Serra volta a defender reativação da Sudene









Serra volta a defender reativação da Sudene
Candidato retoma discurso, adotado em outras cidades que eram atendidas pelo órgão

NANUQUE – O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, voltou ontem a prometer a reativação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). “Vamos refazer a Sudene em bases muito mais fortes e eficientes”, disse. A promessa i feita em Nanuque, Minas Gerais, como já fez em cidades que eram atendidas pelo órgão.

Em Passos, Serra lançou, sábado à noite, duas cartas intituladas A Nova Marcha do Café e Leite Para todos, nas quais promete, se eleito, adotar política de preços mínimos, linhas de crédito para custeio, colheita e estocagem, além de recadastrar o parque cafeeiro .

Antes de ir a Nanuque, Serra esteve em Brasília e defendeu a transferência do traficante Fernandinho Beira-Mar, do Rio para capital federal. Em Brasília, Serra participou de uma caminhada e um comício com o governador Joquim Roriz (PMDB), candidato à reeleição. O evento previa apresentação de pára-quedismo e acabou em incidente. Um dos quatro pára-quedistas contratados para pular numa clareira errou o alvo e atingiu Valéria Fernandes Mota e Maria José Braga de, 32 e 38 anos.

Elas foram atendidas no hospital mais próximo com escoriações leves, segundo a PM. Para impedir que o fotógrafo do Estado, Dida Sampaio, registrasse a cena, seguranças quebraram o flash de sua máquina e tentaram agredi-lo.

O candidato do PSDB voltou a criticar a proposta do PT de criar 10 milhões de empregos, sem dizer como. As críticas foram reforçadas em um comercial exibido na TV.

Suspensão – O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu suspender a exibição, no programa de Serra, de uma enquete na qual se pergunta quem é mais competente para criar empregos, se ele – José Serra – ou o petista Luiz Inácio Lula da Silva. (Colaborou Gustavo Freire, da Agência Estado)


Ciro sai à frente do MP em denúncia contra Serra
Em nova ofensiva para se recuperar, candidato explora ação que não foi oficializada

Como esperavam os tucanos, o candidato do PPS, Ciro Gomes, nem esperou o Ministério Público Federal denunciar o empresário e ex-diretor do Banco do Brasil Ricardo Sérgio de Oliveira por empréstimos concedidos pela instituição para usar o fato contra seu adversário do PSDB, o candidato José Serra. Embora a denúncia esteja prevista para ocorrer hoje, a estratégia, com a qual Ciro tentará desacreditar Serra e recuperar votos, foi posta em prática no fim de semana.

“Quem investigar quem está por trás disso, a sociedade dele (Serra) com esse primo afim, esse espanhol Gregório Preciado, quem examinar a conexão dele com Ricardo Sérgio, que foi seu financiador de campanha do Banco do Brasil e comandou a Previ e a mal-cheirosa privatização da Vale do Rio Doce e das Telecomunicações, vai encontrar por que o senhor José Serra não responde ao requisito ético e moral necessário para ser presidente do Brasil”, declarou Ciro, depois de participar de um comício em Mogi das Cruzes, sábado à noite. “Isso é a pontinha do iceberg.”

Também antecipando-se às denúncias, a equipe do tucano agiu rapidamente e, anteontem à tarde, pôs um aviso no site do candidato (www.joseserra.com.br) e no horário eleitoral, informando que “a campanha de José Serra foi alertada por profissionais de diversos órgãos de imprensa que está sendo montada uma farsa em forma de denúncia, a partir de fatos já esclarecidos, com o objetivo de ser explorada no horário eleitoral”.

A iniciativa de Serra foi classificada por Ciro, em seu site, de “inacreditável e acintosa”. No texto “Entregaram o jogo sujo”, o candidato ironiza os tucanos dizendo que “o candidato do desemprego e da corrupção passa um recibo completo do papel de grande parte da mídia na campanha do PSDB/PMDB”.

Na nota, Ciro pergunta “quais são esses diversos órgãos de imprensa que trabalham, agora comprovadamente, como linha auxiliar de José Serra”.

