Ascensão de Serra faz FHC virar alvo








Ascensão de Serra faz FHC virar alvo
Lula, Ciro e Garotinho unem-se para atacar o governo e impedir, por tabela, o crescimento do candidato do PSDB nas pesquisas eleitorais. Reação está pronta: todas as críticas serão respondidas pela equipe de Fernando Henrique Cardoso

O som é o de uma tradicional campainha de telefone. ‘‘Alô. É da companhia de mudanças’’, diz uma voz. ‘‘Ah, o senhor quer trazer empregos? Mas não sabe se usa a nossa companhia ou a outra?’’, continua a voz. ‘‘Ah, mas esse aí está careca de saber que não vai dar conta de trazer oito milhões de empregos’’, conclui a voz. Em seguida, entra a voz rouca e a inconfundível língua presa do candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva. Responde a perguntas do locutor que diz que todos os candidatos prometem empregos, ‘‘inclusive o candidato da turma que está em Brasília faz oito anos e nada de emprego’’. Lula responde que o país, antes, optou infelizmente por um governo ‘‘que subordinou o Brasil à especulação financeira’’, mas agora percebeu o erro e quer mudanças.

Os trechos acima são parte do programa de Lula no rádio ontem pela manhã. Lulinha não quer mais paz e amor, como declarou o candidato no mês passado. E o programa de ontem foi o primeiro ensaio de que essa tática foi abandonada. O presidente vinha sendo poupado, mas no debate de anteontem, o candidato do PT, líder nas pesquisas, uniu-se a Ciro Gomes, do PPS, e a Anthony Garotinho, do PSB, nos ataques diretos ao governo de Fernando Henrique Cardoso. Os três o elegeram como alvo para, indiretamente, atacar o candidato do PSDB, José Serra, e minar a sua ascensão nas pesquisas de intenção de voto. ‘‘Vamos entrar em uma fase da campanha onde o que estará em julgamento são os oito anos do governo de Fernando Henrique’’, avalia o cientista político José Luciano Dias, do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos (Ibep).

No caso do programa de rádio de Lula, a idéia era ironizar Serra como candidato das mudanças. E, imitando o que já fizera Garotinho, a forma usada para identificar o candidato do PSDB foi chamá-lo de careca. O novo tom da campanha petista começou a ser acertado na semana passada. A troca de tática será gradual. Na avaliação do presidente do PT, deputado José Dirceu (SP), Lula não encontrará, nos 30 dias finais da campanha no primeiro turno, a mesma tranqüilidade que tem experimentado até agora. ‘‘Vamos começar a apanhar. E temos de estar preparados para bater também’’, disse Dirceu, em reunião com assessores da campanha. Bater, no caso, significa bater em Serra. E bater em Serra é colá-lo ao governo e explorar os defeitos e fragilidades dos oito anos da administração de Fernando Henrique. ‘‘O paz e amor era para Ciro. Com o crescimento de Serra, Lula fica obrigado a antecipar para agora o debate sobre o governo que estava guardando para o segundo turno’’, resume Luciano Dias. Os assessores de Lula confirmam a análise.

Os mesmos 40%
Assim, Lula une-se a Ciro no ataque à promessa de Serra de criar oito milhões de novos empregos. Ciro voltou a usar, em seus programas de rádio e TV, o quadro com trechos dos programas eleitorais de Fernando Henrique prometendo novos empregos em 1994 e 1998 e de Serra agora, concluindo com a frase: ‘‘Se não fizeram em oito anos, vão fazer em quatro?’’.

Não é diferente do que fez Garotinho. Além de duvidar das promessas de novos empregos, o candidato do PSB lembrou que o governo, na proposta orçamentária de 2003, previu um aumento de apenas R$ 11 para o mínimo. E colou o baixo índice de reajuste nas costas de José Serra.

Mas se para Lula e Garotinho atacar o governo é uma tática natural, o mesmo não se pode dizer sobre Ciro. Segundo o presidente do Instituto Vox Populi, Marcos Coimbra. as pesquisas demonstram que Serra e Ciro disputam uma mesma fatia de eleitorado, em torno de 40% dos votantes. Somados os votos dos dois, o percentual nunca fica longe desse número. Boa parte dos eleitores de Ciro, portanto, é governista. Serra, quando sobe, tira votos de Ciro e vice-versa.

