Revolta contra Garotinho








Revolta contra Garotinho
Falta de dinheiro na campanha do candidato do PSB à Presidência da República provoca a quebra de promessas com aliados que disputam cargos estaduais e estimula críticas dentro do próprio partido

O clima dentro do PSB para presidenciável Anthony Garotinho está cada vez pior. Sem recursos de campanha, ele não tem como cumprir a promessa que fez de ajudar financeiramente os candidatos a governador e está se indispondo com os correligionários. Conseqüentemente, começa a perder palanques em estados importantes.

Sua agenda, que prioriza encontros com o público evangélico, também é motivo de críticas. A cúpula do PSB quer mudar sua campanha e o convocou para uma reunião de emergência hoje, em Brasília (leia entrevista nesta página). Estacionado no quarto lugar de todas as pesquisas de intenção de voto, Garotinho diz que não pretende renunciar. ‘‘Minha candidatura é fato consumado’’, afirmou ontem, em Barra do Piraí (RJ).

A revolta contra Garotinho se explicitou ontem na Bahia. A candidata ao governo do estado pelo PSB, Lídice da Mata, vai oficializar sua renúncia no próximo sábado. Isso pode dar início ao chamado ‘‘efeito manada’’, conforme definição do vice de Garotinho, o deputado federal José Antônio Almeida (MA). Ele calcula que 14 dos 25 candidatos a governador pelo PSB não possuem qualquer chance nas eleições. Sem o apoio financeiro prometido por Garotinho, eles poderiam simplesmente abandonar suas candidaturas. Um outro indício do ‘‘efeito manada’’ vem de São Paulo, onde o candidato a governador do PSB, Jacob Bittar, também poderá renunciar, segundo disse ontem o líder do partido na Assembléia Legislativa paulista, deputado Pedro Mori.

Os assessores mais próximos de Garotinho reconhecem que a revolta contra ele se resume à falta de recursos financeiros. Na Bahia, o prefeito de Itabela, Dino Pereira (PSB), contou ao Correio que a situação de Lídice da Mata ficou insustentável por causa disso. ‘‘Ela se prontificou a ser candidata por causa de um acordo com o senhor Anthony Garotinho. Infelizmente, ele apenas deu tchau. Não responde os telefonemas dela e nem mandou um centavo sequer para ajudar na campanha.’’

Para a equipe de Garotinho, os candidatos a governador deveriam ter fôlego próprio. O candidato a vice, José Antônio Almeida, acredita que a direção do partido deve reavaliar os critérios de repasse de recursos para as candidaturas nos estados. ‘‘A promessa de ajuda estava condicionada à arrecadação. Se ela não está vindo, essa ajuda precisa ser redimensionada.’’ Para ele, os candidatos com viabilidade eleitoral nos estados deverão ter preferência na redistribuição de recursos eventualmente arrecadados pela equipe de Garotinho.

Crise no DF
O candidato do PSB ao governo do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg, também está insatisfeito com o descaso de Garotinho à sua candidatura. Ele também não recebeu nenhum recurso da campanha nacional, mas pretende concentrar suas críticas no campo político. ‘‘Desde o início, nossa candidatura foi uma vontade do PSB local. Nunca dependeu do Garotinho’’, afirmou. ‘‘E ele só sabe fazer política dentro da religião. Eu, não. Para mim, igreja é lugar de rezar, não de fazer campanha’’, disparou.

Os problemas na campanha de Garotinho reacenderam as críticas da ex-prefeita de São Paulo e candidata à reeleição para deputado federal pelo PSB, Luiza Erundina. Ontem, em Recife, ela afirmou que ‘‘já passou do tempo’’ de Garotinho desistir da candidatura. Erundina sempre foi contrária ao projeto presidenciável do ex-governador do Rio de Janeiro. Para Erundina, a campanha do PSB ‘‘não tem densidade política’’ e o partido deveria liberar os diretórios estaduais para que definissem os apoios que melhor lhes conviessem. Ela também criticou o discurso evangélico de Garotinho. Para Erundina, o PSB está sendo ‘‘usado’’ pelo candidato para um projeto político pessoal, que destoa dos princípios socialistas da legenda.


