Jader irá renunciar à presidência do Senado



Jader irá renunciar à presidência do Senado Saída do senador foi negociada em reunião convocada por Michel Temer entre líderes governistas e FH O senador Jader Barbalho (PMDB-PA) reassumiu ontem a presidência do Senado e, em seguida, anunciou que deixará o cargo no início da próxima semana, numa tentativa de pôr fim à crise política que vem desgastando a instituição. O anúncio foi quase simultâneo a uma reunião entre os presidentes dos partidos governistas e o presidente Fernando Henrique Cardoso, da qual o PMDB saiu com uma garantia: fica com a presidência do Senado. Eleito presidente do PMDB no último domingo, o deputado Michel Temer (SP) comandou as negociações. Na hora do almoço, agendou a conversa com FH. À tarde, levou os presidentes do PSDB, do PFL e do PPB ao Planalto. Foi o próprio Jader que autorizou Temer a procurar os líderes e FH para negociar. Ele pensava em reassumir, mas a renúncia ao cargo sempre foi uma alternativa analisada. Dois fatos precipitaram a decisão: um movimento do PFL para eleger o novo presidente do Senado, detectado pelos PMDB, e a decisão do Conselho de Ética de sugerir à Mesa que impedisse o retorno do senador à presidência. Jader disse que fará um discurso na segunda ou na terça-feira para formalizar a renúncia. Pelo regimento, o vice-presidente, Edison Lobão (PFL-MA), assume para comandar a eleição do seu sucessor, que deve ser convocada no prazo de cinco dias. O gesto de Jader foi anunciado no dia em que cresceram as pressões no Senado para que ele não voltasse a presidir a Casa. Pela manhã, o líder do PFL na Câmara, Inocêncio Oliveira (PFL-PE), comunicou à Executiva nacional do partido que os deputados do partido iriam boicotar as sessões do Congresso que fossem presididas por Jader. A volta de Jader à presidência se tornou insustentável depois da decisão do Conselho de Ética de recomendar à Mesa Diretora tomar medidas para impedi-lo de reassumir enquanto estivesse sob investigação. Os próprios senadores do PMDB integrantes do conselho chegaram a propor uma solução alternativa para chegar ao mesmo fim: uma comissão de diferentes partidos para fazer um apelo a Jader. Na quarta-feira, os senadores Romeu Tuma (PFL-SP) e Jefferson Peres (PDT-AM) apresentaram ao conselho um relatório contundente, propondo abertura de processo por falta de decoro contra Jader, acusando-o de ter se beneficiado do dinheiro desviado do Banpará. Ele foi acusado também de ter mentido a esse respeito ao negar seu envolvimento no caso. O relatório de Tuma e Peres será votado na quinta-feira da próxima semana. Se for aprovado e acolhido pela Mesa, terminará o prazo para que uma eventual renúncia de Jader ao mandato suspenda o processo. Sarney é cotado para o comando da Casa O senador José Sarney (PMDB-AP) figurava ontem como favorito para assumir a presidência do Senado após Jader Barbalho anunciar sua renúncia ao comando da Casa. Sarney, que já presidiu o Senado, é apoiado pelo Palácio do Planalto, pelo presidente do PFL, Jorge Bornhausen (SC), por PPB, PSDB e PTB. – Até quinta-feira, esse será um assunto resolvido – disse o senador Pedro Simon (RS). No entanto, existem outros nomes interessados em substituir Jader, que deverá renunciar à presidência segunda ou terça-feira. São os senadores José Fogaça (RS), Renan Calheiros (AL), líder do partido no Senado, e José Alencar (MG). A lista é integrada ainda por Gerson Camata (ES) e Ramez Tebet (MS), atualmente no Ministério da Integração Nacional. Considerando uma decisão “acertada” por parte de Jader, Simon disse que a renúncia poderia ter ocorrido há mais tempo. Para ele, Fogaça tem chances de vir a ocupar a presidência da Casa: – As chances são boas, principalmente porque Sarney só aceita se for uma unanimidade. Segundo Simon, o espírito da Casa é não criar nenhum incidente e evitar que a vaga, pertencente ao PMDB, seja cobiçada por outra legenda. Fogaça, por exemplo, já avisou