Embora a avaliação geral do governo Fernando Henrique não seja boa, de acordo com a última rodada da pesquisa Vox Populi/Correio, há um percentual de 23% que consideram seu governo bom ou ótimo. É semelhante ao número de pessoas que considera que é preciso continuar com ‘‘todas’’ ou ‘‘com a maioria’’ das atuais políticas de governo: 25%. Nem todos os eleitores que têm esse pensamento votam em Serra. Nenhum vota em Lula. ‘‘No caso de Ciro, bater no governo pode ser um tiro pela culatra. Ele pode causar a queda de Serra, mas provocar como conseqüência a subida de Lula’’, observa Luciano Dias. ‘‘Até agora, nenhum dos dois demonstrou capacidade de agregar novos eleitores. E, nessa onda de ataques mútuos, podem bem se juntar num abraço de afogados’’, emenda Coimbra.

Ao final do debate de segunda-feira, Serra reclamou que todos ficaram contra ele. Não foi um fato isolado. Será assim daqui por diante. E a tática para reagir a isso está montada pelo PSDB. As críticas ao governo devem ser respondidas pela equipe de Fernando Henrique. Ontem, o Ministério do Trabalho já pediu à Justiça direito de resposta contra Ciro. O ministro da Saúde, Barjas Negri, vai processar Ciro para exigir que ele prove as acusações de corrupção no ministério. É a tática do irmão mais novo. Na hora da briga, Serra chama seu irmão mais velho. Fernando Henrique é quem vai ter de sair no braço.


Bagagem cultural
Confira o que leram e escreveram ao longo da vida os quatro presidenciáveis, os detalhes do programa de cada um para a cultura e os artistas que acompanham os candidatos nos palanques e na tevê

O placar do, digamos, verniz cultural dos presidentes da Nova República, que entrou em campo em 1985, aponta honroso empate: 2 x 2. Tivemos, de um lado, José Sarney e Fernando Henrique Cardoso, que pareciam (e parecem) saber a diferença entre os músicos Eric Satie e Pixinguinha. Entre os escritores Marcel Proust e Lima Barreto. Entre os escultores Auguste Rodin e Franz Krajcberg. Do outro, Fernando Collor de Melo e Itamar Franco, que certamente não entrarão para a posteridade como homens capazes de dissertar sobre a produção poética (e ensaística) de Ezra Pound. Ou mesmo de Luiz Gonzaga, o nosso rei do baião.

Não que saber a diferença entre essas antenas-da-raça sirva para avaliar a capacidade de alguém domesticar e civilizar este país. José Sarney aparentemente sabia — e nem por isso deixou muitas saudades. Alçado ao poder pelas trapaças do destino — o ungido Tancredo Neves morreu antes de tomar posse —, deve entrar para a posteridade mais como escritor do que como estadista.

Fernando Henrique Cardoso também sabe (ou pretende saber) a diferença entre a música de Lamartine Babo e John Cage. É homem culto, poliglota, dono de notável currículo acadêmico. Nem por isso chegamos ao paraíso após vivermos durante oito anos sob o domínio dele. O que, por linhas tortas, atesta que o ímpeto cultural do candidato não deverá ser avaliador muito seguro das capacidades de cada candidato administrar o país nos próximos quatro anos.

Isso tampouco significa que Luiz Inácio Lula da Silva seja o candidato ideal. Acusado de parvo em outras eleições, tomou providências: fez barba, cabelo e bigode, abrigou a proeminente barriga em bem-cortados ternos, não faz nada sem ser brifado por bem-informadíssimo assessores, e foi à luta. De igual para igual com os outros candidatos.

Quando o acusam de despreparado para ocupar o mais importante (e cobiçado) cargo do país, discursa, impávido: ‘‘A sabedoria de um homem não está na quantidade de anos que ele passou na escola, mas na sua formação de berço, no caráter e no compromisso com sua fa mília, sua cidade, seu Estado, seu país. Não se aprende política na escola.’’

Mesmo sabendo que esse pomposo mundo das belas artes tem pouco, ou nada, a ver com o pantanoso mundo da política brasileira, é grande a tentação de resgatar pistas que levem a crer que nossos candidatos à Presidência da República estariam interessados em se descobrir homens de cultura.

LIVROS E HOMENS
Três dos quatro candidatos escreveram livros. Quem não escreveu (caso de Luiz Inácio Lula da Silva), prefaciou um — As Cartas Ácidas da Campanha de Lula de 1998, escrito pelo jornalista Bernardo Kucinski) — e organizou outro: Custo Brasil — Mitos e Realidade.

Haverá quem duvide que tenha sido Luiz Inácio Lula da Silva quem de fato escreveu esse prefácio e organizou esse livro. Trata-se de desprezível detalhe. Não é de hoje, políticos em campanha pagam assessores competentes para realizar esse tipo de serviço.

Temos nesta campanha, por exemplo, na equipe de Luiz Inácio Lula da Silva, a presença de uma das mais luminares — injustamente sempre à sombra dos amigos mais famosos Caetano e Gil — inteligências baianas: Antonio Risério.

