Testemunha diz que foi "laranja"







Testemunha diz que foi "laranja"
A testemunha Sílvio Gonçalves Dubal, que depôs ontem na CPI da Segurança Pública, do Rio Grande do Sul, afirmou ter sido pressionada a colocar seu nome na lista de doadores do Clube de Seguros da Cidadania. Na lista, ele aparece como doador de R$ 500. Ele disse que não doou nada.
Dubal afirmou, ainda, acreditar que outros doadores também seriam "laranjas" no esquema.

O depoimento foi considerado muito importante pelo relator da CPI, Vieira da Cunha (PDT).
""É um depoimento decisivo, porque um doador aparece dizendo que não doou. Fica claro que se esquentou dinheiro. Quem nos assegura que outras pessoas também não tenham sido usadas? Fica caracterizado que havia um laranjal no Clube de Seguros da Cidadania", disse o relator da CPI, Vieira da Cunha.
A CPI investiga a possibilidade de o Clube de Seguros da Cidadania, criado para captar recursos para o PT e integrado por petistas e simpatizantes do PT, ter recebido doações de banqueiros do jogo do bicho.

O presidente do clube, Diógenes de Oliveira, apresentou lista de doadores e de um empréstimo pelos quais a entidade arrecadou fundos destinados à compra de um prédio de R$ 310 mil, posteriormente cedido em comodato -empréstimo gratuito- ao PT.
Oliveira não conseguiu explicar de onde vieram R$ 80 mil usados na compra do prédio. Ele teve seu depoimento suspenso por problemas cardíacos na última segunda-feira e continua internado.

Demissão
Dubal trabalhou para o Clube da Cidadania. Demitido, ingressou com uma ação na Justiça do Trabalho, avaliada em R$ 36 mil.
"Se o que ele disse é verdade, é grave. Mas tenho dúvidas quanto a isso. Ele não deveria ter deposto como testemunha, mas como informante", afirmou o líder do governo na Assembléia Legislativa, Ivar Pavan (PT).
Outro depoimento importante ocorrido ontem foi o de Espártaco Dutra, filho de Olívio, que trabalhou na Condor Seguros durante três anos e fez doação ao Clube de Seguros da Cidadania, para a compra do prédio.

O depoimento de Espártaco Dutra foi rápido, mas bastou para Vieira da Cunha afirmar ser ""uma coincidência" o fato de ele ter declarado doação também de R$ 500 -assim como Dubal. Vieira da Cunha suspeita que Espártaco poderia ter apenas colocado seu nome na lista para justificar a entrada de dinheiro na entidade.

Hoje, o depoimento mais aguardado na CPI é o do secretário da Justiça e da Cidadania, José Paulo Bisol. O PT marcou para hoje um ato público em desagravo ao governo gaúcho. O líder petista Luiz Inácio Lula da Silva deve comparecer ao evento.


Prefeito de Porto Alegre teme desgaste
O prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, está preocupado com o desgaste da imagem do PT, após as denúncias de envolvimento do partido e do governo gaúcho com o jogo do bicho.
Para ele, os petistas vencerem por três vezes as eleições para a Prefeitura de Porto Alegre e a última para o governo do Estado porque o partido foi identificado como uma instituição ética.
"Uma gravação desse tipo fornece uma arma poderosa aos nossos adversários, particularmente aos setores que sempre foram muito criticados por nós", disse Genro, que veio ao Rio para um encontro da Frente Nacional dos Prefeitos.


Ex-tesoureiro disse que jogo do bicho fez doação
Em maio, durante a CPI da Segurança Pública, delegados disseram que banqueiros do jogo do bicho doaram dinheiro ao PT e a obras do governo.
No dia 18 daquele mês, o ex-tesoureiro do PT Jairo Carneiro dos Santos, expulso do partido sob acusação de desvio de verbas, disse que bicheiros doaram R$ 600 mil à campanha de Olívio Dutra ao governo estadual, por meio do Clube de Seguros da Cidadania, formado por petistas e simpatizantes.
O clube teria usado o dinheiro para a aquisição do prédio do diretório regional do PT. No dia seguinte, dirigentes do clube e do PT negaram as acusações. Diógenes Oliveira, presidente do clube, disse que prédio foi comprado por R$ 310 mil por meio de doações legais.
Na CPI, Santos declarou ter inventado as declarações por ter sido expulso do PT. No dia 26 de outubro, porém, a CPI divulgou um CD com conversa entre o ex-chefe de polícia Luiz Fernando Tubino e Diógenes Oliveira. Na gravação, Oliveira diz falar em nome de Olívio e pede a Tubino menos rigor na repressão ao jogo do bicho.
Olívio disse que Oliveira não foi autorizado a falar em nome do governo. Oliveira isentou o governador de qualquer culpa.


