Tasso e Roseana selam pacto e Jarbas nega ação anti-Serra







Tasso e Roseana selam pacto e Jarbas nega ação anti-Serra
Os governadores e presidenciáveis Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Roseana Sarney (PFL-MA) fizeram um pacto ontem de não concorrer um contra o outro na sucessão de 2002. É uma senha para a aliança PSDB-PFL.
Os dois almoçaram ontem em Brasília com um terceiro governador nordestino, Jarbas Vasconcelos (PE), que representou o PMDB governista e atuou como uma espécie de porta-voz do ministro José Serra (Saúde), principal adversário de Tasso no PSDB.

"Se era uma manobra contra o Serra, era uma manobra capenga. Eu sou amigo do Serra e vejo grandes qualidades na candidatura dele", disse Jarbas.
No meio do encontro, ele deixou claro que não concordaria com qualquer ato de hostilidade a outros candidatos e citou especificamente o nome de Serra. "Não houve contestação", relatou depois. "Não sinto entusiasmo [de Tasso e Roseana" pelo Serra, mas também não sinto restrições."
Ao final do almoço, na casa de Roseana, a grande preocupação dos governadores era dizer que não havia qualquer veto ou ação contra Serra e que a intenção era justamente promover a unidade para enfrentar Luiz Inácio Lula da Silva, do PT.

"Não é nenhuma reunião contra o ministro José Serra. Só tem um objetivo: somar, parar de briga, parar de disputa boba", disse Tasso, que tenta justamente deslanchar sua campanha presidencial. Sua explicação para o fato de Serra não ter sido convidado foi irônica: "Ele não é governador". Depois de uma pausa, acrescentou: "Por enquanto..."
O Planalto soube do almoço na semana passada, mas nada foi combinado antes com o presidente Fernando Henrique Cardoso. No final da tarde, por meio do porta-voz, George Lamazière, FHC disse que "acha muito bom os três estarem juntos na busca de um caminho comum".

"Caraminholas"
Serra, que não participou do encontro, disse ontem que ele estava preocupado com a questão do antraz e não falaria sobre esse "tititi e caraminholas".
As apreensões em relação a Serra eram naturais: Tasso resolveu disputar renhidamente a indicação tucana à Presidência e Roseana, refletindo o pensamento do PFL, afastou-se de Serra.
O PFL culpa o ministro da Saúde por ter ficado de fora do comando das duas Casas do Congresso (Senado e Câmara), de haver perdido a maioria na Câmara e de tentar cooptar pefelistas importantes no Paraná e na Bahia.

Esses episódios é que levaram o PFL a criar dificuldades à indicação do secretário de Comunicação Andrea Matarazzo para a Embaixada do Brasil em Roma. Oficialmente, as restrições, tanto pefelistas quanto de Tasso, são no sentido de que Serra é um candidato de pouco apelo popular, "pesado e difícil de carregar".
Os três governadores justificam a necessidade de união e de reedição da aliança que elegeu e reelegeu FHC com pragmatismo: precisam de um candidato leve, o oposto de Serra, para ganhar da oposição em 2002.

"Nunca o PT esteve tão perto de ganhar a eleição como desta vez", admitiu Roseana durante a reunião. Ao concordar, Jarbas fez até uma ressalva: "O problema do Lula é que ele está de salto alto, já está até se comparando com o Schumacher [Michael Schumacher, campeão de Fórmula 1".
Durante o encontro, no qual Jarbas também foi tratado como presidenciável, cada um falou sobre suas próprias perspectivas. Roseana, que é o nome da coligação mais bem situado nas pesquisas, deixou claro que não está disposta a entrar "em aventuras".

Citou, inclusive, que tem em torno de 80% das pesquisas para o Senado no Maranhão e que esta é uma eleição que lhe é suficiente e não irá disputar a Presidência só por vaidade.
Tasso contou que irá a São Paulo no dia 22 e que realmente o apoio da família do governador Mário Covas o sensibiliza e é um trunfo político e afetivo importante.
Os governadores também discutiram a realização de prévias conjuntas dos partidos que integram a coligação governista, mas admitiram que se trata de um projeto de difícil execução.
"Mas algum tipo de consulta tem que haver", disse Roseana, com apoio de Tasso e Jarbas.