Ontem à noite, Ciro voltou a criticar Serra, chamando-o de “candidato da continuidade piorada”, depois de participar da cerimônia do Dia do Perdão (Yom Kipur), na Congregação Israelita Paulista, em São Paulo. No evento, Ciro encontrou e conversou rapidamente com o governador Geraldo Alckmin (PSDB).

Sem resultado – Os correligionários de Ciro decidiram reagir com força, questionando a independência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o governo federal. Além de não dar o resultado esperado, pois Ciro caiu ainda mais nas pesquisas de intenção de votos, a cúpula da campanha tentou fazer uma mudança na equipe de comunicação da campanha.

Em recente reunião, os cordenadores da campanha pediram a contratação de um outro especialista em marketing, mas Ciro não abre mão de seu marqueteiro e cunhado, Einhart da Paz.

Confusão – A repórter Viviane de Almeida, do jornal Mogi News, registrou um boletim de ocorrência, no 1.º DP de Mogi das Cruzes, de “apropriação indébita” de seu gravador por um “funcionário” que trabalhava no comício de Ciro naquela cidade, O incidente aconteceu após discussão com integrantes da Força Sindical. (Colaborou Mariana Barbosa)


TSE suspende publicidade da Petrobrás contra Lula
BRASÍLIA - O ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Caputo Bastos, determinou ontem a suspensão de uma campanha publicitária da Petrobrás. Foi uma resposta à representação apresentada pelo candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, no sábado.

Lula alegava que a campanha tem a intenção de responder declarações feitas em seu horário eleitoral gratuito em 20 de agosto, quando abordou a política do governo de construção de plataformas petrolíferas fora do País.

O PT quer ainda que a Corregedoria-Geral Eleitoral apure o uso indevido, desvio e abuso de autoridade, do poder econômico e uso dos meios de comunicação em benefício do candidato do PSDB, José Serra.

A suspensão terá validade pelo menos até o julgamento final da ação em Lula acusa a estatal de querer interferir no processo eleitoral em favor de Serra.

Em ação movida anteriormente pela Petrobrás contra Lula, Caputo Bastos negou direito de resposta no horário eleitoral do petista. O pedido da Petrobrás teve como motivo justamente as críticas de Lula à compra de plataformas no exterior. (Gustavo Paul e Gustavo Freire/AE)


Garotinho vai ao TSE
O candidato do PSB à Presidência da República, Anthony Garotinho, entrou ontem com reclamação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra o candidato do PSDB, José Serra, por descumprimento de decisão judicial. Na quinta-feira à noite, segundo Garotinho, o tribunal concedeu liminar obrigando os tucanos a suspender a veiculação de inserções de rádio nas quais Garotinho é acusado de maquiar os númerosda violência no Rio quando governou o Estado. “Ele (Serra) insiste em divulgar as inserções contra nós, se considerando acima da lei”, afirmou o candidato do PSB, que disse ter notícias do desrespeito à decisão em todo o País.


Energia residencial subiu 167% em sete anos
Tendência é de que tarifa continue a avançar bem acima dos índices da inflação

Em sete anos, a tarifa de energia elétrica subiu 167% para o consumidor residencial, enquanto o índice de preços medido pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) aumentava 103,19% e o IGPM, 108,12%. Para os próximos anos, a tendência não é diferente. Além de toda reestruturação do setor elétrico, que tende a elevar o preço da energia, num primeiro momento, a partir do próximo ano todas as distribuidoras do País terão direito de revisar o nível de suas tarifas.

Um a medida legal, prevista nos contratos de concessão, mas que tem provocado uma verdadeira batalha entre Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e representantes das concessionárias.

A briga já chamou a atenção até do Ministério da Fazenda, que deverá acompanhar o processo.

O objetivo da revisão periódica é reposicionar a tarifa em nível compatível com a cobertura dos custos operacionais e de remuneração adequada de investimentos, garantindo a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro das empresas. Ela também prevê o repasse aos consumidores dos ganhos de produtividade obtidos pelas concessionárias e ocorre, em média, a cada quatro anos.