Bornhausen sabota Serra
Presidente do PFL segue os passos do candidato do governo para tentar desmontar alianças dos governistas. O tucano também tem problemas com peemedebistas na Paraíba

Os movimentos parecem até um nado sincronizado. Brasília, 14 de julho, domingo — o candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, participa de comício na Ceilândia ao lado do deputado Paulo Octávio (PFL-DF), candidato ao Senado. Brasília, 17 de julho, quarta-feira — o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), reúne-se com o deputado e diz que o lugar dele é ao lado do candidato da Frente Trabalhista, Ciro Gomes (PPS). Paulo Octávio balança e diz que a maioria do PFL local deseja apoiar Ciro.

Curitiba, 19 de julho, sexta-feira — Serra e a candidata a vice, Rita Camata, reúnem-se com governador do Paraná, Jaime Lerner (PFL). Curitiba, 22 de julho, segunda-feira — o senador Geraldo Althoff (PFL-SC), ligado a Bornhausen, organiza um jantar com deputados do PFL paranaense em apoio a Ciro. Consegue o apoio de quatro dos cinco deputados federais do PFL no estado.

Esses ensaios mostram a blitz que Bornhausen vem fazendo para que o PFL siga em bloco no apoio a Ciro. Ontem, ele foi a São Paulo tentar levar para o palanque de Ciro o senador Romeu Tuma (PFL), que disputa a reeleição e apóia Serra. Tuma não respondeu. Sabe que precisa do governador Geraldo Alckmin (PSDB) para a sua campanha.

São poucos os estados em que o PSDB tem força para pressionar o PFL. No Mato Grosso do Sul, por exemplo, a aliança PSDB-PMDB-PFL está coesa em torno da candidatura da deputada Marisa Serrano (PSDB) para o governo estadual. Mas o secretário-geral do PFL, Saulo Queiroz, levou seu partido a apoiar Ciro.

No Paraná, Lerner e o candidato a governador pelo PSDB, Beto Richa, não têm esse poder. ‘‘Estamos arrebanhando a companheirada para fazer a campanha de Ciro. Somos o autêntico PFL que busca seu espaço’’, comenta o deputado Abelardo Lupion (PFL-SC), um dos que atendeu aos apelos de Bornhausen desde a primeira hora. ‘‘Lerner não foi ético com o Bornhausen. Quando tínhamos a Roseana Sarney candidata, ele já estava com o Serra’’, completa.

Enquanto Bornhausen segue os passos de Serra, tentando tirar o PFL do palanque do PSDB, o PT de Luiz Inácio Lula da Silva tenta arrebanhar o PMDB insatisfeito com a coligação estadual. O primeiro alvo foi a Paraíba, onde Serra já esteve com o candidato a governador pelo PSDB, Cássio Cunha Lima. O próximo alvo será Santa Catarina, onde o candidato a governador pelo PMDB, Luiz Henrique da Silveira, tem reclamado da proximidade de Serra com o governador Esperidião Amin (PPB), candidato a reeleição.

OS PROBLEMAS

Distrito Federal
Paulo Octávio e José Roberto Arruda, estrelas do PFL local, decidem na sexta-feira se seguirão mesmo para a campanha de Ciro.

Mato Grosso do Sul
O secretário-geral do PFL, Saulo Queiroz, tirou o PFL local do palanque de Serra.

Paraná
Das estrelas do PFL no estado, apenas o governador Jaime Lerner e um dos cinco deputados federais estão na campanha de Serra.

Paraíba
O PMDB, aliado de Serra no plano nacional, fechou apoio a Luiz Inácio Lula da Silva.


