Roseana tenta conter PMDB








Roseana tenta conter PMDB
Governadora do Maranhão vai tirar férias em fevereiro para dedicar-se a articulações políticas contra a adesão peemedebista à candidatura de José Serra. PFL também combaterá Garotinho

Com o programa que manteve Roseana Sarney por 20 minutos no ar, ontem, em rede nacional de TV, o PFL encerrou a primeira fase da campanha de sua candidata à Presidência. Depois da superexposição que tornou a governadora do Maranhão nacionalmente conhecida e elevou seus índices de intenção de voto ao patamar de 20%, Roseana começará a trabalhar para dentro. De 4 a 24 de fevereiro, de férias do governo, ela se dedicará a alinhavar as alianças que podem sustentar sua candidatura. Vai assumir o papel de que mais gosta — a costura dos bastidores.

Pressionada pela investida do candidato tucano, o ministro José Serra, sobre o PMDB, Roseana começou ontem mesmo a empreitada. Em almoço de duas horas com o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), a governadora tentou reverter o impacto da recente aproximação entre Serra e o governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos (PMDB). Contou com o apoio de Renan, um dos peemedebistas mais próximos ao senador José Sarney, pai da governadora.

Ao sair do encontro com Roseana, Renan disse que a disposição de Jarbas de aliar-se a Serra, que o convidou para ser candidato a vice-presidente, é uma posição individual. ‘‘Estou trabalhando para que não haja posição individual no PMDB, e sim posição partidária’’, comentou. Na avaliação do senador, como noiva cobiçada, é cedo para que o PMDB aceite qualquer proposta. ‘‘Estamos na fase de amizade. A hora é de conversar com todo mundo e deixar as definições para março ou abril.’’ Defensora da mesma política, Roseana pretende incluir Jarbas em sua agenda de férias.

Enquanto isso, o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), atua para neutralizar outra frente de ameaça à maranhense — a candidatura de Anthony Garotinho (PSB), turbinada pelas inserções de seu partido na TV e nas rádios. O governador do Rio ironizou o encontro entre Bornhausen e o ex-governador Leonel Brizola (PDT), na quarta-feira. ‘‘Usando um termo que ele mesmo gosta de usar para os outros, o ex-governador começa a costear o alambrado para a direita’’, comentou Garotinho. Para o PFL, que trabalha seriamente com a possibilidade de segundo turno entre Garotinho e Roseana, o apoio de Brizola seria fundamental para dividir o eleitorado do governador fluminense.

Programa de TV
Ora respondendo a um talk show ensaiado, ora conversando descontraidamente com o auditório, a Roseana do programa de ontem tinha a nítida intenção de responder às provocações dos que vêem nela um produto de marketing sem conteúdo. Insistiu no discurso feminino, agregando virtudes como experiência administrativa, sinceridade e firmeza. Rebateu com números do IBGE as críticas ao desempenho de seu governo na área social e centrou fogo na segurança pública.

Um terço do programa foi dedicado ao tema. Sem olhar para a Câmera, Roseana conta ao auditório como combateu o crime organizado no Maranhão ao punir os responsáveis pelo assassinato de um delegado que investigava roubo de cargas. ‘‘Botei todo mundo na cadeia. Até hoje eles estão lá’’, diz, lembrando que na quadrilha havia inclusive um deputado de sua base de apoio. Encerra a história fechando os punhos: ‘‘Polícia tem que ter comando’’.Na campanha do PFL, o comando agora é dela.


PDT contra José Serra
O ex-governador Leonel Brizola, presidente nacional do PDT, disse ao Correio que seu partido vai provocar a Justiça Eleitoral para que se pronuncie sobre o uso da máquina pública e por infração à lei eleitoral pelo ministro da Saúde, José Serra, pré-candidato do PSDB à presidência da República. ‘‘Ele está se aproveitando do cargo para fazer campanha. Isso é deprimente’’, atacou Brizola.

O episódio que o ex-governador classifica de deprimente aconteceu na cidade de Sinop, interior do Mato Grosso. Como mostrou reportagem publicada ontem no Correio, Serra se deslocou para o local num avião da Força Aérea Brasileira. Lá, deveria participar do lançamento da pedra fundamental do hospital municipal, obra de sua alçada de ministro da Saúde. Mas começou a discursar com as seguintes palavras: ‘‘Este é um comício democrático, porque o sol está esquentando todos’’.

Segundo advogado de um dos partidos aliados (que pediu anonimato), há duas afrontas à lei eleitoral. Em primeiro lugar, comício é um ato de campanha. E campanha, na letra fria da lei, só pode ser feita a partir do dia 6 de julho. Além disso, se o evento servia aos planos políticos e eleitorais do PSDB, Serra não poderia ter usado um avião oficial para se deslocar até a cidade.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Nélson Jobim, preferiu não se pronunciar sobre o assunto. Disse que julgará o caso, se lhe chegar alguma queixa formal, e portanto está impedido de tornar pública sua opinião. O procurador-geral eleitoral, Geraldo Brindeiro, que poderia provocar o TSE, disse por meio de sua assessoria que só atuará se for chamado pelos partidos políticos.