Toda polêmica recai sobre a metodologia para calcular a base de remuneração, que definirá a necessidade de aumentar, reduzir ou manter o nível das tarifas. E, embora a Aneel já tenha definido esse critério, ninguém garante que até o fim do processo não haja mudanças, pois a resolução em nada agrada as distribuidoras. E as pressões sobre o governo já começaram.

As empresas querem aproveitar a oportunidade para recuperar perdas com o aumento de custos, provocados pela redução do consumo, alta do dólar e pela pesada carga tributária. "A reposição dos prejuízos acordada no fim do ano passado foi apenas uma injeção de ânimo para as empresas", afirma o diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), Adriano Pires. O problema é que a metodologia de remuneração definida pela Aneel, há duas semanas, vai na contramão dos interesses das concessionárias. Segundo a agência, a revisão terá de ser feita com base no valor de mercado dos ativos, cujo cálculo prévio soma cerca R$ 9,3 bilhões, um impacto próximo de 10% nas tarifas.

Do outro lado, as distribuidoras argumentam que a resolução reduz a remuneração e o nível de investimento, além de desequilibrar as contas das empresas. O presidente da Associação Brasileira dos Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Orlando Gonzales, chegou a dizer que a medida resultaria em perdas de cerca de R$ 13 bilhões para as matrizes das empresas.

A proposta da associação prevê uma base de remuneração pelo preço mínimo pago pelas empresas nos leilões de privatização. Dados preliminares calculados pelo mercado apontam para um valor próximo de R$ 23 bilhões. Ou seja, essa seria a base da revisão tarifária e poderia representar aumento de 34% para o consumidor.

Mas o preço mínimo dos leilões incorpora expectativas de lucros e exploração de negócios, como explica o coordenador técnico do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Marcos Pó.

Ele afirma ainda que, de acordo com a proposta das concessionárias, a sociedade seria onerada em R$ 3,5 bilhões.

A discussão também tem sido motivo de preocupação do ministro da Fazenda, Pedro Malan.

Recentemente, ele enviou ao Ministério de Minas e Energia um ofício demonstrando apreensão em relação aos impactos da revisão na economia nacional. Por um lado, um aumento expressivo das tarifas poderia comprometer o superávit programado e os índices inflacionários. Por outro, um reajuste pequeno poderia fragilizar a saúde financeira das empresas, que já não vai muito bem.

A solução seria encontrar um meio-termo, que não onerasse tanto o consumidor nem prejudicasse as empresas. Como a Aneel se mostra irredutível em relação a mudanças na metodologia de revisão, a alternativa foi contratar um consultor internacional para promover estudo sobre avaliação de ativos. A informação foi dada por João Randolfo Pontes, assessor do ministro de Minas e Energia, Francisco Gomide. O profissional será pago com recursos do Banco Mundial (Bird).

Isso acabou pondo em dúvida os poderes da agência reguladora, cuja atribuição é regular, fiscalizar e mediar conflitos. A decisão de elaborar novo estudo para avaliação dos ativos foi interpretada por alguns especialistas como um enfraquecimento do órgão.

Justiça - No entendimento do ex-secretário de Energia, do Ministério de Minas e Energia, Afonso Henriques, a visão da Aneel é muito contábil e não econômica. Para ter justiça, diz ele, deveria haver uma reavaliação dos ativos, como já ocorreu com a empresa Xanxerê. "É preciso deixar a tarifa compatível com o serviço, mas tendo preocupação de não onerar a população."

Henriques alerta, porém, para a urgência de resolução de outro problema: a reestruturação tarifária das classes de consumo. Para ele, fazer a revisão periódica sem eliminar as distorções das tarifas pode representa um grande problema.

