Ciro alongará pagamento da dívida
Ciro alongará pagamento da dívida
Candidato afirma que não vai fazer acordo com o FMI e que Lula está caindo numa armadilha
O candidato da Frente Trabalhista à Presidência, Ciro Gomes, apontou ontem como suas três principais bandeiras a retomada do desenvolvimento econômico, a melhor distribuição de renda e a moralização da vida pública. A afirmação foi feita ontem, no Jornal Nacional, da TV Globo, aos apresentadores William Bonner e Fátima Bernardes. A entrevista teve a duração de dez minutos e, nela, Bonner e Fátima usaram quatro minutos e meio na apresentação das perguntas e de argumentos contrários aos do entrevistado.
Ciro negou que tenha temperamento difícil e dificuldade para negociar, lembrando as experiências como governador do Ceará e prefeito de Fortaleza. Diante da insistência dos apresentadores, afirmou: ''Sou de convicções, indignado. Só um verme não ficaria indignado num país com 11,5 milhões de desempregados, os índices de violência que temos e a volta de epidemias medievais''. E completou: ''Não faltam razões para a indignação''.
O candidato garantiu respeito aos compromissos de pagamento da dívida pública. Mas enfatizou a necessidade de inversão de rumos e de um alongamento negociado dos prazos de vencimento da dívida.
Bonner e Fátima voltaram ao tema, perguntando se, na prática, isso não significaria quebra de contratos. Ciro negou. Disse que os investidores que aceitassem um prazo de pagamento mais longo poderiam ser recompensados com juros maiores. E afirmou que a própria redução da taxa de juros ajudaria a pressionar investidores para aceitar o acordo.
Os apresentadores recorreram a um estudo do economista Fábio Giambiagi sobre países europeus que tinham dívidas públicas significativas para sugerir a linha de conduta propugnada pelo FMI e adotada pelo atual governo: a busca de cada vez maiores superávits primários (diferença entre o que o governo arrecada e o que gasta, sem contar juros e amortizações da dívida). Os superávits primários maiores permitiriam que o equilíbrio das contas públicas dependesse menos de novos empréstimos, permitindo, portanto, juros mais baixos. Esse caminho é criticado pela oposição, que identifica nele a origem dos sucessivos cortes em investimentos na área social.
Na saída, Ciro reafirmou que não fará acordo com o FMI. ''Não vou cair na armadilha que Lula está caindo''. Disse, também, que não estabelecerá metas inflacionários. ''Isso é uma estupidez''.
Hoje será entrevistado o candidato do PSB, Anthony Garotinho. Na quinta-feira será a vez de José Serra (PSDB) e, na sexta, do petista Luiz Inácio Lula da Silva.
Lula volta a criticar o FMI
BRASÍLIA E GOIÂNIA - O candidato petista à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, voltou a criticar os acordos assinados pelo Brasil junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI). E responsabilizou o atual presidente, Fernando Henrique Cardoso pela crise econômica atual. “Não sou culpado pelos problemas do Brasil”, disse Lula ao referir- à volatilidade do mercado, com quedas constantes das bolsas seguidas de altas do dólar e aumento do risco-país nas últimas semanas. “É FHC quem está no comando do País”, afirmou.
Ontem, Lula se encontrou com a diretoria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Goiânia. Anunciou que, se eleito, “o Brasil investirá 2% do PIB para atender as demandas do setor de ciência e tecnologia”. O que significa, explicou, dobrar os atuais investimentos.