a alguns colegas que pretende concorrer à indicação. – Temos de caminhar para uma solução que assegure ao Senado seu pleno funcionamento – disse. Se Fogaça mantiver essa decisão poderá complicar o favoritismo de Sarney, que tem reiterado que só aceitará a missão se for convocado por unanimidade por seu partido e pelo Senado. Sarney, que estava ontem no Rio, disse a correligionários que não quer o cargo. Ao mesmo tempo, pediu tempo para pensar. Em janeiro, foi procurado pelo ex-senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), que pretendia fazê-lo seu sucessor. Na avaliação de senadores do PMDB, a opção Renan Calheiros criaria dificuldades políticas no plenário do Senado e com o Palácio do Planalto. Ele é considerado um dos políticos mais próximos de Jader e terá que atuar como coordenador da escolha na bancada. Tem ainda vetos do PFL e do PSDB, por causa de suas brigas com Bornhausen e as acusações que fez à família do ex-governador Mário Covas, quando foi ministro da Justiça. O nome de Alencar surge como uma alternativa que não teria resistências do plenário. O senador, porém, não tem a unanimidade do PMDB. Contudo, poderia derrubar resistências na oposição, já que é respeitado nos partidos de esquerda a ponto de ter sido convidado por Luiz Inácio Lula da Silva, provável candidato do PT à Presidência, a integrar a sua equipe. Governo brasileiro se irrita com críticas de Cavallo ao real Malan garante que sistema de câmbio flutuante será mantido O governo reagiu com irritação às declarações do ministro da Economia da Argentina, Domingo Cavallo, à “política brasileira de desvalorização” e às suas ameaças de rompimento das relações de seu país com o Brasil e com o Mercado Comum do Sul (Mercosul), caso o governo brasileiro mantenha o sistema de câmbio flutuante. Por meio de nota oficial, divulgada ontem, o Ministério das Relações Exteriores reforçou o contra-ataque disparado na noite anterior pelo ministro da Fazenda, Pedro Malan, e a decisão do governo de manter seu regime cambial. A reação brasileira foi ordenada pelo próprio presidente Fernando Henrique Cardoso. FH disse ontem, durante reunião com congressistas, que “o (ministro argentino Domingo) Cavallo passou dos limites, segundo relato do deputado Eduardo Campos (PSB-PE). A nota enumera dois parágrafos com declarações de Malan, que foram corroboradas pelo Itamaraty. – O Brasil tem um regime de taxas de câmbio flutuante, que não pretende abandonar. É absolutamente equivocada a idéia de que o Brasil persevera em uma política deliberada de desvalorização – afirmou o ministro, conforme o texto. – Câmbio flutuante, por definição, pode depreciar como pode apreciar. Este regime será mantido. Fontes diplomáticas explicaram que o Itamaraty está consciente de que os ataques de Cavallo ao Brasil não tiveram como principal destino os gabinetes de Brasília. Assim como ocorreu nas ocasiões anteriores, o discurso do ministro teve como objetivo convencer empresários e formadores de opinião da Argentina de que o aumento de suas exportações é vetado pela desvalorização do real, que encarece seus produtos embarcados para o Brasil. O problema não estaria, nessa lógica, no regime de câmbio fixo adotado desde 1991 pelo país vizinho, que impede a adequação do valor da moeda local. Apesar dessa conclusão, a cúpula do governo brasileiro irritou-se mais uma vez com a fórmula adotada por Cavallo. Primeiro, porque esses ataques ocultam o fato de o Brasil ter feito concessões seguidas à Argentina desde março, quando a crise econômica local se aprofundou. Entre essas medidas está a suspensão da Tarifa Externa Comum (TEC), do Mercosul, para que o país vizinho pudesse reduzir as alíquotas de importação de bens de capital e elevar as de bens de consumo. O segundo motivo de irritação, expresso nas declarações de Malan, está no comportamento de Cavallo, que prefere tratar as divergências entre os sócios do bloco econômico por meio da imprensa e de