Enquanto os consumidores residenciais viram suas tarifas subirem 167%, desde 1995, as classes industriais e comerciais tiveram aumento de 111% e 110%, respectivamente. Até o mês de junho, a tarifa média para o residencial era de R$ 203,88 o megawatt/hora (MWh); industrial, R$ 92,00; e comercial, R$ 179,19. A disparidade de preços pode ser explicada pela existência do subsídio cruzado para alguns consumidores de alta tensão. Mas, com a reestruturação, a tendência é que esses benefícios sejam eliminados, o que diminuiria a diferença de preços entre as classes.

Mesmo assim, o valor cobrado da indústria continuará sendo inferior às demais classes. Isso porque os custos de atendimento dos clientes de alta tensão (inclui indústria) são menores que os da baixa tensão (residencial).

Um dos itens que mais pesam na tarifa residencial são os encargos de distribuição, que englobam transformação de potência, conexão da rede, transmissão, etc. Mas, segundo técnicos da Aneel, a estrutura atual é antiga, de 1986; e nesse tempo todos os custos foram elevados e não repassados para a tarifa da alta tensão.

Outro tema presente nas discussões sobre tarifas é a necessidade de uma reestruturação tributária. Dos reajustes concedidos às distribuidoras, segundo a Abradee, 29% refere-se a impostos. E agora, com a minirreforma tributária, os custos deverão aumentar ainda mais, pois a alíquota do PIS foi elevada de 0,65% para 1,65%. Além disso, os reajustes também estão atrelados à alta da moeda americana. Como as distribuidoras do Sul, Sudeste e Centro-Oeste compram energia de Itaipu, a variação cambial é repassada para o consumidor.

Leilão - O governo conseguiu derrubar ontem a liminar que suspendia a realização do leilão de energia das geradoras federais. As transações deverão ocorrer hoje a partir das 10 horas.


Artigos

Paz, amor e inexperiência
Fabio Giambiagi

Nos últimos dois ou três meses, virou lugar-comum se dizer que: a) tem havido uma aproximação entre o PT e o mercado; e b) Lula amadureceu. São proposições corretas. A questão que cabe avaliar é se tal amadurecimento permite ao eleitorado votar nele com a tranqüilidade de saber que, em caso de uma crise, será um timoneiro à altura dos desafios impostos pelas circunstâncias.

Nesse sentido, muita gente tem dito que o programa de governo do PT é muito mais moderado e que Lula tem tido posições lúcidas. É preciso qualificar melhor esse ponto. "Amadurecer" indica uma evolução em relação a um ponto inicial, mas não revela a aptidão de ninguém. É possível evoluir e mesmo assim ficar aquém das qualificações que se desejam para um cargo. O ponto-chave é: será que o PT está maduro a ponto de se encontrar em condições de assumir o Poder sem incorrer em alguns dos equívocos que o eleitorado temia nas outras três vezes em que Lula perdeu? O leitor tire suas conclusões, à luz dos fatos.

O partido divulgou uma "Nota sobre o acordo com o FMI", em 8 de agosto, saudada como sinal dos progressos do "novo PT", que estaria "até aceitando o FMI". O que diz a nota? Ela atende ao objetivo de passar a idéia de que um eventual governo do PT poderá fazer um acordo com o Fundo, mas nela se afirma que "a história recente da intervenção do Fundo na América Latina é um testemunho dos graves equívocos da sua concepção monetarista, ortodoxa e recessiva".

Pasmem! O que o leitor pensaria se fosse gerente de um banco e um devedor entrasse pela porta acusando-o de ser um incompetente? Seria essa a forma mais apropriada de o devedor ter o seu crédito ampliado?

A verdade é que essa frase revela um radicalismo infantil, impróprio em quem pretende assumir o Poder. De duas, uma: ou se trata de palavras vazias - e nesse caso o PT não acredita numa vírgula do que assina - ou é um sinal de despreparo. O Brasil quer ampliar o seu endividamento junto ao Fundo. Que o partido que pretende ser governo em janeiro emita uma nota oficial com essa frase é absurdo. Os técnicos do Fundo vão guardar a nota no congelador e, se o PT vencer, seus negociadores pagarão caro por essas críticas inúteis, com as quais a única coisa que se consegue é irritar à toa o outro lado da mesa.