Os três, agora, pretendem discutir a idéia com as cúpulas dos partidos e atrair outros governadores aliados ao Planalto para o projeto. Dos três partidos representados no almoço, só o PFL é francamente favorável às prévias para a definição de um nome comum para a coligação. O PMDB terá a sua própria prévia em janeiro. O PSDB teme perder a cabeça de chapa. Na véspera do almoço, o governador Geraldo Alckmin (SP) já deixava claro que o partido não abriria mão de lançar o candidato.


Itamaristas criticam idéia de prévia conjunta
Políticos ligados ao grupo do governador de Minas Gerais, Itamar Franco (PMDB), criticaram ontem a proposta de prévias feita pelo governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos (PMDB), classificada de "impossível".
O pernambucano defende que as prévias peemedebistas de janeiro sejam disputadas também por candidatos do PFL e do PSDB, partidos que fazem parte da base de sustentação do presidente Fernando Henrique Cardoso.

Jarbas é o nome que os governistas do PMDB, que controlam o partido, tentavam viabilizar para disputar com Itamar as prévias de janeiro -ocasião em que, teoricamente, será escolhido o candidato do partido à Presidência.
"É inconsistente, o estatuto do PMDB não prevê isso", disse o vice de Itamar, Newton Cardoso (PMDB), que já trabalha em sua campanha ao governo de Minas e que vê na candidatura Itamar uma chance de o PMDB eleger vários governadores pelo país.
Segundo o 2º vice-presidente do PMDB de Minas, Aloísio Vasconcelos, caso a direção nacional do PMDB não siga à risca o cronograma das prévias, definido na convenção nacional, a atitude será interpretada como "golpe" e será questionada na Justiça.

Vasconcelos diz que a proposta do governador pernambucano não passa de blefe: "É o velho golpe de jogar no ar para ver se cola".
O presidente da Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais) e assessor político de Itamar, Marcelo Siqueira, disse ter gargalhado ao saber da proposta do governador de Pernambuco. "É sinal de desespero", afirmou.
Itamar evitou comentar a idéia.


Ciro diz que prefere Serra como rival
O pré-candidato do PPS à Presidência da República, Ciro Gomes, disse ontem que prefere enfrentar o ministro José Serra (Saúde) ao governador do Ceará, Tasso Jereissati (PSDB), nas eleições.
"O melhor quadro do PSDB sempre foi Tasso Jereissati. Portanto, ele é o pior candidato para mim [porque seria um concorrente mais forte". O melhor candidato para mim é o Serra", disse Ciro, que é amigo do governador cearense, ao ser questionado sobre qual seria, na sua opinião, o melhor candidato do governo.
Ciro se recusou a comentar a reunião realizada ontem entre Roseana Sarney (PFL-MA), Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e Tasso Jereissati (PSDB-CE).

Ciro disse ainda que tem esperanças de que o PDT participe da aliança que apoiará sua candidatura. "Estamos dando demonstrações da nossa vontade de obter a unidade", afirmou.
A Folha apurou que o pré-candidato espera que o ex-governador Leonel Brizola (PDT-RJ) decida-se em 20 de janeiro, quando o PMDB escolherá o nome de seu candidato. Caso o governador Itamar Franco (PMDB-MG) não seja o escolhido, o PPS espera ter o apoio do PDT.
O presidenciável não descarta uma aliança nacional do PPS com o PT, mas diz que "a cada dia essa idéia se torna mais impraticável". "Reconheço o PT como o principal partido da oposição."


