Frente de Ciro ataca governo e Justiça Eleitoral








Frente de Ciro ataca governo e Justiça Eleitoral
Partidos se queixam de ação a favor da candidatura de Serra e ministros reagem

BRASÍLIA - A Frente Trabalhista do candidato Ciro Gomes decidiu partir para o ataque direto contra o governo Fernando Henrique e a Justiça Eleitoral. Em nota divulgada ontem, os três partidos que compõem a Frente acusam dois ministérios e a Controladoria-Geral da União de agir em benefício da candidatura tucana. Levantam suspeitas, ainda, em relação ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

No texto, os presidentes do PPS, Roberto Freire, e do PDT, Leonel Brizola, e o coordenador da campanha de Ciro, Walfrido Mares Guia (PTB), apontam os Ministérios da Saúde e do Trabalho e a Controladoria como "usinas de falsas notícias e verdadeiras calúnias" contra o candidato e seu companheiro de chapa, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho. Eles se dizem, ainda, surpresos com a freqüência com que Serra sai vitorioso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em seus pedidos de direito de resposta contra o candidato da Frente Trabalhista. PPS, PDT e PTB prometem promover hoje um protesto em frente ao tribunal.

Fernando Henrique Cardoso não quis comentar a nota. "O presidente não se pronuncia sobre disputa de cunho eleitoral", disse o porta-voz da Presidência, Alexandre Parola. Já o advogado-geral da União, José Bonifácio de Andrada, reagiu, afirmando que os dois ministérios e a Controladoria são alvo de difamação por parte da Frente.

"A AGU irá aos tribunais pedir o exercício do direito de resposta em nome da União sempre que a administração federal for difamada por qualquer um dos candidatos ou partidos políticos", disse Bonifácio de Andrada. "A honra da administração federal é patrimônio do povo brasileiro e tenho a obrigação de defendê-la."

A nota assinada pelos dirigentes da Frente Trabalhista afirma que as "mentiras" contra Ciro e Paulinho "terminam por macular o processo eleitoral e enodoar com suspeitas sem fundamentos a reputação e a biografia de políticos que sempre marcaram suas vidas públicas pelo compromisso com a verdade e com o bom debate de idéias".

Depois de atacar a Justiça Eleitoral, Freire, Brizola e Mares Guia advertem:

"Sentimo-nos no dever de alertar o País para os desvios pelos quais a disputa pode enveredar. Isso não é democrático. Isso é arriscado. Isso não faz justiça a uma nação que há 17 anos trilha o caminho em busca da plenitude do estado democrático de direito".

"Credibilidade" - O Ministério da Saúde divulgou uma nota de resposta na qual classifica de "levianas e irresponsáveis" as acusações da Frente Trabalhista. "O Ministério da Saúde manterá a postura equilibrada, transparente e firme de responder aos ataques inconsistentes, críticas infundadas e acusações sem provas, como as que vêm sendo feitas no decorrer dessa disputa eleitoral, por entender que essa é a maneira de defender e preservar um patrimônio conquistado com trabalho árduo: a credibilidade do Sistema Único de Saúde", diz o texto.

A assessoria da Controladoria-Geral informou que a ministra Anadyr Rodrigues não comentaria a nota, mesma atitude tomada pelo Ministério do Trabalho.

Anadyr, porém, já negou que esteja agindo politicamente ao investigar supostos desvios de recursos praticados pela Força Sindical na época em que Paulinho presidia a entidade.

Os aliados políticos de Serra também reagiram à Frente Trabalhista. O líder do PSDB na Câmara, Jutahy Magalhães Júnior (BA), por exemplo, rechaçou a denúncia de a máquina federal está sendo usada a favor de Serra. "A impressão que se tem é de que bateu o desespero na campanha do Ciro", disse.

"Eles mentem, agridem, acusam e querem transformar tudo isso em fatos eleitorais. Não são. As decisões do TSE em relação à campanha estão no âmbito do Judiciário, que é autônomo e independente." (Christiane Samarco, Demétrio Weber, Eugênia Lopes e Mariângela Gallucci)


Ciro diz que urna falsa desviaria votos para Serra
Ele afirmou, ao saber de equipamentos achados em Brasília, que eleição poderia ser fraudada

JACAREZINHO – O candidato à Presidência pela Frente Trabalhista, Ciro Gomes (PPS), declarou ontem à noite em Jacarezinho, no interior do Paraná, que as eleições podem ser fraudadas. Ele fez a afirmação com base na notícia de que a Polícia Federal havia apreendido, em Brasília, urnas falsas numa blitz determinada pela Procuradoria Regional Eleitoral do Distrito Federal.