Pelo menos duas publicações européias – Der Spiegel e La Vanguardia – dedicaram, ontem, espaço ao candidato. Todas repercutindo o impacto da possível vitória do petista sobre a economia brasileira. A revista alemã Der Spiegel publicou artigo alertando que a vitória de Lula em outubro poderá provocar “um desastre financeiro nacional”. A revista traça um paralelo da atuação do candidato com a estrela do pentacampeonato conquistado no Japão, o atacante Ronaldo. Diz que ambos têm influência direta sobre o país. Mas enquanto o jogador de futebol trouxe alegria e produziu efeitos positivos, Lula pode ser “o pior atacante do Brasil”. Em artigo, Thomas Hillenbrand analisa a posição do mercado financeiro numa eventual vitória do petista. “O país desliza dia após dia cada vez mais profundamente na crise econômica, que poderia terminar numa expulsão coletiva de campo, a insolvência do maior país sulamericano”, diz o articulista do Der Spiegel. Se os mercados financeiros continuarem negando capital ao Brasil, por temor de insolvência, o colapso se tornará cada vez mais provável, avalia.
O jornal espanhol La Vanguardia publicou uma entrevista de Lula, em que ele avalia os acordos firmados pelo governo brasileiro com o Fundo Monetário Internacional. Lula classificou-se como “ruins e mal-feitos. O FMI não tem dado uma boa orientação aos países”, diz Lula. “Veja os casos da Argentina e da Rússia. Eles mesmos reconheceram que se equivocaram. Então, por que o Brasil deve aceitar condições equivocadas?” Lula avisa: se ganhar os termos serão outros: “Nosso governo será soberano e não aceitará imposições nem receitas prontas. Vamos discutir e negociar. Se tivermos que recorrer novamente ao FMI, o que espero que não aconteça, será em outras condições”.
Garotinho adia bônus
Papel é tido como trunfo de sua campanha
SÃO PAULO - Foi adiado ontem, para data ainda não definida, o lançamento oficial do bônus de R$ 1 para levantar fundos para a campanha presidencial de Anthony Garotinho (PSB). A assessoria de imprensa do candidato ainda não informou o motivo do adiamento, mas disse que o lançamento ocorrerá até o final desta semana.
A tarefa de cadastrar os voluntários para vender os bônus nas ruas é considerada delicada pelo PSB por envolver dinheiro. O partido também ainda não definiu a quantidade de bônus a ser colocado à venda.
O bônus é tido por Garotinho como um trunfo de campanha. O candidato já criou o slogan ''A campanha do Real contra o milhão'', que terá como base a venda dos bônus.
Hoje, Garotinho estará no Rio, onde se prepara para participar de uma entrevista de 10 minutos no Jornal Nacional. Segundo a assessoria do candidato, a dimensão do programa requer uma preparação diferenciada.
O candidato a vice-presidente em sua chapa e líder do PSB na Câmara, deputado José Antônio Almeida (MA), disse ontem que quer evitar a aprovação do projeto que prevê foro privilegiado na Justiça ao presidente Fernando Henrique Cardoso após a sua saída do cargo.
O projeto passou na Comissão de Constituição e Justiça do Congresso discretamente, na penúltima sessão da comissão antes do recesso parlamentar.
Para brecar o projeto, que segue para o Senado, o deputado precisa recolher 52 assinaturas até o dia 5 de agosto para entrar com um recurso exigindo votação no plenário da Casa. Até agora, Almeida recolheu 12 assinaturas. ''Esse é o ônus de quem exerce função pública. Ninguém é obrigado a disputar o cargo'', justificou Almeida.
Caso o projeto seja aprovado em todas as etapas, os processos envolvendo a ex-governadora Roseana Sarney (PFL-MA) e o ex-senador Jader Barbalho (PMDB-PA), por exemplo, seriam julgados em tribunais superiores.
Tucano perde espaço em MG
O diretório mineiro do PFL não apoiará José Serra. Vai apoiar a candidatura Ciro Gomes (PPS) à Presidência da República. O primeiro evento oficial está previsto para hoje, em Uberaba, com a presença do presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC) e do próprio Ciro. A migração dos pefelistas do segundo maior colégio eleitoral do país em direção a Ciro é um golpe para Serra. O tucano contava com o PFL mineiro. Ch egou a anunciar que esperava esse apoio na quarta-feira passada, em seu comitê, em Brasília. A coordenação de campanha do tucano informou que 14 diretórios do PFL – incluindo Minas – marchariam com o tucano. Mas o próprio PSDB sabia que o noivado do PFL com Serra no estado não ocorreria, como antecipou o presidente da Câmara Aécio Neves (PSDB-MG) ao J B, há duas semanas. O presidente do PFL de Minas, Clésio Andrade, candidato a vice-governador na chapa de Aécio Neves disse que a decisão não era uma surpresa. “Quando nós anunciamos o apoio a Aécio, avisamos que a tendência do partido no estado era apoiar o Ciro, não o Serra”, declarou. “O apoio ao Aécio foi feito a partir de uma consulta às nossas bases”.