Talvez a presença dele na equipe de Lula explique o surpreendente texto que o candidato à presidência pelo PT ‘‘escreveu’’ sobre o filme Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, recém-megaestreado nos cinemas de todo o país. Nesse artigo, publicado no site do candidato, lê-se trechos assim: ‘‘O melhor de tudo é que o filme, montado em ritmo contagiante, não cai no mero discurso social. O vazio — e o sangue que o preenche — falam por si.’’

Afora isso, é quase impossível garimpar alguma reflexão, ou simples menção, à cultura e à arte brasileiras nos mais de vinte anos de carreira política de Luiz Inácio Lula da Silva. Não se sabe se leu Monteiro Lobato na infância; ou se considera Machado de Assis nome maior (ou o menor) da literatura nacional.

DE ZÉ SIMÃO A TOM JOBIM
Ciro Gomes lançou dois livros: Ciro Gomes — Um Desafio Chamado Brasil (coletânea de artigos publicados no Jornal do Brasil e O Estado de S. Paulo) e, em parceria com o fiel escudeiro Roberto Mangabeira Unger, O Próximo Passo — Uma Alternativa ao Neoliberalismo. No primeiro, faz alguns (rasos) sobrevôos sobre a cultura brasileira e exalta nomes como Luís Carlos Barreto, Antonio Calado (sic), Carla Camurati, Zé Simão, Arnaldo Jabor, Jorge Amado, Paulo Coelho, Mônica Waldvogel, Adriana Calcanhoto, Tom Jobim e Raimundo Fagner. Como se vê, espécie de cânone-do-crioulo-doido.

Em Ciro Gomes no País dos Conflitos, livro em que é entrevistado por Miriam Leitão, Suely Caldas, Ancelmo Gois, Geneton Moraes Neto e Marcelo Pontes, dá mais algumas pistas sobre o perfil cultural do candidato. Nele confessa: 1) Cem Anos de Solidão lhe causou forte impressão (‘‘Mexeu comigo, mudou minha visão sobre determinadas coisas’’). 2) Achou O Capital, de Karl Marx, muito difícil de entender (‘‘Mas tinha de ler, e li’’). 3) Leu tudo de Graciliano Ramos e Machado de Assis (‘‘Tudo mesmo!’’). 4) Também sentiu dificuldade em entender os livros de Guimarães Rosa (‘‘É difícil para um nordestino ler, porque tem muito termo regional’’). 5) É louco por Luís de Camões (‘‘Aos 15 anos ganhei concurso sobre ele’’).

Camonólogo (como costuma se definir), de boa cepa, encerrou recente encontro com artistas cariocas recitando trechos de Os Lusíadas. Ainda bem (nada contra a poética camoniana, e sim contra a dicção nada pauloautraniana do candidato) que os marqueteiros do candidato não o puseram para fazer o mesmo — pelo menos até ontem — no horário eleitoral gratuito.

FÃ DE MACHADO
José Serra é o campeão em termos de livros publicados: quatro. São, por ordem de entrada em cena: América Latina — Ensaios de Interpretação, Reforma Política no Brasil, Ampliando o Possível (em que tenta capitalizar, mais política que literariamente, a passagem pelo Ministério da Saúde) e O Sonhador que Faz (em que concede caudalosa entrevista ao jornalista Teodomiro Braga).

É exatamente esse último que revela mais pistas da bagagem cultural de José Serra.

Pista 1: ‘‘Aos oito ou nove anos eu havia lido vários dos livros de Monteiro Lobato para crianças. Depois, do Mark Twain, as Aventuras de Tom Sawyer e Huckleberry Finn. Eu lia tudo que me caía nas mãos... Lia de Machado de Assis a Knut Hamsun (um livro chamado A Fome, cujo impacto sinto até hoje). Viciei-me também em Seleções do Reader’s Digest, que comprava nas bancas de jornais.’’

Pista 2: ‘‘Uma boa maneira de aprender português é ler Machado de Assis.’’

Pista 3: ‘‘Circulava pouco, só saía à noite, não via quase ninguém. Passava os dias lendo. (foi quando) Li Os Sertões, de Euclides da Cunha.’’

‘‘De língua portuguesa, (destaco) o Machado de Assis. E também um escritor de que o Machado de Assis não gostava, o Eça de Queiroz. De poesia, o Fernando Pessoa e o Carlos Drummond de Andrade. De literatura em espanhol, o (Jorge Luis) Borges, que é o número um, e o Vargas Llosa; européia, Dostoievski, George Orwell e Graham Greene.’’