“É só apertar qualquer número que o resultado sai para o José Serra”, acusou o candidato, numa referência a seu adversário direto na disputa por uma vaga no segundo turno.

Para Ciro, a disputa eleitoral está ficando “desequilibrada”. “Devolvo a responsabilidade ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para nos tranqüilizar de que essas eleições não serão fraudadas”, disse. “Em todos os ataques me comparam com (o ex-presidente Fernando) Collor, usam minha imagem, fraudam, editam e o TSE diz que é debate político nornal.”

O candidato voltou a se queixar do rival, a quem acusa de querer lhe atribuir a pecha de pavio curto, briguento e rude: “Eu falo o que precisa ser falado.”

Ciro participou de um comício, acompanhado do candidato a governador do Paraná pelo PPS, Álvaro Dias. Cerca de 2 mil pessoas acompanharam o evento, segundo estimativa da PM.


Lula reforça atuação no Rio para ajudar Benedita
Petistas reagem à acusação de que haveria um pacto com o PSB para garantir apoio no 2.º turno

RIO – A 31 dias da eleição, o PT luta contra a impressão de que evita o confronto com o presidenciável Anthony Garotinho para ter apoio do PSB numa aliança no segundo turno, principalmente no Rio, onde Rosinha Garotinho (PSB) pode vencer no primeiro a disputa pelo governo. Reforçada pela posição do presidenciável petista, Luiz Inácio Lula da Silva, no debate da TV Record – quando ele não defendeu a governadora do Rio, Benedita da Silva (PT), das críticas de Garotinho –, essa aparência ronda a campanha da candidata do PT à reeleição, vista no próprio partido como tímida em relação ao PSB.

Uma ofensiva para tentar fazer crescer a candidatura de Benedita – tecnicamente empatada no segundo lugar com Jorge Roberto Silveira, da Frente Trabalhista (ele tem 15%, e ela, 12%, longe da líder Rosinha, com 45%) – começa na semana que vem. Até o fim da campanha, Lula estará no Estado pelo menos em três grandes eventos de rua, para tentar transferir votos e reforçar o slogan de alguns outdoors: “Quem vota em Lula vota em Benedita.” Mas, segundo números do Ibope, a pregação, até agora, beneficiou mais o presidenciável que a governadora.

“Não há nenhuma orientação da direção nacional do PT para pouparmos o PSB”, disse o deputado estadual Chico Alencar, um dos integrantes da coordenação da campanha petista do Rio. Ele contou que o presidente nacional do partido, José Dirceu, o secretário-geral, Luiz Dulci, e o coordenador de programa de governo de Lula, Antônio Palocci, já reiteraram que o Rio é livre para escolher sua estratégia de campanha. Outro dos coordenadores da campanha estadual confirmou, sob condição de anonimato, que os dirigentes nacionais já negaram haver algum tipo de acordo com o PSB.INTERTITULO/INTERTITULO

Estadista – Entre dirigentes petistas do Rio, atribui-se a posição pouco incisiva do PT em relação ao PSB a Lula, que tem evitado polêmicas mais ácidas com todos os adversários, e à própria Benedita, que se recusa a atacar mais incisivamente Garotinho e Rosinha. Na coordenação, é praticamente unânime a opinião de que Benedita tem de partir para o confronto.

O jornalista Florestan Fernandes Júnior, que cuida da área no Rio, tem dito à coorde nação que pesquisas qualitativas mostram que Benedita não ficaria bem para os eleitores se batesse duro em Garotinho e Rosinha. O ataque frontal poderia ser contraproducente e a posição de “estadista” seria mais adequada. Benedita também já disse aos dirigentes que, se atacasse o casal poderia ficar mal junto ao eleitorado evangélico.

Na semana passada, ela até gravou para o programa de TV um texto agressivo, no qual denunciava amargamente a situação financeira em que a administração do Estado lhe foi entregue pelo presidenciável do PSB, em abril, e se dizia traída por Garotinho e Rosinha. Depois de ver a gravação, porém, ela vetou a exibição, preferindo uma linha menos incisiva.