O secretário-geral do PFL, Saulo Queiroz, evitou atacar Serra. Preferiu dizer que seu partido paga os deslocamentos da governadora do Maranhão, Roseana Sarney, toda vez que ela tem compromissos de candidata e de governadora numa mesma viagem.

O senador Roberto Freire (PE), presidente nacional do PPS, ao contrário de Brizola, não pretende reclamar do uso da máquina pública pelo PSDB. ‘‘Não vou brigar com fantasmas. Um discurso para 2.500 agentes de saúde é muito menos impactante do que um programa de TV’’, atacou, referindo-se à propaganda gratuita a que os partidos têm direito e que vêm usando para promover seus presidenciáveis — caso de Roseana Sarney (PFL) e Anthony Garotinho (PSB).


Governo com mais verba em ano eleitoral
Uma manobra financeira no Orçamento engordou o caixa dos ministérios às vésperas das eleições. O governo empurrou para este ano R$ 21,6 bilhões em despesas que deveriam ser efetuadas no ano passado. Foram incluídos como ‘‘restos a pagar’’ no Orçamento de 2002. Da verba, R$ 10,4 bilhões já foram liberados pelo Tesouro Nacional e estão à disposição dos ministérios. Os números são do sistema de controle de gastos da União (Siafi). O Ministério da Saúde, comandado pelo candidato à presidência pelo PSDB, José Serra, é um dos que terá mais verba para gastar este ano. Iniciou 2002 com R$ 1,14 bilhão em caixa para efetuar despesas atrasadas.


Lula quer novo acordo
O pré-candidato a presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou ontem que, se o partido vencer as próximas eleições, vai procurar discutir com os credores novos acordos para a dívida externa, com base na realidade do País. ‘‘O mundo inteiro será sensível para não permitir que crianças morram de fome por conta deste pagamento e seria solidário, se parte da dívida dos países pobres fosse reinvestida dentro desses próprios países’’, ressaltou. Lula disse também que é contra a proposta de criação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). ‘‘Como brasileiro, vou lutar muito para que não se implante a Alca’’, anunciou, em Porto Alegre.


Chomsky apóia genéricos
O linguista norte-americano Noam Chomsky, o mais conhecido dissidente norte-americano, fez ontem, no Fórum Social Mundial, um elogio às medidas tomadas pelo governo federal em relação aos medicamentos genéricos. ‘‘Os acordos internacionais não têm nada a ver com livre comércio. São proteci-onistas’’, disse ele. A queda-de-braço entre o governo brasileiro e a indústria farmacêutica é um dos principais trunfos do ministro d a Saúde, José Serra, pré-candidato do PSDB à Presidência da República.


Ministro é candidato
O ministro da Educação, Paulo Renato Souza, não foi convidado a participar da campanha presidencial do antigo desafeto José Serra. E garante: mesmo que fosse não aceitaria, pois prefere continuar candidato. Depois de perder a vaga de presidenciável para Serra, Paulo Renato briga para concorrer ao mandato de senador pelo PSDB. Uma das duas vagas de que os tucanos dispõem para concorrer ao Senado será dada ao PFL de Roseana Sarney. A outra vaga, o ministro quer para si.


Artigos

As águas do Guaíba
A globalização foi identificada a um rio caudaloso, um fenômeno cuja existência é simplesmente admitida. O que sim se pode fazer é controlar os seus efeitos negativos

Denis Lerrer Rosenfield

O Guaíba permanece calmo nestes primeiros dias do Fórum das Autoridades Locais pela Inclusão Social, embora nuvens cinzentas despontem no horizonte. Em sua abertura, com os prefeitos de Paris, Roma, Buenos Aires, São Paulo e Porto Alegre e com uma conferência inaugural do ex-presidente de Portugal Mário Soares, o clima era de franca tendência reformista. Sem meias palavras, toda tentativa de transformação violenta da sociedade foi descartada.

A globalização foi identificada a um rio caudaloso, um fenômeno cuja existência é simplesmente admitida. O que sim se pode fazer é controlar os seus efeitos negativos. Destoando do Fórum Social Mundial que se anuncia, Mário Soares citou um artigo do presidente Clinton, publicado no jornal francês Le Monde. Para os radicais, um tal propósito pôde parecer blasfematório, pois um ex-presidente dos EUA é invocado como crítico da globalização e isso num jornal francês cuja linha editorial não é pró-americana. Convém lembrar que o Le Monde Diplomatique é um dos maiores promotores do Fórum Social.

