Promessas por votos








Promessas por votos
Eleitores assediados por militantes preenchem fichas de cadastro para ter a garantia de emprego e atendimento médico. Procurador Franklin da Costa afirma que se trata de crime eleitoral e vai pedir à Polícia Federal que investigue o caso

Os eleitores brasilienses estão recebendo promessas de emprego e outros benefícios em troca de votos. Procurados por cabos eleitorais, eles preenchem fichas de cadastro em que fornecem o título eleitor e outros dados pessoais. As denúncias já chegaram ao Ministério Público Federal e serão investigadas pelo procurador eleitoral Franklin Rodrigues da Costa.


Em Taguatinga, moradores da QNG 11 filiaram-se a uma associação chamada Movimento dos Inquilinos do Distrito Federal. No verso da ficha de inscrição, há um santinho do deputado distrital José Edmar (PMDB), que concorre ao quarto mandato. Os moradores foram procurados por dois filiados da associação.‘‘Falaram que se eu me associasse e votasse no Zé Edmar, ganharia um emprego logo depois das eleições’’, diz Célia Rodrigues Ribeiro, 32 anos, mãe de três filhos.

Ela e a vizinha Débora Rodrigues da Costa Leite, 18, aderiram ao Movimento dos Inquilinos do DF na quinta-feira passada. Desempregada há dois anos, Célia topou a oferta dos filiados na hora. Preencheu uma ficha com os dados pessoais (número da identidade, CPF, título de eleitor) em troca de uma carteira de sócio. O documento ainda tem a frase: ‘‘Você tem atendimento garantido no nosso gabinete. Marque pelo telefone 348-8246’’. O número é o do gabinete de José Edmar na Câmara Legislativa.

Também desempregada, Débora não pestanejou. ‘‘Tenho um filho de dois meses para criar e não posso ficar desocupada’’, empolga-se. Outras cinco pessoas ouvidas pelo Correio contaram a mesma história. Elas pediram para não ser identificadas.

O procurador eleitoral Franklin da Costa afirma que o cadastro de eleitores e a promessa de emprego são crimes eleitorais. ‘‘A lei proíbe vantagem pessoal ao eleitor em troca do voto’’, afirma. O procurador acionará a Polícia Federal para investigar as denúncias. ‘‘O voto é livre e as listas são uma forma de coação, uma afronta à democracia’’, comenta. Segundo Franklin, o depoimento das testemunhas serve como prova no processo.

O presidente do Movimento dos Inquilinos do DF, Gerardo Pereira, foi procurado pelo Correio, mas não retornou às ligações. Ele é assessor parlamentar de José Edmar desde 1991. Segundo o deputado, os militantes do Movimento dos Inquilinos não prometem empregos nem lotes em nome dele. ‘‘Para me incriminar tem que haver uma gravação em que eu prometa alguma coisa. Isso não vai existir. Eu nunca prometi lote, não posso dar lote para ninguém. Agora lutar por moradia, eu posso’’, afirma Edmar.

Atendimento dentário
Eleitores de Sobradinho também são assediados por cabos eleitorais. Pelo menos uma abordagem aconteceu em uma clínica odontológica instalada na Escola Classe 12, na quadra 1 da cidade. Em todo o Distrito Federal, existem 30 dessas clínicas funcionando em escolas públicas. Os filhos das famílias beneficiadas pelo Renda Minha têm prioridade no tratamento dentário. O programa atende 43.280 famílias — uma multidão de potenciais eleitores.

Enquanto as crianças são atendidas, os pais preenchem cadastros com dados pessoais e número do título de eleitor. Uma dessas listas, com 33 nomes de eleitores e que circulou na Escola Classe 12 de Sobradinho, foi reproduzida e enviada ao Correio. A lista não revela o nome do candidato.

O segurança José Domingos Penha Xavier Silva, 50 anos, está na lista. ‘‘Eu era o único que não tinha o título na mão e a mulher ficou de ligar para pegar depois’’, conta o torcedor do Vasco. No dia em que assinou a lista, 8 de agosto, José Domingos levava o caçula Douglas, de 7 anos, na garupa da bicicleta para a primeira consulta ao dentista.