Se Benedita prefere evitar os ataques diretos aos adversários, a tática de Garotinho não é a mesma. Ontem, em Porto Alegre, ele disse que Lula cedeu tanto que não é mais um candidato comprometido com mudanças reais. “Fica parecendo que, se ele for eleito, não vai poder mandar rasgar os livros dele porque nunca escreveu nenhum, mas pelo menos pedir que esqueçam tudo o que já disse.” Garotinho cancelou os compromissos e voltou ao Rio para acompanhar o velório de uma tia de sua mulher. (Colaborou Elder Ogliari)


Lula é o preferido dos homens, aponta Ibope
Uma eventual vitória de do candidato petista à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, em primeiro turno seria possível hoje se o eleitorado brasileiro fosse constituído apenas por homens. A última pesquisa nacional do Ibope, feita entre 31 de agosto e 2 de setembro, mostra que, entre o eleitorado masculino, o petista tem 43%, a mesma quantidade de votos que a soma de seus adversários nesse segmento.

Ciro Gomes (PPS) tem 18% dos votos masculinos, enquanto José Serra (PSDB) tem 16%; Anthony Garotinho (PSB), 8%; e José Maria de Almeida (PSTU), 1%. Em comparação à pesquisa da semana anterior, Lula ganhou 2 pontos entre os homens, mas caiu na mesma proporção entre as mulheres. No segmento feminino, o petista tem 28% da intenção de votos (Serra tem 19%; Ciro, 16%; e Garotinho, 14%).

Lula também apresentou um crescimento entre os eleitores que vivem em municípios de periferia.

O petista subiu 5 pontos nesse grupo, chegando a 37%, enquanto Serra tem 17%; Ciro, 14%; e Garotinho, 13%. Por outro lado, Lula cai 2 pontos entre os moradores das capitais – esses votos se dividiram entre Serra e Garotinho, ganhando 2 pontos cada. Lula tem 36% nas capitais, Serra 15%; Ciro 18%, e Garotinho, 13%

O petista conseguiu recuperar ainda os votos que havia perdido na Região Sul em julho. No último levantamento, Lula subiu 5 pontos na região, passando de 33% para 38%.

A margem de erro da pesquisa é de 1,8 ponto porcentual. (F.W.)


FHC banca coquetel para agradar às Forças Armadas
Por causa de corte de despesas, Exército tem de restringir festa do 7 de Setembro este ano

ASSINA/ASSINABRASÍLIA – O presidente Fernando Henrique Cardoso, querendo fazer um agrado aos militares, que têm se queixado da pouca atenção que recebem do governo federal e dos rigorosos cortes em seu orçamento, comunicou ao Comando do Exército que desejava participar do coquetel de comemorações do dia 7 de Setembro.

Informado de que os coquetéis nesta data já não são realizados há alguns anos e que, além disso, as Forças Armadas estão em forte contenção de despesas, o presidente avisou que bancaria a festa e liberou R$ 8 mil para a realização de um “Vin d’honneur” (vinho de honra). A verba saiu do orçamento do Palácio do Planalto.

Este é o agrado de Fernando Henrique aos militares. O prestígio à classe será demonstrado também pela presença de todos os ministros de Estado, foram “convidados” a comparecer à cerimônia e ao coquetel, acompanhados de suas respectivas mulheres. O convite, na verdade, foi uma intimação, já que junto com a mensagem seguiu um recado de que a presença de todos é indispensável. No Dia do Soldado, 25 de agosto, o Exército cancelou o tradicional coquetel e o desfile militar da tropa justamente por falta de verbas.

Fernando Henrique quer prestigiar os militares e se reaproximar deles, depois de estar sendo considerado o presidente que mais submeteu a categoria a sacrifícios e que permitiu, pela primeira vez, que 44 mil recrutas fossem dispensados antes do tempo por falta de dinheiro para mantê-los cumprindo os nove meses de serviço obrigatório.

O afago vem também em um momento em que militares da reserva, como o ex-ministro do Exército general Leônidas Pires Gonçalves e o ex-ministro-chefe do extinto Serviço Nacional de Informações, general Ivan de Souza Mendes, ambos integrantes do primeiro escalão do governo José Sarney, estão conversando com interlocutores do presidenciável do PT, Luiz Inácio Lula da Silva.