Tomemos este outro exemplo: no debate da TV Record, em 2 de setembro, depois de toda a turbulência que o mercado financeiro viveu em julho-agosto, associada ao temor de que o próximo governo pudesse vir a optar por um "calote" da dívida pública, Lula deu um escorregão grave, quando disse que o País "não pode continuar sendo vítima da insanidade, de uma política econômica que só pensa no pagamento de juros e não pensa no pagamento de salário". Fora o fato de que o governo nunca deixou de pagar os seus salários em dia, preocupa que a esta altura o candidato do PT continue sem perceber o efeito que esse tipo de declarações pode ter sobre a confiança dos depositantes. O cidadão que aplica suas poupanças num fundo lastreado em títulos públicos, e pensa em juntar dinheiro ao longo de alguns anos para poder comprar uma TV, um carro ou um apartamento, espera que o próximo governo tenha o mesmo comprometimento que o atual e honre aquilo que se comprometeu a pagar nos leilões de dívida pública. No dia em que o governo deixar de "pensar no pagamento dos juros", o País estará às portas de um "corralito". Nos últimos anos, os credores do governo sabiam que o governo tomaria as medidas necessárias para que a dívida fosse honrada. Por conta disso, o superávit primário passou de zero a quase 4% do PIB e o governo pôde conservar um mercado para colocar seus títulos. A questão é: o próximo governo vai manter esse tipo de compromisso? Se o compromisso vai ser mantido, a frase de Lula é demagógica e assusta gratuitamente os detentores de papéis do governo; e, se ele não for mantido, quem vai comprar títulos públicos num governo do PT? Como se pode tratar de forma fútil um assunto tão sério?

Não nos vamos enganar. Lula pode cortejar a Bolsa, ir à Fiesp e prometer que vai respeitar o acordo com o FMI, mas os candidatos a deputado do PT estão fazendo campanha País afora com as mesmas palavras de ordem do passado. Se Lula for eleito e for fiel às suas bases, vai arrasar com o País. E, se deixar de lado as bases, vai arrasar com o partido. O PT tem uma militância cheia de cacoetes intervencionistas, que de vez em quando afloram no discurso do seu candidato, sem que ele perceba. O PT é um partido que prega hoje o contrário do que declarou há seis meses; que se manifesta a contragosto a favor de algo numa página, mas contra o qual há um ranço evidente na página seguinte; que tem um candidato que promete honrar a dívida ante platéias seletas e, ao subir no palanque, faz discurso "contra a agiotagem"; que, se ganhar o governo, vai precisar de US$ 24 bilhões de uma instituição - o FMI - que acusa de favorecer a recessão; e que não responde a nenhuma das críticas porque está em fase de paz e amor na televisão sob a batuta mágica de Duda Mendonça.

A pergunta que não quer calar é: se Lula vencer, o que vai acontecer quando, um dia, o País tiver de enfrentar uma crise internacional, for preciso cortar o gasto público, seus ministros tiverem sugestões diferentes acerca de como encarar a crise e Duda tiver ido embora, depois de ter cumprido a sua missão?


Colunistas

RACHEL DE QUEIROZ

Os aprendizes
Esse caso passou-se, faz tempo, pouco depois de nos mudarmos para o Leblon, que era ainda um bairro amorável e tranqüilo, sem grades nos edifícios - aliás, poucos edifícios e ainda muitas casas com jardim e quintal. Hoje, não sei se foi o Leblon que mudou, mas quanto a mim, sei que mudei muito, quase não saio de casa e, em sã consciência, não posso dizer se é melhor agora ou era melhor então.

Mas voltemos à historinha que eu ia contar: A gente saiu à praia manhã cedinho, quase com escuro. O tal vendedor de mexilhão nos avisara que chegava às cinco horas, trazendo os mexilhões da Ilha das Cagarras, sem poluição, arrancados das pedras, e não de casco de barco, como vendem por aí. Nós chegamos às 5, as luzes do calçadão ainda acesas, mas do vendedor nem sinal. Sentamos na calçada, mas soprava um ventinho frio, resolvemos caminhar um pouco.