críticas públicas em vez de levá-las à discussão nos foros bilaterais ou do Mercosul. Malan respondeu, dizendo que “se algum parceiro comercial pretende analisar o que fazer com o Mercosul, o Brasil espera que isso seja analisado nos foros apropriados, e não por meio de declarações à imprensa”. Reduzido ICMS do arroz gaúcho industrializado Estado vai exportar o grão para o Irã O setor arrozeiro gaúcho festejou ontem duas novidades: a redução do ICMS nas vendas do grão beneficiado para o Sul e o Sudeste e um acordo para exportação de 30 mil toneladas do produto ao Irã na próxima safra. Adiminuição da carga tributária foi anunciada pelo secretário da Fazenda, Arno Augustin. As indústrias de arroz ganharão um crédito presumido de 5% do ICMS nas vendas incrementais. A base de cálculo do incremento será de 70% do valor das saídas de arroz industrializado no período de setembro a dezembro de 2000. O benefício será retroativo a 1º de setembro e vigora até 31 de dezembro. Para o secretário executivo do Sindicato das Indústrias de Arroz, César Gazanela, a reivindicação do setor é a redução da alíquota de 12% para 7%. No entanto, o meio-termo anunciado pelo governo agradou: – Poderá aumentar a competitividade de nossa indústria, que perdeu terreno para outros Estados. A notícia da exportação foi dada pelo presidente do Instituto Rio Grandense de Arroz (Irga), Francisco Signor, que retorna sábado de uma missão comercial no Irã. Segundo o dirigente, que viajou com quatro industriais, devem ser exportadas inicialmente 30 mil toneladas para o governo daquele país. Mas há possibilidade de incremento para 90 mil toneladas. Governo e oposição acertam pacto Projetos sobre escuta telefônica, vigilância na Internet e infiltração de quadrilhas terão prioridade no Congresso A ameaça aos Estados Unidos uniu governo e oposição no Brasil. Os líderes de todos os partidos com representação no Congresso prometeram ao presidente Fernando Henrique Cardoso rapidez na votação de projetos que facilitem o uso de escuta telefônica, o rastreamento de Internet e a infiltração da polícia em grupos criminosos. Foi a primeira vez, desde a redemocratização do país, em 1985, que governo e oposição concordaram em dar uma resposta comum a um fato político de grande magnitude. O dia de ontem também foi de medidas concretas contra a ameaça terrorista. O governo federal reforçou a vigilância em aeroportos, na fronteira e em áreas com forte presença de árabes ou de judeus (veja no quadro abaixo as medidas mais importantes). O ministro das Relações Exteriores, Celso Lafer, que participou do encontro, elogiou a postura dos 20 líderes partidários presentes na reunião no Planalto: – Diante de um evento internacional dessa magnitude, que altera o eixo diplomático, todos os líderes políticos do país tomaram este problema como da nação e não do governo. Ao abrir o encontro, o presidente condenou a agressão aos Estados Unidos. – Em um grau extremo, leva a desatinos que, por enquanto, foram praticados por um dos lados. Tomara que o outro não o faça – disse Fernando Henrique. Lafer invocou decisões da Organização das Nações Unidas (ONU) para indicar que o governo brasileiro poderá apoiar os Estados Unidos em retaliações caso fique comprovado o envolvimento de outros países nos ataques a Nova York e Washington. As resoluções recomendam a cooperação internacional em ações para combater o terrorismo e responsabilizar seus patrocinadores. – Claramente isso significa não uma carta branca, mas uma disposição do sistema das Nações Unidas para tomar medidas que naturalmente contemplam o uso da força – disse o chanceler. O líder do PSDB na Câmara, deputado Jutahy Júnior (PSDB-BA), deixou a reunião convencido de que o governo só apoiará uma ação retaliatória americana se for detectada a presença de um país por trás dos atentados. – Esse país será considerado inimigo do Brasil – afirmou Jutahy Júnior. Mais rigor em aeroportos e nas regiões fronteiriças