A CURA PELA FÉ
Nesta corrida político-literário rumo à presidência, Anthony Garotinho não ficou atrás. Escreveu e publicou Virou o Carro Virou a Minha Vida. Nesse livro, na verdade opúsculo-quase-publicitário-da-crença-que-professa, narra a trajetória existencial que levou o candidato a trocar de religiões. Foi do marxismo-leninismo, dos tempos do movimento estudantil na universidade, ao evangelismo, depois de acidente de carro que quase o levou à morte em 1994.

Um dos momentos culminantes da obra:
‘‘Ele se aproximou e pegou na minha mão.
— ‘Seu’ Garotinho, o que o senhor está sentindo?
Contei a história toda outra vez e repeti com ansiedade a frase: ‘Parece que Deus está falando comigo’, o que provocou uma resposta firme, rápida e surpreendente.
— Parece, não. Ele está mesmo falando! — disse o irmão sem pestanejar e prosseguiu com uma pergunta:
— O senhor sabe o que é esse negócio quente dentro do seu coração?
Eu nem imaginava.
— O senhor está pensando que é azia, não é? Mas isto é o Espírito Santo de Deus queimando todos os seus pecados. ‘Seu’ Garotinho, o senhor tem de entregar a sua vida para Jesus.’’


Com mais votos e empatados
Cristovam e Paulo Octávio lideram a preferência dos eleitores para ocupar as duas vagas do Senado, com 51% e 49%. Em um mês, número de indecisos caiu de 58% para 39%. Frejat, na terceira posição, cresceu menos que os concorrentes

O ex-governador Cristovam Buarque (PT) e o deputado federal Paulo Octávio (PFL) mantêm o favoritismo para ocupar as duas vagas no Senado reservadas ao Distrito Federal nesta eleição. Os candidatos foram os que mais cresceram na segunda pesquisa do instituto Vox Populi realizada a pedido do Correio, nos dias 28 e 29 de agosto, e estão tecnicamente empatados em primeiro lugar. Os dois também abriram vantagem maior sobre o terceiro colocado, o deputado federal Jofran Frejat (PPB), em comparação com a pesquisa anterior, realizada no final de julho.

Como cada eleitor votará em dois candidatos a senador este ano, o Vox Populi pediu aos 712 entrevistados de 18 cidades do DF que citassem os dois concorrentes preferidos. Na pesquisa estimulada, em que os entrevistados têm auxílio de uma lista dos candidatos, Cristovam obteve 51% do total de citações. Paulo Octávio ficou logo atrás, com 49%. A diferença de dois pontos percentuais caracteriza empate técnico, porque a margem de erro da pesquisa é de 3,7 pontos percentuais para mais ou para menos.

Os dois candidatos cresceram significativamente em relação ao levantamento feito no final de julho. Cristovam subiu 14 pontos percentuais contra 11 de Paulo Octávio. Jofran Frejat tam bém cresceu, mas não acompanhou o ritmo dos principais concorrentes. O ex-secretário de Saúde obteve 27% das citações, contra 21% da pesquisa anterior. A diferença entre ele e o segundo colocado saltou de 16 para 22 pontos percentuais. ‘‘A pesquisa confirma a tendência de favoritismo de Cristovam e Paulo Octávio’’, analisou o diretor do Vox Populi, Marcos Coimbra.

A pesquisa, feita oito dias depois do início do horário eleitoral gratuito, registrou mudanças também na disputa pelo quarto lugar. O senador Lauro Campos (PDT) caiu de 11% para 9% e agora está tecnicamente empatado com Fredo Ebling Júnior (PC do B). O candidato da coligação de Cristovam saiu de 1% e foi a 7%. O candidato Pastor Gedalias (PL) manteve os 3% da pesquisa anterior. João Arnolfo (PV), Celson Batista de Oliveira (Aliança Trabalhista), José Casimiro (PMDB) e Milton Cintra (PTN) tiveram 1% de citações cada.

O aumento das intenções de voto dos principais candidatos, exceto Lauro Campos, foi acompanhado de uma queda expressiva no número de eleitores indecisos ou que pretendem votar branco e nulo. Na pesquisa estimulada, o percentual de indecisos caiu de 58% no final de julho para 39%, e os votos nulos e brancos recuaram de 24% para 11%. ‘‘A diminuição do número de indecisos pode ser explicada em parte pelo início do horário eleitoral gratuito. Pela pesquisa, Cristovam foi o que mais se beneficiou dos programas’’, avaliou Marcos Coimbra.