Aumenta patrimônio dos presidenciáveis
Em comparação com outros anos, todos acumularam bens
BRASÍLIA - Se os presidenciáveis souberem cuidar do país como cultivaram seu patrimônio nos últimos anos, os brasileiros podem dormir sossegados. Embora sejam necessários quase R$ 3 para comprar um dólar e as dívidas abocanhem R$ 56 de cada R$ 100 produzidos no Brasil, os principais candidatos ao Palácio do Planalto não têm do que reclamar. Em geral, viram suas contas e os bens crescerem nos últimos anos.
A começar pelo candidato do PSDB, José Serra. O tucano não é o primeiro nas pesquisas, mas lidera no ranking do melhor patrimônio. Em 1994, quando foi eleito senador por São Paulo, Serra declarou à Justiça Eleitoral ser dono de R$ 314 mil. Dois anos depois, quando disputou a Prefeitura da capital paulista, informou ter menos da metade: R$ 147 mil. Este ano, disse á Justiça Eleitoral ter entrado na disputa presidencial com R$ 603 mil em bens.
O candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, reclama que a renda do brasileiro desabou - só na região metropolitana de São Paulo o rendimento médio caiu de R$ 1,1 mil em 1995 para R$ 880 em 2001 - , mas não pode apresentar-se como exemplo. Quando candidatou-se pela segunda vez ao Planalto, há oito anos, Lula garantiu ao TSE ter bens avaliados em R$ 207 mil. Quatro anos depois, ao disputar novamente o cargo, informou ter R$ 310 mil. Agora, é dono de patrimônio superior a R$ 422 mil, incluindo aplicações financeiras no valor de R$ 85 mil.
Ciro Gomes, que disputa pela coligação PPS, PDT e PTB, não declarou o valor atual de seu patrimônio. Quando tentou chegar à Presidência pela primeira vez, declarou que possuía R$ 300 mil, listando dois apartamentos, um automóvel importado, parte de uma empresa e cerca de R$ 130 mil em aplicações. Ao listar agora seu patrimônio ao TSE, Ciro informou que possui um apartamento e parte de outro, mas não calculou quanto cada bem vale. Ele disse ter trocado carro importado por um mais novo, mas também não declarou o valor. Ciro mantém R$ 53 mil no banco.
O ex-governador do Rio Anthony Garotinho, que disputa a eleição pelo PSB, também declarou à Justiça Eleitoral manter os mesmos bens de quando concorreu ao governo do Estado, em 1998. A casa, herdou dos pais. É dono da mesma linha telefônica e a casa em que vive é registrada em nome dos filhos. Ele também preferiu não discriminar os valores dos bens.
Nesse mais sobe do que desce patrimonial dos candidatos, até o metalúrgico José Maria de Almeida teve o que festejar. Em 1998, quando também concorreu ao Planalto pelo mesmo PSTU, afirmou que possuía apenas uma linha telefônica e um aparelho celular que, somados, representavam R$ 600. Agora, ele também possui um automóvel e seu patrimônio passou para R$ 9 mil.
Zito dá apoio a Jorge Roberto
Ex-prefeito de Niterói diz que adesão define as eleições: ''É a minha vitória'', comemora
O ex-prefeito de Niterói Jorge Roberto Silveira (PDT) não tem dúvidas: a manifestação pública de apoio que recebeu ontem do prefeito de Caxias, José Camilo Zito (PSDB) foi decisiva: ''Isso significa, simplesmente, a minha vitória. Esse apoio define o vencedor das eleições para governador'', disse Jorge Roberto.