FHC adia de novo escolha de ministro peemedebista
O presidente Fernando Henrique Cardoso corre o risco de ganhar um inimigo no Senado com a hesitação em nomear o senador Ney Suassuna (PMDB-PB) para o Ministério da Integração Nacional. Indicado pelo PMDB para a vaga de Ramez Tebet (MS), que deixou o cargo em 20 de setembro para assumir a presidência do Senado, Suassuna está irritado com a demora de FHC em convidá-lo.
Em conversa com amigos, ameaça partir para a oposição ao governo. Até o início da noite de ontem, Suassuna aguardava um sinal do Planalto. Anteontem, FHC já cancelara um encontro, que foi remarcado para ontem pelo secretário-geral da Presidência, Aloysio Nunes Ferreira, mas até as 18h30 não estava confirmado.

Apesar do veto público ao seu nome imposto pelo grupo do senador Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB), de quem é adversário político no Estado, Suassuna disse ao secretário-geral da Presidência que, para ele, "o veto é pessoal do presidente FHC".
Suassuna é pré-candidato a governador da Paraíba, assim como o prefeito de Campina Grande, Cássio Cunha Lima (PSDB), filho do ex-aliado e hoje adversário.

Eduardo Jorge
Reservadamente, Suassuna promete incomodar o governo. Ele preside uma comissão estratégica para o Planalto: a de Fiscalização e Controle, encarregada de examinar atos do governo.
Entre outras coisas, na comissão Suassuna é relator do chamado "caso EJ", investigação de suposto envolvimento do ex-secretário-geral da Presidência da República Eduardo Jorge Caldas Pereira em irregularidades. Seu parecer iria propor o arquivamento das denúncias, mas agora ele poderá mudar a conclusão.

O veto causa desgaste ao senador, embora o cargo não seja promissor. Se for confirmado, Suassuna será ministro por cerca de três meses, já que o PMDB tem data marcada para desembarcar do governo -20 de janeiro de 2002, quando serão realizadas as prévias para escolher o candidato a presidente da República.

Gravatas
Suassuna ficou conhecido por atitudes inusitadas no Senado, como distribuir bombons em reuniões de comissões, oferecer tortas no cafezinho do Senado para protestar contra reedições de medidas provisórias, possuir uma coleção de gravatas com motivos infantis e quase trocar socos com o ex-senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) em plenário.

Nos próximos dias, ele vai lançar um livro de poesias chamado "Ousadia". Além disso, pinta quadros e compõe músicas (letra e melodia registradas em gravador e depois entregues a um músico profissional) e peças teatrais (uma delas em fase de ensaio).

"Podem procurar que não vão achar nada contra mim. Não sou ladrão, não cometi crime eleitoral. De mim, só podem dizer que sou feio. Isso podem", afirmou.

Plano
Antes de ser nomeado, já esboça um plano de ação para o ministério. Planeja estimular cidades a implantarem projetos de embelezamento e limpeza, patrocinadas por grandes empresas.
Ao mesmo tempo, pretende discutir com o Ministério da Cultura incentivo às culturas locais, principalmente ao artesanato, como forma de atrair turistas.


Senado adia sabatina de Matarazzo
A indicação do ministro Andrea Matarazzo (Secretaria de Comunicação de Governo) para a Embaixada do Brasil na Itália sofreu mais um revés ontem.
Sua sabatina na CRE (Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional) do Senado foi adiada pela segunda vez, agora por 15 dias. Matarazzo aguardava havia duas horas, quando a reunião foi cancelada pelo presidente da comissão, Jefferson Péres (PDT-AM). Eram cerca de 19h30. Como a sessão da próxima terça-feira terá uma audiência pública com procuradores da República -para tratar da investigação realizada no sul do Pará, na região em que atuou a guerrilha do Araguaia, na década de 70-, a sabatina será no dia 30 de outubro.