Primeiro voto
O crescimento de Cristovam ocorreu por causa do bom desempenho como primeira opção de voto dos eleitores para senador. O petista é o preferido de 42% dos entrevistados. Na última pesquisa, o percentual era de 31%. O ex-governador cresceu três pontos como segunda opção dos brasilienses, mas ainda está com percentual pequeno: 9%. Na corrida pelo Senado, o primeiro e o segundo votos de cada eleitor têm o mesmo peso.

A distribuição das intenções de voto de Paulo Octávio é oposta a de Cristovam. O pefelista tem a preferência de 27% dos entrevistados como primeira citação, 15 pontos percentuais a menos que o ex-governador. Mas o deputado recupera o fôlego porque é o primeiro colocado como segunda opção de voto, com 22%. Significa que ele consegue votos mesmo entre eleitores dos adversários.

É o caso da promotora de cartões de crédito Renata Lima Silva, 19 anos. Eleitora de Cristovam, a moça escolheu Octávio como segundo voto. ‘‘Voto no Cristovam porque ele tem boas propostas e escolhi o Paulo Octávio como segunda opção porque ele tem condições de fazer boas coisas pela cidade’’, justificou a moradora de Samambaia.

A pesquisa, porém, indica melhoria na situação de Cristovam na tentativa de evitar que seus eleitores também votem em adversários, principalmente Octávio e Frejat. Fredo Júnior, companheiro de coligação do petista, cresceu justamente como segunda citação dos eleitores. O candidato tinha apenas 1% no final de julho e agora está com 7%. A subida é explicada em parte pelo início do horário eleitoral gratuito, em que o ex-governador apresenta Fredo como companheiro de chapa.

A professora Margareth Teixeira, 42 anos, mudou o voto para Fredo por causa da televisão. ‘‘Não conhecia o Fredo. Passei a conhecê-lo depois que começou o horário eleitoral e decidi votar nele’’, contou a moradora do Núcleo Bandeirante, que pretendia votar em Lauro Campos.

Na pesquisa espontânea, na qual os eleitores respondem sem ajuda de uma relação dos candidatos, Cristovam Buarque lidera com 41% do total de citações, quatro pontos percentuais à frente de Paulo Octávio. O levantamento também registrou aumento da diferença entre o pefelista e Jofran Frejat, de 9% para 18%.


Campanha limpa
No município goiano de Formosa, candidatos respeitam acordo firmado com o Ministério Público local e não poluem a cidade com propaganda eleitoral. Cartazes e outdoors ficam restritos a uma área determinada pela Justiça

Em pleno período eleitoral, na Avenida do Bosque, um dos locais mais movimentados de Formosa, o baiano João Moura, 77 anos, vende churrasquinhos e refrigerantes sem ser incomodado por cabos eleitorais e políticos. O ambulante não é o único privilegiado na cidade. Assim como ele, os 72 mil moradores do município goiano, distante 79 km de Brasília, não sofrem com os excessos da campanha eleitoral. Nos muros, postes e cercas de Formosa não há qualquer tipo de propaganda política.

A disputa pelos 50.665 votos da cidade é feita de maneira limpa. Literalmente. Candidatos e militantes respeitam as normas eleitorais e um acordo firmado com o Ministério Público local em 1994. Os moradores condenam os políticos sujões. ‘‘Gosto de candidato limpo, igual a mim. Tenho um nome respeitado e não deixo um papelzinho no chão’’, ressalta João Moura, que mora em Formosa desde 1939. Dono de um posto de venda de gás, Joannes Paulus Carlos Pinto, 22, sente orgulho de ver a cidade limpa. ‘‘Saber que Formosa é uma exceção é ótimo. Eu não voto em candidato que prega cartaz em poste.’’

A sujeira da campanha política que domina o Distrito Federal e a região do Entorno vai até os limites de Formosa. Cartazes de candidatos estão pendurados em todos os postes de iluminação e até em placas de sinalização ao longo da BR-020 — rodovia que liga Brasília ao município goiano. Mas, do trevo de acesso à cidade até os bairros mais pobres não se vê um adesivo ou cartaz pregado em via pública. A propaganda se restringe a outdoors fixados em locais determinados pela Justiça e a grupos de cabos eleitorais com bandeiras em alguns cruzamentos.

Sem punição
O lixo eleitoral em Formosa não é combatido com punições. Há quatro eleições, está proibida a propaganda em muros. Isso foi acordado num termo de conduta criado pelo Ministério Público local e assinado por todos os representantes de partidos políticos. O acordo, que regulariza a propaganda política, é renovado a cada eleição. ‘‘Aqui também fazemos valer a Lei Eleitoral, que deveria se cumprida no Brasil inteiro’’, diz o promotor eleitoral de Formosa, Celso Leardini, 38.