Tesoureiro de Taniguchi depõe e reafirma caixa dois
Em depoimento ao Ministério Público do Paraná, o economista aposentado Francisco Paladino Júnior, 63, confirmou a autenticidade do livro-caixa que mostra movimentações financeiras não declaradas à Justiça Eleitoral na campanha à reeleição do prefeito de Curitiba, Cassio Taniguchi (PFL). Paladino Júnior foi o tesoureiro da campanha do PFL, intitulada "Movimento Curitiba Sempre Você".
A existência do livro foi revelada pela Folha, em reportagem que mostrou que o PFL movimentou R$ 29,8 milhões no caixa dois da campanha de Taniguchi.

No depoimento, colhido anteontem à noite pela Promotoria de Proteção ao Patrimônio Público, ele afirma que fazia as anotações referentes à movimentação financeira da campanha a mando de Mário Lopes Filho, coordenador financeiro da campanha.
Como a investigação -instaurada a partir da reportagem da Folha- corre em caráter sigiloso, a reportagem não teve acesso à íntegra do depoimento.

Em nota divulgada ontem, Paladino Júnior ratifica o que disse antes à promotoria. "Examinei minuciosamente os papéis apresentados [pela Folha". Eram, de fato, todos do meu conhecimento, por serem cópias idênticas ao material que manuseei pessoalmente durante a campanha, junto com os coordenadores do comitê financeiro da campanha", diz.
Segundo amigos de Paladino Júnior, ele deixou ontem Curitiba e vai permanecer alguns dias fora da cidade, incomunicável.

O esquema relatado por ele ao Ministério Público apresenta semelhanças com o que levou à cassação do prefeito de Londrina, Antônio Belinati (ex-PFL).
O caixa secreto da campanha de Taniguchi traz anotações manuscritas de entradas e saídas e abreviaturas dos nomes de beneficiários e colaboradores.

Procedimento criminal
Ontem, o Ministério Público Federal instaurou procedimento criminal preliminar para apurar o escândalo do caixa dois na campanha de Taniguchi.
A Procuradoria da República enviou ofício ao Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, requisitando a documentação apresentada na prestação de contas da coligação "Movimento Curitiba Sempre com Você".
O órgão vai requisitar à Folha cópia dos documentos que serviram de base para a reportagem.
Outra medida foi requisitar ao Instituto Vox Populi cópias de documentos relativos a pesquisas realizadas em Curitiba na campanha do ano passado.
As empresas citadas pela reportagem como fornecedoras da campanha de Taniguchi também terão seus documentos analisados pela procuradoria.


Governista diz que denúncias são manobra
O líder do governo na Assembléia Legislativa do Paraná, Durval Amaral (PFL), disse ontem que as denúncias sobre caixa dois na campanha de Cassio Taniguchi fazem parte de uma "manobra política para tentar atingir a imagem do prefeito".
Procurado ontem pela Agência Folha, o prefeito mais uma vez preferiu não se pronunciar sobre o caso.
A reportagem tentou ouvir o coordenador financeiro da campanha do PFL, Mário Lopes Filho, atual superintendente da Secretaria Municipal de Governo, mas ele não foi localizado.
Funcionários do gabinete de Lopes Filho informaram que ele estava "fora, em uma audiência" e que não retornaria ontem ao trabalho na secretaria.


