Embaixadores apresentam visões diferentes para participação do Brasil nas negociações da Alca



A Comissão Parlamentar Conjunta do Mercosul reuniu duas posturas antagônicas quanto à participação do Brasil nas negociações para estabelecimento da Área de Livre Comércio das Américas. Enquanto o embaixador José Botafogo Gonçalves, que representa o Brasil nas negociações do Mercosul, entende que o país deve participar das negociações, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães acha que a Alca acabará por sepultar o próprio Mercosul.

Em reunião realizada nesta terça-feira (dia 11), Botafogo Gonçalves afirmou que a saída das negociações da Alca "acrescenta mais riscos ao Brasil, pois significa não estar lá para defender nossos interesses". Para ele, a retirada do Brasil das conversas prévias não será acompanhada pelos países do Mercosul.

- O Brasil sair da Alca é tudo o que o americano quer, porque então não haverá nenhuma resistência para fazerem valer seus interesses - disse o embaixador.

Já o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães vê na assinatura do tratado a impossibilidade de o país empreender políticas industrial e tecnológica dignas deste nome. Sem liberdade para impor barreiras tarifárias, o país não poderá proteger setores mais sensíveis de sua economia, afirmou o embaixador.

Para ele, é uma falácia aceitar a premissa de que a economia brasileira é competitiva como a americana. Afirmou que o grau de competitividade das empresas brasileiras - e também das empresas estrangeiras instaladas no Brasil - pode ser medido pela "dificuldade enorme" que ambas tem para exportar seus produtos.

Pinheiro Guimarães afirmou que o Mercosul deixaria de existir, do ponto de vista comercial, com o fim das barreiras. Lembrou que o bloco sul-americano já tem uma grande dificuldade de coordenar políticas macroeconômicas, como as políticas cambial e tributária.

Para ele, é uma ilusão julgar que a Alca aumentaria os investimentos estrangeiros no Brasil. O maior perigo, afirmou, é o contrário: que os capitais aqui investidos regressem aos países de origem, para racionalizar a produção e abastecer os mercados estrangeiros a partir de lá.

Pinheiro Guimarães criticou o fato de a Alca ter uma data para entrar em funcionamento, enquanto outros problemas brasileiros, como a fome, a miséria e dificuldades de infra-estrutura, não tenham data fixa para serem resolvidos.

O senador José Fogaça (PMDB-RS) argumentou que o Japão e os Estados Unidos não têm acordos de livre comércio, mas tarifas aduaneiras tão baixas que eles seriam o próprio livre comércio. Disse também que com a constituição da União Européia houve um grande aporte de recursos para países mais pobres, como Portugal e Espanha.

O embaixador Pinheiro Guimarães respondeu que países como os Estados Unidos têm, sim, tarifas altas, que usam para proteger setores como o de automóveis e o siderúrgico. Disse também que a formação do bloco econômico europeu previu o aporte de recursos para melhoria da infra-estrutura dos países mais pobres, caso de Portugal e Espanha, mas que isto não está previsto nas negociações sobre a Alca.

A senadora Emilia Fernandes (PT-RS) elogiou o presidente da comissão, senador Roberto Requião (PMDB-PR), por transformá-la em um verdadeiro fórum de debates. Lembrando que o Mercosul é "uma questão fundamental para fortalecimento do país", afirmou que a formação da Alca "ainda tem muitas perguntas que não foram respondidas" .

Ao final da reunião, Requião apresentou proposta formulada por Fogaça para que se dê início à formação da "comunidade de cidadania latino-americana", com direitos iguais para os cidadãos. Com a aprovação da proposta, ele determinou que sejam convidados os embaixadores de Argentina, Paraguai e Uruguai para debaterem o assunto na próxima reunião da comissão, terça-feira que vem (dia 20).

11/09/2001

Agência Senado


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