"O Matarazzo está sendo vítima de uma sucessão de azares", afirmou Péres, negando haver uma articulação contra sua nomeação a embaixador. "Estão vendo chifre em cabeça de cavalo", disse.
Péres justificou o adiamento pelo fato de ainda estar havendo votação no plenário do Senado. Como a reunião da CRE só poderia começar depois, o melhor seria adiá-la, já que a arguição demoraria cerca de duas horas.
O primeiro adiamento ocorreu na terça-feira da semana passada, por um surpreendente pedido de vista do senador Bernardo Cabral (PFL-AM). "Dizem que está havendo uma conspiração amazônica. Mas foi coincidência", afirmou Péres ontem.

No primeiro adiamento, Matarazzo também aguardava na sala ao lado para ser sabatinado, e Pedro Piva (PSDB-SP) havia lido seu parecer favorável à indicação. Uma das versões que circularam na semana passada foi a de que se tratava de uma estocada do PFL na pré-candidatura à Presidência do ministro José Serra (Saúde), a quem Matarazzo é ligado. Os pefelistas negam.
Cabral disse que queria analisar "juridicamente" o fato de o ministro possuir a nacionalidade italiana, além da brasileira.
Matarazzo vai substituir o embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima. O presidente Fernando Henrique Cardoso já nomeou o publicitário Luiz Macedo sucessor de Matarazzo na Secretaria de Comunicação.



Lula modera discurso e lança a 3ª versão do "Fome Zero"
Em mais uma tentativa de moderar o discurso e ser aceito pelo "establishment", o Partido dos Trabalhadores lançou ontem em Brasília seu programa de combate à fome no país, cujo modelo é um sistema utilizado pelo governo dos Estados Unidos.
Para exemplificar a miséria, o PT reproduziu no início da cerimônia reportagens sobre a fome do "Jornal Nacional".

O projeto "Fome Zero", lançado pelo provável candidato a presidente pelo PT, Luiz Inácio Lula da Silva, é inspirado no "Food Stamp Program" (programa do selo alimentar) dos EUA. Trata-se de um sistema pelo qual a população de baixa renda (renda inferior a US$ 1 por dia, no Brasil) recebe cupons para trocar por comida em estabelecimentos credenciados.
Ao responder uma pergunta sobre quando esperaria "acabar" ou "reduzir significativamente a fome" no Brasil, Lula disse: "Você tem de trabalhar, na pior das hipóteses, com um prazo de um mandato de um governo".

O fato de haver semelhança com o programa dos EUA não foi escondido pelos petistas. Ao contrário. A cada explicação dada era citada a origem do "Fome Zero". No material divulgado há até um detalhado histórico do sistema norte-americano.
Sobre o partido estar usando um modelo dos EUA e até imagens do "Jornal Nacional" -noticiário criticado por petistas em outras ocasiões-, o principal economista do PT, o deputado federal Aloizio Mercadante (SP), disse o seguinte: "Usamos o exemplo dos EUA porque, se dissermos que é também da China, da Índia e de Cuba, não seremos compreendidos pela mídia. Em vez de sermos incorporados, estamos incorporando".

A apresentação do projeto foi feita em auditório do Senado. Dezenas de prefeitos e parlamentares do PT, entre eles Marta Suplicy (SP), e um governador (Jorge Viana, do Acre) estiveram presentes. Havia a intenção deliberada do PT em fazer do evento uma cerimônia multipartidária. Os senadores do PMDB Pedro Simon (RS) e Maguito Vilela (GO) foram convidados e compareceram. Simon teve assento na mesa que dirigiu os trabalhos e direito a discurso. Havia também parlamentares de outros partidos, entre eles o líder do PL na Câmara, Valdemar Costa Neto (SP), que está negociando uma possível aliança com os petistas para 2002.

O projeto foi remodelado para causar menos polêmica. Foram abandonadas as idéias de criar um ministério extraordinário e uma taxa de 5% sobre as contas em restaurantes não-populares.
Agora, segundo a proposta de ontem de Lula -apontado como o coordenador-geral do projeto-, a idéia central é a distribuição de cupons de alimentação para 44 milhões de brasileiros ao custo de R$ 19,961 bilhões anuais.
Não há especificação sobre qual será a fonte dos recursos. "O problema nosso não é de dinheiro. É de redefinição de prioridades", afirmou Lula. "Se faltar dinheiro, falta para outra coisa, e não para acabar com a fome."