"Sou contra o homossexualismo", diz Garotinho em programa de TV
O governador do Rio, Anthony Garotinho (PSB), condenou ontem o homossexualismo. "Em relação ao homossexualismo, eu digo o seguinte: sou contra, sou abertamente contra", disse numa visita a São Paulo.
Garotinho deu a declaração durante entrevista ao programa "Em Questão", da TV Gazeta. Havia sido indagado sobre o que pensava do projeto de união civil entre pessoas do mesmo sexo, defendido na Câmara pela prefeita Marta Suplicy (PT), quando ela era deputada federal.

"O projeto da Marta era para legalizar a situação patrimonial dessas pessoas que viviam juntas e que ao final da vida tinha de resolver esses problemas de herança, de patrimônio. O projeto que ela apresentou (...) eu defendo."
Presbiteriano, Garotinho disse que sua posição não era um dogma religioso e explicou: "Não gostaria para os outros aquilo que não desejo para mim".
Como Garotinho tem se apresentado como candidato a presidente, no programa de ontem foi questionado se sua opinião sobre os homossexuais não seria prejudicial na campanha.
Respondeu: "Absolutamente. O Brasil precisa de pessoas que defendam as suas posturas [sic". Chega de político que concorda com tudo. Depois que ele ganha a eleição, muda de idéia completamente. (...) Você votou em um e depois é fraudado. Ninguém vai ser enganado por mim. O que eu penso eu digo".

O governador fez questão de diferenciar sua opinião a respeito de homossexuais. "Não sou contra o homossexual. Por isso que eu quis separar. O pecado e o pecador. Então eu separo o homossexualismo e o homossexual. Aí você pode perguntar? O senhor tem amigos? Tenho amigos, claro. Convive com eles? Convivo, respeito, amo a todos eles. Não quer dizer que eu concorde com isso", disse.
No Rio de Janeiro, a assessoria do governador divulgou nota de Garotinho na qual afirma que "em nenhum momento houve a intenção de ofender ou de promover qualquer tipo de discriminação contra os homossexuais.
Além do homossexualismo, Garotinho também falou sobre sua candidatura. Disse já ter tomado a decisão e que não voltará atrás. Para ser candidato, terá de deixar o cargo em abril de 2002.


Itamar Franco ataca traidores do PMDB
O governador de Minas Gerais, Itamar Franco, disse ontem que vai lutar "de cabeça erguida" nas prévias que o PMDB fará para escolher seu candidato à Presidência: "Vamos lutar de cabeça erguida. A traição não conduz a nada. A traição pode existir em alguns homens que estão acoplados ao Palácio do Planalto, mas ela não pode existir plantada nos nossos corações", declarou.


PT quer Duda na campanha de Lula e Genoino em 2002
O publicitário Duda Mendonça deve acumular a condução das campanhas de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência e do deputado José Genoino ao governo de São Paulo no ano que vem.
O PT coloca como condição que Duda trabalhe com exclusividade para o partido em 2002, diferentemente das eleições de 98, quando ele coordenou campanhas de diferentes partidos em vários Estados. A exigência não deve causar empecilho à negociação.

O PT já pagou R$ 595 mil ao publicitário -R$ 280 mil no primeiro semestre e R$ 315 mil no segundo- desde que ele foi contratado, no início do ano, em uma espécie de "período de experiência". Duda foi encarregado de produzir dois programas de TV de 20 minutos cada, além das inserções de 30 segundos e 1 minuto veiculadas em horário nobre.
Apesar das resistências das alas radicais, que condenam o fato de Duda ter sido publicitário do ex-prefeito Paulo Maluf (PPB), o PT, controlado pelos "moderados", deverá aprovar a continuação do trabalho no encontro nacional de dezembro, em Recife.

"O partido de forma geral está bastante satisfeito com o trabalho de Duda e as conversas existem para que ele fique. Mas a permanência depende da aprovação nas instâncias deliberativas", diz Ozéas Duarte, secretário de Comunicação do PT.
Duda é hoje uma espécie de czar do marketing petista. Em consonância com Lula e com a direção partidária, o publicitário deu início a um processo gradual de suavização da imagem petista, com o objetivo declarado de diminuir sua rejeição em setores conservadores do eleitorado.
Na TV, abundaram tons suaves, jingles bem-humorados, participação de atores de novela e imagens de Lula sorridente. O lema é conjugar a crítica ao governo tucano com um formato leve.

