Senado aprova Fundeb, mas proposta ainda volta à Câmara



Com a unanimidade dos 57 senadores presentes na votação em primeiro turno e, em segundo turno, por 50 votos favoráveis e uma abstenção, o Plenário do Senado aprovou, na noite desta terça-feira (4), o substitutivo da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) à proposta de emenda à Constituição (PEC 9/2006) que cria o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais de Educação (Fundeb). Devido à aprovação de um substitutivo, a proposta, que teve como relator na CCJ o senador José Jorge (PFL-PE), volta agora à Câmara dos Deputados. Diversos dispositivos da PEC ainda dependerão de regulamentação em lei.
Como a Constituição determina dois turnos de votação em Plenário para aprovação de uma PEC, um esforço concentrado dos senadores foi realizado para permitir que a proposta de criação do Fundeb fosse aprovada pela Casa nesta terça com a realização de sessões extraordinárias, mediante acordo de lideranças. A aprovação da criação do Fundeb pelo Senado é uma das matérias mais esperadas pela sociedade e pelos parlamentares neste primeiro semestre. A expectativa é que o Fundeb amplie de 31 para 48 milhões o número de crianças atendidas pela educação básica, aumente substancialmente os recursos para financiar o ensino básico e a participação da União no fundo, além de melhorar a distribuição do dinheiro entre os entes federativos.
- É certo que o financiamento não é condição suficiente para resolver os problemas da educação brasileira, mas é uma condição necessária. A instituição do Fundeb representará um passo inicial para melhorar a educação brasileira, mas é preciso lembrar que o Fundeb não se constitui em programas para a educação e sim em um instrumento financeiro para implementá-las, com uma melhor distribuição de recursos entre os entes federativos - disse o relator.
O presidente do Senado, Renan Calheiros, parabenizou o relator, José Jorge, pelo aprimoramento da proposta. Na mesma linha, o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), louvou o trabalho do relator, agradecendo ainda a todos os senadores que contribuíram para que o Senado aperfeiçoasse o teor do texto da PEC, apresentado pelo Executivo. Diversos outros senadores também enalteceram a atuação do relator.
Defensor de uma revolução no ensino brasileiro, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) ressaltou que "o Fundeb é melhor do que nada, mas está longe da mudança que a educação precisa fazer". Por sua vez, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) classificou este como o projeto mais importante desta legislatura, por alterar para melhor um aspecto estrutural brasileiro. O líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM), lembrou que o Fundeb é um aprimoramento do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), implementado pelo governo Fernando Henrique.
O senador José Agripino (PFL-RN) considerou um insulto a recente declaração do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, que insinuava que os parlamentares estariam procrastinando a votação do novo fundo, enfatizando o esforço feito pela oposição para viabilizar a aprovação da matéria. A senadora Heloísa Helena (PSOL-AL) disse que o governo faz demagogia com o novo fundo, que, segundo ela, tem pouca participação da União, uma vez que ele é composto em sua maioria por recursos dos próprios estados.
O senador Pedro Simon (PMDB-RS) disse temer que a União não cumpra a transferência de recursos ao estado, exemplificando com o que acontece atualmente com a Lei Kandir. O senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) demonstrou preocupação com a falta de definição da fonte dos recursos da União para complementar o fundo.
Também se manifestaram favoravelmente à proposta os senadores Ney Suassuna (PMDB-PB), Patrícia Saboya (PSB-CE), autora da emenda que incluiu no financiamento a educação das crianças de até 5 anos, Ideli Salvatti (PT-SC), Wellington Salgado (PMDB-MG), Leonel Pavan (PSDB-SC), Eduardo Suplicy (PT-SP) e Marcelo Crivella (PRB-RJ).
Desde a aprovação da matéria, há cerca de dois meses, na CCJ, José Jorge esteve reiteradas vezes em Plenário para apelar aos parlamentares pela celeridade na votação da proposta. No entanto, a constante obstrução na pauta de deliberações do Plenário do Senado por medidas provisórias impediu sua votação. Além do relator, diversos senadores, tanto da bancada governista quanto da oposição, também ocuparam a Tribuna do Senado para ressaltar a importância do novo fundo para a o desenvolvimento da educação no país.
Novidades
O novo fundo irá substituir o atual Fundef, aprovado em 1996 e vigente desde 1998. A principal diferença entre os fundos é que, enquanto o Fundef se destina unicamente ao ensino fundamental (antigo 1.º grau), o Fundeb estenderá seus recursos para todo o ensino básico, que inclui, entre outros, a educação infantil e o ensino médio (antigo 2.º grau).
A partir da promulgação desta emenda constitucional, será criado no âmbito de cada estado e do Distrito Federal, com vigência para os próximos 14 anos, fundo contábil composto com 20% da receita do Imposto sobre Transmissão de Bens e Direitos Causa Mortis (ITCD), do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), do Imposto sobre Propriedade e Veículos Automotores (IPVA), dos Fundos de Participação dos Estados (FPE) e dos Municípios (FPM), do Imposto sobre Produtos Industrializados destinados à exportação (PIP-Exp), da transferência da União aos estados e municípios resultante da compensação pela desoneração de ICMS (Lei Kandir) e do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR).
O Fundeb aumenta a participação de recursos da União para o ensino básico, obrigando-a a complementar os fundos dos estados e do Distrito Federal. A PEC fixa a complementação por parte do governo federal de R$ 2 bilhões no primeiro ano de vigência do Fundeb, R$ 3 bilhões no segundo ano, R$ 4,5 bilhões no terceiro ano e, a partir do quarto ano, 10% da soma das receitas dos fundos referentes ao ano anterior. De acordo com o relatório, a complementação atual da União é da ordem de R$ 400 milhões. O contigenciamento desses recursos serão ainda enquadrados como crime de responsabilidade da autoridade competente.
Outra inovação implementada pela PEC que institui o Fundeb coloca em nível constitucional a valorização do trabalho dos educadores da rede pública (conceito a ser definido em lei), ao garantir a implantação de planos de carreira e de um piso profissional salarial nacional para os educadores que ingressarem na carreira por concurso público. No mínimo, 60% dos recursos do Fundeb serão destinados ao pagamento dos profissionais do magistério da educação básica.
Também foi aprovada a ampliação das áreas de aplicação dos recursos da contribuição social do PIS/Pasep, para atender à educação profissional dos trabalhadores e à educação infantil de seus dependentes.