O nome da ex-secretária de Educação Eurides Brito, candidata à reeleição como deputada distrital, é citado pelos eleitores que forneceram os dados para a lista. Eles contam que foram orientados por servidores da clínica odontológica que funciona dentro da escola. O cadastro de eleitores é feito sem o conhecimento e autorização dos diretores. Mais cinco pessoas ouvidas pelo Correio confirmam as denúncias de que listas circulam em outras escolas de Sobradinho e também em Planaltina e Brazlândia.

O procurador Franklin Barbosa também considera o caso irregular. ‘‘Ambos estão sujeitos à cassação da candidatura’’, afirma. Os dois distritais também podem ser condenados a pagar multa de até R$ 53.205,00.

O que diz a lei
As normas para as eleições estão previstas na lei federal 9.504, de 30 de setembro de 1997. O artigo 41 proíbe a comercialização do voto — chamada de ‘‘captação de sufrágio’’.

Confira:
O candidato não pode doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, com o intuito de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição.

A pena prevista para esse crime eleitoral é multa, cujo valor varia de R$ 1.064,10 a R$ 53.205,00 (1 mil a 50 mil UFIRs), e cassação do registro ou diploma.


Militância contra a concorrência
Alguns recebem salário mensal e dão duro para aumentar a renda. Outros são voluntários e trabalham por idealismo. Em sua maioria, são jovens os cabos eleitorais que estão ajudando a colorir a cidade com nomes de candidatos

O expediente pode se estender por doze horas ininterruptas. O trabalho é cansativo. Inclui longos períodos em pé, sob o sol, para agitar bandeiras e panfletar. Uns trabalham de graça, outros ganham salários que giram em torno de R$ 200,00. De uma forma ou de outra, o trabalho na política transforma-se em ocupação para milhares de jovens nos meses que antecedem as eleições.

Quem não ganha nada diz que não se arrepende. ‘‘Vale a pena renunciar a algumas coisas por uma causa’’, afirma Maria Lígia Moreira de Souza. Desempregada, 21 anos e moradora do Varjão, Lígia acredita que o esforço de hoje será recompensado. ‘‘Eu poderia estar procurando emprego agora, mas nesse momento acho importante me dedicar à campanha eleitoral’’, emenda.

A rotina dos militantes é parecida. Lígia, por exemplo, acorda cedo. Às 6h30, já está no gramado ao lado do Eixão Norte, próximo à ponte do Bragueto. Tem a missão de agitar uma bandeira até as 10h. Na programação do dia, há ainda panfletagem no Paranoá, nas escolas da Asa Sul e mais ‘‘bandeiraço’’ nas ruas do Plano Piloto. A maratona só termina às 20h — 11 horas e meia de trabalho, considerando um intervalo para almoço.

Os militantes são, em sua maioria, jovens. Alguns têm discurso afiado. ‘‘É preciso investir no Ensino Público, dar melhores condições aos jovens mais humildes na peneira da universidade pública’’, defende Marco Antônio Jovane Barroso Júnior, 20 anos e morador da 406 Norte.

Lígia e Marco Antônio têm em comum o trabalho voluntário. Os dois dedicam-se a campanhas de candidatos do PT. Foram atrás do partido e pediram para trabalhar. Recebem apenas ajuda de custo para o transporte e para o almoço. Essa consciência política, no entanto, não é uma constante entre os militantes. Muitos deles sequer estão afinados com as idéias defendidas por seus candidatos.

É o caso de Francisco das Chagas, 20 anos. Ele reconhece que tem feito da rotina eleitoral apenas um passatempo. ‘‘Rola azaração’’, explica. Ele viu na militância feminina o maior atrativo para trabalhar na campanha do governador Joaquim Roriz (PMDB). Segundo ele, recebe apenas ajuda de custo para alimentação e para o transporte.

Já Silvina Cruz, 33 anos, reconhece que embarcou na campanha da candidata a deputada distrital Eurides Brito (PMDB), no início do mês, por dinheiro, sem seguir um posicionamento político. A militante recebe um salário mensal, além de transporte e refeição. ‘‘Hoje, conheço algumas das idéias da candidata e concordo com elas. Acho que deve haver esse interesse político por parte do militante’’, opina a moradora da 714 Sul.