Ele não especificou qual seria a redefinição de prioridades orçamentárias. Mas fez uma crítica à propost a recente do presidente Fernando Henrique Cardoso de priorizar exportações:
"O que não dá é que temos que "exportar ou morrer" e vendo as pessoas morrendo aqui dentro. Nosso povo tomou café da manhã, almoçou e jantou? Então vamos exportar o que sobrou."


De sandália, Suplicy faz crítica a projeto
De terno social e sandálias de couro, com os dois pés machucados -"pisaram muito nos meus dedões durante o Círio de Nazaré no fim de semana, em Belém"-, o senador e economista Eduardo Suplicy (PT-SP) foi a voz discordante ontem no lançamento do "Fome Zero".
Para Suplicy, que deve disputar a prévia presidencial do PT contra Luiz Inácio Lula da Silva, é um erro usar cupons de alimentação. "É muito comum ver as pessoas hoje trocando seus vales-refeição ou vales-transporte por dinheiro nas grandes cidades. Elas fazem isso porque preferem decidir sozinhas o que vão consumir."

O deputado e também economista Aloizio Mercadante (PT-SP) discorda de Suplicy.
"O programa de cupons de alimentação dá certo nos EUA, onde existe há 72 anos. Além disso, hoje em dia está muito fácil informatizar. Em vez de cupons, podem ser dados cartões magnéticos. Os beneficiados trocariam o crédito em estabelecimentos que só aceitariam o pagamento para alimentos."
Suplicy chegou ao lançamento do "Fome Zero" com um livro de capa dura e 1.180 páginas: "Economics", do economista Joseph Stiglitz, ganhador do Nobel na semana passada.

"O Stiglitz tem a mesma opinião sobre a ineficácia do sistema de cupons", dizia Suplicy.
À página 630, Stiglitz escreve o seguinte: "Cupons de alimentação podem não levar a um aumento substancial do consumo de comida. Os cupons podem resultar simplesmente em pessoas comprando a mesma quantidade de comida."


Petista condena ataque dos EUA ao Afeganistão
Apesar da moderação atual do discurso do PT, o pré-candidato à Presidência pelo partido Luiz Inácio Lula da Silva condenou ontem pela primeira vez de forma explícita a ação militar que os Estados Unidos iniciaram contra o Afeganistão no último dia 7.
Depois de dizer preferir a via diplomática, com mais pressão política, Lula foi indagado se estava afirmando ter havido precipitação na ação dos EUA. Eis sua resposta: "Eu acho que se precipitaram. Eu acho que poderia ter tido mais tempo de negociação".

Em seguida, completou: "O que eu acho é que não deveriam ter tomado essa decisão [ação militar" como primeira medida. Eu acho que deveriam ter feito pressão". Lula ressaltou, entretanto, que o Brasil deveria se solidarizar com os norte-americanos e que eles "têm o direito de pegar os culpados e punir".
A seguir trechos da entrevista à Folha: (FERNANDO RODRIGUES)

Folha - O sr. acha que os ataques dos EUA ao Afeganistão são corretos ou não?
Luiz Inácio Lula da Silva - Achava que isso poderia ser resolvido com uma negociação política, com uma certa pressão. Acontece que eu acho que o presidente americano é pressionado pela opinião pública. Eu não sei se o ataque vai fazer mais inocentes mortos do que pegar o Bin Laden [Osama bin Laden, apontado como o terrorista mais procurado pelos EUA". Não foram feitos todos os meios de pressão possíveis.
Que os americanos têm o direito de pegar os culpados e punir, têm. Os americanos têm o direito de exigir o fim do terrorismo porque foram vítimas. Mas eu acho que a guerra pode matar mais inocentes.

Folha - O sr. quer dizer que os EUA se precipitaram ao atacar o Afeganistão?
Lula - Eu acho que se precipitaram. Eu acho que poderia ter tido mais tempo de negociação.