Não há ainda uma definição sobre quanto o partido pagará a Duda no ano que vem, mas os valores serão bastante superiores ao que desembolsou em 2001. Em 98, o PT gastou R$ 2,9 milhões, em valores atualizados, pela sua campanha presidencial de TV.
As tratativas para que Duda faça também a campanha de Genoino ao governo de São Paulo também estão avançadas. Mesmo trabalhando com Maluf, em 98, o marqueteiro colaborou na campanha de Genoino a deputado federal.

O privilégio dado a Genoino -que não deverá ser estendido a outros Estados- mostra a importância que o partido dá à construção de um palanque sólido no maior Estado da Federação.
"Há conversas e muito depende da disposição do Duda, mas eu diria que é bastante provável ele fazer a campanha de Genoino. São Paulo terá de comparecer mais com a campanha de Lula agora, porque nas eleições passadas, ficou devendo", diz o presidente do PT-SP, Paulo Frateschi.
Ainda não está definido se Duda pessoalmente cuidaria do programa de Genoino ou indicaria outro publicitário para tocar o dia-a-dia da campanha. Em qualquer hipótese, ele seria o responsável final.
"Tenho grande respeito pelo Duda. Antes de qualquer decisão, é preciso ver se existem condições materiais para ele trabalhar em minha campanha", diz Genoino.

A idéia seria criar um núcleo político unindo as campanhas de Genoino e Lula, havendo o compartilhamento de estúdios de gravação e equipes de produção. Tudo em nome da unidade na linguagem e no padrão técnico.
"É preciso cuidado para a campanha estadual, que tem dinâmica própria, não virar um apêndice da nacional", diz Frateschi.
No que depender de Duda, não haverá problema em tocar as duas campanhas. "Eu já fiz dez em 98, fazer duas no ano que vem seria fácil", diz ele.


PPB divide programa entre 2 presidenciáveis
O PPB dividiu o tempo do programa do ontem entre dois presidenciáveis do partido: o ministro Pratini de Moraes (Agricultura) e o deputado Delfim Netto (SP).
O presidente nacional da sigla, Paulo Maluf, não apareceu nem teve seu nome mencionado durante os 20 minutos da publicidade eleitoral gratuita. O cantor Almir Sater apresentou parte do programa do PPB.
Ao apresentar seu currículo, Pratini não citou sua participação nas gestões de Emílio Médici, quando foi ministro da Indústria e Comércio (1970-1974), e de Fernando Collor, quando foi titular das Minas e Energia (1992). Pratini defendeu uma política econômica desenvolvimentista.

Delfim, que ocupou metade do programa dedicado, expôs sua proposta de crescimento econômico para o Brasil, sustentada no estímulo às exportações e em uma política de apoio à indústria.
O deputado disse que a participação do PPB na aliança governista tem sido muito importante para manter a governabilidade no país. "O PPB tem dado suporte ao governo nas coisas que parecem corretas e tem tentado corrigir algumas coisas que não parecem tão corretas", afirmou.

O deputado elogiou a estabilidade monetária conquistada pelo atual governo e disse que ainda precisam ser feitas reformas importantes, como a tributária, mas criticou o crescimento excessivo da dívida interna na gestão FHC. Disse que o PPB tem bons nomes para concorrer à sucessão presidencial, mas não citou o de Maluf.


Tasso ironiza Serra e amplia divergências entre tucanos
Convencido de que o Palácio do Planalto já teria se decidido pela candidatura de José Serra (Saúde) à sucessão de Fernando Henrique Cardoso, o governador do Ceará, Tasso Jereissati, partiu para a ironia e aumentou o tom das críticas a seu maior adversário no PSDB.
Perguntado sobre o nome da base governista que poderia ser o candidato de consenso em 2002, Tasso reagiu: "A Carmen Miranda". Não satisfeito, disparou alfinetadas contra Serra.

Mostrando-se irritado com o fato de o partido decidir não abordar a sucessão presidencial no seu programa gratuito, no dia 15 -como havia sido articulado pelo presidente dos tucanos, José Aníbal-, por causa da pressão de Serra, Tasso decidiu buscar nos programas de entrevista dos canais abertos de televisão o espaço para falar de sua pré-candidatura.