Provocações
Ser militante exige jogo de cintura. No trabalho de agitar bandeiras e panfletar nas ruas sobram provocações dos motoristas — embora existam também manifestações de apoio. É preciso lidar também com os adversários políticos. A ponte do Bragueto já foi palco de bate-boca entre militantes de candidatos governistas e de oposição. Eles chegam ao local cedo, por volta das 6h30, para tentar conquistar votos entre as pessoas que estão a caminho do trabalho.

Do viaduto na avenida das Nações, nas proximidades da ponte Costa e Silva, vem outro exemplo de como está acirrada a luta por espaço para a propaganda política em Brasília. Candidatos estão pagando militantes para vigiarem as faixas com a propaganda política durante todo o dia. Do contrário, elas são retiradas e rasgadas. ‘‘Se a gente não ficar de plantão, vem gente de outro candidato e arranca tudo’’, explica Fagner Batista de Oliveira, 14, responsável pelas faixas dos candidatos do PT.

O candidato Osório Adriano (PFL) também tem colocado gente no mesmo viaduto, de manhã e à tarde, para vigiar os banners. São duas duplas. Cada uma cuida de um turno. Rafael Oliveira, 23 anos, faz parte de uma delas. À noite, ele trabalha como garçom e descolou há um mês um emprego na campanha do candidato. ‘‘Recebo R$ 200,00 por mês, é uma boa complementação de renda’’, comemora.


Advogados entram em ação
Ciro Gomes pede direito de resposta a acusações de José Serra. Petrobras quer se defender dos ataques de Lula. Não demorou muito para que as assessorias jurídicas dos candidatos a presidente entrassem na campanha eleitoral

A equipe de advogados da Frente Trabalhista (PPS-PTB-PDT) entrou com pedido de direito de resposta ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) do candidato Ciro Gomes pelos ataques sofridos no programa do horário eleitoral gratuito do candidato José Serra (PSDB-PMDB), na noite de terça.

‘‘Pedimos ao TSE que nos dê o mesmo tempo de resposta ao que foi utilizado pela equipe de Serra para ofender o Ciro’’, disse o advogado do PPS, Hélio Parente. Os advogados da coligação também solicitam a suspensão da veiculação pelo programa de Serra de ataques a Ciro, sob pena de o tucano ter de conceder o tempo em dobro de cada ofensa para a resposta do candidato da Frente Trabalhista. Caputo Bastos, ministro substituto do Tribunal, analisará o recurso.

O contra-ataque de Serra veio rápido. Seus advogados, Gustavo Lobo de Carvalho e Eduardo Alckmin, entraram com representação no TSE contra Ciro. O recurso acusa o presidenciável da Frente Trabalhista de participar, indevidamente, de inserções do candidato ao governo de São Paulo, Antonio Cabrera. Os representantes de Serra esperam que os aliados de Ciro no estado percam algumas das inserções a que têm direito. O ministro substituto Peçanha Martins decidirá o caso.

O TSE terá trabalho pela frente. A Petrobras, por meio de seu presidente, Francisco Gros, ajuizou no tribunal pedido de direito resposta para se defender do que considerou fatos inverídicos e difamatórios que lhe foram feitos pelo candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em seu programa nacional. Lula criticou a escolha, pela estatal, de uma empresa de Cingapura para construir uma plataforma marítima de exploração de petróleo. Caputo Bastos analisará o caso.

O QUE DIZ A LEI
O artigo 58 da Lei 9.504 regulamenta o direito de resposta. O candidato que se sentir caluniado ou difamado pode entrar com recurso. Os prazos variam de acordo com a circunstância em que é veiculada a ofensa. Se for no horário eleitoral gratuito, os advogados da vítima têm 24 horas para reclamar direito de resposta. Quando o ataque ocorrer durante a programação normal de tevê ou rádio, o prazo aumenta para dois dias. Na imprensa escrita, o tempo alonga-se até 72 horas após a agressão.