Lula têm conquistado simpatias na tropa, pelo discurso moderado e nacionalista que vem fazendo.

Já o candidato do PSDB, José Serra é o mais repelido pelos militares.

A pé –A situação está sendo considerada tão crítica pelos militares que alguns ironizam que o presidente Fernando Henrique e os ministros não assistirão a um desfile, mas a uma passeata, porque só haverá desfile a pé. Com recursos reduzidos, os comandantes das três forças optaram por cortar os desfiles de viaturas e de carros de combate, além da apresentação dos aviões e helicópteros, que consumiriam uma quantidade de combustível considerada “preciosa” em tempos de “economia de guerra”. A vinda de tropas de outros Estados também foi dispensada, para evitar despesas de movimentação e pagamento de diárias.

Os desfiles motorizado e aéreo ficarão por conta da Polícia Militar do Distrito Federal e Polícia Rodoviária Federal. (T.M.)


Serra inicia contra-ataque no horário da TV
Defesas da Saúde e da mulher respondem as últimas acusações de Ciro

De tarde, o empresário Antonio Ermírio de Moraes defendendo a gestão do candidato José Serra (PSDB) no Ministério da Saúde, que havia sido acusada pelo adversário Ciro Gomes (PPS) de corrupção e desperdício de recursos públicos. À noite, um conjunto de projetos em defesa da mulher, com depoimentos de Naná Caymmi, Glória Perez, Lucinha Araújo. Foi essa a estratégia, ontem, do comando de campanha dos tucanos para fustigar o rival da Frente Trabalhista.

Mas o comando da Frente Trabalhista também aumentou ontem o tom de suas críticas, em que junta a história do governo Fernando Henrique com os planos de Serra. Na TV, à noite, Ciro mostrou imagens em preto-e-branco de FHC e Serra fazendo declarações sobre emprego, e jogando em cima o carimbo “Promessa Não Cumprida”.

No rádio – A batlha começou logo de manhã, pelo rádio. Os tucanos retomaram a frase de Ciro sobre o papel de Patrícia Pillar na campanha – que seria o de “dormir com ele”. A apresentadora leu uma nota, mandada pelo Conselho da Condição Feminina, segundo a qual “as mulheres brasileiras não aceitaram as desculpas esfarrapadas" apresentadas pelo candidato. No horário da noite, na TV, a vice da chapa, Rita Camata, declarou que “Serra trata as mulheres com respeito e dignidade”. A seguir, o candidato enfileirou idéias que pretende implantar, se eleito, entre as quais a “Rede Quero-Quero”, de creches em todo o País, o sistema de cotas para cargos de chefia em áreas públicas, casas-abrigos para vítimas de violência familiar. E Ciro, em seu espaço, apresentou pessoas queixando-se das filas nos hospitais e da dengue. O candidato entrou, declarando: “Isso é o que vamos mudar, fazendo com que funcione o SUS”.

Na entrevista da tarde, Ermírio afirmou que Serra “moralizou os pagamentos na área da saúde no Brasil”. Como exemplo, deu dados da própria Beneficência Portuguesa, onde 60% das internações são de conveniados do Sistema Único de Saúde (SUS) e 80% das cirurg ias do coração também são feitas dentro desse sistema. INTERTITULO/INTERTITULO


Artigos

O novo patamar
Washington Novaes

Parece claro, com o fim da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, em Johannesburg, que o deslocamento das chamadas questões ambientais para o centro das discussões sobre o desenvolvimento coloca novas, complexas e urgentes questões na agenda mundial. Crises até - ainda sem definição clara de rumo.

Na aparência, divergem muito as avaliações sobre a cúpula. Ambientalistas e representantes de organizações não-governamentais não hesitam em qualificá-la de "retrocesso", "fracasso", "Rio menos 10" ou até de "Cúpula Mundial dos Acordos Vergonhosos", como disse uma das maiores ONGs do mundo, o WWF, em seu comunicado, referindo-se ao Plano de Implementação (das conferências de mudanças climáticas e da biodiversidade, assim como da Agenda 21 mundial, aprovadas na Rio-92), discutido durante vários dias. E que resultou em escassos consensos, noticiados nos últimos dias. Diplomatas e chefes de Estado preferem dizer que houve avanços e foram importantes, ainda que muito mais modestos do que se esperava. Longe dos microfones, câmeras e blocos de anotações dos jornalistas, entretanto, admitem o impasse.