As autoridades brasileiras puseram em prática medidas para incrementar a segurança no país, especialmente em aeroportos, regiões de fronteira e áreas de concentração de indivíduos de origem árabe e judaica. A Polícia Federal (PF) começou a recolher informações sobre possíveis células terroristas no país. As investigações concentram-se em regiões fronteiriças densamente povoadas – Foz do Iguaçu, no Paraná, e Chuí, no Rio Grande do Sul – e em cidades como Rio Grande e São Paulo, onde há grandes colônias árabes. O Departamento de Aviação Civil (DAC) adotou regras de policiamento comuns em países ricos, como a inspeção periódica de áreas públicas (banheiros e cabines telefônicas) e a fiscalização de cinzeiros e lixeiras. Os procedimentos da PF foram adotados a pedido da CIA (agência de informações) e do FBI (a polícia federal dos Estados Unidos). O trabalho é feito por agentes da área de inteligência, vinculados à Coordenação de Inteligência da PF, com auxílio da Polícia Internacional (Interpol). A PF mantém sob vigilância pessoas suspeitas de integrar ou dar apoio a grupos extremistas ligados ao terrorismo internacional. Há dois dias, o monitoramento foi ampliado. A operação tem o apoio dos serviços de inteligência da Argentina, do Paraguai e do Uruguai, num trabalho unificado. Além de vigiar os movimentos nas comunidades árabes no Brasil, a PF acompanha a movimentação na hidrelétrica de Itaipu, em Foz do Iguaçu, que os turistas estão proibidos de visitar desde terça-feira, até nova ordem. Também há uma determinação interna do Departamento de Polícia Marítima Aérea-Portuária e de Fronteira (Dpmaf) para aumentar a fiscalização na emissão de passaportes, principalmente de descendentes de árabes. A orientação é para que, logo após a emissão do documento, os dados sejam incluídos imediatamente num sistema informatizado da PF. O procedimento costumava levar três dias. Artigos Suicidas com causa JÚLIO MARIANI O terrorista-suicida é o único vilão que, embora morra no fim da história, é sempre o vencedor. Contra ele não há defesa possível. Ou se existe ainda não foi inventada, como ficou claro nos episódios das torres do World Trade Center e do prédio do Pentágono. Quando os pilotos japoneses da II Guerra decidiram que se matariam pela pátria, aumentaram consideravelmente a eficiência dos ataques aéreos desfechados contra os americanos. Não há o que fazer contra um avião que, em vez de simplesmente lançar um bomba contra o alvo, joga-se inteiro contra ele, até o último segundo dirigido pelo piloto que aceitou a idéia de deixar de existir juntamente com suas vítimas. O piloto suicida japonês era tão impressionante na sua eficácia e tão comovente em seu desprendimento que eu, guri que brincava de guerra ainda sob o impacto dos acontecimentos reais, abri uma exceção para o camicase e o incorporei às forças aliadas. Quando a coisa estava feia para o nosso lado, um grupo de pilotos camicases americanos ou ingleses arrasava alvos alemães e japoneses e decidia a parada em favor dos exércitos do bem. Mas sem dúvida deve ter sido a imagem de um piloto japonês, a bordo de um caça Mitsubishi-Zero, os raios do sol nascente tremulando numa linha de bandeiras postada à beira da pista do campo de aviação, o inspirador e o merecedor de minha admiração infantil. O homem-bomba é um tipo de arma tão eficaz que conseguiu driblar as defesas da maior potência do planeta Já um soldado da democracia poderá ser um herói, mas nunca um suicida, atitude que pressupõe um tipo de fanatismo estranho à mentalidade ocidental. Os mais corajosos de nós podem estar dispostos a lutar até a morte por uma causa, mas suponho que dificilmente concordarão em transportar nas próprias roupas uma carga de explosivos cuja detonação será o seu último gesto sobre a terra. Não se tem certeza se foram muçulmanos os autores dos atentados do último dia 11, mas sem dúvida são os terroristas identificados com o Islã os melhor equipados para