Hoje, o governador grava entrevistas com Marília Gabriela, da Rede TV!, e com Boris Casoy, da TV Record, em São Paulo. "Eu acho que só com uma exposição maior, realmente, e exposição maior hoje tem de ser na televisão, é que, aos poucos, vai se conhecendo quem é e que idéias tem cada candidato", disse.

Cadeira vazia
O governador não poupou Serra ao tomar conhecimento de que as aparições referentes ao ministro nas inserções publicitárias do PSDB que começam a ser veiculadas amanhã trariam uma cadeira vazia. A idéia, do publicitário Nelson Biondi, seria mostrar que Serra não pudera gravar o programa porque estava ocupado, trabalhando. Serra, em viagem a Qatar, no Oriente Médio, onde participa de uma reunião da OMC (Organização Mundial do Comércio), negou por meio de assessores que tivesse sido consultado sobre a proposta de Biondi.

Tasso, de qualquer forma, reagiu: "Essa cadeira [de Serra" não tem estado vazia nas cadeias nacionais de TV", afirmou Tasso. Serra é o ministro que mais apareceu em cadeia de TV este ano.
O clima de animosidade criado no partido e a convicção de que FHC teria fechado posição com Serra levaram Tasso a admitir a interlocutores que pode vir a boicotar a candidatura do ministro e apoiar o tucano Aécio Neves (MG), presidente da Câmara, ou a governadora maranhense, Roseana Sarney, do PFL, em 2002.
Para Tasso, Roseana chegou ao segundo lugar nas pesquisas de opinião após aparecer no programa e nas inserções do partido na TV. A campanha está sendo conduzida pelo publicitário Nizan Guanaes, o mesmo que agora trabalha para Tasso. "Todos os partidos, do PT ao PFL, usam a TV para apresentar seus potenciais candidatos. Só o PSDB não quer".


Artigos

Meu amigo, o livro
JOSÉ SARNEY

Há pouco menos de 3.000 anos um cego escreveu dois livros: a "Ilíada" e a "Odisséia". Nos séculos 17 e 18 surgiu a idéia de que isso não podia ser verdade, que os poemas homéricos eram reuniões de cantos populares muito mais recentes, que Homero não era uma pessoa. Nessa mesma sequência se afirmou que os Evangelhos eram todos apócrifos, obras do segundo e terceiro séculos. Depois veio a correção dos métodos científicos, que demonstraram que a escrita era corrente na Ásia Menor desde os tempos da guerra de Tróia, e que a unidade dos dois livros fundadores da literatura ocidental era tal que se chegou ao extremo de imaginá-los como obras inteiriças de 12 mil ou 15 mil versos, em vez de coleções de cantos de 300 ou 400 versos.

No caso dos Evangelhos, a descoberta dos documentos do Mar Morto tem recuado sua datação para o primeiro século, nos revelando que o autor do Apocalipse era mesmo o "discípulo amado". As palavras tinham sido gravadas, não havia somente uma tradição oral, por mais forte que fosse esta.
Quando as expedições de Schliemann descobriram Tróia, não havia uma cidade, mas uma sucessão de cidades. A cidade perecera, não era imortal. Mas a descrição que Homero fizera de sua localização permitiu sua redescoberta. Homero e os livros são imortais.

A leitura e a escrita caminharam. A cópia era uma arte, os livros, as bibliotecas, preciosidades. Até a revolução de Gutemberg. Com a imprensa, começaria a difusão do conhecimento e, pouco a pouco, o ler e o escrever foram se encontrando.
Esse longo passo da difusão da cultura oral para a difusão da cultura escrita levou 25, 30 séculos. De repente, com a televisão e o computador, estamos criando gerações que, no espaço de uma vida, passam da cultura oral diretamente para uma nova forma de cultura, a visual.