Já em discussões paralelas, o que mais vem à tona é o que tem sido qualificado de "crise do sistema multilateral de negociações", ou "crise do sistema ONU", ou "crise do modelo de conferência (como esta) que exige consenso para qualquer decisão". Sempre com a pergunta: que modelo poderá levar a soluções de problemas tão sérios e intrincados como os que estão sobre a mesa?

Quem ouviu os discursos de chefes de Estado - palavras que não representam compromissos formais - nas sessões plenárias se impressionou com o quadro dramático por eles exposto, tanto na área ambiental como na social.

O chefe do governo alemão, Gerard Schroeder, por exemplo, não hesitou em iniciar suas palavras dizendo que mudanças climáticas não são mais um prognóstico, uma possibilidade; já são uma realidade. Pregou o desmantelamento dos subsídios à agricultura nos países mais ricos (US$ 1 bilhão por dia), que dificultam o acesso dos produtos primários de países em desenvolvimento (inclusive do Brasil) a seus mercados. Verberou a pobreza e prometeu aumentar a ajuda aos países mais pobres.

O primeiro-ministro Rassmunsen, da Dinamarca, disse ser insustentável um mundo em que os países mais ricos, "com 15% da população, concentram 80% da produção, do consumo e da renda". O presidente Jacques Chirac foi ainda mais dramático, ao lembrar que precisaríamos "de dois planetas como o nosso" se todas as pessoas consumissem como norte-americanos, europeus ou japoneses.

Mencionou a nuvem de poluentes de milhões de quilômetros quadrados que "envenena o continente asiático". As mudanças climáticas já afetando muitas partes do mundo e ameaçando eliminar do mapa dezenas de países insulares.

"Não podemos dizer que não sabíamos."

O primeiro-ministro Tony Blair lembrou que "a guerra de um país atinge outro", assim como "a contaminação produzida por um atinge outros". O que é inaceitável, pois "valemos todos a mesma coisa", não podemos concordar que "a África continue sendo uma cicatriz na consciência do mundo".

Não é preciso relembrar outros pronunciamentos. Estes bastam para evidenciar alguns pontos fundamentais:
Nossos modos de viver, nossos padrões insustentáveis de consumo geram problemas - ditos ambientais - que não respeitam fronteiras administrativas nem geopolíticas e colocam a questão num patamar novo: o dos limites planetários insuperáveis; o simples crescimento econômico não terá como superar o problema, já que não haverá recursos físicos (ou recursos naturais) suficientes para manter ao longo do tempo um crescimento capaz de elevar toda a população mundial a padrões de renda e consumo mais altos desejados, como têm afirmado numerosos cientistas; não dispomos de instituições em âmbito planetário capazes de criar, para todos os países, regras que enfrentem a insustentabilidade dos padrões de produção e consumo - e instituições com poder ainda para exigir a mudança.

Algumas conseqüências desse quadro começam a evidenciar-se. Primeiro, a de que, na verdade, não está claro ainda o que deve ser feito nesse âmbito planetário para instituir esse novo padrão civilizatório - que é do que se trata, ao fim e ao cabo. Segundo, que começa um novo debate, em que alguns pensadores dos países mais ricos contestam o conceito do "desenvolvimento sustentável", alegando que não tem sentido pensar em garantir os direitos das futuras gerações se não somos capazes de suprir as necessidades de uma grande parcela dos atuais habitantes da Terra. A tarefa indispensável e urgente seria promover o máximo de desenvolvimento econômico - já - para suprir essas necessidades. E esquecer a sustentabilidade. Mas sem responder como se fará para enfrentar as conseqüências de limites já superados e que geram questões como a das mudanças climáticas. Ou, como constou do texto da declaração política desta cúpula mundial, com o "apartheid" mundial levando a maioria pobre do planeta a "descrer dos regimes democráticos".

Complicado. Mas inarredável. Por isso, parece muito provável que seja essa a discussão central dos próximos tempos. Se for, o impasse de hoje será extremamente útil. Não só exigirá a presença dessas questões na base de todas as políticas públicas e planejamentos privados, como abrirá caminho para cogitações e debates que possam conduzir a novos patamares.

Melhor o impasse do que a caminhada cega em direção ao indesejável.