As jogadas de Ciro
Candidato planejou um dia que começaria com a adesão de Tasso Jereissati e terminaria com uma vitória da Seleção em sua homenagem na capital do Ceará. Não combinou com o adversário: o Paraguai venceu o jogo

O presidenciável Ciro Gomes (PPS-PDT-PTB) calculou o dia de ontem meticulosamente. De uma só vez, comemoraria a adesão oficial do ex-governador do Ceará Tasso Jereissati à sua candidatura e o apoio dos pentacampeões da Seleção Brasileira de futebol, que jogaria em Fortaleza — seu principal reduto eleitoral — uma partida amistosa contra o Paraguai. Mas o Brasil perdeu o jogo e estragou parte da festa planejada por Ciro. Mesmo assim, ele contabilizou o apoio de Tasso e de alguns atletas, entre eles Cafu, Kaká e Roberto Carlos.

Foi Tasso quem negociou com o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) que o primeiro jogo da Seleção após a conquista do penta fosse em Fortaleza. Combinado o primeiro lance, o governador desembarcou logo pela manhã da candidatura do seu companheiro de partido, José Serra. Numa carta enviada ao deputado federal Pimenta da Veiga (PSDB-MG), coordenador-geral da campanha de Serra, ele argumentou que Ciro é seu ‘‘aliado natural’’ na política cearense. Por isso, se sentia impedido de participar da campanha presidencial do seu próprio partido, porque ficaria obrigado a se posicionar contra o candidato do PPS.

Concluído o segundo lance, Tasso imediatamente integrou-se à comitiva de Ciro que visitou os jogadores da Seleção em um hotel de Fortaleza. Ele posou para fotógrafos e cinegrafistas ao lado do candidato, que recebeu de Kaká uma camisa com o número 23, número do jogador na Copa e também da sua candidatura. Tasso também foi presenteado. Recebeu de Cafu uma camisa de número 10, autografada por todos os pentacampeões mundiais.

O novo adversário de José Serra ainda tentou minimizar o lado político do evento esportivo. ‘‘Esta homenagem partiu dos próprios jogadores. Não existe aproveitamento político nenhum’’, afirmou Tasso, que é amigo pessoal do cartola Ricardo Teixeira. ‘‘Esses garotos deram o exemplo de que um trabalho obstinado, feito com humildade, mas com muita confiança na sua própria força, pode fazer o mundo render-se em aplauso e admiração’’, disse Ciro, em tom de discurso, após receber as homenagens e presentes da Seleção. À noite, a Fifa condenou a mistura de futebol e política, mas ressaltou que o Brasil não seria punido por se tratar de um amistoso.

Adversário
Como diria Garrincha, Tasso e Ciro ‘‘não combinaram com o adversário’’. Veio o jogo e a Seleção perdeu para o Paraguai por 1 a 0. Frustrada parte da festa, o técnico Luiz Felipe Scolari, na sua última entrevista como comandante da Seleção, reconheceu a jogada de Ciro, Tasso e Ricardo Teixeira. Ao ser indagado sobre a entrega de camisas aos candidatos, ele revelou que tudo foi combinado entre a CBF e os dois políticos. ‘‘Sou funcionário da CBF. Se o teu chefe te pedir para fazer uma redação, você vai fazer’’, respondeu a um jornalista.

Em Montevidéu, o presidente Fernando Henrique Cardoso definiu o desembarque de Tasso Jereissati da campanha presidencial de José Serra como uma punhalada “pela frente’’. O presidente do PSDB, deputado federal José Anibal (SP), lamentou a decisão de Tasso. E o deputado Pimenta da Veiga (MG) criticou o colega de partido. ‘‘Ele será julgado pelo futuro, e acredito que este julgamento não será favorável.’’ O maior golpe veio de uma das principais aliadas do ex -governador cearense no PSDB: Renata Covas, filha do ex-governador de São Paulo Mario Covas, que defendia publicamente que fosse Tasso e não Serra o candidato do partido à Presidência. “Não era o momento de Tasso fazer isso”, disse ela. O governador tentou se defender das críticas dos companheiros de legenda. ‘‘Sou do PSDB e quero ficar no partido até o fim’’, declarou.