Zito recebeu Jorge Roberto em seu gabinete e adiantou que a adesão de seu grupo político ao candidato da Frente Trabalhista deverá ser anunciada ''em grande estilo'', na próxima segunda-feira, na sede do Sesi-Caxias. Mas o prefeito não quis chancelar o pacto ontem mesmo: ''Ainda vou falar com prefeitos, deputados e vereadores que me apóiam'', explicou. Já há uma reunião agendada com prefeitos, sábado, em Teresópolis.
José Zito disse estar convicto de que não terá dificuldades em obter a adesão do seu grupo ao ex-prefeito de Niterói: ''A chance do nosso pacto se concretizar é de 90%'', afirmou.
Jorge Roberto não conseguia esconder a satisfação, não só pelo apoio de Zito, mas também pelos números da pesquisa Datafolha sobre a eleição estadual, divulgados ontem. O levantamento mostra Rosinha Matheus (PSB) com 30%, e Benedita da Silva (PT) com 21%, empatada tecnicamente com Jorge Roberto, que tem 19%. Solange Amaral (PFL) está com 8%.
''O importante, na pesquisa, é que estou à frente, disparado, entre os eleitores de maior escolaridade. Ou seja, sou o mais bem colocado entre os formadores de opinião. E também sou o candidato com o menor índice de rejeição'', exultou o ex-prefeito de Niterói.
A pesquisa informa que Jorge Roberto tem 32% dos votos dos eleitores com educação superior, seguido por Rosinha Matheus, com 24%, Benedita da Silva, com 17%, e Solange Amaral, com 10%.
E seu índice de rejeição, de 12%, é o mais baixo de todos os candidatos. A lista é encabeçada por Benedita da Silva (38%), seguida por Rosinha Matheus (23%) e Solange Amaral (20%).
''São dados altamente positivos para a minha candidatura. Mas o que muda tudo mesmo é o apoio do prefeito Zito, sem dúvida, o maior eleitor deste pleito'', avaliou Jorge Roberto.
José Camilo Zito fez questão de justificar a escolha de Jorge Roberto: ''Sempre dialogamos, como administradores, e temos pontos de vista idênticos em relação à maioria dos assuntos. Nossos governos deram prioridade à educação, saúde e saneamento, por exemplo. Além disso, a segurança é um ponto de honra de Jorge Silveira.'' O ex-prefeito de Niterói devolveu:
''É por esta razão que o vice da minha chapa é o Flávio Furtado, delegado da Polícia Federal, atuando na Baixada.'' Furtado (PTB), ex-vice-prefeito de Belford Roxo - onde o irmão de Zito, Valdir Zito (PSDB) é o prefeito - estava na sala e sorriu, ao ser mencionado.
''O meu vice não será peça decorativa. Vai trabalhar efetivamente pela segurança no Estado. E na Baixada, o Zito será praticamente um segundo governador. O governador da Baixada.'', continuou o candidato.
Para Jorge Roberto Silveira, Zito ''tem a cara do PDT. Já o convidei várias vezes para vir para o nosso partido''. Zito responde que a questão partidária não é prioridade. Mas revela que Leonel Brizola tem a sua simpatia como candidato a senador. E não se cansa de elogiar Ciro Gomes.
Collor aparece na TV e faz mea-culpa
MACEIÓ - O ex-presidente Fernando Collor de Mello, candidato ao governo de Alagoas pela Frente de Oposição (PRTB), fez ontem um mea-culpa inédito. Em entrevista à TV Pajuçara (retransmissora do SBT no Estado), ele pediu perdão aos eleitores pelos erros cometidos durante os dois anos à frente da Presidência da República. Fernando Collor disse estar amadurecido e arrependido pelos ''arroubos da juventude''.