Editorial

UM BOM ACORDO PARA O NOVO GOVERNO

O próximo governo será beneficiado pelo novo acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), cujos detalhes foram revelados na quinta-feira pelo ministro da Fazenda, Pedro Malan. Segundo todas as projeções, 2003 ainda será um ano difícil para a economia global. O mercado financeiro continuará retraído. Mesmo que as tensões diminuam, os investidores deverão exibir, ainda por algum tempo, acentuada aversão ao risco.

Nesse quadro, será precioso o financiamento de US$ 24 bilhões que o FMI deverá liberar para o Brasil, em quatro etapas, se os termos do acordo forem cumpridos de forma satisfatória. O programa de 2003 não terá nenhum custo que um presidente sensato não estivesse disposto a assumir, no começo de seu mandato.

Sensatez é a palavra-chave: 2003 será um tempo de teste para o próximo governo, que terá de mostrar, de modo inequívoco, seu compromisso com a estabilidade. O mercado será mais severo, nesse teste, se for eleito um presidente da oposição. Muitas outras previsões para 2003 podem estar erradas. Essa é uma das mais seguras e nenhum político razoável deverá menosprezá-la.

Com ou sem acordo com o FMI, o presidente eleito deverá cuidar de obter, para o conjunto do setor público, um superávit primário pelo menos igual a 3,75% do Produto Interno Bruto (PIB).

Essa meta foi prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias e será confirmada no Orçamento-Geral da União. Não é novidade para nenhum candidato. Será preciso, segundo o acordo, cumprir no primeiro semestre 59% dessa meta. Mas isso é normal, pois a receita de impostos é mais concentrada nesse período, ao passo que a despesa maior ocorre no resto do ano.

Só para 2002 foi elevada a meta do resultado primário, que corresponde à diferença entre arrecadação e gasto, excetuada a conta de juros líquidos.

Como está prevista uma receita adicional, neste fim de ano, o governo se dispôs a rever para 3,88% do PIB o resultado primário. Isso não implicará maior sacrifício, porque o Tesouro deverá arrecadar R$ 1,7 bi lhão além do que estava projetado. Esse dinheiro extra será aplicado no pagamento de juros. Será adicionado, portanto, ao esforço do governo para controlar a dívida pública. A nova administração será beneficiária desse esforço.

Um resultado semelhante está programado para os 12 meses que terminarão em julho próximo, mas boa parte do esforço será realizada pelo atual governo. O presidente eleito não terá dificuldade maior para cumprir esse objetivo intermediário, em condições normais de execução do Orçamento. Para o final de 2003, a meta anual será reduzida para 3,75%.

Embora se preveja um orçamento apertado para o ano que vem, o governo poderá trabalhar, muito provavelmente, com juros um pouco menores que os de hoje.

Se não houver maior turbulência no mercado internacional, e se a nova administração brasileira for bem avaliada, o câmbio também tenderá a se acomodar.

Esses fatores contribuirão para um crescimento econômico pouco maior que o deste ano. Essas mudanças deverão facilitar a arrecadação de impostos.

O próximo governo será favorecido, também, por uma inovação nas cláusulas do acordo.

Tradicionalmente, os investimentos públicos eram incluídos na despesa e afetavam o cálculo do resultado primário. Isso valia tanto para os gastos de capital da administração direta quanto para as operações das estatais. Pelo novo acerto, parte dos investimentos da Petrobrás poderá ficar fora desse cálculo, o que será benéfico para o crescimento da economia.

As metas de inflação combinadas com o Fundo são mais folgadas do que aquelas fixadas, até recentemente, pelo Banco Central. Não deverão dificultar o cumprimento do programa. Algum candidato, ou assessor, sempre poderá dizer que terá pouco espaço, em 2003, para cumprir seu programa. Isso é em boa parte verdadeiro, mas não por causa das metas acordadas com o Fundo.

Nenhum programa será iniciado com segurança, em 2003, se o governo menosprezar as condições internacionais e a disposição do mercado financeiro. Pode-se não gostar dos dados objetivos e tentar mudá-los. Quando não se pode mudá-los, deve-se tentar a adaptação menos custosa. Só não se pode ignorá-los ou fingir que o mundo é diferente.

Adotar esse caminho é cortejar o desastre.


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09/06/2002


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