A posição dos prefeitos, confrontados ao dia-a-dia de suas administrações, foi comedida. Eles reconhecem que esse rio caudaloso atravessa suas cidades, produzindo efeitos negativos que devem ser controlados. Muitas vezes, esse controle é difícil, sobretudo nos países periféricos, cujas políticas federais são muito mais dependentes do que se passa nos países centrais. Os problemas de Paris e Roma não são os mesmos que os de Buenos Aires, São Paulo e Porto Alegre. O importante, no entanto, consiste no próprio debate entre essas diferentes cidades. Acrescentemos que a administração municipal, se almeja ser bem-sucedida, deve abandonar os chavões ideológicos e revolucionários sob o risco de se tornar uma mera apropriação de uma esfera estatal com fins aventureiros.

Lembrou o prefeito de Budapeste, um liberal destoando dos presentes, que a inclusão social não é uma bandeira da esquerda, mas de qualquer político comprometido com o bem-estar dos seus cidadãos. Lutar contra a exclusão social não pode ser um dogma daqueles que dela querem fazer um uso exclusivamente partidário.

Sob a égide de uma justa homenagem ao brutal assassinato do prefeito Celso Daniel, essa abertura foi igualmente comedida. O prefeito Tarso Genro elogiou sua honradez e competência, pedindo um minuto de silêncio, não fazendo sua outras manifestações do PT, que procuraram politizar em proveito próprio essa atrocidade. Não houve menção a um crime político.

No entanto, as águas do Guaíba começam a dar sinais de agitação. No próprio Fórum das Autoridades Locais, há manifestações de prefeitos que criticam as investigações policiais, insistindo em que se siga a pista política. Ora, todas as pistas devem ser seguidas e, para tanto, a polícia deve ser deixada livre para fazer o seu trabalho, independentemente de pressões. A partidarização surge novamente, o que não deixa de ser curioso, vinda de políticos que deveriam ter o mesmo fervor na condenação de outros assassinatos, como o de uma mulher em Campinas, em frente de sua casa, alguns dias antes da morte de Celso Daniel. Ademais, o Fórum Social está se organizando sob a égide de uma condenação dos EUA, como se o cruel massacre do World Trade Center devesse continuar impune. Confunde-se, novamente, a vítima e a punição necessária do agressor. Vejamos, nos próximos dias, quão conturbadas estarão as águas do Guaíba.


Editorial

LIÇÕES DA ENRON

O colapso da Enron, a gigante da energia cuja estrepitosa falência causou e ainda causará grandes danos econômicos e políticos, traz embutidas algumas lições para países em desenvolvimento. O Brasil tem muito a aprender com elas.

A Enron fazia negócios num território econômico quase virgem, criado pela desregulamentação dos serviços públicos que os países do Hemisfério Norte promoveram nas últimos décadas do século 20. Beneficiava-se da vitória ideológica do liberalismo, representada pelas políticas privatizantes promovidas com garra por Margareth Thatcher, a então primeira-ministra britânica.

Tais teses, hoje hegemônicas em quase todo o mundo, vetam ao Estado a participação direta no sistema produtivo, mesmo em setores estratégicos de infra-estrutura, dos quais não poderia haver exemplo melhor que a produção, distribuição e comercialização de energia. A propriedade de empresas produtivas deve ser província exclusiva do setor privado: ao Estado cabe apenas o papel de legislador, regulador e fiscalizador da atividade econômica, para resguardar a livre concorrência e proteger os direitos do consumidor.

O que vimos, no caso da Enron, foi o fracasso dramático dessa política no país que, mais que qualquer outro, encarna o espírito da livre iniciativa. O Estado não cumpriu seu papel regulador e fiscalizador. Não detectou a tempo que a Enron rumava para o desastre e, pior ainda, tentava escondê-lo apelando para recursos contábeis no mínimo questionáveis (fracasso compartilhado com as firmas de auditoria que tampouco cumpriram seu papel de fiadoras dos balanços apresentados pela empresa ao mercado).

Discute-se, neste momento, se o fracasso do Estado no caso Enron se deve apenas à inépcia do fiscalizador, ou se — hipótese muito mais grave — foi precipitado pelas estreitas relações políticas entre a firma falida e o Partido Republicano, hoje no poder nos Estados Unidos.

O que a bancarrota da Enron nos pode ensinar? Antes de tudo, que não se brinca com setores estratégicos como a energia. Estamos atravessando um racionamento provocado, pelo menos em parte, pelas indefinições que um arrastado processo de privatização impôs ao planejamento de longo prazo, crucial para o setor.
O Estado pode e deve se retirar da produção, mas não pode abdicar de seu papel regulador e fiscalizador, sob pena de entregar o futuro do país a interesses particulares. É também indispensável que as relações entre políticos e funcionários do governo, de um lado, e executivos e acionistas das empresas que disputam e assumirão os serviços privatizados, de outro, se dêem com absoluta transparência — algo que faltou em grau inacreditável no caso Enron. Qualquer suspeita de promiscuidade poderá causar graves danos à credibilidade de todo o processo.

Na qualidade de país emergente, muitas vezes adotamos políticas criadas e supostamente bem-sucedidas nos países desenvolvidos. Já é hora de aprendermos também com seus erros e fracassos.


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02/01/2002


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