FIDELIDADE GOIANA
Aliados de José Serra começam a explicar aos eleitores em praça pública por que continuam ao seu lado. ‘‘Trago o Serra aqui, mesmo ele estando em baixa nas pesquisas. Alguns me perguntam: será que ele não vai te atrapalhar? Não atrapalha. Se tivermos um presidente desastrado, tudo pode desabar’’, discursou o governador candidato Marconi Perillo (GO), num comício com 7 mil pessoas em Alexânia (GO). ‘‘O Serra não envergonha ninguém. Tenho orgulho dele’’. Quando Serra prometia terminar a duplicação da estrada Brasília-Goiânia, faltou luz por duas vezes. ‘‘Tem alguém da oposição desligando o fusível’’, brincou.


Imagem da campanha
Cabo eleitoral da ex-secretária de Educação do DF, Eurides Brito, derrapa nas leis de respeito ao trânsito. Ao guarda, só resta cumprir o seu dever e multar o simpatizante da candidata a uma vaga na Câmara Legislativa .


Desemprego sobe, mas juro não cai
Apesar do aumento de 21% na taxa de desemprego, entre julho deste ano e julho do ano passado, BC manteve juros em 18% ao ano. A renda média do brasileiro encolheu 4,3% no primeiro semestre. A inflação bateu novo recorde

O Comitê de Política Monetária (Copom) não se sensibilizou com os claros sinais de desaquecimento da economia. Por unanimidade, decidiu ontem manter em 18% ao ano a taxa básica de juros, a Selic. Para amenizar as críticas do setor produtivo, que pedia a imediata redução dos juros, o Copom avisou que há uma tendência de baixa na taxa. É o que, tecnicamente, se chama de viés de baixa. Para justificar tal decisão, o Copom divulgou uma tímida nota: ‘‘As incertezas na economia aumentaram desde a última reunião do Copom. Entretanto, fatos recentes reforçam a perspectiva de melhoria no cenário, confirmando-se previsão de inflação para 2003 abaixo da meta. Diante disso, o Copom decidiu, por unanimidade, manter a taxa Selic em 18% ao ano com viés de baixa.’’

Ninguém no mercado acredita, porém, que o Copom usará o viés de baixa até sua próxima reunião, em 17 e 18 de setembro. ‘‘Há indicadores ruins demais para que os juros caiam a curto prazo’’, afirmou o sócio-diretor do Banco Stock-Máxima, André Petersen. ‘‘O barril do petróleo bateu nos US$ 30, o que obrigará o governo a reajustar os combustíveis. Há, ainda, uma grande demanda por dólar e dificilmente as linhas externas de financiamento voltarão na velocidade desejada pelo governo. Para piorar, a inflação continua apontando para cima’’, disse o analista. ‘‘As taxas de juros só cairão quando a pressão sobre os preços do dólar diminuir e o risco-Brasil baixar’’, emendou o diretor de Tesouraria do Banco Brascan, Luiz Fernando Romano.

Recorde negativo
A decisão do Copom de não mexer na Selic levou o Brasil a manter um recorde nada agradável: o de ostentar a maior taxa real (descontada a inflação) de juros do mundo. Foi essa, inclusive, a principal razão para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ter registrado, em julho, desemprego de 7,5% na População Economicamente Ativa (PEA) do país. O índice é 21% maior que os 6,2% de julho do ano passado. E, de acordo com a responsável pela área de emprego do IBGE, Shyrlene Souza, foi o segundo pior mês de julho desde a criação do Plano Real, em 1994. Só perdeu para julho de 1998, quando o desemprego chegou a 8%, em meio às crises da Ásia e da Rússia, quando o governo foi obrigado a dobrar as taxas de juros.

Junto com o aumento do desemprego, o IBGE constatou a queda na renda dos trabalhadores. O dado, no entanto, é defasado em um mês. Ou seja, em junho, o salário médio dos brasileiros encolheu 0,5% em relação a maio e 3,1% quando comparado a junho de 2001. No acumulado do primeiro semestre, a renda ficou 4,3% menor frente ao mesmo período do ano passado. ‘‘Infelizmente, não vemos nenhum sinal de reversão no desemprego e de recuperação na renda média do trabalhador, que fechou junho em apenas R$ 793,61’’, afirmou Shyrlene.