fazê-lo, até porque são eles que vêm utilizando o homem-bomba com macabra eficácia no Oriente Médio. E foi o homem-bomba que permitiu ao terror driblar com espantosa facilidade as defesas da maior potência militar do planeta. Qualquer avião não-autorizado ou míssil procedente de fora do território norte-americano seria interceptado antes de atingir o alvo, mas o estratagema adotado permitiu que fossem utilizados aviões de carreira que decolaram de aeroportos situados não apenas em território dos EUA como até de pontos extremamente próximos dos objetivos. Um piloto que decolasse de Newark ou de La Guardia provavelmente enxergaria, da cabine do avião, as torres que deixaram de existir. O suicida com causa é uma arma de destruição bem mais inteligente e mortífera do que o rebelde sem causa que tanto assustava o mundo nos anos 60. Que longa distância foi percorrida em 40 anos! A face moderna do terrorismo já existia no século 19, mas o que aconteceu em Nova York foi de uma ousadia e de uma capacidade técnica inimaginável no passado. Para o bem e para o mal, tudo hoje é maior, mais veloz, mais global, mais eficiente e mais espetacular. A verdade verdadeira é que existem recantos no mundo onde se gestam credos, posições filosóficas e idéias em geral que diferem profundamente daqueles dominantes no Ocidente e nos países orientais que vivem segundo os padrões ocidentais, como o Japão. Será que os serviços de inteligência ocidentais realmente sabem alguma coisa de concreto sobre essa gente ou simplesmente ficam inventando rótulos e descrições para mostrar serviço? A surpresa e a perplexidade provocadas pelos ataques a Nova York e Washington parecem demonstrar que a última hipótese está mais próxima da verdade. O vulnerável não-pensável JOÃO OSÓRIO Todos estamos habituados a uma dose diária de destrutividade. Adidos, contemplativos ou coadjuvantes, faz parte incômoda do ser humano. Desta vez a dose ultrapassa até o imponderável. Uma faixa mais além do não-pensável, quem sabe. Aponta para a impotência no seu mais alto grau, para a desproteção disruptiva para o impacto desproporcional do assimilável, desdenha com os requintes da segurança e inclina o homem forçosamente a perplexidade na sua história e sobrevivência. O “poder” e a condição da intocabilidade, a cada dia, em doses “homeopáticas”, ou não, sofrem reveses e parecem ser insuficientemente pensados. Importa muito quem, onde e como para alavancar atenções mais efetivas. Importa talvez aproveitar este impacto narcíseo que todos sofremos Desta vez, quem: a nata de cidadãos da geografia empresarial e financeira; onde: na decantada, vaidosa e rica Nova York; como: na embalagem mórbida de um suicida que indomitamente põe de sócios à empreitada macabra passageiros de um vôo qualquer de um dia qualquer. A concentração da destruição, seu palco e a coletividade que sossobrou despedaçada, impõe uma vista à história, repensar sociedades e debruçar-se sobre o processo de humanização com o foco no singular indivíduo. As condições mega dos anos 2000 têm que ser computadas nos nossos “computadores”. São megaeventos, megabites, megawatts, megapopulações e condição mega é acessada por um prosaico e perverso bípede qualquer. Este momento em que se desconhece a autoria deste massacre não importa para o efêmero texto. Importa talvez aproveitar este impacto narcíseo que todos sofremos. Considerá-lo, permeando a tristeza e a vergonha, de que a espécie humana funciona também desta forma, e sabermos mais, do quanto menos temos de certezas e de garantias, que tanto fantasiamos, não obstante necessárias e úteis dentro de um enquadre lógico, que não nos leva a construir castelos opulentos de onipotência, desgaste e sinal de nossa precariedade e limitação. A vida é o presente/passado que já foi, o futuro é o presente que se deseja, e o presente é o momento que deixa de sê-lo a esta nova palavra que escrevo. De resto, que se possam neutralizar as desmedidas