Serys: Paz no mundo depende de mais poder para a mulher



Pouco depois de presidir uma sessão do Senado pela primeira vez na condição de 2ª vice-presidente da Casa, a senadora Serys Slhessarenko (PT-MT) recebeu a Agência Senado em seu gabinete. Bem-humorada, ela ainda ria da brincadeira feita pelo senador Augusto Botelho (PT-RR), minutos antes, ao dizer a ela que mulheres não poderiam participar da Mesa, por incomodarem a todos com os lugares que escolhem para colocarem suas bolsas.

Serys respondeu a perguntas sobre suas missões na Mesa, suas muitas atividades no Senado - que agora aumentam com o novo cargo -, sobre as missões das mulheres na política e sobre suas expectativas quanto ao futuro. Acompanhe os melhores momentos da entrevista: 

Agência Senado: Uma senadora foi eleita 2ª vice-presidente da Mesa do Senado pela última vez há mais de dez anos. É muito tempo?

Serys Slhessarenko: É muito tempo.Masa explicação é simples: a grande maioria do Parlamento é composta de homens. No Senado, de 81 cadeiras, nós temos 10 mulheres.

Agência Senado: Mas a Mesa anterior, composta por 11 homens, não garantia nem essa proporção.

Serys Slhessarenko: E a Câmara não garantiu nada, nesta nova mesa. É uma luta muito grande. Alguém vai dizer: mas há algumas décadas não havia qualquer representação, e hoje temos 10 mulheres. É significativo, são 12%, mas queremos 50%. Somos 52% da sociedade e os outros 48% são nossos filhos. Precisamos da participação da mulher mais ativa na luta político-partidária, para que a gente chegue realmente às instâncias de poder.

Nós não geramos a vida sozinhas, mas nós gestamos a vida sozinhas. E quem gesta a vida, com certeza, tem competência e luta bravamente pra preservar essa vida em todos os sentidos. Digo que a paz, no mundo ou dentro de uma casa, por menor que ela seja, gira também em função do 'empoderamento' da mulher; da mulher não ser uma pessoa dentro de casa humilhada, desrespeitada, violentada - que a violência doméstica é uma coisa extremamente grave, não só no Brasil, mas na maioria dos países. Isso tem de ser superado para que a paz seja mais facilmente conquistada.

Agência Senado: Algumas ações no Brasil, como a reserva de cotas para mulheres entre os candidatos a cargos proporcionais, já contribuíram para aumentar a presença das mulheres na política. O que mais pode ser feito?

Serys Slhessarenko: A lei de cotas é extremamente importante, por assegurar que 30% das candidaturas de todos os partidos têm de ser de mulheres. Se não preencher os 30%, por falta de mulheres que queiram ser candidatas, essas vagas não são cedidas ao outro gênero. 30% é importante, mas não é o suficiente. Não adianta só ter uma lei que estabelece esse percentual. Precisamos de outras questões que nos ajudem: mais recursos nas campanhas, mais espaço na mídia na hora da campanha, mais espaço para as mulheres nos programas políticos exibidos fora das campanhas. E a mulher tem outras dificuldades. Culturalmente, ela ainda é tida como quem tem que arrumar a casa, cuidar dos filhos, lavar a roupa, fazer todas as lides da casa, cuidar da família. É a terceira, a quarta jornada de trabalho. Agora que a mulher, assim como o homem, sai pra rua pra buscar seu sustento, ela tem que trabalhar oito horas, pega condução, levanta de madrugada pra fazer a boia, pega condução, almoça em pé porque não dá tempo, chega em casa às 22 horas e aí tem que lavar roupa, lavar louça, tem que providenciar comida pro outro dia, tem que ouvir as queixas dos vizinhos sobre os filhos - porque parece que só mulher tem a obrigação de cuidar dos filhos. Claro que tem muitos companheiros homens ajudando nessas lides e na educação dos filhos, mas, culturalmente, como um todo, a sociedade joga essas funções para as mulheres. E isso sem falar que 30% das mulheres brasileiras que têm filhos são sustentáculos das famílias sozinhas, sem ajuda de qualquer companheiro para sustentar filho, para cuidar de um irmão doente, para ajudar pai e mãe idosos.

Agência Senado: Os programas sociais, como o bolsa-família, privilegiam o pagamento das quantias às mulheres. Isso ajuda?

Serys Slhessarenko: Isso é muito importante. Até pouco tempo, lote no meio rural, a moradia popular urbana, só podiam ser dados aos homens. Isso é um absurdo! Quantas mulheres sozinhas precisam de uma casa pra morar.

Agência Senado: O matriarcado brasileiro de que falava o professor (e ex-senador) Darcy Ribeiro, referindo-se ao grande número de famílias brasileiras chefiadas por mulheres...