Para completar as más notícias do dia, a Fundação Getúlio Vargas (FGV) divulgou inflação recorde de 2,26% medida pelo Índice Geral de Preços-10, calculado entre os dias 11 de julho e 10 de agosto. Os preços no atacado (indústria), com 60% de peso no índice, aumentaram 3,13%, explicitando que os consumidores arcarão com mais reajustes no varejo nas próximas semanas. ‘‘Está cada vez mais difícil apostar na queda dos juros’’, reforçou Luiz Fernando Pedrinha, administrador de investimentos da Banif-Primus Asset Management.


O eleitor quer saber

O que fará para melhorar a escola pública e frear o comércio em que se transformou o ensino particular?
Temos que valorizar o professor dando-lhe salários dignos e condições de trabalho. Não podemos fechar o diálogo entre o governo e os sindicatos. Deveremos designar o Secretário de Educação e os diretores de escolas, ouvindo o corpo docente e os pais de alunos. Melhorando o ensino público, a demanda do ensino particular diminuirá e haverá redução nas mensalidades.

CARLOS ALBERTO TORRES (PPS)
Em nosso governo implantaremos a Universidade Aberta e a Universidade Tecnológica do Distrito Federal, assegurando novos espaços para o estudante das famílias de baixa renda. Preservaremos o sistema de contratação por concursos públicos e os planos de carreira.

GERALDO MAGELA (PT)
A principal medida é colocar um fim às greves dos professores e auxiliares em educação. Quero elaborar um Plano de Carreira que preserve o salário dos profissionais. Outra medida é retomar a gestão democrática nas escolas, retornar com a Escola de Aperfeiçoamento dos Profissionais de Educação, a Bolsa-Escola, Poupança-Escola e Cesta Pré-Escola.

GUILHERME TROTTA (PRTB)
Com a municipalização das cidades satélites, sem sombra de dúvidas o número das escolas públicas irá se multiplicar e dará mais condições àqueles que não podem pagar as escolas particulares.

ORLANDO CARIELLO (PSTU)
É preciso destinar mais verbas à educação, remunerar melhor professores e funcionários das escolas, democratizar a gestão do ensino e não destinar dinheiro público para as escolas privadas, só para o ensino público.

RODRIGO ROLLEMBERG (PSB)
Adotaremos a progressiva educação integral, criando atividades regulares de cultura, esporte e lazer. Vamos informatizar toda a rede pública de ensino, retomar a eleição direta para os diretores das escolas e valorizar os professores, aumentando progressivamente seus salários, com a adoção do plano de carreira. A melhor forma de conter o crescimento do ensino privado sem qualidade é oferecer qualidade no ensino público.


Era uma vez um Lula erudito
Rui Barbosa faz a primeira campanha política de verdade, com povo na rua e candidato de oposição. Defende operários e perde a eleição

Eu sou dos sacrifícios. Se fosse para a vitória não me convidavam, nem eu aceitaria; mas como é para a derrota, aceito. A idéia não morrerá pelo meu egoísmo. Perderemos, mas o espírito da resistência civil se salvará. E assim, com uma sinceridade acachapante, Rui Barbosa, um metro e cinqüenta de altura, corcunda, 48 quilos, minúsculo no tamanho e gigante na oratória, começava a mudar a história das eleições no Brasil. Era 3 de outubro de 1909.

Naquela tarde, o nordestino nascido baiano em 1849 anunciou que seria candidato da oposição à Presidência da República. Foi para o meio do povo, fez comício e comandou a primeira campanha com participação popular. Defendia o voto secreto e o direito dos operários, esbravejava contra o coronelismo e as fraudes eleitorais. Perdeu o pleito para o marechal Hermes, mas não descansou.

Tentou ser reconhecido pelas urnas outras três vezes, mas fracassou. No total, das seis disputas que participou perdeu quatro. A verve oposicionista, a paixão por mudanças, o signo e a dificuldade com as urnas unem Rui Barbosa a Luiz Inácio Lula da Silva.