agressões, os revides passem por algum nível de elaboração e que se saiba que o planeta Terra é menor que a dimensão do rancor existente. Colunistas JOSÉ BARRIONUEVO – PÁGINA 10 Congresso se mobiliza pela paz Diante dos acontecimentos que desde terça-feira abalam o mundo, o dia de ontem no Congresso brasileiro foi dedicado à defesa da paz. O Senado aprovou o requerimento do senador gaúcho Pedro Simon (PMDB) para que a Casa apóie as iniciativas de paz no Oriente Médio e alerte para as conseqüências do acirramento dos conflitos. O texto tramitava desde outubro do ano passado, mas, com o episódio de Nova York, saiu da gaveta. Na Câmara, o líder da bancada gaúcha, deputado João Augusto Nardes, e o deputado Pompeo de Mattos (PDT) entregaram lenços brancos aos integrantes da Ordem dos Cavaleiros do Rio Grande do Sul, que cavalgaram durante um mês, do Sul até Brasília, para homenagear os 166 anos da Revolução Farroupilha. – O mundo inteiro é responsável pela tragédia dos atentados terroristas nos Estados Unidos, todos nós estávamos assistindo de braços cruzados o crescimento do ódio e da intolerância – discursou Simon, que condenou atitudes de represália aos atentados ocorridos nos EUA. Sonho realizado Quase três anos depois de ter sido barrado na entrada do plenário da Câmara por estar pilchado, Pompeo de Mattos realizou ontem o desejo de ir à tribuna de bota, bombachas e lenço no pescoço. Fez uma homenagem à revolução dos gaúchos recitando uma poesia que tinha em seu texto uma provocação nas entrelinhas àqueles que, em 1999, o barraram na Câmara. Aula sob a lona preta Preocupado com a situação dos filhos de agricultores sem-terra acampados diante do prédio da Receita Federal, na Capital, o secretário municipal de Educação, Eliezer Pacheco, foi ontem até o local. Sob as lonas pretas, conversou com os adultos sobre formas de a Smed ajudar as cerca de 20 crianças e adolescentes com atividades educacionais. Peregrinação partidária Numa verdadeira maratona, o senador pernambucano Roberto Freire, presidente nacional do PPS, esteve ontem com políticos gaúchos de diversos partidos. Foi recebido no aeroporto pelo correligionário Bernardo de Souza, e logo depois visitou o presidente da Assembléia Legislativa, Sérgio Zambiasi, do PTB. Mas o que Freire queria mesmo era conversar de perto com José Fortunati (sem partido), a quem espera convencer que o melhor lugar é o PPS. Jantaram juntos na Churrascaria Barranco, mas a resposta deverá ser conhecida somente na próxima semana. Sorte lançada Numa última cartada para convencer o governo a conceder-lhes reajuste salarial, os técnicos-científicos debateram ontem com os deputados estaduais da Comissão de Serviços Públicos da Assembléia. A reunião foi coordenada pelo próprio presidente da Casa, Sérgio Zambiasi, e pela presidenta do sindicato (Sintergs), Nádia de Paula. Agora a sorte dos 7,5 mil servidores públicos com curso superior está nas mãos de Zambiasi, que tem se mostrado um excelente negociador. Sem assédio O vereador de Porto Alegre Aldacir Oliboni (PT), que interpreta Jesus Cristo na tradicional procissão do Morro da Cruz, quer proibir assédio moral no serviço público. Por meio de um projeto de lei, tenta incluir a determinação no Estatuto dos Funcionários Públicos da Capital. Cartilha em Brasília O deputado Onyx Lorenzoni (PFL) entregou uma cópia da cartilha “A proteção sócio-ambiental”, produzida pelo governo do Estado, ao ministro da Educação, Paulo Renato Souza. O ministro manifestou indignação com o material que está sendo distribuído aos alunos da rede pública gaúcha. Resposta rosa A direção da Associação dos Funcionários do Município de Porto Alegre repudia a acusação da Chapa Verde (oposição) de que empréstimos de R$ 50 são concedidos aos servidores em troca de apoio nas eleições da entidade. A eleição está próxima e a campanha pega fogo. ROSANE DE OLIVEIRA Esperto o senador Jader Barbalho: anunciou sua renúncia à presidência do Senado num