PFL em dúvida sobre Ciro
Partido decide amanhã quem irá apoiar na campanha presidencial. Direção nacional quer Ciro Gomes, mas PSDB local pressiona para manter pefelistas com Serra. PPS não aceita dividir palanque

O PFL do Distrito Federal tentará resolver amanhã a complicada equação em que se transformou a possível adesão à campanha de Ciro Gomes (PPS). Os 21 membros da executiva regional do partido se reunirão pela manhã para avaliar as conseqüências de um eventual apoio ao candidato do PPS. No encontro, os pefelistas devem decidir se o partido fará campanha para Ciro, permanecerá ao lado de Serra ou liberará cada filiado para escolher um dos dois candidatos.

Para cada uma das possibilidades, há vantagens e problemas. Um eventual apoio a Ciro atenderia ao pedido do presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), que tenta esvaziar palanques de Serra em vários estados. Ao aderir à campanha do candidato do PPS, os pefelistas também poderiam se beneficiar do crescimento de Ciro nas pesquisas e do bom desempenho que o ex-ministro da Fazenda costuma ter entre eleitores de Brasília.

Ocorre que uma eventual debandada do palanque de Serra provocaria abalos na Frente Brasília Solidária, coligação de PFL, PSDB e PMDB que apóia a candidatura de Joaquim Roriz à reeleição. A deputada federal Maria de Lourdes Abadia (PSDB), candidata a vice de Roriz, avisou que os tucanos podem deixar de fazer campanha para os candidatos pefelistas se o apoio a Ciro for confirmado.

Outra dificuldade a ser superada é a posição do PPS de Brasília. Em reunião realizada na terça-feira, dirigentes do partido firmaram entendimento de que um eventual apoio dos pefelistas é importante para a campanha de Ciro, mas não admitirão dividir o palanque do presidenciável com candidatos do PFL.

Pressão
‘‘Não podemos impedir que o PFL tome a posição de apoiar Ciro Gomes. O apoio fortaleceria a candidatura de Ciro, fortaleceria a minha candidatura e enfraqueceria a de Roriz. Mas nós da Frente Trabalhista (PPS e PDT) não aceitamos que os candidatos do PFL subam no nosso palanque’’, afirmou o candidato do PPS ao governo, Carlos Alberto Torres.

Dirigentes do PFL admitem que a decisão é complicada e evitam arriscar prognósticos sobre o resultado da reunião. ‘‘O assunto é delicado porque a coligação do PFL em Brasília apóia Serra. Conversamos com pessoas ligadas ao Ciro, mas há pressão da Abadia e do Pimenta (da Veiga, coordenador da campanha de Serra)’’, disse Paulo Octávio, presidente regional do PFL.

Um indício a favor de Serra, porém, é a possível participação de dirigentes do PSDB na reunião da executiva do PFL. A deputada Maria Abadia informou que conversou com Paulo Octávio e acertou uma visita à reunião do PFL. No encontro, ela pretende fazer um apelo aos pefelistas para que permaneçam na campanha de Serra. ‘‘Já que estamos todos com Roriz, é importante para a coligação que fiquemos juntos também em torno de Serra’’, argumentou.

A candidata a vice do PSDB terá trabalho para convencer membros do PFL simpatizantes de Ciro. Pelas contas do secretário-geral do PFL, Flávio Cury, a maioria dos candidatos a deputado distrital do partido querem fazer campanha para o candidato do PPS.

Cury defende apoio a Ciro. ‘‘Não fizemos coligação com o PSDB para apoiar Serra. Nosso compromisso é com Roriz’’, justificou. O dirigente também não vê problemas na posição do PPS. ‘‘Não queremos subir no palanque do Carlos Alberto. Podemos montar nosso palanque e convidar o Ciro’’, sugeriu.


Roriz ataca Rollemberg
Governador insinua em discurso que candidato do PSB é usuário de maconha. Em recado para o concorrente Benedito Domingos, Roriz disse também que não tinha interlocutor com evangélicos

O governador Joaquim Roriz, candidato à reeleição pelo PMDB, retomou o hábito de atacar adversários políticos em discursos. Durante almoço com um grupo de pastores em Ceilândia, ele ofendeu um de seus opositores na corrida rumo ao Palácio do Buriti. Roriz insinuou que o deputado distrital Rodrigo Rollemberg (PSB) é usuário de maconha.