''Peço desculpas se em algum momento magoei ou prejudiquei qualquer pessoa, qualquer brasileiro. Hoje, certamente não cometeria os mesmos erros do passado, que aconteceram pela imaturidade própria da juventude'', confessou.
O ex-presidente disse que tentou abrir o diálogo e formar, no primeiro ano de sua administração, uma aliança com as forças mais representativas do país - o que incluiria o PSDB. ''Eu tentei uma coalizão. Ofereci ao presidente do PSDB, Franco Montoro, os ministérios da Economia e das Relações Exteriores. Os meus ministros seriam José Serra e Fernando Henrique Cardoso, respectivamente'', revelou.
Artigos
Um diálogo
Jarbas Passarinho
Um pedagogo, dirigente educacional do MST, define a missão deste como: ''A construção da nova sociedade socialista, para o que os sem-terra devem ser postos ombro a ombro com os operários, pois os camponeses foram peças importantes nos processos revolucionários, desde a Rússia, China, Cuba e Nicarágua''. Prepara futuros quadros nas escolas itinerantes, freqüentadas por milhares de filhos dos sem-terra, recebendo maciça doutrinação, desde as cartilhas de alfabetização.
A revista IstoÉ, há três anos, publicou reportagem feita numa escola no interior de Santa Catarina, que comprova o objetivo da educação nos assentamentos: ''Os alunos aprendem a discutir conceitos complicados como luta de classes, reforma agrária e exclusão social........ São 40 mil crianças em cerca de mil escolas de primeiro grau. A pedagogia vai das idéias de Paulo Freire às de Che Guevara, Karl Marx, Mao Tse Tung e Antônio Gramsci''. Em um assentamento provisório, na praça pública de Brasília, esse tipo de escola funcionou, ornamentada com posters de Guevara, Mao e Fidel. A rede escolar é financiada também por certas ordens religiosas e por ONGs internacionais, com o objetivo de ''preparar o homem novo''.
Esse quadro foi mostrado a um militar estudioso da teoria da guerra revolucionária e a um professor universitário de tendências liberais. O militar começou por uma observação sintética: o MST cumpre, à risca, o mote do Foro de São Paulo, em 1990: ''O que foi perdido no Leste Europeu será reconquistado na América Latina''. Mas teme preparar, em vez do ''homem novo'' revolucionário, o pequeno-burguês a partir da posse individual da propriedade. Por isso, vem usando tática de impacto político. Em maio de 2000, cerca de 5 mil militantes ocuparam prédios públicos ao mesmo tempo em 14 capitais. Outros 25 mil foram empregados em invasões de propriedades rurais ou em marchas tão organizadas que fazem inveja aos militares profissionais. Em Brasília, ministérios foram ocupados. Gilmar Mauro, um dos líderes nacionais do MST, disse à revista Veja: ''A vontade de nosso povo é pegar a foice e descer o cacete''. As propriedades produtivas passaram a ter o mesmo destino: a invasão, com roubo de gado, depredações e agressões, que bispos habilmente chamam de ocupação, como se de terra devoluta fosse. A invasão e o forró na fazenda dos filhos do presidente caracterizaram deboche e a desmoralização do poder. O então ministro Raul Jungman, egresso do Partido Comunista, criticou a pedagogia do MST em entrevista: ''Um modelo como esse está voltado para a formação de quadros para um projeto político e não para a formação de cidadãos. É um modelo fracassado, como o usado na União Soviética e em Cuba, país que leva zero em democracia. Falo isto como socialista que sempre fui e continuo a ser''. O MST já não quer terra, mas toda a terra. Consolidou as invasões rurais e já tem os cadáveres que buscou ou fez. Na área urbana, não vejo possibilidade de repetir o movimento estudantil e as greves políticas de 1968. O movimento religioso dos cristãos-marxistas, sim. É uma aliança nítida, alimentada pela Teologia da Libertação, a estimular as invasões. Se Lula não vencer as eleições de outubro próximo, o MST pode tentar a aventura do ''foquismo'' que marcou a guerrilha do Araguaia. Na teoria da guerra revolucionária, a revolução já esgotou as fases iniciais. Só espera as famosas ''condições objetivas'', ensinadas por Marx.