dia em que não corria o menor risco de virar manchete nos jornais. Concorrendo com a repercussão dos atentados nos Estados Unidos, passou quase despercebido nos telejornais. O Congresso se livrou de um fardo, mas o PMDB continuará a carregá-lo por mais algum tempo. A renúncia é uma jogada para tentar preservar o mandato de senador. Não havia condições políticas de continuar no comando do Congresso enquanto o Conselho de Ética avalia se abre ou não um processo contra ele por quebra do decoro parlamentar. Se sentir, como Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda, que a cassação é inevitável, Jader renunciará também ao mandato para não ficar inelegível por oito anos. O senador está conseguindo ganhar tempo em sua defesa e aproveita para tentar costurar um acordo que o livre do julgamento pelos colegas. O risco de deixar a decisão para o plenário é muito grande. Apesar de o voto em processos de cassação ser secreto, em véspera de renovação de dois terços do Senado, nenhum candidato à reeleição quererá subir aos palanques de 2002 tendo de explicar por que poupou um colega que o senso comum considera culpado. Livre de Jader, o Senado escolherá para ocupar a cadeira de presidente alguém que tenha uma ficha impecável e trânsito em todas as bancadas. A desastrada experiência com a eleição de Jader – uma vitória de Pirro na disputa com ACM – ensinou que é preciso escolher um conciliador. O senador José Sarney, nome mais cotado hoje para a vaga, tem a vantagem de ser considerado uma espécie de magistrado no Congresso. Sarney não entra em disputas e só será candidato se houver consenso no PMDB em torno do seu nome. O gaúcho José Fogaça, lembrado em fevereiro como uma opção para evitar a eleição de Jader, tem mais dificuldades no PMDB do que fora dele para se viabilizar como candidato. Por nunca ter se envolvido em escândalos, é uma alternativa, mas nem os maiores defensores de seu nome acreditam que ele tenha a bênção da cúpula do PMDB, mesmo sendo um dos integrantes do diretório nacional . Editorial Segurança e democracia Com o apoio da sociedade norte-americana, em percentual superior a 90% segundo os institutos de opinião pública, e com o respaldo oficial tanto do Capitólio como da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), a aliança militar ocidental, o presidente George W. Bush decidiu considerar os atentados terroristas aos Estados Unidos como “atos de guerra”. No mesmo e enfático pronunciamento, prognosticou que seu país vencerá a “batalha monumental do bem contra o mal”. Não é muito diverso o tom do secretário de Estado, Colin Powell, quando afirma que “o povo americano tem uma clara compreensão de que se trata de uma guerra e não se pode ver o ataque de nenhuma outra maneira, independentemente de tal interpretação ser ou não legalmente correta”. Proclamada a determinação de retaliar uma agressão bélica, resta aos Estados Unidos enfrentar dois desafios: identificar inequivocamente quem são seus inimigos e conter uma forte tendência interna, a que não estão alheios altos escalões de Washington, em favor de uma reação em grande escala, mesmo que mais forte e mais terrível do que o bárbaro abalo sofrido. Ora, a revolta que se apossou dos norte-americanos é certamente compreensível. As investidas suicidas contra Nova York e Washington já cobraram mais vidas – e vidas de civis – do que a destruição da frota do Pacífico em Pearl Harbor, dramático episódio que levou os EUA a ingressar na II Guerra Mundial. Por isso mesmo, dissemina-se o ponto de vista de que a busca de maior segurança coletiva deve compreender até mesmo algum prejuízo às liberdades dos cidadãos. O primeiro dos compromissos dos stados Unidos nesta hora deve ser a preservação desse equilíbrio Uma vez mais, como ocorreu após a explosão do edifício do governo federal em Oklahoma, analistas respeitados defendem a tese de que o terrorismo não pode ser mais tratado como crime, o que permitiria submeter os