Rodeado por 200 evangélicos, o governador comentava o quadro pré-eleitoral. ‘‘Se você olhar qualquer pesquisa que está aí, tá eu lá com 58% (aplausos da platéia). O PT tá com 17%. Aquele rapaz, aquele que gosta de maconha, como é que ele chama? (algumas pessoas gritam: Rollemberg!). É... o Rollemberg tá com 6%. Benedito tá com 5%. E tem o Carlos Alberto, que está com 1%’’, disse Roriz. A última pesquisa divulgada pelo instituto Soma, publicada segunda-feira no Jornal de Brasília, apresenta números próximos aos citados pelo governador: Roriz (53%), Magela (18%) e Rollemberg (7%). Logo após o discurso, o governador foi orientado por assessores para não dar entrevistas.

Rodrigo Rollemberg mostrou-se surpreso com a declaração de Roriz. Ele acredita que o governador já agiu de forma semelhante com a sua vice, Maria de Lourdes Abadia (a quem chamou de ‘‘vadia’’ em 1994 durante discurso em comício), e com o aposentado Marinaldo Nascimento, chamado de ‘‘crioulo petista’’ em janeiro.

‘‘Não sei a quem o governador se referiu, mas mostra que ele está desequilibrado e despreparado para governar o Distrito Federal’’, comentou Rollemberg. O candidato do PSB disse que não levará o caso à Justiça. E evitará trocar agressões verbais com Roriz. ‘‘Minha campanha será feita com propostas, com a discussão de idéias. Não vou partir para a baixaria’’.

O procurador regional eleitoral Franklin da Costa classificou a atitude do governador como um crime de calúnia. ‘‘Ele atacou a honra de uma pessoa. Seria o caso do candidato ofendido procurar o Ministério Público para mover um processo’’, sugere. ‘‘O Rollemberg, por exemplo, poderá exigir que o governador prove que está falando a verdade’’, completa. Prevista no artigo 324 do Código Eleitoral, a pena para o crime de calúnia é de seis meses a dois anos de detenção.

O ataque de Roriz a Rollemberg ocorreu durante almoço na Confederação Brasileira da Pastores, em Ceilândia. Ao lado dos deputados federais Paulo Octávio, candidato ao senado pelo PFL, e Tadeu Filippelli (PMDB), que disputa a reeleição, Roriz ouviu dos líderes evangélicos a promessa de apoio para as eleições de outubro.

Para conquistar a simpatia do rebanho evangélico, Roriz prometeu criar um canal direto de negociação com os pastores. E ainda mandou um torpedo para o vice-governador Benedito Domingos, evangélico e candidato ao Buriti pelo PPB. ‘‘Quanta coisa eu poderia ter feito para os evangélicos, mas eu não tinha ninguém para trazer vocês para conversar. Agora são vocês que vão me telefonar, que vão dizer que precisam falar comigo’’, discursou.

‘‘Nós temos o compromisso de ir para as ruas ganhar as eleições. É com muita satisfação que apoiamos Roriz’’, comentou o pastor Adalino Inácio Sobrinho, presidente da Federação Brasiliense de Pastores e Igrejas Evangélicas (Febraiev), entidade que representa cerca de 25 mil evangélicos no Distrito Federal.

‘‘Vamos arregaçar as mangas e buscar votos para o governador’’, garantiu o pastor Carlos Calheiros, da igreja Missão Independente. ‘‘Sou amigo do outro candidato (Benedito Domingos) há mais de 30 anos. Mas temos um compromisso firmado há mais de seis meses pela reeleição de Roriz’’, completou o pastor Maurílio Silva, membro do Conselho Fiscal da Confederação Brasileira de Pastores.