O professor universitário discorda. Não vê a menor possibilidade de um ressurgimento do comunismo. Reconhece a escalada violenta do MST, mas não passa de baderna, mera bagunça. Da esquerda, no Brasil, são adeptos intelectuais e burgueses da classe média. Marx, no Manifesto de 1848, afirma que a classe média não é revolucionária, mas conservadora. Os pobres, entre nós, votam nos populistas. Não há massa para fermentar a revolução leninista. Discorda de enquadramento do MST na lei. Nisso, louva o governo por não agir contra os que se declaram revolucionários. São apenas retóricos. Deles a repressão legal faria vítimas e geraria repercussão negativa nos foros democráticos do mundo. De resto, qualquer aventura que tivesse - mas não tem - possibilidade de vencer uma luta armada no Brasil, não duraria em face do imperativo da Nova Ordem Mundial, que rejeita qualquer violência contra os Estados democráticos.
São duas visões, distintas e antagônicas. Ambas preocupantes. O professor raciocina com probabilidade; o militar, com possibilidades.
Colunistas
COISAS DA POLÍTICA – Dora Kramer
Ainda falta o voto da Xuxa
Longe daqui qualquer impulso sádico de tratar fraturas expostas a golpes de martelo, mas a declaração de voto de Luiz Felipe Scolari em favor de Ciro Gomes não encerra - no campo da idolatria popular -, as contas ainda em aberto das brigas que o tucano José Serra comprou de graça.
Não bastassem os desaforos trocados há tempos com Scolari - tempos menos favoráveis ao técnico, é verdade - Serra, ministro da Saúde, envolveu-se numa refrega com Xuxa, quando ela anunciou que estava grávida, conferindo, no evento, condição de pormenor ao futuro pai.
Serra considerou que a apresentadora dava mal exemplo e incentivava a gravidez na adolescência.
O senador podia até ter lá suas razões palmeirenses para confrontar o então técnico de seu time. Pediu a demissão de Scolari, tal como, depois, durante as eliminatórias para a Copa, milhões de brasileiros também pediram.
No caso de Xuxa, abstraindo-se o fato de tratar-se de uma mulher adulta cuja vida sexual não é da alçada alheia, é bastante provável que o então ministro da Saúde tenha se sentido tão à vontade para comentar as circunstâncias por causa da desenvoltura com que a dona da vida privada a expunha à visitação pública.
Ainda assim, escapou-lhe uma lição básica: com ídolo não se briga. Político muito menos, dada a má colocação da categoria no quesito popularidade. Candidato à Presidência da República então, este mesmo é que não pode se dar ao luxo nem de aceitar provocação, quanto mais de chamar às falas gente que não pode sair na rua pelos motivos opostos aos que levam certos políticos a considerar mais seguro o recesso do lar.
Quem dá autógrafos tem léguas de vantagem em relação a quem pede votos. Injustiça? Em alguns casos, não resta dúvida. Mas, como estamos falando de campanha eleitoral, período em que se costuma pensar com o coração, o fígado e os nervos, a velha rusga com Felipe Scolari pode ter produzido agora um efeito maior que a adesão de qualquer político.
E não porque o eleitor seja um boçal que não consiga distinguir sucessos esportivos de êxitos ou fracassos eleitorais. Não se trata disso. O técnico brasileiro saiu desse pentacampeonato com um crédito mais subjetivo e duradouro.
''Falou'' à nação de persistência, confiança, amizade, firmeza, convicção. Conceitos meio fora de moda, mas que calam fundo à alma de quem se desconforta com essa era de marias-vão-com-as-outras - cujas convicções terminam onde começa a patrulha do vizinho - esses tempos em que princípios nada significam além de vários inícios.
Felipe Scolari - pelo menos até que dirija times outra vez perdedores - pegou a marca daquele que sabe fazer escolhas. Daí o dano pesado dessa declaração de voto sobre Serra.