Como nos templos pré-históricos as pinturas representavam a caça, a vida e a morte, cenário de um ritual, a televisão nos mostra imagens abstratas de bombardeios. A morte, a violência são apreendidos como mitos distantes, catarse do quotidiano. É impossível compreender.
A televisão também a toda hora nos mostra a criança que mal sabe falar mas sabe "clicar o mouse" para "navegar na internet". Dominado pelo efêmero, pelo instantâneo, o computador - e sou um viciado usuário - não fixa conhecimento como a escrita. Não é nova a verificação de que as informações registradas pelos computadores, ante a sucessão de programas e linguagens informáticas, tornam-se ilegíveis em poucos anos, inclusive pelo desaparecimento de equipamentos que tenham a capacidade de ler os "arquivos" armazenados.

Mas o próprio Bill Gates chamou a atenção para que é preciso saber ler e escrever para criar o computador. O caminho para a civilização passa pelo livro. O livro abre a porta do conhecimento, da ciência, da arte. O livro transforma o efêmero em permanente, o humano em imortal.
É preciso garantir o acesso de todos ao livro, viabilizar as bibliotecas e a indústria do livro. Com esta religião apresentei ao Congresso, tendo a cultura como a minha causa parlamentar, um projeto criando uma política nacional do livro, colocando-o no seu altar devido.
Ele deve ser salvo, para que não se torne uma façanha mitológica.


Colunistas

PAINEL

Vida de artista
Aécio Neves (PSDB) contratou, com recursos da Câmara, uma equipe de TV na Itália por US$ 6.000 (R$ 15,18 mil) para registrar a viagem que fará a Roma e a Turim na próxima semana. O tucano, que alimenta o sonho de disputar a Presidência em 2002, ficará dois dias na Itália.

Interesse mundial
As imagens do périplo do tucano pela Itália serão utilizadas pela TV Câmara. Aécio Neves será recebido pelo Papa João Paulo 2º, pelo presidente da Itália, Carlo Azeglio Ciampi, e pelo presidente da Câmara dos Deputados do país, Pier Casin.

Ah, bom
Justificativa de Severino Cavalcanti (PPB), primeiro-secretário da Câmara, para a contratação de uma equipe de TV na Itália para acompanhar Aécio: ficaria mais caro enviar à Europa uma equipe da TV Câmara.

Clima quente
José Aníbal (PSDB) telefonou ontem a Tasso e Serra para tentar botar panos quentes na briga dos dois. É possível que o governador e o ministro se encontrem assim que o paulista retornar do Qatar. Para dar uma demonstração pública-e apenas pública- de que está tudo bem.

Conversa de corredor
Com o recrudescimento da disputa entre Tasso e Serra, aumentou no Congresso a impressão de que o PSDB terá de encontrar uma terceira via para a eleição presidencial de 2002.

Direitos iguais
Itamaristas vão exigir que Michel Temer (SP) se afaste da presidência do PMDB se quiser disputar as prévias do partido contra o governador mineiro.

Salto baixo
Passada a euforia inicial do crescimento de Roseana nas pesquisas, a ordem no PFL é manter a cautela. Jorge Bornhausen pediu aos líderes do partido que evitem provocações ao PSDB e ao PMDB. Nunca se sabe como será o dia seguinte.

E se perder?
Pefelistas já preparam o discurso para uma eventual classificação do Brasil à Copa do Mundo, em partida que será realizada no Maranhão. Vão dizer que o pé-quente da governadora Roseana Sarney (MA) ajudou a equipe de Felipão.

Medida preventiva
Paulo Renato (Educação) diz que chegou a hora de o PSDB definir como será o processo de escolha do candidato a presidente. Afirma que, do contrário, o clima vai acirrar- se ainda mais no partido e há risco de racha.

Punhal histórico
Depois que o tesoureiro de campanha de Cassio Taniguchi (PFL) reconheceu a autenticidade dos documentos de um caixa dois, o deputado Padre Roque (PT-PR) diz que só resta ao prefeito de Curitiba recorrer à história romana: "Até tu, Brutus?".

Vizinho do barulho
Campos Machado (PTB-SP) programou para segunda, em sua casa, um almoço para Ciro Gomes (PPS) e mais 50 aliados do ex-ministro. A casa do deputado fica a 30 metros da de Serra.

Perdido por um
Presidente da Assembléia do ES, José Carlos Gratz foi motivo de piada ontem no Estado. Citado no relatório da CPI do Narcotráfico, o parlamentar declarou que vai antecipar-se à Câmara e restringir, de uma vez, a imunidade parlamentar.