acusados dessa prática nefanda a julgamentos sumários, sem direito de defesa. É de se esperar que o forte apreço dos americanos ao Estado de Direito acabe por derrotar tais teses. Em verdade, a Casa Branca defronta-se hoje com um repto, o de garantir a segurança da sociedade, sem prejuízo da inteira prevalência das prerrogativas democráticas. Com uma tradição de mais de dois séculos de normalidade constitucional o primeiro compromisso dos EUA nesta hora grave deve ser com a preservação desse equilíbrio. É, guardadas as proporções, o que se observa no Brasil. Na reunião que celebrou ontem com os líderes de todos os partidos políticos, o presidente Fernando Henrique Cardoso conclamou-os à manutenção da normalidade institucional, sem prejuízo da aprovação de projetos que fortaleçam a segurança nacional e sem arranhões à democracia. Não foi outra, aliás a lição de uma das maiores figuras americanas de todos os tempos. “Aqueles que desistem das liberdades essenciais para obter segurança temporária – disse Benjamin Franklin – são indignos tanto das liberdades quanto da segurança”. Ameaças ao comércio No rastro dos monumentais prejuízos impostos pelo terror ao principal centro financeiro dos Estados Unidos, com repercussões sobre todo o mundo, ampliam-se agora estimativas sombrias que tendem a afetar particularmente os interesses de países em desenvolvimento como o Brasil. Um dos prognósticos mais preocupantes relaciona-se à perspectiva de uma profunda alteração na agenda de prioridades dos países avançados a partir de agora. O risco é o de que, ao se verem forçados a privilegiar o combate ao terrorismo, com exigências que se estenderiam também ao mundo em desenvolvimento, os países industrializados acabem relegando a um plano menor as pressões por uma nova ordem comercial. Seria lamentável que essa perspectiva viesse de fato a se consolidar, pois está em jogo um melhor equilíbrio nas relações entre economias de diferentes graus de desenvolvimento. Ainda é cedo para se avaliar se uma atitude como a dos Estados Unidos de fechar a fronteira com o México logo depois dos atentados indica mudança de rumos no Nafta, já que as relações com o parceiro canadense foram mantidas inalteradas. Dificilmente, porém, o ritmo das negociações de cúpula na área comercial conseguirá escapar da descontinuidade. Enquanto os Estados Unidos se concentram em calcular as perdas humanas e financeiras, ampliam-se as dúvidas sobre a possibilidade de realização de encontros decisivos para a liberação do comércio. Dentre eles, estão o que deflagraria as discussões sobre o acordo entre Estados Unidos e integrantes do Mercosul no dia 24 em Nova York e a própria conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC) prevista para novembro, em Catar. O mundo avançou tanto na abertura de mercados que é inconcebível qualquer perspectiva de recuo nesta área São apenas possibilidades, mas que contribuem para agravar ainda mais os já preocupantes cenários desenhados para a atividade econômica no mundo globalizado e em países latino-americanos em particular, como o Brasil. O próprio fechamento temporário do USTR – a representação comercial norte-americana – em Genebra e o adiamento desta para a próxima semana do acordo sobre as condições de ingresso da China na OMC dão uma dimensão dos possíveis percalços no andamento da pauta, o que é lamentável. Em períodos de temor generalizado sobre os rumos das finanças globais, é importante não subestimar os prejuízos, sem esquecer a afirmação do estadista alemão Otto von Bismarck, para quem “quando as fronteiras se fecham aos mercadores, logo as cruzam os soldados”. O mundo avançou tanto na abertura de mercados que é inconcebível qualquer perspectiva de recuo nesta área, pois só agravaria as perdas, particularmente para países dependentes de recursos externos e de ampliação nas exportações como o Brasil. Topo da página

09/14/2001


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