O erudito de bigode era escorpiano como o metalúrgico, que volta e meia escorrega no português. Rui, devorador de livros, amante do cinema, da carne de moela e de fígado, queria a redução da jornada de trabalho — o assunto está no programa de governo de Lula.

O petista é ídolo entre os operários paulistas e cariocas. Rui também era. Lutou contra a escravidão, defendeu a licença-maternidade e o fim dos salários desiguais para homens e mulheres. Fez isso num tempo em que o voto feminino e o voto de analfabeto eram sonhos.

Rui estava à frente de seu tempo e por isso sabia que a política não lhe seria generosa. Até ali, a República engatinhava, mais parecia uma monarquia civil, com revezamento silencioso dos poderosos e desprezo absoluto pelo povo.

Rui Barbosa descobriu o povo. Fez comícios, viagens e debates. Encheu praças com homens de cartola e estandartes de papel. Inaugurou a mania dos panfletos e das faixas, inventou o marketing. Seu adversário não era dado a esses modernismos.

O marechal Hermes da Fonseca preferia o tititi, os encontros reservados, não se metia no meio do populacho. Carregava o apoio do Exército, do governo e da maioria dos governadores. Para enfrentá-lo, Rui Barbosa, abolicionista que três décadas antes peitara fazendeiros contrários ao fim da escravidão, criou o civilismo.

Inicialmente o civilismo se limitava a uma campanha contra o militarismo nas eleições, mas logo se transformou na primeira janela para a cidadania. A classe média e os trabalhadores urbanos apoiaram Rui Barbosa. Pregava o voto secreto, o fim do analfabetismo, a reforma da Constituição e o fim da interferência do Exército na vida civil.

Ex-monarquista, fluente no inglês, no francês e no alemão, jornalista de letras impecáveis, Rui sabia que estava condenado à derrota, que suas plataformas eram liberais demais para uma elite gananciosa demais.

‘‘Pela primeira vez o povo sabia em que ia votar e em quem ia votar. Tinha a sensação de que poderia escolher seu candidato. A nação acordava para a única eleição verdadeiramente nacional realizada na República’’, escreveu Hélio Silva, um dos maiores historiadores do país, em seu livro A História da República Brasileira.

As eleições aconteceram no dia 1 de março. A população estava entusiasmada, esperava-se um grande comparecimento às seções eleitorais. Mas, mesmo no Rio, na capital da República, a roubalheira campeou. Das 96 seções eleitorais, apenas 25 funcionaram. Até mesmo o presidente do Congresso, Quintino Bocaiúva, adepto de Rui, tentou votar e não conseguiu.

Chamado de Águia de Haia por sua brilhante participação na Conferência da Paz em Haia, em 1907, Rui Barbosa denunciou, esperneou, mas não conseguiu reverter o resultado. ‘‘Não nasci para ganhar, não nasci cortesão, não quis ser da ditadura, não o serei das baionetas’’, disse o fã de Chaplin, pouco antes de morrer em 1923, quando o povo carregou seu caixão nos ombros.

Frases
O que o pobre precisa é deixar de ser pobre. Com os grandes e fortes está o lucro, com os fracos e humildes, o perigo.
Não somos uma nação em estado de indigência. Carecemos de boa administração, firme e íntegra, circunspeta e audaz


Artigos

Loteamento eleitoral
Ana Dubeux

Nas mãos de políticos descompromissados com a qualidade de vida e com o futuro da cidade, as terras públicas se transformaram em moeda eleitoral. Em troca de voto, convidam-se as pessoas a entrar na cidade e aqui permanecer, a despeito de ter ou não condições de oferecer emprego, habitação e infra-estrutura. Há sempre uma árvore e uma ponte para se fazer de teto e parede. E um quilômetro quadrado, que hoje é o mais povoado do país, para dividir com mais uma família que chega com esperança de conseguir um lote.

E assim, o principal legado de JK está se esvaindo, escorrendo entre os dedos de cada cidadão brasiliense sem que ele se dê conta disso. O troco vem em forma de voto para aqueles que leiloam em pequenos grupos a nossa herança.