Folha - A sua posição então é contrária aos ataques?
Lula - O que eu acho é que não deveriam ter tomado essa decisão como primeira medida. Eu acho que deveriam ter feito pressão.

Folha - Qual a sua avaliação sobre a posição do presidente Fernando Henrique Cardoso a respeito desse tema?
Lula - Depende, ele tem várias posições. A primeira foi correta, que é a de que todos os países têm de ser contra o terrorismo. O governo brasileiro tomou essa posição, depois "destomou", depois tomou outra vez. Mas eu acho que nós não temos como deixar de ser solidários com o povo americano neste momento. E, ao mesmo tempo, chamar a atenção do mundo inteiro de que nós estamos vivendo no século 21 e que essa guerra pode gerar outra guerra, que pode gerar mais violência e mais protesto.

Folha - O sr. acha, portanto, que o presidente Fernando Henrique não foi claro?
Lula - Faz tempo que ele não é claro.


Benedita quer disputar governo do Rio
A vice-governadora do Rio, Benedita da Silva (PT), anunciou que vai assumir o governo do Estado a partir de abril de 2002, caso se confirme a saída do governador Anthony Garotinho (PSB), que declarou que vai deixar o cargo para disputar a Presidência.
Benedita vinha protelando sua decisão, pois seu desejo era concorrer a uma vaga no Senado. Porém, acabou cedendo aos interesses da direção nacional do PT, que quer ter no Rio um palanque privilegiado para a campanha presidencial. Com a decisão, ela agora pretende disputar o governo.

Os petistas vão formar já neste mês uma comissão para analisar a situação financeira e administrativa do Estado, com o objetivo de formar um embrião de futuro secretariado para o governo de oito meses de Benedita. "Não vamos deixar para abril esse trabalho de conhecimento da máquina. Não queremos ser pegos de surpresa", disse a vice-governadora, que não tem funções administrativas no governo desde que o PT rompeu com o governador, em 2000.

PMDB
O presidente da Assembléia do Rio, Sérgio Cabral Filho (PMDB), disse a Garotinho que também vai entrar na disputa para sucedê-lo no governo. Os peemedebistas esperam seu apoio a Cabral, mas isso sofre resistências dentro do PSB, que quer lançar candidato.


Sem-terra invadem quinta fazenda no RS
O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) invadiu ontem a quinta fazenda no segundo dia da Marcha Rumo ao Latifúndio, que está sendo realizada no Rio Grande do Sul.
Cerca de 500 famílias entraram em uma área de 5.000 hectares no município de Alegrete, no oeste do Estado. Como nas invasões anteriores, não houve confronto.

Os sem-terra disseram que só deixarão as cinco fazendas se o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) assentar 2.500 famílias até dezembro no Estado. Com a ação de ontem, subiu para 20 mil hectares o total de área invadida por cerca de 2.400 famílias. Os proprietários já disseram que vão pedir reintegração de posse à Justiça.

O superintendente regional do Incra, Jânio Guedes Silveira, afirmou que o órgão vai assentar pelo menos mil famílias até o início de 2002 no Rio Grande do Sul e pediu aos sem-terra que desocupem as fazendas. Segundo ele, esse procedimento ""não contribui para a reforma agrária". Silveira disse que as áreas invadidas não poderão ser desapropriadas por dois anos


Artigos

Cem anos de atraso
CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Diz o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) que a América Latina precisará de um século para que sua população desfrute do mesmo nível de renda que os cidadãos dos países desenvolvidos possuem hoje.
Vale para o Brasil, claro, posto que o BID afirma que o crescimento econômico da região nos anos 90 foi "decepcionante". Como bem se sabe, o do Brasil também foi.
Fica, pois, claro que houve um fracasso (mais um) em matéria de crescimento, mesmo depois de aplicadas as receitas neoliberais, hegemônicas nos anos 90.