TRE recebe mais de cem denúncias em 13 dias
Em apenas 13 dias, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) recebeu 128 denúncias de propaganda eleitoral irregular. Levantamento não-oficial do tribunal mostra que o governador Joaquim Roriz (PMDB), é o campeão de queixas com sete denúncias. Logo atrás, com seis denúncias cada, estão o deputado federal Geraldo Magela, candidato ao governo pelo PT, o ex-senador José Roberto Arruda (PFL), candidato a deputado federal, o deputado distrital Alírio Neto (PPS), que tenta a reeleição, e candidato a distrital Paulo Roriz (PFL). Os casos serão avaliados pela Coordenação de Fiscalização de Propaganda Eleitoral do TRE. Denúncias podem ser feitas por qualquer pessoa pelo Disque-denúncia do TRE, no número 342-2050, pelo formulário no site do tribunal (www.tre-df .gov.br) ou nas zonas eleitorais de cada cidade.

O NÚMERO

Disque-denúncia
342-2050 - O telefone do TRE para denúncias de propaganda irregular funciona das 8h às 19h


Tudo pronto para acordo com FMI
O Brasil vai recorrer dentro de poucas semanas a uma nova ajuda do Fundo se a crise econômica piorar. Arminio Fraga destacou que esse socorro será de curto prazo e poderá ocorrer até sem o aval dos candidatos à Presidência

O agravamento da crise, que faz o dólar e o risco-Brasil atingirem patamares recordes e a inflação disparar, pode levar o governo a fechar um acordo de transição com o Fundo Monetário Internacional (FMI) sem o aval dos candidatos à Presidência da República. Foi o que garantiu ontem o presidente do Banco Central, Arminio Fraga. ‘‘Precisamos sair da posição defensiva em que nos encontramos agora para construir um caminho que permita ao próximo presidente retomar o crescimento econômico. É melhor prevenir do que remediar’’, disse. ‘‘O acordo, se sair, terá um curto prazo de duração. Não é justo que ele avance sobre um outro governo. Nesse caso, o presidente eleito participará das negociações’’, afirmou.

O acordo com o FMI, segundo Fraga, pode sair em questão de semanas se a onda de turbulência que engolfou o país não acalmar. ‘‘Tudo depende de algumas questões operacionais. O apoio do Fundo existe e está lá. Basta o Brasil querer’’, ressaltou. ‘‘Existem várias opções de acordo, desenhadas para antes e depois das eleições, com prazo mais curto ou mais longo’’, disse. O presidente do BC não quis falar sobre o volume de recursos que seria necessário para que o país faça uma travessia tranqüila rumo ao próximo governo. Admitiu, porém, que os US$ 10 bilhões tomados emprestados do Fundo no mês passado já não são suficientes para garantir ao BC força suficiente para conter o nervosismo. ‘‘Os US$ 10 bilhões vieram em uma conjuntura diferente da atual.’’

Para o ataque
A fragilidade para enfrentar a crise não significa, na avaliação de Fraga, que o país esteja na UTI, como ressaltou, dias atrás, o deputado Aloizio Mercadante (PT-SP). ‘‘Não estamos na UTI, mas não estamos em uma posição confortável. O país não está crescendo a uma taxa de 5% ao ano, como gostaríamos’’, destacou. ‘‘Temos que sair da defensiva para o ataque. Se a situação adversa não melhorar, vamos agir. Seria irresponsabilidade não nos preocuparmos com a atual conjuntura’’, disse. ‘‘Temos que construir um caminho para que o próximo presidente possa retomar o crescimento econômico. Precisamos arrumar a casa para que o futuro presidente trabalhe com tranqüilidade.’’