Não se tinha andado quase nada, quando demos com um pequeno ajuntamento em torno de qualquer coisa que estava dentro de um desses valões cavados na praia pela ressaca.

Um monte oblongo de areia molhada interrompia o valão. E na borda desse monte de areia apareciam os dedos de um pé, com as unhas pintadas de vermelho vivo. E os dedos mexiam!

Um moço forte, corredor de cooper - ainda se diz assim? - ajoelhou junto e começou a afastar com as mãos a areia frouxa e úmida que cobria o outro pé, a perna, as coxas. Uma mulher ajoelhada perto de onde deveria estar a cabeça, cavava também e de repente gritou "Está mesmo viva!".

Nessa altura já uns dez pares de mãos desenterravam a moça que não estava nua como a princípio se pensara, mas trajava short e bustier. Então a mulher da cabeça gritou: "Não está respirando, não está respirando mais!"

O moço corredor mudou de posição; tomou o lugar da mulher, afastou do rosto da moça - morta ou desacordada? - o cabelo empapado de areia, olhou em torno e anunciou: "Vou fazer respiração boca a boca!"

As pessoas se aproximaram mais, avidamente, como se fossem assistir a uma cena de sexo explícito. O moço, que até se parecia um pouco com galã de televisão, enterrou a mão sob a nuca da vítima e tacou-lhe um beijo, no melhor estilo de novela. Os dedos dos pés mexeram de novo; o rapaz levantou a cabeça e disse, sóbrio: "Reparem, ela já está respirando."

Aí uma menina gorda, que a mãe levava pela mão, evidentemente para obrigar a exercício, comentou bem alto: "Também, com aquele tamanho chupão!"

A mãe deu um beliscão no braço grosso da filha, e ralhou: "Que palavra feia!

Onde você aprendeu isso?"

Agora já era visível para todos que a moça respirava. Foi puxada do buraco, meio sentada, apoiada ao peito do seu salvador.

A mãe da filha gorda perguntou de repente: "Terá sido estrupada?" E um idoso senhor de uniforme esportivo, tranqüilizou: "Não, olhe o calçãozinho dela, está direito no lugar."

Aí alguém viu, no pescoço da moça, uns arranhões que ainda sangravam levemente, misturados com a areia. O senhor de roupa esportiva continuava observando: "São arranhões feitos por unhas."

"Quem sabe não foi um vampiro?" - falou a garota gorda.

Ninguém falou nada, mas alguns se entreolharam.

A mulher, ainda ajoelhada, pegou nas mãos largadas da vítima, olhou os dedos: "Roubaram também um anel. Está arranhado, olhem!"

Sempre encostada ao peito do rapaz, a moça afinal abriu os olhos e, vendo toda aquela gente aglomerada ao seu redor soltou um grito. Mas descobrindo apenas faces benévolas, perguntou ansiosa: "Cadê os pivetes?" Todo mundo rosnou: "Ah, foram os pivetes!" E a moça explicou entrecortado: "Me bateram na cabeça, eu caí." Daí, não se lembrava mais.

O senhor disse: "Bateram nel a, desacordaram, arrastaram para o valão, cobriram de areia..." Outros completaram: "A sorte é que a areia foi pouca, não sufocou." Alguém de repente exclamou: "E a polícia? É bom chamar a polícia. Onde tem um telefone?"

Nos oferecemos, nossa casa era perto. Saímos correndo, para telefonar. E cruzamos com o homem dos mexilhões que parou, espantado, vendo que eu passava célere, lhe dizendo: "Só depois, só depois!"