Até ontem, Leardini não havia recebido nenhuma denúncia de abuso na campanha. Já no DF, o Tribunal Regional Eleitoral já protocolou 1.101 denúncias de propagandas irregulares. Desse total, 802 resultaram em autuações. Paulista, Leardini mora em Formosa com a mulher e dois filhos há cinco anos. Os demais integrantes do poder judiciário local também vivem na cidade de ruas estreitas e arborizadas. ‘‘Esse envolvimento com o município nos faz zelar ainda mais por ele. Diferente das demais localidades do Entorno, Formosa tem vida própria. Aqui não é uma cidade-dormitório’’, frisa o promotor.

A sujeira na propaganda eleitoral foi a principal arma do prefeito Sebastião Monteiro Guimarães Filho, o Tião Caroço (PPB), para vencer a eleição de 2000. Tião Caroço não usava panfletos e cartazes. Imagens do lixo provocado pelos cabos eleitorais dos outros candidatos eram exibidas nos seus comícios. ‘‘A população ficava revoltada com a sujeira. Acho que a estratégia deu certo’’, lembra. Tião Caroço teve 66% dos votos contra 29% do segundo colocado.

Ele afastou-se do cargo para coordenar a campanha à reeleição do governador Marconi Perillo (PSDB). Tião Caroço proíbe os cabos eleitorais do seu candidato a jogar qualquer papel no chão.


Anadyr complica vida de Paulinho
Força Sindical tem contas rejeitadas. Entidade desconfia de manobra para prejudicar o vice de Ciro

A ministra-chefe da Corregedoria Geral da União, Anadyr de Mendonça Rodrigues, reprovou ontem a prestação de contas da Força Sindical, que recebeu R$ 38 milhões no ano passado para treinar trabalhadores. A entidade pode ser acionada na Justiça para devolver aos cofres públicos o dinheiro mal aplicado se esse for o entendimento d o Tribunal de Contas da União (TCU) ou do Ministério Público Federal.

As irregularidades cometidas pela Força Sindical na aplicação de dinheiro do FAT têm desgastado politicamente seu presidente licenciado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, candidato a vice na chapa liderada pelo presidenciável da Frente Trabalhista, Ciro Gomes.

Em nota divulgada no meio da tarde de ontem, a ministra recomendou ao Ministério do Trabalho que ‘‘não seja aprovada a prestação de contas’’ da Força Sindical e que ‘‘não sejam repassados recursos à entidade’’ sem que as dúvidas da auditoria estejam plenamente esclarecidas.

No dia 30 de julho, a corregedoria enviou à Força Sindical relatório de 29 páginas que apontava a existência de irregularidades na prestação de contas sobre o treinamento de 245 mil trabalhadores pelo Programa Nacional de Qualificação do Trabalhador (Planfor), que usa recursos do FAT.

No dia 20 de agosto, a entidade sindical entregou à corregedoria
suas respostas, que foram analisadas por uma equipe técnica durante nove dias. O relatório da comissão técnica foi concluído segunda-feira e analisado ontem por Anadyr. De acordo com ela, foram detectadas ‘‘fragilidades’’ na execução dos cursos e as explicações da entidade não foram convincentes. As conclusões da corregedoria reforçam o entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU). Há meses o TCU vem acusando problemas na gestão de recursos do FAT.

A Força Sindical divulgou nota no início da noite em que acusa Anadyr de adotar ‘‘inusitado procedimento’’ na apuração de irregularidades cometidas com recursos do FAT. A entidade diz que vai ‘‘desconhecer’’ os resultados da apuração feita pela equipe técnica de Anadyr e pretende contratar uma auditoria independente para avaliar a execução de cursos de treinamento de mão-de-obra.

‘‘A Força Sindical estranha que a ministra-chefe tenha divulgado nota oficial à imprensa, sobre supostas irregularidades em convênios da entidade, antes mesmo de encaminhar sua ‘‘nota técnica’ à central sindical e ao Ministério do Trabalho’’, diz texto assinado pelo atual presidente da entidade, João Carlos Gonçalves.


Justiça pune Benedito novamente
Não adiantou trocar o azul pelo alaranjado no cenário. Nem retirar da cena a placa onde se lia ‘‘governador azulão’’. A nova versão da paródia eleitoral veiculada pelo vice-governador e candidato ao GDF Benedito Domingos (PPB) incomodou o governador Joaquim Roriz e foi novamente suspensa por decisão judicial. A novelinha, que satirizava problemas como a falta de remédios e o preço da terceira ponte, chegou ao fim por força de liminar concedida pelo juiz federal Jirair Meguerian, do Tribunal Regional Eleitoral (TRE).