Fraga afirmou que recorrer a novo socorro do FMI não é um fato agradável. ‘‘Ninguém vai ao médico porque quer, mesmo para um check-up. Vai porque precisa’’, disse. ‘‘Eu vejo que, em momento difíceis, o FMI é uma opção que só traz benefícios e não tem custos. Em 1999, se não recorrêssemos ao Fundo, o país enfrentaria um forte processo recessivo.’’ O presidente do BC ressaltou que o ideal seria que o país não tivesse que pedir socorro ao Fundo, que se financiasse sem alarde no mercado externo, como as economias desenvolvidas. ‘‘O que eu vejo, olhando para esse ambiente financeiro de fato tumultuado, é que realmente algo deve ser feito ainda este ano.’’

Crise de conciança
Num discurso contundente, o presidente do BC convocou todos os candidatos à Presidência da República a continuar, diariamente, declarando seu compromisso com a manutenção da política de responsabilidade fiscal, com o controle da inflação e com o respeito aos contratos. ‘‘Às vezes, na vida, a gente tem que insistir. Não podemos ficar frustrados, temos que falar mais, discutir mais.’’ Ao reafirmarem tais compromissos, acrescentou Fraga, os candidatos ajudarão o país a superar a atual crise de confiança, sustentada pelas dúvidas em torno da transição de um governo que está no poder há oito anos.

O presidente do BC contou que, nas últimas três semanas, reuniu-se com o presidenciável do PSDB, José Serra, com o deputado Aloizio Mercadante, com o presidente do PSDB, José Aníbal, e com o candidato do PPS, Ciro Gomes. As conversas, na avaliação de Fraga, tiveram como objetivo dar uma sinalização clara de que é preciso pensar e tratar do que pode ser feito para dar tranqüilidade maior à economia do país. ‘‘Eu tenho o pulso do mercado. Me senti na obrigação de dar um relato a essas pessoas’’, afirmou. O presidente do BC está agendando um encontro com o candidato do PSB, Anthony Garotinho.

Fraga disse, ainda, que o Brasil não vai cumprir, pelo segundo ano consecutivo, as metas de inflação. ‘‘Na atual conjuntura, com os preços do dólar em alta, dificilmente a inflação será menor do que 5,5% (o teto da meta)’’. A inflação só ficará abaixo desse patamar se as cotações da moeda norte-americana caírem, o que não se espera a curto prazo, diante do agravamento da crise internacional, por causa dos sucessivos escândalos nos Estados Unidos e na Europa, de falsificação de balanços de empresas. ‘‘O fato de estourar as metas não fará o Brasil perder credibilidade. Vamos explicar isso à sociedade sem artificialismos’’, destacou o presidente do BC. Pelas projeções do mercado, a inflação medida pelo IPC-A fechará o ano em 5,8%.

A inflação, afirmou o presidente do BC, está sendo pressionada, sobretudo, pelos preços administrados, isto é, tarifas públicas, muitas delas corrigidas pelo dólar. Fraga afirmou que um produto, particularmente, está merecendo atenção especial do governo: o gás de cozinha, cujos preços foram liberados em janeiro último. Pelas contas do BC, somente no primeiro semestre deste ano, o botijão de gás subiu 32%. No acumulado do ano, o reajuste será de 42%. Ele informou que partiu da equipe econômica pedido para analisar os preços do gás.

‘‘Percebemos, nas nossas pesquisas, que havia movimentos diferenciados em relação ao gás. Levantamos a lebre e agora estamos estudando o que há de errado, se falta competitividade ou o problema é de regulação’’, assinalou. Fraga disse que o governo precisa conter os abusos no setor. Mas ressaltou ser contrário ao tabelamento do preço do produto, como se cogita no governo.


Artigos

Ciro Gomes por distinção de Lula e Serra
As pesquisas dizem que não são poucos os eleitores desejosos de um meio-termo, um político nem tanto ao mar nem tanto à terra, nem tanto Lula nem tanto Serra

Walder de Góes

Existem veios nordestinos na alma política de Lula, o que anunciaria sua semelhança com Ciro Gomes. No entanto, de onde mais Lula extrai sedimentos é de seu envolvimento direto, desde sempre, com os movimentos sociais de base das áreas centrais do capitalismo brasileiro e de seu esforço persistente para criar um partido trabalhista moderno. Ciro Gomes, por sua vez, tem traços paulistas em sua alma política, o que anunciaria semelhança com Serra. Ele nasceu em família de classe média do interior de São Paulo e lá experimentou na adolescência uma primeira socialização. O básico de sua visão de mundo, porém, vem de sua vida nordestina, de seu envolvimento em um projeto de modernização política muito específico, isolado, mais até cearense que nordestino, e bem-sucedido.