Se houve fracasso em matéria de crescimento, o neoliberalismo não foi mais bem sucedido em matéria de alívio da pobreza.
Reproduzo abertura de texto de Luciana Nunes Leal em um jornal ("O Estado de S. Paulo") que está longe de morrer de amores pelo intervencionismo estatal: "As noções de mercado livre e de preços baseados em oferta e demanda foram importantes pilares da economia de muitos países, mas não colaboram em nada para resolver a grande preocupação mundial do século 21: a diminuição da pobreza".

A avaliação é do pesquisador britânico David Gordon (Universidade de Bristol), em seminário promovido no Rio pelo IBGE.
Gordon chega a dizer que "preços baseados no mercado tiveram consequências dramáticas para os pobres".
Tudo somado, tem-se que o liberalismo dos anos mais recentes, tal como o modelo intervencionista anterior, não foi capaz de produzir nem crescimento adequado nem a indispensável atenuação da pobreza e da desigualdade.

Logo, está na hora de abandonar os fundamentalismos e pôr a cabeça para funcionar em busca do "mix" correto. A história definitivamente não acabou. Na América Latina, a rigor, nem começou.


Colunistas

PAINEL

Remédio amargo
Estrategistas ligados a José Serra (PSDB) aconselham o ministro da Saúde a comparecer ao ato promovido pela família Covas para alavancar a candidatura Tasso Jereissati, a ser realizado na próxima segunda-feira. A presença dele inibiria grandes arroubos em favor do cearense.

Segundo round
Para tucanos serristas, o apoio da família Covas e a união de Tasso e Roseana (PFL) colocaram em risco a candidatura do ministro da Saúde. Acham necessário reagir rápido. Só não sabem muito bem como.

Praga baiana
Do ex-senador ACM (PFL-BA), sobre o desempenho de Serra nas pesquisas para a Presidência: "A maldição do governo pegou nele. Por isso ele não cresce nas pesquisas. Patina".

Raspa do tacho
Governadores do PMDB queixaram-se à cúpula do partido das ameaças de deixar o governo. Temem perder os repasses orçamentários da União neste final de ano. Dizem que o partido não pode tomar nenhuma decisão antes das prévias para presidente (20 de janeiro).

Morde e assopra
As relações entre o Planalto e o PMDB, no entanto, estão desgastadas. Ontem, a bancada da sigla no Senado votou contra o governo num projeto de interesse do BC. Até Ney Suassuana, cotado para o Ministério da Integração Nacional, foi contra.

Gol contra
Com o cargo ameaçado, o líder do governo no Congresso, o tucano Arthur Virgílio (AM), deu entrevista ontem para defender a criação da CPI do FAT, uma proposta dos partidos de oposição. Ninguém entendeu.

Outro time
O PFL de Goiás ameaça lançar candidatura própria no Estado em 2002, desfazendo a aliança que elegeu o governador Marconi Perillo (PSDB) em 98.

Sala de espera
Hoje faz um mês que Marta Suplicy (PT) pediu uma audiência com FHC para tratar da renegociação da dívida da cidade. Até agora, a prefeita de SP não recebeu nenhuma resposta. Anteontem, o presidente ficou uma hora com vereadores tucanos.

Coerência política
Presidente da Câmara, Aécio Neves tenta derrubar um monstrengo que ele mesmo ajudou a criar. Em 99, então líder do PSDB, assinou requerimento pedindo urgência para a tramitação da proposta. Considerava que a matéria era de "relevante e inadiável interesse nacional".

Peso extra
José Genoino, então líder do PT, também assinou o pedido de urgência do projeto do 13º salário para ex-congressistas. A oposição agora vai tentar derrubar a proposta, alegando que matérias desse tipo não poderiam ter sido aprovadas por votação simbólica (de líderes).

Efeito cascata
Dificilmente Jader Barbalho será investigado no caso Sudam antes de meados de 2002. A imunidade do primo/ deputado José Priante criou uma blindagem em torno do ex-senador.

