB-PB). A medida, conhecida como MP da Lei da Seca, facilita a quitação de dívidas de produtores rurais atingidos pela estiagem, tem prazo de validade até 15 de novembro e ainda precisa passar pela análise da Câmara e do Senado.
A aprovação do relatório da MP, no entanto, não ocorreu sem polêmica. Um requerimento para retirada de pauta – assinado pelo líder do governo no Congresso, senador José Pimentel (PT-CE), e pelo deputado Júnior Coimbra (PMDB-TO) – chegou a ser apresentado. Por votação nominal, o pedido foi rejeitado por 14 votos a 2.
Júnior Coimbra disse “não ter nada contra os produtores da região Nordeste” – principais beneficiados pela medida. Ele argumentou, porém, que a MP tinha só um artigo e o relatório “a transformou em um texto imenso”, ampliando seu alcance. A ideia da retirada de pauta, segundo o deputado, era permitir uma análise mais profunda do texto.
- A União não resiste a tamanho perdão dessa natureza – argumentou Coimbra.
O senador José Pimentel ponderou que o governo sancionou o projeto de lei de conversão resultante da MP 618/2013, que também trata de dívidas e operações de crédito, com base em um acordo com os líderes do Senado e da Câmara. Ele disse que o acordo, por parte do governo, foi cumprido. Segundo Pimentel, os acréscimos no relatório precisariam ser analisados de forma mais cuidadosa, pois o texto poderia perdoar “algumas fraudes nas dívidas rurais”, como o caso do Fundo de Investimentos do Nordeste (Finor), que levou à extinção da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), em 2001.
Em resposta, Cícero Lucena disse que não aceitava a acusação de “resgatar fraude”. Ele explicou que o artigo sobre o Finor atendia a uma demanda de um grupo de trabalho do Ministério da Integração. Os contratos de recursos que foram considerados mal aplicados, disse o senador, não seriam alcançados pelos benefícios da MP.
- Existem representantes que entendem muito mais de fraude e não são do meu partido – declarou Cícero, que aceitou a retirada do artigo, lembrando que a sugestão era do próprio governo.
O senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) disse que a tentativa do governo de adiar a votação do relatório da MP era uma “manobra inaceitável”. Já o deputado Humberto Souto (PPS-MG) disse que era preciso saber “quem é contra e quem é a favor do Nordeste”. O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) se disse “escandalizado” com o ocorrido. Ele lembrou que o adiamento da votação, prevista para a semana passada, foi acordado de “boa fé”.
- Estou absolutamente perplexo com esse procedimento. Acima disso, temos que ver a situação do Nordeste – ponderou o senador.
Relatório
A sessão de apreciação do relatório havia sido suspensa na semana passada, quando o senador José Pimentel pediu mais tempo para analisar o texto de Cícero Lucena. Ele argumentou que era preciso conciliar o relatório com a MP 618/2013.
- Grande parte do texto apresentado pelo relator tem a consolidação de legislações anteriores e matérias inseridas na MP 618 – apontou o senador, na ocasião.
Na sessão desta tarde, Cícero Lucena explicou que excluiu do relatório da MP 623 o que já estava previsto no texto da MP 618, para evitar dupla legislação. Em relação ao texto original do governo, o relator incluiu entre os beneficiários da MP 623 os contratantes do Programa Reorientação da Pequena e Média Propriedade Rural (Prodesa) – linha de financiamento do Banco do Nordeste do Brasil (BNB) dos anos 1990, que incentiva a reestruturação de pequenas e médias propriedades rurais no Nordeste. Produtores de cana-de-açúcar e etanol também passam a ser beneficiados.
O relatório ampliou o alcance dos municípios atingidos pela medida, com base em critérios sociais, históricos e climáticos – este último envolvendo o volume e o tempo de chuva. Assim, outros municípios atingidos pela estiagem, mesmo fora da região do Semiárido, passam a ser atendidos. Cícero também dispensou a decretação de situação de emergência do município como condição para o agricultor conseguir os descontos previstos na medida. O relator alegou que o agricultor já se encontra em situação muito vulnerável para ter preocupação com a condição em que se encontra seu município.
O relator ainda acatou algumas sugestões para o texto final da MP 623, como a inserção de cooperativas entre os beneficiários da medida, a autorização para Advocacia Geral da União (AGU) atuar na negociação de dívidas rurais, a determinação para os bancos apresentarem extratos da evolução das dívidas – item que figura entre as principais reclamações dos produtores rurais – e questões burocráticas como datas e prazos. Uma das emendas prevê o prazo de até dez anos para a renegociação da dívida.
O presidente da comissão, deputado José Airton (PT-CE), definiu o relatório como “um trabalho bem elaborado e abrangente”, que atende aos anseios dos produtores endividados. O senador José Pimentel também elogiou o relatório, apesar de apontar que o relator “foi além do acordo firmado” com o governo, acrescentando mais municípios e programas para serem beneficiados pela medida. O deputado Manoel Júnior (PMDB-PB), relator-revisor da matéria, também exaltou o trabalho do relator.
- Antes de ser da base do governo e do PMDB, sou paraibano e nordestino – declarou.
Alcance
A MP complementa a chamada Lei da Seca (Lei 12.844/2013), que trata de operações de crédito rural relativas a empreendimentos localizados em áreas atingidas pela seca. A expectativa do governo é que cerca de 100 mil operações sejam alcançadas por esta medida, cujo custo para o Tesouro Nacional está estimado em R$ 126 milhões. De acordo com a proposta, as dívidas contratadas até R$ 15 mil (preço originário) terão desconto de 65%; para valores de R$ 15 mil a R$ 35 mil, o desconto é de 45%; e finalmente, para valores superiores a R$ 35 mil até o teto de R$ 100 mil, o desconto é de 40%.
29/10/2013
Agência Senado
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