O passo seguinte é legalizar o ilegal. Foi assim com a invasão da Estrutural, um emblema da situação atual de descaso com a preservação da cidade. A Câmara Legislativa aprovou a fixação. E o governo liberou os aliados para efetivar a maior favela do DF. São cinco mil famílias iludidas por um pedaço de chão, incrustadas em uma área de preservação ambiental, pondo em risco o abastecimento de água de Brasília e assumindo risco de morte ao conviver com um lixão e um poliduto.

Invasões pipocam pelos quatro cantos, e o governo se dispõe a legalizar todas. Só as localizadas em áreas urbanas no Distrito Federal somam aproximadamente 500km². Um espaço maior que o ocupado pela região administrativa de Brasília, que tem 473km². Isso significa que 40% de todo o espaço urbanizado do DF não tem registro em cartório. Foi ocupado e transformado em favelas, vilas, condomínios e assentamentos irregulares.

O governo Joaquim Roriz é refém do próprio populismo. A política do GDF em relação à invasão do Itapuã — área entre Sobradinho e Paranoá onde moram 20 mil famílias — desmascara os supostos propósitos sérios da política habitacional anunciados na campanha de 1998. Para afastar-se da pecha de estimulador das invasões, Roriz prometeu não mais doar lotes. Não só não cumpriu a promessa como estimulou a criação de novas favelas. No mês passado, ele prometeu legalizar o Itapuã. Legalizar o ilegal.

O esforço de alguns técnicos do governo, que fizeram de tudo para dar um verniz sério à política habitacional, corre o risco de ser desmoralizado.


Editorial

IMPOSTO DE RENDA

Causou espanto a divulgação da existência de erro na lei que corrigiu a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física. O Congresso Nacional dispõe de um corpo técnico altamente qualificado em questões tributárias e técnica legislativa. O governo, que acompanhou com lupa os detalhes da tramitação da medida provisória, também conta com profissionais de respeitável calibre na matéria. Apesar da assessoria de alto nível, descobre-se, sete meses depois de aprovada a lei, falha que lhe restringe a validade até 31 de dezembro.

Cria-se, com isso, vácuo jurídico. Para contorná-lo, os especialistas apontam duas saídas. Uma: a volta da tabela anterior, que comete enorme injustiça com o contribuinte de todas as faixas. A outra: o não recolhimento do Imposto de Renda, cuja arrecadação atingiu os R$ 4,3 bilhões em 2001. Ambas, há de convir, inaceitáveis.

Causa espanto, também, a celeuma que se estabelece em torno do assunto que só caberia se o erro resultasse de má-fé. Tudo indica não ser esse o caso. A nação sabe que a intenção do legislador ao aprovar a lei era a de corrigir a tabela por prazo indefinido. Constatado o lapso, o que se admite discutir é, quando muito, o instrumento mais fácil para efetuar a necessária correção atendendo ao espírito das discussões legislativas levadas a cabo durante o processo.

Cabe medida provisória. Cabe, também, projeto de lei. Seja qual for o instrumento, não resta nenhuma dúvida sobre a urgência de respeitar as regras aprovadas. Nas sentenças emanadas do Poder Judiciário, o espírito do processo legislativo constit ui matéria fundamental na apreciação dos efeitos jurídicos da lei. Essa é doutrina mansa e pacífica.

Romper com a justa interpretação é fazer recair sobre o contribuinte ônus indevido. Hoje, está isento quem tem rendimentos de até R$ 1.059 mensais. Pela regra antiga, o limite é de R$ 900. A alíquota máxima é de 27,5%. A intenção do legislador foi, a partir de 2003, reduzi-la a 25%.

A sociedade espera que o Legislativo e o Executivo se entendam com urgência sobre o direito legítimo posto, momentaneamente, em risco. Não há necessidade de demora nem discussões semelhantes às registradas nos avanços e recuos observados durante a tramitação da medida provisória que deu origem ao novo pacto contributivo. O respeito a ele se impõe.


Topo da página



08/22/2002


Artigos Relacionados


Aberta a temporada de promessas

Orçamento limita promessas

Agripino lembra promessas de campanha

Artigo: Mil dias de promessas e frustrações

Gymnasiade têm jovens promessas e medalhistas olímpicos

Heráclito: promessas feitas aos piauienses não são cumpridas