Pé na estrada
O PFL prepara uma agenda de eventos para Roseana Sarney em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. A maratona terá início no dia 25, em um evento em Belo Horizonte.

Atração fatal
O PMDB lançará no final de semana a candidatura de Sérgio Cabral Filho, presidente da Assembléia do Rio, ao governo do Estado. Com a intenção de obter o apoio de Garotinho (PSB).

Pista esburacada
Emídio de Souza (PT-SP), que articula a abertura da CPI do rodoanel na Assembléia paulista, diz que são tantas as irregularidades no contrato que o governo Alckmin (PSDB) deveria rebatizar a obra de "romboanel".

TIROTEIO

Da senadora Marina Silva (PT-AC), sobre o governo destinar recursos do fundo de combate à pobreza ao ajuste fiscal:
- No lugar de combater a fome com comida e Bolsa-Escola, o governo combate com mídia. Se isso não é propaganda enganosa, não sei o que é.

CONTRAPONTO

Justa causa
Depois de deixar a Prefeitura de São Paulo em 88, Jânio Quadros resolveu fazer uma viagem de férias à Europa.
Durante o período em que esteve em Londres, aproveitou para encontrar velhos amigos e fazer programas culturais.
Em uma das noites que passou na cidade, marcou um jantar com o amigo Augusto Marzagão. Pediu especial atenção ao horário, pois antes pretendia assistir à montagem inglesa da peça ""O Rei e Eu".
Ao chegar ao restaurante para o compromisso, demonstrava estar mal-humorado.
-Não gostou da peça?- perguntou Marzagão .
- Eu estava tranquilo até que Eloá, minha mulher, deu-me uma cotovelada no meio do espetáculo. Ela queria dizer que seu vizinho de poltrona estava dormindo. Precisava ter-me acordado para dizer uma coisa dessas?!


Editorial

COOPERAÇÃO OU BARBÁRIE

Providencial foi a visita do secretário de Estado norte-americano, Colin Powell, ao Paquistão. O enviado do governo Bush afirmou que membros moderados do Taleban podem compor o futuro governo do Afeganistão. Comprometeu-se com o presidente paquistanês, Pervez Musharraf, em implantar em solo afegão um governo multiétnico democraticamente eleito quando os radicais forem banidos de Cabul. Não deixou de cobrar do governante paquistanês que restaure a democracia em seu próprio território.

Com esse movimento, Powell parece ter ajudado a conduzir dois assuntos delicados dessa ofensiva antiterror. Trata-se do fio de navalha em que se equilibra Musharraf no apoio aos norte-americanos e do risco de que uma vitória do principal grupo opositor ao governo afegão, a Aliança do Norte, não forneça estabilidade política àquela região conflagrada.

Contribuíram para deixar ainda mais complicada a situação de Musharraf o prolongamento dos bombardeios ao Afeganistão, o aumento da pressão interna contra o apoio aos EUA, os expurgos que o presidente paquistanês realizou em seu governo contra dissidências pró-Taleban e o temor de que os norte-americanos deixem caminho livre para a Aliança do Norte ascender ao poder.
Foi oportuna, portanto, a intervenção de Colin Powell. Através dela, os EUA renovaram por mais algum tempo o endosso do Paquistão aos ataques. Porém fica cada vez mais claro que o prolongamento dos bombardeios maciços ao Afeganistão e o seu inevitável e nefasto efeito sobre a população civil são fatores que contam contra a manutenção da ampla rede de apoio internacional construída com muita dificuldade.

Outro elemento que muito preocupa, nesse aspecto, são as contínuas ações de bastidores de alguns assessores de Bush que propugnam por ações militares unilaterais dos EUA contra outros países e outros alvos que não o Afeganistão e a Al Qaeda.
Seria lastimável e perigoso retrocesso romper o multilateralismo que até aqui prevalece na ofensiva antiterror. Sem cooperação internacional, a luta contra o terrorismo se arrisca a acender o estopim que falta para que as coisas se tornem ainda piores.


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10/17/2001


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