Editorial

A FARSA DAS ELEIÇÕES PROPORCIONAIS

Certamente o sistema de eleição para deputados federais e estaduais, com sua falta de lógica e de condições de expressar a vontade política dos cidadãos-eleitores, não é o único item da reforma política que, poderia se dizer, se insiste em não fazer no Brasil, apesar de tanto se falar da necessidade dela. Há outros relevantes entraves ao aperfeiçoamento da legitimação de nossa democracia representativa, tais como os relativos ao número de cadeiras dos Estados nas Casas Legislativas (no que ressalta a sub-representação paulista e a super-representação nortista), a questão da fidelidade partidária (ou, no caso, da extrema infidelidade) e a inflação desmesurada de legendas (no que o amontoado de partidos "nanicos" e "de aluguel" constitui o aspecto a um tempo derrisório e deprimente).

Na verdade, assemelha-se à velha questão da origem do ovo ou da galinha, saber se não temos uma reforma política em razão da baixa qualidade da representação parlamentar, ou não temos uma alta qualidade de representação parlamentar por falta de uma reforma política. Esse é um entulho sistêmico de nossa Democracia Representativa, herdado do "pacote de Abril", do governo Geisel, e de remoção muito difícil, ano após ano, eleição após eleição. Mas é o sistema de escolha dos representantes do povo na Câmara dos Deputados e nas Assembléias Legislativas estaduais que, a cada nova eleição, deixa mais frustrados os cidadãos que se sentem responsáveis - como todos os eleitores deveriam sentir-se, numa verdadeira Democracia - pelo destino da coisa pública, graças ao sagrado exercício do voto.

Antes de mais nada as atenções, nos períodos eleitorais, voltam-se quase que exclusivamente para os candidatos a cargos majoritários: de longe em primeiro lugar os pretendentes ao cargo de presidente da República, depois, os candidatos a governador e, muito depois, a senador. A diluição de uma grande quantidade de nomes na propaganda gratuita do rádio e da televisão, por mais que o eleitor - quando pode ou tem tempo para a assistir a esses programas - se interesse em distinguir qual, na sua opinião e de acordo com seu interesse, seria o melhor representante parlamentar a escolher, não lhe dá condição alguma de formar um juízo, pois os candidatos só têm tempo de mostrar o nome, o número e, no máximo, uma curta frase, na qual nem Shakespeare conseguiria sintetizar algum plano, propósito ou meta.

Certo é que essa pulverização indiferenciadora decorre da inexistência do voto distrital, o que leva os candidatos a deputados federais e estaduais a concorrerem, indistintamente, em todos os distritos eleitorais de cada Estado - mesmo que, de modo informal, muitas regiões (não todas) já tenham suas eleições proporcionais meio distritalizadas. Uma boa idéia de sistema eleitoral a ser discutida pela sociedade seria o distrital misto, como o adotado na Alemanha, pelo qual os partidos concorreriam em cada distrito (geograficamente mapeado, conforme as regiões) com um só candidato - tornando assim essa eleição majoritária. Dessa maneira, o eleitor teria condições de acompanhar mais de perto o trabalho de seu representante, encaminhar-lhe as reivindicações que julgasse justas e cobrar-lhe o cumprimento de compromissos ou promessas eleitorais. Mas, para que a representação parlamentar não se restringisse apenas aos interesses locais - o que transformaria o Congresso Nacional ou as Assembléias Legislativas numa espécie de câmara de vereadores -, poderia haver também, simultaneamente, candidatos de legenda, extraídos (em convenção) de listas partidárias integradas de lideranças reconhecidas e notórias, em termos estaduais. É claro que essas são apenas sugestões, que de maneira alguma esgotariam as inúmeras possibilidades de melhorar a precária representatividade do sistema de eleição proporcional vigente no País.

Uma outra distorção que produz o atual sistema é a que resulta na possibilidade de um eleitor votar em quem quer eleger e eleger quem não quer, em razão das sobras de votos que passam para os candidatos de cada legenda - pela ordem dos mais aos menos votados. Nesse caso, o voto do cidadão se torna um imprevisto instrumento de traição a sua vontade político-eleitoral.

Enfim, é preciso que a classe política brasileira - e o futuro governo do Brasil - tenha bem em conta que esse farsesco sistema de eleição proporcional não pode continuar.


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09/16/2002


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