Foi feita num momento especialmente favorável ao inimigo - em se tratando de Ciro e Serra, não há meio-termo - que, voluntarioso, dado a ímpetos de onipotência, está mais para outros personagens da História que para o artífice d o penta: obstinado, calculista, surdo a superficialidades e intragável só a distância.
Perfil algo semelhante ao do tucano, que dessa proximidade poderia se favorecer, caso o gosto pelo atrito não lhe subtraísse, de quando em vez, a noção de que a boca fechada de hoje pode garantir o voto de amanhã.
Melhor um pouco
Não é, como parece na letra fria da lei, tão draconiana a norma eleitoral que procura garantir tratamento igualitário a todos os candidatos nos noticiários de rádio e televisão.
A Resolução n° 57 proíbe ''tratamento privilegiado a qualquer candidato, partido ou coligação'', que dá a impressão de que as emissoras são obrigadas a conferir tempo igual a todos eles.
O ministro Fernando Neves, relator das normas para a eleição de 2002, esclarece que a leitura deve ser feita da forma inversa: é garantido tempo a todos, mas de acordo com os fatos gerados no dia.
Do contrário, argumenta o ministro, o privilégio estaria caracterizado pela tentativa de igualar diferentes. Se alguém produz uma notícia relevante, é assegurado espaço proporcional à importância do acontecimento. E vice-versa.
Vários pesos
Quem sabe os especialistas possam explicar: por que o PT nacional interfere no diretório de Alagoas quando a representação regional do partido rejeita a aliança com o PL, e usa mão bem mais leve em Minas Gerais, onde a revolta é a mesma?
Por que o pedido de intervenção no Espírito Santo, ante a impotência do poder público contra o crime organizado, enquanto no Rio só o ''escritório'' de Bangu 1 já comprova infiltração do crime no aparelho de Estado?
Em ambos os casos, vai ver conta o peso político dos Estados
Editorial
PROMESSAS DE SOL
A campanha eleitoral começou. Agora é para valer. E os candidatos à Presidência da República sabem que um tema central os desafia: o futuro da economia brasileira. Chegou a hora de explicar aos eleitores o que será feito para alcançar os objetivos de crescimento, geração de empregos e redução da exclusão social. Vêem-se metas comuns nos programas de Luiz Inácio Lula da Silva, José Serra, Ciro Gomes e Anthony Garotinho. Nenhum deles, porém, apontou com clareza o caminho que pretende seguir. Por enquanto, as palavras soam apenas como promessas de sol. Nada além.
Tornou-se monótona e cansativa a acusação de que o ministro da Fazenda, Pedro Malan, deu ênfase excessiva ao controle da inflação, em prejuízo do crescimento. Ora, Malan fez o que tinha de ser feito: assegurou a estabilidade em meio a fortes tempestades, entre as quais a crise da Ásia, o default da Rússia, a perda de fôlego da economia americana e o tango alucinado da Argentina. O Brasil resistiu às intempéries e manteve em padrões razoáveis os fundamentos econômicos. Houve seqüelas. As taxas de juros explodiram e cresceram as dívidas públicas interna e externa. Foi o preço a pagar pelo cenário externo e, também, pelo adiamento de reformas vitais. Adiamentos que devem ser debitados aos políticos.
Se ficou distante das taxas de crescimento ideais, o Brasil evoluiu bastante, até mesmo nos indicadores sociais. Tem razão o presidente do Banco Central, Armínio Fraga, quando diz que, apesar de tudo, foram lançadas as bases de tempos mais generosos. Garante Armínio que o país tem tudo para deixar a zona de risco e ingressar no privilegiado grupo do investment grade. O foco, obviamente, é de médio e longo prazo, não de curtíssimo prazo.
As cartas estão na mesa. E os candidatos não podem blefar. O eleitor saberá separar o joio do trigo. Está alerta. E não confundirá bazófia com realidade.
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07/09/2002
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