Projeto que reserva cotas em universidades aguarda análise da CCJ



Uma das propostas mais polêmicas a serem discutidas pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) na reabertura dos trabalhos legislativos é o projeto de lei que obriga as instituições federais de educação superior, vinculadas ao Ministério da Educação, a reservarem o mínimo de 50% das vagas dos vestibulares dos cursos de graduação para o ingresso de estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas (PLC 180/08 ou PL 73/99, na Câmara).

De autoria da deputada Nice Lobão (DEM-MA), o projeto foi tema de audiência pública conjunta na CCJ, em dezembro de 2008, e agora aguarda inclusão na pauta da comissão, onde tem como relatora a senadora Serys Slhessarenko (PT-MT), cujo voto é pela aprovação da matéria.

Após aprovação da CCJ, o projeto ainda será examinado pelas comissões de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) e de Educação, Cultura e Esporte (CE), que também participaram da audiência pública, bem como pelo Plenário.

Cotas

O projeto estabelece que as instituições federais de ensino técnico de nível médio deverão reservar o mínimo de 50% das vagas de seus cursos, por turno, para estudantes que cursaram integralmente o ensino fundamental em escolas públicas, oriundos também de famílias com renda igual ou inferior a 1,5 salário mínimo.

Essas vagas deverão ser preenchidas por pessoas que se autodeclararem negras, pardas ou indígenas, no mínimo em proporção igual à quantidade de negros, pardos e indígenas existente na unidade da Federação onde estiver localizada a instituição de ensino, com base em projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Caso as vagas não sejam preenchidas de acordo com esses critérios, o percentual remanescente será destinado aos estudantes que tenham cursado integralmente o ensino fundamental em escola pública.

As instituições de ensino contempladas pelo projeto de lei deverão implementar, no mínimo, 25% da reserva de vagas a cada ano. O prazo máximo para o cumprimento integral das disposições contidas no projeto é de quatro anos, contados a partir da data de publicação da lei.

Audiência pública

O debate na CCJ para instrução do PLC 180/08 foi realizado em 18 de dezembro a requerimento de Serys Slhessarenko e dos senadores Demóstenes Torres (DEM-GO), Paulo Paim (PT-RS) e Cristovam Buarque (PDT-DF), com a participação de autoridades e representantes de entidades ligadas à educação, que se dividiram em relação à proposta.

O projeto foi defendido por representantes do Movimento dos Sem-Universidade (MSU), Sérgio José Custódio; da Universidade de Brasília (UnB), Deise Benedito; e da entidade Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro), David Santos, para quem a proposição vai beneficiar pobres, negros e índios, contribuindo para a redução da desigualdade social.

As ressalvas de que o sistema de cotas não garante a implantação de ações afirmativas de inclusão social partiram da professora-titular do Departamento de Antropologia Cultural do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Yvonne Maggie; do advogado da Afrosol-Lux Promotora de Soluções em Economia Solidária, José Roberto Ferreira Militão; do coordenador do Movimento Negro Socialista, José Carlos Miranda; do Movimento Nação Mestiça, Jerson Carlos Leão Alves; e do secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação (MEC), André Lázaro.

Algumas observações foram feitas pelos senadores ao longo da audiência pública. O presidente da CCJ, Marco Maciel (DEM-PE) disse esperar que o Congresso Nacional chegue a um consenso em relação ao assunto. No que diz respeito ao ingresso em universidades públicas, Pedro Simon (PMDB-RS) disse que "o negro deveria ter um carinho especial". Já Eduardo Suplicy (PT-SP) afirmou que "as cotas podem significar algo importante" para o país.

Por sua vez, Ideli Salvatti (PT-SC) lembrou que o projeto resultou do apensamento de várias outras propostas, o que incluiu proposição de sua própria autoria. Tal apensamento, de acordo com a senadora, foi feito de forma equivocada durante a tramitação na Câmara dos Deputados, o que teria produzido um impasse na tramitação da matéria. Mesmo o projeto inicial de Nice Lobão, ressaltou Ideli, é diferente da proposta em debate na CCJ, já que visava reservar no processo seletivo do vestibular uma parte das vagas para quem tivesse determinado coeficiente de desempenho nos estudos.

Divergência

Dias antes da realização da audiência, surgiu uma divergência quanto à forma como foi redigido o texto do projeto, que permitiria interpretações variadas e conflitantes a respeito dos critérios para a reserva de 50% das vagas. Na avaliação de Demóstenes Torres, a redação da matéria é conflituosa e "pode prejudicar o cidadão branco pobre".

- O branco pobre está contemplado, mas não naquela metade em que deveria estar. Na realidade, o negro entra ali também, junto com o índio e o pardo. Então nós precisamos estabelecer bem como vai ser essa divisão. Porque, se ficar obscuro, o grande desprotegido passa a ser o branco pobre que recebe menos de 1,5 salário mínimo. Nós vamos estabelecer uma cota muito grande, que vai contemplar todos os grupos sociais, menos o branco pobre - afirmou em entrevista à época, comprometendo-se a apresentar um texto que recupere o "espírito" da matéria.

Na ocasião, Serys Slhessarenko disse que, do seu ponto de vista, o texto do projeto está claro e que a questão é política. Ela acrescentou que a matéria tramita no Congresso Nacional há quase dez anos porque "muitos não querem que a lei seja aprovada".



06/02/2009

Agência Senado


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