Esta foi a segunda vez que Meguerian concedeu liminar suspendendo as sátiras de Benedito Domingos às promessas e realizações de Roriz. A primeira decisão saiu no último dia 28. A Coligação Frente Brasília Solidária, da qual Roriz faz parte, ajuizou um pedido de direito de resposta contra a coligação de Benedito por causa da paródia veiculada pelo vice-governador no horário eleitoral gratuito. Na primeira decisão, o juiz ordenou a suspensão da novelinha do governador Azulão, em que um ator de terno e camisa azul fazia piada sobre a promessa de reajuste salarial de 28% aos servidores do GDF, feita por Roriz na campanha de 1998.

Mudanças
Dois dias depois da primeira decisão, a novelinha voltou ao ar repaginada. Em vez do horário eleitoral gratuito, ela passou a ser exibida em inserções de 30 segundos durante a programação das emissoras. Na decisão de ontem, o juiz argumentou que, apesar de todas as modificações, havia elementos na nova paródia que induziam o eleitor a identificar o alvo das piadas como Roriz. O ator era o mesmo e segurava a mesma mamadeira gigante que caracterizava o ‘‘governador azulão’’. O juiz Jirair Meguerian entendeu o programa como uma reedição velada da novela e concordou com a tese de que ela ridicularizava a imagem do governador.

Segundo a coordenação da campanha de Benedito, a nova versão da paródia foi veiculada pelo menos 15 vezes entre sábado e ontem. Para cada uma das inserções, a coligação de Roriz ajuizou um pedido de direito de resposta no TRE. Até o final da tarde de ontem, a coligação de Roriz entrou com 20 representações. Se conseguir direito de resposta em todas, o candidato do PMDB tomará de Benedito no mínimo 15 minutos de propaganda eleitoral.

‘‘Sabíamos que estávamos correndo esse risco, mas mesmo assim optamos pela sátira, por acharmos uma forma mais eficiente de propaganda eleitoral’’, afirma o coordenador de marketing da campanha de Benedito, Ornílio Gomes. Substituir os ataques diretos pelo humor foi uma maneira de chamar a atenção do eleitor em meio à monotonia do programa eleitoral de TV.

A coordenação escolheu a dedo o intérprete do governador azulão: o ator, cantor e compositor mineiro Saulo Laranjeira, conhecido por encarnar o político demagogo João Plenário em um programa humorístico de TV. Em dez dias, o personagem do programa de Benedito satirizou o desvio de verbas da saúde para a construção da terceira ponte, a falta de segurança no DF e o reajuste salarial de 28% prometido aos servidores públicos por Roriz na campanha de 1998.

Ornílio considera que a suspensão da paródia foi uma censura prévia. ‘‘Nós fizemos humor com os problemas da cidade, eles entenderam como agressão pessoal a Roriz. Não temos culpa se vestiram a carapuça.’’ Pelo sim, pelo não, a coordenação da campanha de Benedito decidiu tirar a paródia do ar definitivamente. Vai substitui-la por ‘‘outro tipo de humor, mais difícil de ser alvo de ações judiciais’’, segundo Ornílio.


Artigos

Lavagem de biografias
Eumano Silva

Nada como uma eleição depois da outra. O tempo passa, os políticos mudam e a população fica sem saber o que fazer diante de tanta incoerência. Quem acompanhou a trajetória política do candidato Luiz Inácio Lula da Silva nos anos 80 não imaginava um dia vê-lo festejar a aliança com o ex-presidente José Sarney.

Naquela época, uma das palavras de ordem preferidas dos militantes petistas era ‘‘Sarney, Sarney, Sarney, suas terras tomarei’’. Antes de chegar ao Palácio do Planalto sem aprovação das urnas, o pai de Roseana tinha presidido a Arena, partido que deu sustentação à ditadura militar. Depois de tomar posse, tornou-se alvo da fase mais radical do partido de Lula.

Líder do PT na Assembléia Nacional Constituinte, Lula defendeu propostas como o fim da demissão sem justa causa e a redução do mandato do presidente para quatro anos.

Foi nessa época que o deputado Roberto Cardoso Alves (PMDB-SP) adaptou para a política brasileira a máxima do ‘‘é dando que se recebe’’, extraída dos ensinamentos de São Francisco de Assis. Sarney garantiu os cinco anos com os mesmos métodos usados na década de 90 por Fernando Henrique Cardoso para conseguir a reeleição. Os dois abusaram das doações em troca de votos dos parlamentares.

Do ponto de vista de Lula, a adesão de Sarney representa uma boa parcela dos votos do Maranhão e do Amapá. Mais do que isso, significa ser aceito por um legítimo representante da elite nordestina, que pode ser útil numa futura base parlamentar.