Serys Slhessarenko: Um matriarcado que não é matriarcado, porque a mulher tem que tomar conta das coisas, mas não tem poder, não tem emprego digno, não tem quem ajude, não tem nada. Mas há avanços grandes, como a mulher poder ter o lote rural em nome dela, poder se inscrever para pegar uma habitação popular. Até bem pouco tempo isso não era verdadeiro. Há 70 anos a gente não podia sequer votar, imagina ser senadora ou deputada... Quer dizer: uma sociedade extremamente machista, não digo nem patriarcal. As mulheres avançaram, mas pela luta de sua organização na sociedade civil organizada para a conquista de seus direitos.

Agência Senado: A senhora está ocupando a 2ª Vice-Presidência do Senado, o que acarretará novas funções às muitas que a senhora já exerce. Como compatibilizar as atividades da senadora "dirigente" com as da senadora "legisladora"?

Serys Slhessarenko: É serviço, muito mesmo. Costumo dizer que sou um extintor de incêndio. Chega no gabinete uma demanda simples e não sei dizer que eu não trato daquilo, vou logo tentar ajudar. Então tem um acúmulo muito grande de trabalho. Também participo muito de comissões. Nos dois últimos anos fui titular da CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania), da CAE (Comissão de Assuntos Econômicos), da CI (Comissão de Serviços de Infra-Estrutura), da CMO (Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização) e suplente da CRE (Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional), da CMA (Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle) e da CAS (Comissão de Assuntos Sociais). Quer dizer: é uma sobrecarga gigantesca. Além de presidir o Conselho Bertha Lutz, é muita coisa. Isso sem falar que, na sexta-feira, vou para o estado, volto domingo à noite ou segunda-feira de manhã, e lá no estado percorro muitos municípios, distantes da capital. Mato Grosso tem suas peculiaridades, tem uma extensão geográfica gigantesca (é o terceiro maior estado) e tem uma densidade demográfica pequena (temos em torno de três milhões de habitantes). Então, pra você ver gente, tem de andar muito, muito, muito mesmo. E as estradas... Você tem estrada federal lá que ainda tem 400 quilômetros sem asfalto. Você tem municípios que estão a 1.500 quilômetros da capital, e a capital não é na ponta do mapa.

Agência Senado: E propositura de matérias, atividade na qual a senhora é muito atuante e eclética?

Serys Slhessarenko: Eu proponho muito projetos em todas as áreas onde a gente vê que a coisa é necessária. Atendo a interesses e necessidades da população de um modo geral, seja na saúde, na área financeira. Eu achando que é politicamente correto, eu apresento a proposição. Outro dia recebi a visita de um diretor de uma grande rede de supermercados, querendo discutir o projeto de minha autoria que proíbe a utilização de sacolas plásticas, danosas ao meio ambiente. A rede já tem uma loja no Rio de Janeiro operando com total respeito ao meio ambiente e ele me convidou para conhecê-la, como também ofereceu sugestões e ajuda para resolver este e outros problemas.

Agência Senado: E quanto à sua atividade na Mesa?

Serys Slhessarenko: Tem muita coisa pra fazer. O presidente José Sarney falou, em seu discurso de posse, das prioridades, e as prioridades que ele elencou, no meu ponto de vista, têm de ser consideradas como prioridade. Tanto a reforma tributária como a reforma política, a ampliação da discussão sobre as Medidas Provisórias, aprofundar e melhorar cada vez mais o relacionamento com os outros Poderes, preservando a autonomia do Poder Legislativo.

Agência Senado: A senhora foi relatora da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano, aprovada ano passado, e agora é 2ª vice-presidente do Senado. Essa vocação para voos cada vez mais altos, somada ao ecletismo de suas áreas de atuação, tornam inevitável uma candidatura ao Poder Executivo?

Serys Slhessarenko: Não, nem tanto. Fui três vezes deputada estadual, depois fui candidata ao Senado, à época sem perspectiva. Fui candidata contra dois senadores e um governador, Dante de Oliveira, que tinha 75% das intenções de votos nas pesquisas. Comecei com 2%, daí a 30 dias tinha 5% e no dia da eleição, ganhei (risos). Então a gente vai continuar, com nossos motes, nossos focos principais, que é a questão ambiental, a questão da mulher, de gênero, que é para nós muito forte; e tantas outras, como o turismo - que acho extremamente importante para o desenvolvimento com sustentabilidade, para o Brasil como um todo e para o Mato Grosso especialmente. O turismo é uma grande chance que a gente tem, uma indústria limpa que gera bastante emprego e traz divisas para o país. A atividade ainda está muito esquecida, apesar de todos os esforços já feitos, como a criação do Ministério do Turismo pelo presidente Lula. O turismo é uma coisa nova e o estado do Mato Grosso ainda tem dificuldades.



05/02/2009

Agência Senado


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