Lula e Ciro Gomes têm, assim, uma semelhança em forma invertida a dar-lhes uma dupla dimensão. Serra tem outro tipo de dualidade, cujo primeiro aspecto é a condição absolutamente paulista, e o segundo, a experiência do exílio. Ele se envolveu na juventude com movimentos políticos de esquerda, diferentes dos movimentos sociais de base de Lula, e o exílio lhe deu o realismo e o senso de pertencimento de classe dos cosmopolitas. Essa química proporcionou a Serra um a relação cúmplice com a elite paulista. Ciro Gomes também tem um toque cosmopolita por seu gosto pelas idéias, por idas vagas a Harvard, mas não se tornou um primus inter pares da elite brasileira. É cearense, não está marcado pela experiência direta com os elementos dominantes do capitalismo brasileiro.

De Serra pode-se dizer que se senta à vontade, em mesa de jantar, com as elites do capital e do trabalho. Com Lula, em relação às elites do capital, a cumplicidade tem limites muito definidos, há sempre um cálculo de lado a lado, não há a suposição de igualdade à mesa. Com Ciro Gomes é diferente, pois ele vem de outros ares e de relações rarefeitas com as elites paulistas e circunvizinhas. Haverá pouca cumplicidade e muita curiosidade sobre quem é quem à mesa. Essa circunstância rara de Ciro Gomes lhe permite uma certa soltura ideológica, um certo descompromisso, um estilo altivo e resoluto. Isso é combustível de primeira grandeza do voluntarismo, da idéia de que uma carga de vontade individual se substitui ou pode se sobrepor à força extraída de embricamentos sociopolíticos mais construídos. É um estilo que às vezes parece autoritário, visível na frase dita ‘‘as forças vitoriosas são as forças de ocupação’’. Essa característica de Ciro Gomes talvez explique a defesa que ele faz do recall, um mecanismo pelo qual os governados são chamados, em certas condições, a decidir sobre a continuidade do mandato dos eleitos, o que parece democracia direta.

Ciro Gomes não está propondo a democracia direta em sua forma pura, mas há aí um viés a diferenciá-lo de Serra e de Lula, embora de modo distinto. Serra, pelo que representa, pelas peculiaridades de sua formação política, é um animal político típico de um regime no qual os cidadãos elegem seus representantes, autorizando-os a interpretar seus interesses, só lhes cassando os mandatos em virtude de crime julgado em ambiente institucional. A história de Lula lhe autorizaria algum devaneio de democracia direta, mas isso é reprimido pelo aparelho partidário, o PT, que não se permitiria ser alcançado por uma relação não mediatizada entre o príncipe e o povo.

Sobre governar, a experiência, a sapiência de governar, eis aqui muitos aspectos de continuidade do tema a sugerir o perfil de Ciro Gomes por semelhança ou diferença com o de Lula e Serra. De Lula se diz que não tem experiência de administração pública e que desconhece, por falta de escola e de emprego, os rituais, os critérios, os códigos de exercício do poder político. O argumento desconhece o valor único e insubstituível da liderança política, mas tem sua razoabilidade, ao menos no plano formal. De Serra se diz o contrário, pois ele vem há muito tempo na burocracia e domina à perfeição os códigos do exercício do poder político. Isso não faz de Serra um líder, assim como a liderança de Lula não o faz necessariamente um bom gestor público. De Ciro Gomes não se dirá nada parecido. Ele está no meio. Ciro Gomes não geriu aparelhos de base, como Lula, nem complexas burocracias de planejamento, como Serra. O Ministério da Fazenda não conta, sob esse aspecto, porque foi apenas uma saída fugaz da experiência isolada do Ceará.