"Nova" direção
José Agripino Maia (RN) deverá ser o novo líder do PFL no Senado, após a renúncia de Hugo Napoleão, que assumirá o governo do Piauí por determinação da Justiça Eleitoral.

Operação pente-fino
Foi cancelada a palestra da desembargadora federal Diva Malerbi, corregedora do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, marcada para anteontem no prédio do Ministério da Fazenda em SP. Motivo: ela foi impedida de entrar no prédio, pela segurança, por falta de crachá.

TIROTEIO

Do senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE), sobre a disputa entre Serra e Tasso pela candidatura do PSDB à Presidência:
- Admiro muito o ministro José Serra. Mas ele não pode achar que vai ganhar a candidatura na base da carteirada.

CONTRAPONTO

Visão empresarial
David Nasser foi o jornalista brasileiro mais famoso dos anos 50 -era a estrela da revista "O Cruzeiro". Influente, foi amigo de presidentes, de ministros, de militares e de banqueiros.
No livro "Cobras Criadas-David Nasser e O Cruzeiro", que está sendo lançado pela editora Senac-SP, o jornalista Luiz Maklouf Carvalho revela que foi Nasser quem indicou Delfim Netto para Costa e Silva.
Nasser tinha relações com o Bradesco e costumava pedir a abertura de agências em cidades onde tinha interesses.
Certa vez, Nasser pediu um favor pessoal ao banqueiro Amador Aguiar. Queria que o banco comprasse uma propriedade sua. Aguiar recusou discretamente - os técnicos do banco não recomendavam a compra. Como Nasser insistiu, Aguiar respondeu com bom humor:
- Pedi um novo estudo. Desta vez, será feito por um vesgo.


Editorial

COMÉRCIO DESIGUAL

O comércio entre países gera crescimento, mas o comércio desigual produz crescimento desigual. Ou seja, aumenta os desequilíbrios entre níveis de renda e de acesso a tecnologia e financiamento.
A Organização Mundial do Comércio, bem como as rodadas de liberalização que a antecederam, colocou sempre em primeiro plano a idéia correta de que há forte relação entre comércio e crescimento econômico. Mas a questão da desigualdade jamais foi atacada pelos economistas, burocratas e líderes políticos dos países ricos, que controlam os foros da diplomacia econômica global.
Não se trata obviamente de uma limitação de ordem conceitual ou institucional, mas da defesa de interesses. É o que transparece novamente na cúpula ministerial de Doha, no Qatar, onde se inicia hoje mais uma rodada de negociações da OMC.

Os países ricos querem ampliar a agenda, ou seja, incluir na pauta da liberalização comercial novos temas, garantir-se mais direitos ou reduzir a discricionariedade das políticas comerciais adotadas na economia global, em especial nos países em desenvolvimento. Para os mais pobres, a prioridade continua sendo a correção dos desequilíbrios acumulados ao longo das últimas rodadas de liberalização comercial.
A Índia, que, ao contrário do Brasil, soube nos últimos anos resistir aos apelos da liberalização comercial unilateral, ameaça boicotar o encontro se a pauta continuar centrada no interesse dos países mais ricos.
Para a diplomacia brasileira, os efeitos negativos das últimas duas décadas de abertura comercial são dramáticos. Nunca houve reciprocidade. A tal ponto aumentou o conteúdo importado da estrutura produtiva brasileira que agora, quase três anos depois da desvalorização cambial, o país gera algum saldo no comércio exterior apenas à custa de recessão e perdas salariais.

Os produtos agrícolas brasileiros continuam discriminados nos mercados sob controle dos governos de países ricos. O protecionismo disfarçado de combate ao dumping apenas ganhou peso e alcance ao longo dos últimos anos.
Em poucos casos, os mais pobres têm forçado algum avanço contra as corporações multinacionais. É o caso das patentes de medicamentos que, sobretudo depois da Aids, são alvo de políticas públicas.
A prioridade em Doha deve ser resistir, colocando em primeiro plano a correção dos desajustes criados por décadas de comércio desigual.


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11/09/2001


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