O acordo com o PT funciona para Sarney como um eficaz mecanismo de lavagem de biografia. Depois de mais de cinqüenta anos de vida pública do lado conservador, Sarney agora desfila ao lado do principal partido de esquerda, como se passasse por um processo de purificação.

O ex-governador Orestes Quércia vai no mesmo caminho. Perseguido sem tréguas pelo PT paulista quando ocupava o Palácio dos Bandeirantes, Quércia agora é candidato ao Senado e m aliança com o PT. Nada mal para quem terminou o mandato acusado de participar de negociatas com equipamentos de Israel e na privatização da Vasp. No dia 6 de outubro, os eleitores terão a chance de julgar se Lula está certo ou errado ao juntar-se a antigos adversários.


Editorial

ESPERANÇAS FRUSTRADAS

Dez anos atrás, o Brasil foi o anfitrião do histórico encontro mundial batizado de Rio—92. O mundo emergiu mais esperançoso daquela maratona de negociações: nações ricas e nações pobres, países pequenos e grandes potências tinham finalmente reconhecido que a humanidade habita uma casa comum; que essa casa, a Terra, estava ameaçada pelo desenvolvimento predador, desigual e irresponsável; e que havia, afinal, uma tarefa comum a ser empreendida, com o objetivo de proteger o meio ambiente e garantir uma vida digna às grandes populações miseráveis do planeta.

Que enorme diferença para o sentimento de fracasso que toma conta do mundo ao fim da Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Sustentável de Joanesburgo! Apelidada de Rio + 10, para sublinhar a continuidade e o progresso em relação ao encontro do Rio de Janeiro, a reunião recém-encerrada na África do Sul mostrou que as belas palavras e grandes propósitos de dez anos atrás encontram poderosos obstáculos nos interesses políticos e econômicos estabelecidos.

Trata-se de interesses tão poderosos que juntaram de um mesmo lado da mesa de negociações os Estados Unidos e países árabes tratados como inimigos pelo governo de Washington. Inimigos políticos, por certo, mas parceiros na economia do petróleo — portanto, igualmente interessados em esvaziar a proposta sustentada pelo Brasil e pela União Européia de fixar metas concretas e mensuráveis para a substituição dos combustíveis fósseis por novas fontes de energia limpa e renovável.

É irônico, para dizer o mínimo, que o governo dos Estados Unidos, no mês do aniversário dos atentados de 11 de setembro, faça frente comum com países que há pouco o presidente George W. Bush acusava de integrarem um ‘‘eixo do mal’’. Mas a tanto alcança o poder do lobby petrolífero. O texto finalmente negociado omite qualquer referência a metas e prazos, limitando-se a uma exortação genérica aos países para que façam esforços voluntários no sentido de aumentar a participação das fontes renováveis na sua matriz energética.

Alguns avanços resultaram da Cúpula de Joanesburgo, particularmente o compromisso de reduzir pela metade, até 2015, o número de habitantes do planeta sem acesso ao saneamento básico. Mas a sensação geral, sintetizada com felicidade pelo ministro do Meio Ambiente do Brasil, José Carlos Carvalho, é a de que se comemora a vitória mínima de não ter andado para trás. É resultado muito modesto para tão grande esforço.

Há dez anos, o então presidente dos Estados Unidos, George Bush, fixou os limites das concessões que estava disposto a fazer na Rio 92: o american way of life não está em negociação, disse ele. Seu filho o repete de forma ainda mais taxativa: George W. Bush nem sequer compareceu ao encontro de Joanesburgo (ao contrário do pai, que passou algumas horas no Rio de Janeiro em 1992).

O presidente francês Jacques Chirac usou uma imagem eloqüente na África do Sul: se o nível de consumo de recursos naturais dos países ricos fosse ampliado para o mundo inteiro, precisaríamos de mais dois planetas para sustentá-lo. Essa é a questão fundamental a ser enfrentada. São os países ricos os maiores predadores do meio ambiente, para manter seu altíssimo nível de consumo e bem-estar material. A eles cabe a maior mudança se quisermos que as esperanças da Rio—92 não se transformem em frustração irreversível.


Topo da página



09/04/2002


Artigos Relacionados


Serra faz de Ciro o alvo

Maciel: Serra vai virar o jogo

Arruda: ascensão vertiginosa interrompida por escândalos

EDISON LOBÃO DESTACA ASCENSÃO DA MULHER

APROVADA EMENDA QUE FACILITA ASCENSÃO DE AUDITOR A MINISTRO DO TCU

SENADO PODE FACILITAR ASCENSÃO DE AUDITOR A MINISTRO DO TCU