O que conta, para distingui-lo, é justamente a experiência cearense. Governou o estado e a capital com grande aceitação local, cumprindo desígnios fiscais e ancorando-se no consenso de seus pares. Não foi voluntarista, solto, algo que lhe terá chegado mais recentemente, depois das funções cearenses de governo. Uma média de julgamento de administradores públicos talvez lhe desse nota oito como prefeito e governador. Somente não lhe dariam dez pela consideração de que sua boa obra administrativa fez uma certa vitrine, uma ligeira preferência por obras visíveis em relação a obras invisíveis.

Ciro Gomes estaria, assim, entre Lula e Serra no espectro ideológico que vai da esquerda para a direita. Isso pode lhe ser eleitoralmente promissor, pois as pesquisas dizem que não são poucos os eleitores desejosos de um meio-termo, um político nem tanto ao mar nem tanto à terra, nem tanto Lula, nem tanto Serra.


Editorial

MÃO PESADA

O ataque israelense à cidade de Gaza na noite de segunda-feira constrange a consciência civilizada do mundo. Um caça F-16 disparou sobre área densamente povoada. Morreram quinze pessoas e 145 ficaram feridas.
Entre os mortos, havia dez crianças, uma com dois meses.

O objetivo da agressão, segundo fontes do governo judeu, era eliminar o líder do braço armado do Hamas, organização considerada responsável pela explosão de homens e mulheres-bomba que leva pânico à população israelita. A meta foi atingida. Mas a custo demasiadamente alto.

O míssil veio em hora inoportuna. Corta de imediato as negociações de cessar-fogo que se vinham entabulando entre Israel e Palestina. Mas provoca debate no seio do Estado judeu. Questiona-se se a morte de inocentes civis e a conseqüente repulsa mundial ao gesto de brutalidade não seriam preço extorsivo pela morte de um chefe militar de grupo islâmico.

Aparentemente, o governo de Telavive se dividiu. O ministro das Relações Exteriores, Shimon Peres, declarou, em entrevista à BBC de Londres, que a ação foi um erro que precisa ser investigado. Um dos dirigentes do partido trabalhista disse que, embora tenha sido um erro militar, ele só pôde ser cometido com autorização política.

A comunidade internacional reagiu ao massacre com veemência. George W. Bush, tradicional simpatizante dos atos antiterroristas de Telavive, criticou a ‘‘mão pesada que não contribui para a paz’’. Na mesma linha, pronunciaram-se o secretário geral da ONU, Kofi Annan, e líderes da Europa, Rússia, China e do mundo árabe.

O primeiro-ministro israelense, Ariel Sharon, chegou a comemorar ‘‘o sucesso’’ do ataque. Depois, voltou atrás. Afirmou que teria desautorizado o bombardeio se tivesse conhecimento da densidade populacional do bairro atingido. A desculpa não convence. Em primeiro lugar, porque a superpopulação de Gaza não constitui segredo para ninguém. Em segundo, porque Israel tem um dos serviços de informação mais eficientes do mundo.

O conflito iniciado em 2000 já ceifou 559 vidas israelenses e 1.467 palestinas. É hora de pôr um freio na brutal matança. A comunidade internacional não pode mais fingir-se de cega. De um lado, deve pressionar em favor do restabelecimento das conversações entre Israel e Palestina e, de outro, não permitir que escape a possibilidade de avanços no cessar-fogo. Os Estados Unidos — único país que tem peso junto a Israel — têm de coagir Sharon a interromper os ataques enlouquecidos.

Não basta, para tanto, ficar na retórica. Impõe-se passar à ação. Bush disse que o ataque foi mão pesada. Ao mesmo tempo, o Congresso americano aprovou ajuda de 200 milhões de dólares para Israel combater o terrorismo. É incoerência.


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07/25/2002


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